Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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15 julho 2024

Quarta parte do rendimento colectável


A fixação de penalidades por atraso no cumprimento da obrigação de pagamento de quotas de condomínio, ou de outras obrigações dos condóminos, vem prevista no nº 1 do art. 1434º do CC. Estas “penalidades”, têm duas funções ou objetivos: (a) pressionar os condóminos ao cumprimento e, também, (b) estabelecer a compensação (indemnização) a que o condomínio tem direito em caso de mora ou incumprimento.

Tratando-se, de uma efetiva cláusula penal moratória, a sua fixação está também sujeita ao disposto nos art. 811º e 812º do CC. Em conformidade com estes normativos, pode a cláusula penal ser reduzida equitativamente quando o seu valor se revelar manifestamente excessivo (nº 2 do art. 812º).

O nº 2 do art. 1434º do citado código, norma de natureza imperativa, fixa um limite máximo às penalidades aplicáveis em cada ano. Esse limite corresponde “à quarte parte do rendimento coletável anual da fração do infractor”.

Como se sabe, o rendimento coletável correspondia a um conceito de natureza fiscal, no âmbito do Código da Contribuição Predial, e que desapareceu do ordenamento jurídico com a aprovação do Código da Contribuição Autárquica (através do DL 422-C/88, de 30.11), dando lugar, para efeitos de tributação de imóveis, à figura do “valor patrimonial”. Contudo, são realidades distintas não podendo esta, sem mais, substituir aquela. 

Na verdade, o rendimento coletável anual correspondia à utilidade económica que os prédios proporcionavam ou eram suscetíveis de proporcionar aos seus proprietários – quer em caso de recebimento de rendas, quer em caso de fruição pelo próprio -, considerando o período de um ano, e que, enquanto receita, constituía a base de cálculo do imposto ou coleta a pagar. 

O “valor patrimonial” corresponde ao efetivo valor do prédio apurado segundo parâmetros legais e constitui a referência para aplicação de uma taxa variável (entre 0,5 e 0,8) cujo produto corresponde ao imposto a pagar. Estes parâmetros de avaliação contêm-se, atualmente, no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), aprovado pelo DL nº 287/2003, de 12-11, cujo art. 31º revogou expressamente o Código da Contribuição Autárquica (e as normas, ainda vigentes à data, do Código da Contribuição Predial).

Não obstante a dissemelhança dos conceitos, a doutrina e a jurisprudência têm convergido no sentido de que, pese embora a referência a “rendimento coletável”, não existe revogação tácita daquele art. 1434º “ou necessidade do mesmo ser interpretado ou integrada qualquer lacuna, fazendo antes apelo ao regime transitório previsto no art. 6º do DL .º 442-C/88, de 30 de Novembro, que aprovou o Código da Contribuição Autárquica” (veja-se Ac. do TRL, do Relator Tomé Gomes, Proc.984/10.OXVLSB.l1-7, proferido em 13.11.2012, publicado em www.dgsi.pt).

Segundo o nº 1 do art. 6º do DL 422-C/88, de 30 Novembro, que, como se disse, era uma disposição destinada a salvaguardar a transição de regimes:

1 - O valor tributável dos prédios urbanos, enquanto não for determinado de acordo com as regras do Código das Avaliações, será o que resultar da capitalização do rendimento colectável, actualizado com referência a 31 de Dezembro de 1988, através da aplicação do factor 15.
2 - O rendimento colectável dos prédidos urbanos não arrendados, reportado a 31 de Dezembro de 1988, é desde já objecto de uma actualização provisória de 4% ao ano, cumulativa, com o limite máximo de 100%, desde a última avaliação ou actualização, não se considerando para o efeito a que resultou da aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 69.º da Lei n.º 2/88, de 28 de Janeiro.

Acompanhando o citado Acórdão, temos que, partindo desta base, cabe ao tribunal “ ponderar, em cada caso concreto, se a sanção pecuniária fixada pela assembleia de condóminos ultrapassa o limite máximo que resulta do nº 2 do art. 1434º do CC, nomeadamente apelando ao valor tributável conhecido com referência ao ano mais próximo, sujeito ao factor 0,15 e, nos termos do nº 2 do art. 1434.º do CC, encontrar a quarta parte do mesmo, daí resultando o limite anual máximo da sanção, independentemente do número de infracções.”

