Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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12 junho 2025

Substituição porta edifício


Tribunal: Tribunal Relação Guimarães
Processo nº: 3389/19.4T8BRG.G1
Relator: Anizabel Pereira
Data: 17/12/2020

Descritores:
  • Propriedade Horizontal
  • Poderes do administrador
Sumário:

- A iniciativa de substituir a porta de acesso a uma parte comum do edifício é uma decisão que cabe no âmbito das competências e funções atribuídas à administração do condomínio, não carecendo para o efeito de ser previamente autorizada ou deliberada pela assembleia.

- Tratando-se de um ato de administração ordinária do administrador do condomínio, não é relevante ponderar se se tratou de obra urgente ou necessária, critérios para aferir da intervenção de um condómino não administrador.

Texto completo: Vide aqui

29 maio 2025

Uso da coisa comum


Nos termos do art. 1406.° do Código Civil, "Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que têm direito."

Na ausência de qualquer acordo, qualquer consorte pode utilizar a coisa, dentro dos fins a que se destina e sem privar os demais dessa utilização. Essa utilização pode ser exercida quanto á totalidade da coisa, independentemente da dimensão quantitativa que a quota traduz.

Por outro lado, a estatuição do art. 1403º, nº 2, do CC, referindo os direitos dos consortes como qualitativamente iguais, pese embora a diferença quantitativa, afasta a ideia de uma unidade do direito, com pluralidade de titulares. A compropriedade tem a natureza de um direito único com pluralidade de titulares, qualitativamente idêntico, mesmo quando quantitativamente distinto.

Em consequência, deve entender-se a faculdade de uso da coisa por cada consorte como referindo-se à coisa em si mesma, na sua totalidade, independentemente da dimensão quantitativa que a quota traduz. Porém, tal direito, tem a limitação legal de não privação do uso pela outra consorte.

Deve entender-se que esta privação do uso tem carácter abstracto, decorrendo da consideração da própria natureza da coisa em conjunção com a utilização a que se destina, ou que tem carácter concreto, decorrendo de uma impossibilidade de utilização efectiva e concretamente pretendida pelo outro consorte?

Ou seja, deve considerar-se que, na falta de acordo, a utilização por um consorte de uma coisa que não permite a utilização simultânea pelos demais implica a privação do uso por estes?

Ou, pelo contrário, mesmo neste caso, só se verificará a privação se em concreto o consorte não utilizador pretender utilizar, vendo-se impedido de o fazer, pela utilização dada pelo consorte utilizador?

A primeira solução, implicaria a derrogação do regime art. 1406º, do CC, quanto às coisas que apenas permitissem o uso exclusivo por um dos consortes, instituindo a obrigação do gozo indirecto e impossibilitando o gozo directo.

É essa a solução quando haja desacordo, mas não parece que seja quando o acordo falte no sentido de nada ter sido estabelecido. A tal se parecendo referir a expressão «falta de acordo» utilizada pelos Autores citados no inciso acima transcrito. O acórdão do STJ de 15 de Fevereiro de 2007, proferido no processo 06B4630 (Cons. Bettencourt de Faria), embora possa inculcar a defesa de posição diversa da defendida, fá-lo fundando-se numa situação de colisão de direitos nos termos do art. 335º, do CC, de que o art. 1406º, nº 1, é exemplo. Porém, a colisão de direitos tem de ver-se não em abstracto, mas na dinâmica concreta do seu exercício.

É nesta concretização da faculdade de usar que se afigura que os Professores Pires de Lima e Antunes Varela exprimem a diferença entre os regimes português e italiano: «o segundo limite do uso da coisa pelo comproprietário é ditado pela necessidade de facultar aos outros consortes a possibilidade de igualmente se serviram dela (…).

A restrição só funciona, porém, em relação às utilizações da coisa que os outros comproprietários possam fazer ou tenham necessidade de fazer. (…) Neste aspecto afigura-se mais feliz a fórmula do Código português, falando no uso a que os outros consortes têm direito (sendo certo que a existência do direito pressuporá, neste caso, a existência da necessidade correspondente), do que a do art. 1102º do Código italiano, que alude à necessidade de o uso feito por um dos consortes não impedir os outros participantes de usarem igualmente a coisa» (sublinhado nosso).

