Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

4/21/2021

Resolução alternativa de conflitos - Arbitragem

ART. 1418º do CC
(Conteúdo do título constitutivo)


1. (...)
2. Além das especificações constantes do número anterior, o título constitutivo pode ainda conter, designadamente:
a) (...)
b) (...)
c) Previsão do compromisso arbitral para a resolução dos litígios emergentes da relação de condomínio.
3. (...)

Art. 1434º do CC
(Compromisso arbitral)


1. A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios entre condóminos, ou entre condóminos e o administrador (...).
2. (...)

Art. 324º do CC
(Compromisso arbitral)


1. O compromisso arbitral interrompe a prescrição relativamente ao direito que se pretende tornar efectivo.
2. Havendo cláusula compromissória ou sendo o julgamento arbitral determinado por lei, a prescrição considera-se interrompida quando se verifique algum dos casos previstos no artigo anterior.

Quanto ao Centro de Arbitragem

O recurso a um Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo é uma forma alternativa para a resolução dos conflitos entre os condóminos, entre estes e o administrador ou entre o condomínio e terceiros prestadores de serviços diversos, não tendo os inconvenientes dos tribunais, tais como os elevados custos, a complexidade do processo judicial e a sua reconhecida lentidão.

Esta solução pode revelar-se de grande utilidade, nomeadamente, quando não houver um Julgados de Paz situado no concelho onde se situa o condomínio ou, havendo-o, se o valor da causa exceder o montante limite estabelecido para a sua competência (valores que não ultrapassem os € 15 000).
 
A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios entre condóminos, ou entre estes e o administrador, mediante disposição contida no regulamento do condomínio (cfr. art. 1429ºA do CC) ou do TCPH (cfr. art. 1418, nº 2, al. b) do CC), aprovada por unanimidade e nos termos do art. 1432º, nº 5 e segs. do CC.

No entanto, no âmbito do consumo, o art. 15º, nº 1, da Lei nº 23/96 aplica-se mesmo que não tenha sido celebrado um contrato entre as partes, podendo o litígio de consumo resultar de uma relação pré-contratual ou até mesmo não contratual, sendo, para tanto, essencial que exista uma relação entre as partes.

O condomínio tem assim legitimidade para iniciar uma acção arbitral num centro de arbitragem de consumo desde que possa ser qualificado como consumidor, o que sucede sempre que, numa perspectiva objectiva, o bem ou o serviço em causa possa ser considerado um bem ou um serviço de consumo para uma das pessoas que o condomínio representa, como é o caso do condomínio do demandante.
 
O processo corre os seus termos em conformidade com o Regulamento do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo (Autorizado por despacho do Secretário de Estado da Justiça nº 20778, de 8 de Setembro de 2009, publicado no Diário da República, 2ª série, de 16 de Novembro de 2009, pp. 37874 e 37875), e pode concretizar-se de duas formas: (i) através de pessoas escolhidas de comum acordo pelas partes (árbitros); ou (ii) através de centros especializados.

No primeiro caso, os condóminos terão necessariamente que observar o cumprimento de algumas regras, designadamente: (i) Ambas as partes têm o direito de serem tratadas com igualdade; (II) A parte contra quem é proposta a acção tem o direito a apresentar a sua defesa; e (III) Antes de proferida a decisão, as partes conflituosas podem pronunciar-se, oralmente ou por escrito.

Acresce ressalvar que, salvo convenção em contrário, a decisão deve ser proferida dentro de um prazo de 6 meses após a designação do último árbitro, a qual deve ser fundamentada e definir qual a repartição dos custos do processo. Importa outrossim salientar que, regra geral, as decisões da arbitragem têm o mesmo valor de uma sentença proferida por um tribunal de primeira instância.
 
Como funciona o processo de arbitragem?

O demandante pode deslocar-se pessoalmente, enviar os documentos por correio electrónico ou preencher um formulário disponibilizado na página do site do Centro, onde alega em síntese os factos, juntando toda a prova que lograr produzir e que sustente os mesmos, documentos estes que serão juntos ao processo.
 
Os juristas começam por avaliar se o caso pode ir a julgamento. Caso afirmativo será subsequentemente designado o árbitro signatário por despacho da coordenação do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo.

A parte demandada é citada para contestar no prazo de 10 dias, nos termos do art. 14º, nº 2, do Regulamento, para apresentar, se assim o entender, a sua contestação. Se não contestar no prazo havido definido, é proferido um despacho pelo tribunal arbitral, dando nota da ausência de contestação por parte da demandada.