A título ilustrativo, o documento evidencia que o valor patrimonial tributável da fracção foi de €93.572,13, em 2012. Admitindo-se que este valor foi fixado em 2010, sendo igual em 2011, anos em que ocorreram as faltas de pagamento de quotas de condomínio, cabe, então multiplicá-lo pelo fator 0,15. Obtém-se o montante de €14.035,82 e calcula-se a quarta parte deste valor, apurando-se um resultado de €3.508,95. Este é, à luz restrita do nº 2 do art. 1434º do CC, o valor máximo da penalidade exigível, em cada ano e independentemente do número de infrações por ele praticadas.

Havendo embora quem entenda que o limite a que alude o art. 1434º/2 do CC, deve ser calculado em função da colecta resultante da aplicação da taxa municipal ao valor patrimonial não cremos, com o devido respeito, que seja a melhor solução. Na verdade, estas taxas de imposto podem variar - segundo decisão da Assembleia Municipal - entre 0,5% e 0,8% (cfr. art. 112º do CIMI) – e esse facto, retira consistência, uniformidade e objectividade ao conceito o que, salvo melhor opinião, introduz desarmonia e desequilíbrio no sistema.

Mas será que a exigência de uma tal cláusula penal, apesar de se conter dentro dos limites legais do nº 2 do art. 1434º do CC, não é, à luz de juízos de equidade, manifestamente excessiva e não deve ser reduzida como preceitua o art. 812º do CC?

Prevê este normativo que a cláusula penal possa ser reduzida pelo tribunal de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente. O mesmo sucede nos casos em que a obrigação tenha sido parcialmente cumprida.

Há também convergência da doutrina e da jurisprudência no sentido de que cabe ao Demandado invocar, fundadamente, a desproporcionalidade da cláusula. Essa apreciação pode ocorrer por força do art. 26º da LJP.

Vejamos, então.

A obrigação cujo cumprimento aqui se exige tem natureza pecuniária. Nas obrigações pecuniárias, o devedor que não cumpra atempadamente incorre na obrigação de indemnizar o credor pelo dano que lhe causou. Essa indemnização corresponde aos juros de mora, à taxa legal, desde a data do incumprimento até integral pagamento (cfr. art. 804º a 806º do CC). A taxa de juros de mora legal corresponde a 4%.

Se no caso relatado tivesse sido aplicada a taxa de juros legal, a penalidade a cargo do Demandado, relativamente ao ano de 2010, em que as quotas não pagas perfaziam €220,64 e foram pagas antes do final de junho de 2013, rondaria os €22. Este montante é de tal forma irrisório que a sua mera aplicação como sanção pecuniária lhe retiraria toda a força dissuasora de abusos de falta de pagamento. Na verdade, como já se disse, a fixação de uma cláusula penal estabelecida para o atraso no pagamento tem uma dupla função coercitiva e indemnizatória.

Na PH, a cláusula penal tem o objectivo de punir os inadimplentes não só pela falta de entrega, em si, de receitas que pertencem ao condomínio mas, sobretudo, pelos prejuízos que a todos causa a falta de contribuição de alguns para a gestão e conservação das partes comuns do prédio, desde a limpeza dos espaços comuns até à realização de obras de conservação, por vezes, de caráter urgente. E a falta de cumprimento é, ainda, grave num condomínio, porquanto é geradora de mau estar nas relações entre os comproprietários, comprometendo, muitas vezes, o bom funcionamento das assembleias e a sã discussão de temas do interesse de todos. Neste enquadramento não se afigura adequado que a cláusula penal se limite aos juros moratórios à taxa legal; ela deve ser mais gravosa.

Uma cláusula penal que impõe o pagamento de €5 por cada mensalidade em atraso e por cada mês em que perdurar o atraso desde que este seja superior a 90 dias não se nos afigura, na perspectiva simples do montante fixado, exagerada. Todavia, quando o atraso corresponde a várias quotas e perdura por vários meses ela é suscetível de conduzir a valores exorbitantes, que ultrapassarão largamente o prejuízo efetivamente sofrido, pois não está sujeita a um limite máximo que interrompa a contagem da penalidade; antes se verifica que continuará a contar-se ad eterno, enquanto não ocorrer o pagamento. Por outro lado, esta penalidade é igual para todos os condóminos independentemente do valor das quotas a cargo de cada um, o que impede que cada um seja penalizado na proporção do prejuízo efetivamente causado com o atraso. Convenhamos que, embora do ponto de vista da conduta em si, tanto seja censurável a falta de pagamento de uma quota de €20 como uma de €40, já causará mais danos na gestão do prédio a falta de pagamento da segunda.