Do que decorre a licitude da utilização exclusiva da coisa em compropriedade por um dos consortes, mesmo quando a coisa não seja susceptível de utilização simultânea por todos. Aliás, tal ocorrerá, na generalidade dos casos, quando apenas um consorte estiver interessado no gozo directo e nenhum dos outros esteja interessado num gozo indirecto a que aquele obste, sem que nada tenha sido em concreto estipulado.

Refere a esse respeito o Professor Carvalho Fernandes: «como é evidente, os problemas surgem, quanto a este limite, nos casos em que não se mostre praticável um fraccionamento do uso. Suponha-se uma situação de compropriedade que tenha por objecto uma fracção autónoma e esta não permita o uso simultâneo de todos os comproprietários. Na falta de acordo, as alternativas são as de não permitir o uso de qualquer dos comproprietários e a de encontrar uma solução sucedânea da prevista na lei. Poderia ela ser a de o comproprietário, que venha a ter o uso exclusivo, compensar os demais pelo valor do uso que exceda a sua quota. Do ponto de vista económico-social, afigura-se-nos ser esta uma solução acertada».

Nessa situação, embora o gozo pelos demais consortes não seja materialmente possível, os mesmos não estão dele privados porque não o pretendem em concreto exercer e enquanto tal se verificar. Caso o pretendam, podem fazer cessar de imediato a utilização exclusiva, pela declaração dessa pretensão; quando a mesma não seja acatada, cessa a licitude da utilização, na medida em que passa a ocorrer

A privação da utilização pelos demais consortes tem de ser apreciada em concreto e não em abstracto pela mera consideração da natureza ou fins a que a coisa se destina; quando assim não fosse, ficaria derrogado o regime do art. 1406º, nº 1, quanto às coisas que apenas permitam o uso exclusivo, impossibilitando o gozo directo por qualquer dos comproprietários.

A restrição a que a norma alude, deve ser apreciada em concreto, cabendo ao consorte não utilizador alegar e demonstrar a privação do uso concreto da coisa. Caso contrário, a mera falta de estipulação consensual poderia privar todos os consortes do uso da coisa em benefício de nenhum deles, pois até o uso indirecto poderia estar vedado; o que, do ponto de vista socioeconómico seria absurdo, podendo até constituir abuso de direito.

A colisão de direitos nos termos do art. 335º, do CC, de que o art. 1406º, nº 1, é uma sub-espécie, tem de ver-se não em abstracto, mas na dinâmica concreta do seu exercício.

17 abril 2025

EMA - cláusulas abusicas


Dispõe o DL nº 446/85, de 25 de Outubro que Institui o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais (contendo as alterações dos seguintes diplomas: DL nº 220/95, de 31/08 e DL nº 108/2021, de 07/12), no seu art. 19º, sob a epígrafe "Cláusulas relativamente proibidas" que:

São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) (...)
b) (...)
c) Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir;
(...)

Jurisprudência:

Ac. STJ,
Data: 09-12-2014,
Proc. 1004/12.6TJLSB.L1.S1,
Relator Martins de Sousa:
Acórdãos do STJ:

-De 26-04-2007, Proc. nº 07B1070;
-De 12-02-2009, Proc. nº 08B4052;
-De 21-10-2010, Proc. nº 1285/07.7TJVNF.P1.S1;
-De 31-05-2011, Proc. nº 854/10.2TJPRT.S1;
-De 15-12-2011, Proc. nº 1807/08.6TVLSB.L1.S1;
-De 24-01-2012, Proc. nº 343/04.4TBMTJ.P1.S1;
-De 30-10-2012, Proc. nº 3313/06.4TVLSB.L1.S1;
-De 11-04-2013, Proc. nº 403/09.5TJLSB.L1.S1;
-De 14-11-2013, Proc. nº 122/09.2TJLSB.L1.S1;
-De 29-01-2014, Proc. nº 8339/11.3TBOER.L1.S1.