Contestando, segue-se o processo de arbitragem propriamente dita. Subsequentemente e nos termos do art. 14º do Regulamento do CNIACC, o juiz considera, no despacho que estando reunidos todos os elementos para decidir, convida as partes a vir ao processo, no prazo de 10 dias a contar da notificação daquele despacho, e apresentarem, querendo, alegações finais.

Além da questão material, o juiz pode dar nota que pode importar, ainda, resolver, no âmbito do processo, como questões prévias, a competência do Centro (saber se existe um litígio de consumo entre as partes) e a legitimidade substantiva do demandante (por um lado, saber se é condómino, administrador ou terceiro titular de direitos sobre as fracções (se não declarar primitivamente a sua qualidade); por outro lado, saber se o direito à indemnização pode ser exercido por aquele ou se tem de ser exercido pelo condomínio, na pessoa do seu legítimo administrador).

O despacho é então notificado às partes. O demandante pode então juntar novos documentos de prova (nomeadamente da sua qualidade) e bem, acrescentar as suas alegações finais, sendo a parte demandada notificada destes elementos, a qual, por seu turno, também pode responder, juntando os documentos de prova que julgar oportunos. Desta alegação será também notificada a parte demandante.

Concluídos estes expedientes, o juiz estará em condições de decidir. Porém, antes de analisar qualquer outra questão, o juiz começa por verificar se o tribunal arbitral é competente para a resolução daquele litígio.

Este poderá decidir que o demandante submeteu o presente litígio à apreciação daquele tribunal arbitral ao abrigo do art. 15º, nº 1, da Lei nº 23/96 (Lei nº 23/96, de 26/7, alterada pelas Leis nº 5/2004, de 10/2, 12/2008, de 26/2, 24/2008, de 2/6, 6/2011, de 10/3, 44/2011, de 22/6, e 10/2013, de 28/1), que estabelece que “os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à apreciação do tribunal arbitral dos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados”.

Seguidamente observa se foi celebrado qualquer contrato entre o demandante e a demandada. Não o existindo e segundo o entendimento generalizado de que não é fundamental que exista um contrato entre as partes, para que o art. 15º, nº 1, da Lei 23/96 seja aplicável, podendo o litígio de consumo resultar de uma relação pré-contratual ou até mesmo não contratual.

Finalmente, importa sublinhar que nas acções contra terceiros, deve agir quem tiver uma relação com a entidade demandada e, portanto, nestes casos só o condomínio poderia – e poderá, se assim o entender, através do administrador – iniciar o processo de arbitragem ao abrigo do art. 15º, nº 1, da Lei, até porque, a verificar-se uma eventual indemnização pelos factos subjacentes ao processo deve ser atribuída ao condomínio –e não a cada um dos condóminos –, que depois decidirá o destino a dar ao valor em causa, sob pena da absolvição da demandada da instância por incompetência do tribunal arbitral. 
 
Quanto custa recorrer aos Centros de Arbitragem de Conflitos?

Se pensa que recorrer a este tribunal pode ser dispendioso, vamos aos custos: 
- Para se inscrever tem de se pagar 10 euros. 
Se a mediação não resultar e for preciso comparecer perante um juiz:
- Se o bem comprado ou serviço prestado for inferior a 200 euros, o queixoso não paga nada;
- Se o bem comprado ou serviço prestado for até 1 000 euros, o custo é de 20 euros;
- Se o bem comprado ou serviço prestado for entre os 1 001 e 2 000 euros, paga 30 euros;
-
Se o bem comprado ou serviço prestado for entre 2 001 e 5 000 euros, paga um máximo de 40 euros.
 
Atente contudo que cada centro pode ter as suas próprias taxas, pelo que pode consultar as tabelas do que fica mais próximo. Não é preciso contratar um advogado, pelo que o queixoso pode defender-se a si próprio. Em conflitos de água, luz, gás, telecomunicações e bancos (em algumas situações), as empresas são obrigadas a comparecer neste tribunal. As outras só comparecem se quiserem, sendo muito raro haver uma recusa.
 
Para mais informação, os condomínios podem:

Consultar o Regulamento do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo.

Ou contactar directamente o Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo:

Endereço: R. Dom Afonso Henriques Nº1, 4700-030 Braga
Telefone: 253 619 107
E-mail: geral@cniacc.pt
Horário: Segunda a Sexta, das 9h às 16h

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