Voltando à situação concreta, apuramos que no caso do Demandado - a quem competia pagar em 2010 uma quota mensal de €27,58 e a quem está a ser exigida uma penalidade de €5 por cada mês de atraso - a penalidade representa um valor correspondente a 18,13% por cada mês de mora, o que, feitas as contas, vem a corresponder a uma taxa de juros anual de 217,56%. Num segundo ano de mora, a taxa passa a ser de 435,12% e em três anos e meio é de 543,9% que é, sensivelmente, o que vem imputado ao Demandado relativamente às quotas vencidas em 2010 e pagas em 2013.

Vista nesta perspetiva, a cláusula penal em estudo revela-se, em termos de equidade, manifestamente excessiva. É que, não pode a sanção ser de tal forma pesada que exceda os normais ditames da vida em sociedade, podendo tomar-se como referência outras actividades em que a mora no cumprimento de uma obrigação pecuniária e os danos daí resultantes são antecipadamente calculados, mantendo-se um equilíbrio entre o sancionamento eficaz e a manutenção da sanção em limites que não levem ao desencorajamento da liquidação ainda que atrasada.

No caso presente, em face da desproporção da taxa de juro anual, a que efetivamente corresponde a aplicação da sanção de €5/mês, perante o regime geral da mora, justifica-se a redução equitativa de tal sanção por se revelar manifestamente excessiva (vide art. 812º do CC).

Note-se que, não havendo redução, permite-se, na prática, um verdadeiro enriquecimento do condomínio sem causa justificativa e à custa dos seus comproprietários pois os montantes recebidos situar-se-iam muito para além dos prejuízos sofridos. Por outro lado, e como já dissemos, essa redução não pode conduzir a um valor muito baixo sob pena de retirar eficácia à cláusula penal.

Posto que se nenhuma das partes aduzir factos que permitam conhecer as concretas qualidades do imóvel, nomeadamente, em termos de utilidades proporcionadas pelas partes comuns e, tão-pouco, o nível sócio económico dos seus comproprietários, resta-nos o bom senso, as regras da experiência comum e as orientações legais acima enunciadas. Em tais termos, afigura-se-nos adequado, partindo da base de €5/mês que foi a vontade expressa dos condóminos, fixar um limite máximo ao cálculo das penalidades, limite este que será igual ao valor da quota em mora.

Dito de outro modo, à deliberação de “ qualquer Condómino que apresente mensalidades em dívida por um período superior a 90 dias, acresce a cada uma das referidas mensalidades uma sanção pecuniária de €5 (cinco euros) mensal até à completa regularização das mesmas” acrescentaremos “ A sanção a aplicar terá como limite máximo um valor igual ao da(s) mensalidade(s) não paga(s)”.

No caso, as quotas não pagas perfazem, em 2010, €220,64; em 2011, perfazem €330,96 e em 2012 perfazem €220,64, o que dá um valor global de €772,24. Logo, a penalidade máxima exigível, segundo a equidade e atendendo à demora no pagamento, corresponde a um valor igual a essas quotas, logo, a €772,24.

06 maio 2021

Fixação de penas pecuniárias - II

Estatui o art. 1434º do CC (cfr. nº 1, 2ª parte), que a assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições do código, das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador, sendo que o nº 2 do mesmo artigo estabelece um tecto para aquelas sanções: o montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor.

Ao abrigo destas disposições, o condomínio pode incluir no seu regulamento regras das quais resulte que a mora no cumprimento de certas obrigações dos condóminos, nomeadamente a mora no pagamento das quotizações dos condóminos, dará lugar a uma multa correspondente a um determinado valor ou percentagem do somatório das importâncias em dívida e das multas já vencidas.

Regra geral, as normas sancionatórias constam, do regulamento do condomínio aprovado em assembleia de condóminos – e não de deliberações aprovadas ad hoc da assembleia, no entanto, a norma também as parece admitir. Estas sanções, como ensina Rui Pinto Duarte, afastam-se da cláusula penal, prevista e regulada nos art. 810º a 812º do CC, por não dependerem do acordo de todos os que as podem sofrer, e afastam-se da sanção pecuniária compulsória, prevista no art. 829º-A do mesmo código, por não dependerem de decisão jurisdicional (Anotação ao art. 1434º, in Código Civil Anotado, II, Ana Prata (coord.), Coimbra: Almedina, 2017, p. 289).

O administrador exequente deve oferecer à execução as actas das assembleias de condóminos que aprovaram o regulamento do condomínio e a alteração ao mesmo, que contemplam as penas pecuniárias aludidas, podendo completar o requerimento executivo com a alegação referente à mora do executado e juntar, ainda, acta da assembleia de condóminos de onde consta o valor da dívida do executado e a concessão à administração de autorização e poderes para actuar judicialmente, com vista à respectiva cobrança.

No anterior artigo abordou-se o argumento de que as actas não constituem título executivo para a cobrança das penas pecuniárias (serviriam apenas de título para a cobrança das quotas mensais em dívida). Ora, nos termos do disposto no nº 1 do art. 6º do DL 268/94, de 25/10, epigrafado «Dívidas por encargos de condomínio», «a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.».

Destarte, a solução passa, portanto, por saber se o novo título executivo previsto no artigo acabado de transcrever abrange as penas pecuniárias que um condómino deva ao condomínio, ou seja, há que descortinar se o trecho da norma que refere o «montante das contribuições devidas ao condomínio» abrange a pena pecuniária referente ao valor em dívida, deliberada em assembleia de condóminos.

Percebê-lo passa exclusivamente pela interpretação da norma, que importa fazer socorrendo-nos dos parâmetros interpretativos das normas fornecidos pelo art. 9º do CC, a saber: "1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

Assim, há que ler o texto do nº 1 do art. 6º do DL 268/94 no seu conjunto, pois o sentido de cada trecho desse número tem de ser avaliado em confronto com os demais, descobrindo-se dessa forma a coerência de cada parte e do todo. Separemos os vários elementos da norma: (i) acta da reunião da assembleia de condóminos que tenha deliberado, (ii) o montante das contribuições devidas ao condomínio ou  (iii) quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, (iv) constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

O facto do legislador ter distinguido «contribuições devidas ao condomínio» e «despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio» parece-nos evidenciar que não quis deixar de fora qualquer tipo de valor que os condóminos ou alguns deles devam entregar ao acervo comum.

A interpretação textual da norma indica que «as contribuições devidas ao condomínio» são todas as que ao condomínio forem devidas, com fundamento em qualquer norma válida, independentemente da fonte desta. O brocardo romano «ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus», acolhido no art. 9º do CC, pela prevalência que este dá ao elemento literal da interpretação, tem aqui pleno sentido.

Outros cânones hermenêuticos indicam o mesmo caminho. O objectivo do regime da PH delineado pelo DL 268/94, de 25/10, está expresso no seu preâmbulo: «as regras aqui consagradas estatuem ou sobre matérias estranhas à natureza de um diploma como o Código Civil ou com carácter regulamentar, e têm o objectivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros». Nos termos do seu art. 1º, são obrigatoriamente lavradas atas das assembleias de condóminos e as deliberações nelas consignadas são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções.

Cumprindo o anunciado objectivo, o art. 6º do diploma acrescenta ao universo dos títulos executivos a ata da assembleia de condóminos que tenha deliberado contribuições que cada condómino deva entregar ao condomínio, obviando a que o condomínio tenha de percorrer uma acção declarativa cada vez que um condómino entra em mora no pagamento dos devidos valores (o nº 2 expressa que o administrador instaurará a acção judicial, executiva, destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior). 

Deixar de fora parte das prestações devidas seria inviabilizar a eficácia expressamente intencionada, portanto é concebível que o legislador tenha querido que a acta valha como título executivo para quotizações fixas de condomínio (já de si, em termos absolutos, de baixo valor), mas não tenha querido conferir-lhe essa força para cobrança de penas que importam em pequena percentagem do valor das contribuições em dívida? 

Sendo que a imposição de penas pecuniárias é permitida por lei (cfr. art. 1434º do CC) e tem exactamente o mesmo fim de eficácia na gestão do condomínio que o art. 6º do DL 268/94 pretende alcançar com a instituição de um novo título executivo. Terá o legislador querido sujeitar o condomínio a uma acção declarativa para ulteriormente poder cobrar valores tão baixos? 

Não será de crer, até porque isso corresponderia a tornar essas penalizações letra morta, pois os custos da sua cobrança (a incluírem uma acção declarativa) desencorajariam o esforço. No entanto, a interpretação do art. 6º do DL 268/94 não tem sido unânime:

No sentido da posição que aqui defendida, podem ler-se, por ordem cronológica crescente: Ac. TRL de 08/07/2007, proc. 9276/2007-7; Ac. TRL de 20/02/2014, proc. 8801/09.8TBCSC-A.L1-2; Ac. TRG de 22/10/2015, proc. 1538/12.2TBBRG-A.G1; Ac. TRL de 07/04/2016, proc. 2816/12.6TBCSC-A.L1-2; Ac. TRP de 17/05/2016, proc. 2059/14.4TBGDM-A.P1; Ac. TRG de 02/03/2017, proc. 2154/16.5T8VCT-A.G1; Ac. TRL de 15/02/2017, proc. 9207/2006-2 (parte final do texto, antes da decisão); Ac. TRG de 30/11/2017, proc. 2159/168VCT-A.G1, todos acessíveis em www.dgsi.pt.

Em sentido inverso – de que a expressão «contribuições devidas ao condomínio», constante do art. 6º do DL 268/94, não abrange «penas pecuniárias devidas ao condomínio» –, podem ler-se, também por ordem cronológica crescente: Ac. TRG de 08/01/2013, 8630/08.6TBBRG-A.G1; proc. Ac. TRC de 21/03/2013, CJ XXXVIII, II, 19; Ac. TRC de 04/06/2013, proc. 607/12.3TBFIG-A.C1; Ac. TRL. de 01/07/2014, proc. 837/12.8YYLSB-A.L1-1; Ac. TRP de 16/12/2015, proc. 2812/13.6TBVNG-B.P1; Ac. TRL de 02/06/2016, proc. 16871-11.2T2SNT-8; Ac. TRC de 07/02/2017, proc. 454/15.0T8CVL.!.C1; Ac. TRP de 07/05/2018, proc. 9990/17.3T8PRT-B.P1; Ac. TRL de 11/12/2018, proc. 2636/14.3T8OER-A.L1-6; Ac. TRL de 22/01/2019, proc. 3450/11.3TBVFX.L1-7, publicados em www.dgsi.pt, na falta de outra indicação.

Na doutrina, no sentido da leitura restritiva da expressão «contribuições devidas ao condomínio», encontra-se a seguinte passagem de Rui Pinto, Novos estudos de Processo Civil, Petrony, 2017, p. 192: «esta acta não constitui título executivo de quaisquer outras obrigações pecuniárias do condómino, como o pagamento das penas pecuniárias fixadas pela assembleia de condomínio, nos termos do art. 1434.º CC. Esta última conclusão decorre do princípio da taxatividade e literalidade das normas que preveem títulos executivos e a que voltaremos adiante: as penalidades não são nem “contribuições”, nem “despesas”, mas obrigações sucedâneas por incumprimento.».

O argumento do Autor centra-se no entendimento segundo o qual na palavra «contribuições» não cabem «penalidades». O invocado princípio da taxatividade dos títulos executivos não afasta a posição aqui defendida, pois o que se diz é que a norma do art. 6º prevê que a acta da reunião da assembleia de condóminos que tenha deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio, incluindo nestas as penalidades a aplicar ao condómino inadimplente ao abrigo do art. 1434º do CC, constitui título executivo contra o proprietário em mora.

Encontramos, ainda, referência ao tema, em anotação de Rui Pinto Duarte ao art. 1424º, no citado Código Civil Anotado, II, coord. de Ana Prata, p. 261: «A solução da terceira interrogação parece ser a de que as actas não valerão como títulos executivos a não ser quanto ao referido no art. 6º do Dec.-Lei 268/94, de 25 de outubro. V., por ex., ac. do TRC de 29-3-2013 (in CJ, ano XXXVIII, tomo II, 2013, pp. 19 e ss.)».

No sentido que se propõe e na linha da nossa argumentação, Sandra Passinhas no seu A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2.ª ed., Almedina, 2002, pp. 274-275: «A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das penas constitui título executivo contra o proprietário, enquadra-se na expressão “contribuições devidas ao condomínio”, e cai no campo de aplicação do artigo 6º do DL 268/94. 

Embora, rigorosamente, a pena pecuniária não seja uma “contribuição devida ao condomínio”, esta é a solução mais conforme à vontade do legislador. Não faria sentido que a acta da reunião da assembleia que tivesse deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio servisse de título executivo contra o condómino devedor, e a mesma acta não servisse de título executivo para as penas pecuniárias, aplicadas normalmente para punir os condóminos inadimplentes». 

Mais recentemente, a mesma Autora voltou a expressar a mesma posição, ainda que a propósito do desrespeito de uma deliberação da assembleia diferente da que estabelece o valor das quotas de condomínio: «Se a assembleia proíbe a circulação de animais à solta nas partes comuns de um edifício, e um dos condóminos pura e simplesmente não respeita a proibição, quid iuris? Nos termos do art. 1434º, a assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das suas deliberações e das decisões do administrador, sendo que a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das penas constitui título executivo contra o proprietário, nos termos do art. 6º, do DL 268/94, de 25 de Outubro» – Sandra Passinhas, «Os animais e o regime português da propriedade horizontal», Revista da Ordem dos Advogados, Ano 66, Vol. II (2006), disponível em https://portal.oa.pt/comunicacao/publicacoes/revista/ano-2006/ano-66-vol-ii-set-2006/

Compreende-se que a questão aqui suscitada não tenha uma resposta unânime, o que é causado por uma menos clara redação conferida ao art. 6º do DL 268/94, que uma futura intervenção legislativa poderá suprir. Entretanto, entende-se que, na melhor interpretação, no âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem não apenas as despesas extraordinárias necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício e as quotas fixas destinadas à satisfação das despesas comuns ordinárias (limpezas, manutenção de equipamentos, contribuições para o fundo comum de reserva, pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, etc.), como todas as contribuições devidas ao condomínio, incluindo as penas pecuniárias fixadas ao abrigo do disposto no art. 1434º do CC.

05 maio 2021

Fixação de penas pecuniárias - I

O Ac. do TRL de 30-04-2019 decidiu que : "I. A assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das suas deliberações, nomeadamente, penas pecuniárias a aplicar ao condómino em mora no pagamento das quotas de condomínio. II. A acta da reunião da assembleia de condóminos que deliberou a aplicação e o montante dessas penas constitui título executivo contra o proprietário em mora."

Logo, o administrador exequente pode intentar uma execução com vista à cobrança coerciva de dívidas, correspondentes, para além do mais, a quotas de condomínio vencidas e não pagas, com base em actas de condomínio, englobando naquela quantia valores a título de “cláusula penal”.

Nos termos do disposto no art. 10°, nº5, do CPC, “Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”, e nos termos conjugados dos arts. 703°, nº1, al. d), do CPC, e 6° do DL 268/94, de 25 de Outubro:  “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título estabelecido na sua quota-parte”. 

No entanto, João Vasconcelos Raposo, in "Manual da Assembleia de Condóminos", Quid Iuris, 2011, p.89, observa que: "Título executivo é apenas referente a despesas necessárias a conservação e fruição e pagamento de serviços de interesse comum. Isto é, a acta não constitui título executivo se documentar quaisquer outras despesas que não estas. Deve interpretar-se esta referência como restrita a despesas e serviços prestados no próprio condomínio ou directamente conexionados com estes." 

Considerando esta opinião, cumpre, também, saber se uma penalidade quando peticionada se integra ou não no título executivo previsto no supra citado art. 6º, nº1, tendo em atenção o princípio da tipicidade que subjaz a esta matéria.

Ora Sandra Passinhas defende que “deve ser amplo o campo de aplicação da expressão "contribuições devidas ao condomínio", incluindo as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com as inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio do seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penas pecuniárias fixadas nos termos do art. 1434º” – in A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, Almedina, 2000, pág. 310. 

O que claramente parece resultar do citado art. 6º, conjugado com o referido art. 703º, nº 1, al. d), do CPC, é que apenas constitui título executivo a acta que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, não estando aqui referidas quaisquer penalidades.

Efectivamente, se bem se atentar ao preceito em referência reporta-se aos encargos de conservação e fruição previstos no art. 1424º do CC, aos encargos com inovações e com as reparações indispensáveis e urgentes a que aludem os art. 1426º e 1427º do CC e, no caso especial previsto no art. 1429º, nº 2, mesmo o encargo com o seguro obrigatório, sendo estes são os encargos e despesas legalmente estabelecidos a cargo dos condóminos e cujo pagamento pelos mesmos é uma obrigação decorrente da opção pela aquisição duma fracção em PH, não lhe sendo lícito desonerar-se das despesas necessárias à sua conservação e fruição (art. 1420º, nº 2, do CC). Trata-se dos encargos e despesas resultantes da compropriedade relativa às partes comuns do edifício.

Questão diferente são as penas ou sanções pecuniárias estabelecidas pela inobservância das disposições que regem esta forma de propriedade, as quais estão na livre disponibilidade dos condóminos que as podem ou não fixar, conforme da expressão pode vertida no nº 1 do art. 1434º do CC resulta. Portanto, tratando-se de uma possibilidade da AG, cumpre aferir se no espírito do legislador tenha estado a sua equiparação àquelas que são as obrigações legais dos condóminos, estabelecidas para salvaguardar o facto de na propriedade horizontal o condómino ter o direito de propriedade sobre a sua fracção, mas ser apenas comproprietário das partes comuns.

Como tal, tendo o legislador declarado que a acta da assembleia de condóminos constitui título executivo quanto aos encargos previstos no art. 6º, nº 1, do DL 268/94, em cuja letra não estão previstas as penas pecuniárias, não pode quanto a estas haver execução sem título e, como tal, não pode a acta da assembleia de condóminos em que as mesmas foram fixadas, servir de base à execução do montante relativo às penalidades?

Com efeito, os títulos executivos são os indicados na lei como tal – art. 703º CPC –, estando a sua enumeração legal submetida a uma regra de tipicidade sem possibilidade de quaisquer excepções criadas, estando, assim, vedado às partes não só a atribuição de força executiva a um documento a que a lei não reconheça eficácia de título executivo, como ainda a recusa de um título legalmente qualificado como executivo – neste sentido, Ac. TRC, de 21.03.2013, relatado por José Avelino Gonçalves, in www.dsgi.pt.

Nesta conformidade, não existe fundamento para aplicação analógica da referida regra (art. 10º, nº 2, do CC), pela simples mas evidente razão de que a lei não prevê que seja título executivo quanto a estas, e não procederem no caso omisso, atenta a natureza facultativa das penalidades, as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei: a constituição de título executivo especial para as despesas e encargos obrigatórios para o condómino.

Efectivamente, a especial força atribuída por lei às actas das assembleias de condóminos quanto à possibilidade de servirem de base à execução, restringe-se àquelas despesas que se encontram taxativamente previstas no referido normativo, o qual apenas se reporta às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, bem como ao pagamento de serviços comuns que não devam ser suportadas pelo condomínio.

Portanto, parece que só quanto a estas pode constituir título executivo, e não quanto a quaisquer outros montantes objecto de deliberação facultativa dos condóminos, mas não previstos legalmente. Assim sendo, conclui-se que a acta da assembleia de condomínio não constitui título executivo quanto ao montante relativo à penalidade deliberada e contida no regulamento do condomínio contra o devedor que não cumpriu pontualmente o pagamento das quotizações de condomínio em dívida – ver, no mesmo sentido, Ac. RC, de 21.03.2013, relatado por Albertina Pedroso; e mais recentemente, o Ac. RL, de 02.06.2016, relatado por Octávia Viegas, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

14 abril 2021

Multas pelo atraso pagamento quotas

A assembleia pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições constantes na legislação aplicável ao condomínio, do prazo para pagamento das quotizações, das deliberações da assembleia, do regulamento do condomínio, das decisões do administrador, no entanto, .desde que se observem - cumulativamente - as seguintes condições:

a) que as mesmas se encontrem previstas no regulamento do condomínio (o qual é vinculativo para condóminos e terceiros titulares de direitos sobre as fracções - cfr. nº 2, art. 1º DL 268/94 de 25/10);
b) que respeite o limite referido no nº 2 do art. 1434° do CC (que tem carácter imperativo e não supletivo);
c) que se apure esse rendimento colectável com recurso ao disposto no artº 6º, nº 1, DL 422-C/88 (Código da Contribuição Autárquica).

I- Sobre o imperatividade do limite de ¼ do valor colectável

O nº 2 do art. 1434º nº 2 do CC tem carácter imperativo e não supletivo, atendendo à sua redação, concretamente, quando se ressalva que o montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor. O uso da expressão "nunca" significa que esta meta tem carácter imperativo, interpretado numa perspectiva declarativa, ponderado o que preceitua o art. 9º do CC.

Pires de Lima e Antunes Varela (em CC Anotado, vol. III, pág. 450), em anotação a este normativo, explica que a própria limitação do montante da sanção pecuniária aplicável se insere numa linha geral de orientação do direito civil vigente – art. 812º, 494º, etc., assim, e em primeiro lugar, o regulamento de qualquer condomínio tem de respeitar a lei e, por sua vez, as deliberações dos condóminos têm que respeitar, em primeiro lugar, a lei e, em segundo lugar, o regulamento.

Também Ac. Rel. Porto, de 3/3/2008 decidiu que: "A aplicação de multas pelo atraso no pagamento das quotizações de condomínio, uma vez que se encontre prevista no regulamento do condomínio, a partir da data da respectiva aprovação em assembleia, é vinculativa para todos os condóminos".

Importa ainda observar que, mesmo não tendo sido impugnada a deliberação que aprovou o regulamento, o condómino sancionado pode colocar em crise o valor alcançado pela fórmula prevista para o cálculo da penalidade, se esta não respeitar o limite previsto no mencionado art. 1434º, nº 2 do CC. 

II – Como calcular o rendimento colectável anual da fracção

Primeiramente devemos distinguir o rendimento patrimonial (CIMI) do “rendimento colectável” que consta na caderneta predia. Como explica Sandra Passinhas (em Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pág. 273), a noção de rendimento colectável era dado pelo art. 3º, nº 1 do antigo Código de Contribuição Predial e corresponde ao valor da renda dos prédios arrendados e, quanto aos não arrendados, à utilidade equivalente que deles obtivesse ou tivesse possibilidade de obter quem pudesse usufruir ou usar os mesmos. Com o Código de Contribuição Autárquico, de 1/1/1989, o contribuinte passou a ser tributado pelo seu património e não pelo rendimento que obtinha dos seus prédios, isto é, a base de cálculo do imposto cobrado passou a ser o valor patrimonial atribuído ao imóvel. 

Por sua vez, dispunha o nº 1 do art. 6º do citado DL 422-C/88, que aprovou o CC Autárquica:

1 – O valor tributável dos prédios urbanos, enquanto não for determinado de acordo com as regras do Código das Avaliações, será o que resultar da capitalização do rendimento colectável, actualizado com referência a 31 de Dezembro de 1988, através da aplicação do factor 15”.

2 – O rendimento colectável dos prédios urbanos não arrendados, reportado a 31 de Dezembro de 1988, é desde já objecto de actualização provisória de 4% ao ano, cumulativa, com o limite máximo de 100%, desde a última avaliação ou actualização, não se considerando para o efeito a que resultou da aplicação do disposto no nº 1 do art. 69º da Lei nº 2/88, de 28 de Janeiro

Dito isto, verifica-se que o conceito de rendimento colectável não coincide com o conceito de valor patrimonial tributário e que o legislador – que não desconhece a diferença conceitual –, não acompanhou nem alterou, a redação daquele nº 2, perante as nova normas tributárias entradas em vigor, pelo que se deverá entender que se pretendeu manter o limite das penas por referência ao valor colectável e não ao valor patrimonial tributário. 

É que doutra forma, aquela norma ficaria desprovida de qualquer utilidade e funcionalidade, pelo que no mínimo exigir-se-ia a sua revogação, porquanto não é suposto permanecer nos códigos normas inócuas (cfr. art. 9º e 10º do CC). Assim, esta norma, inserida em sede da PH, permitindo que a assembleia de condóminos fixe penas pecuniárias até à quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor, relativo um determinado período de tempo (anual), não coincide, logicamente, com o valor patrimonial.

Destarte, haverá que atender às normas acima expostas, que estabelecem um critério relacional entre rendimento colectável e valor patrimonial, tanto mais que o CIMI manteve o conceito de tributação fiscal sobre o valor patrimonial atribuído ao imóvel que havia sido adoptado pelo CCA (cfr. art. 1º e 7º do CIMI e 1º e 7º do CCA). Pelo exposto considera-se que se deve aplicar, por se manter intacta a filosofia tributária, o enunciado do já referenciado art. 6º do CCA.

É também consabido que o rendimento colectável é anual e corresponde ao valor da renda dos prédios arrendados e, quanto aos não arrendados, à utilidade equivalente que deles obtivesses ou tivesse possibilidade de obter quem pudesse usar ou fruir dos mesmos, nos termos do CCPredial, correspondendo a uma expectativa de rendimento anula.

Destas sortes, a forma mais adequada de se proceder ao cálculo é o seguinte modo:

Exemplo: Valor Patrimonial Tributário de 80 000 x 0,15 (factor 15 referido no artigo 6º nº 1 do DL nº 442-C/88 = 12 000€ (rendimento colectável).

Depois, é aplicar o ¼ (25%) do nº 2 do art. 1434º do CC, e obter a multa a aplicar, que se for maior tem de ser reduzida a este limite: 12 000 x 25% = 3 000€.

III – Aplicação de juros

O incumprimento da obrigação de contribuir para as despesas comuns do edifício, na proporção legalmente fixada, torna o devedor responsável nos termos do art. 798º e seguintes do CC, pelo que, existindo cláusula penal, apenas a partir da citação serão devidos juros de mora, à taxa legal sobre a quantia.