Sumário:

I - Os contratos de assistência técnica, manutenção e reparação de ascensores, devem obedecer a determinados requisitos legais, consubstanciando contratos-tipo, celebrados entre os proprietários dessas instalações e as empresas de manutenção de ascensores (EMA), por regra, com recurso a cláusulas contratuais gerais.

II - Uma cláusula contratual geral, inserta em contratos daquela espécie, com durações de 2 e 5 anos, respectivamente, que confere à EMA, em caso de rescisão antecipada do contrato pelo cliente, o direito a obter o pagamento imediato dos meses em falta até ao termo do contrato, multiplicado pelo valor mensal do serviço de manutenção em vigor à data da rescisão, reveste, manifestamente, o carácter de cláusula penal indemnizatória e compulsória.

III - Considerando as diversas figuras jurídicas extintivas das relações obrigacionais complexas – denúncia, revogação e resolução –, e ponderando que a rescisão não tem um sentido unívoco, deve considerar-se que aquela cláusula tem em vista as situações de resolução não justificada ou sem justa causa.

IV - Dentro do quadro negocial padronizado, é de considerar desproporcionada aos danos que visa ressarcir, e como tal nula, por violação do art. 19.º, al. c), da LCCG, a cláusula penal convencionada, pois dela resultará o pagamento pelo cliente/aderente da totalidade das prestações correspondentes aos meses do contrato em que este já cessou, sem a contraprestação do serviço da EMA que, para além disso, ficaria beneficiada por receber de uma só vez e em antecipação ao que estava previsto.

V - No que tange à denúncia, a LCCG pretende a proibição de cláusulas de exclusão da possibilidade de extinção, por declaração unilateral do contraente, da obrigação contratual duradoura, devendo aferir-se a excessividade do prazo de denúncia tendo como parâmetro de comparação o prazo de duração do contrato.

VI - O estabelecimento, naqueles contratos, com durações de 2 e 5 anos, de uma cláusula contratual geral que preveja um prazo de denúncia de 90 dias, afigura-se idóneo e adequado, dentro do quadro contratual padronizado, por representar, respectivamente, 12,5% e 5% do período total daqueles contratos, e não viola o art. 22.º, n.º 1, al. a), da LCCG.

VII - Exercendo a EMA, que utiliza aqueles clausulados nos seus contratos-tipo, a sua actividade em municípios situados na área metropolitana de Lisboa, apenas será necessária a publicitação da proibição, nos termos do art. 30.º da LCCG, num jornal diário, de maior tiragem, na respectiva área, pelo período de 3 dias consecutivos, sendo injustificado determinar tal publicitação noutras áreas geográficas do país.

Texto integral, vide aqui

17 março 2025

Reparações do terraço


Os terraços de cobertura constituem parte comum do prédio de que fazem parte mesmo quando afectos ao uso exclusivo de uma fracção.

Em virtude daquela dúplice função, de terraço e de cobertura, que é desempenhada pelo mesmo, impõe-se distinguir entre: (i) obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto tal, que serão da responsabilidade do proprietário da fracção autónoma que tem o uso exclusivo do referido terraço - nº 3 do art. 1424º do CC e (ii) obras destinadas a reparar as deficiências estruturais dos terraços ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a sua função enquanto cobertura as quais serão da responsabilidade do condomínio.

Só não será assim quando neste último caso esteja comprovado que, aquelas obras estruturais, se devem a uso anormal por parte do proprietário da fracção autónoma.

O art. 1424º, nº 1 do CC contém um princípio geral que se traduz na obrigação dos condóminos suportarem, na proporção do valor da sua fracção, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício.

As obrigações referidas neste artigo quanto às despesas de conservação e fruição das partes comuns do edifício, constituem um exemplo típico de obrigações “propter rem”, isto é, de obrigações impostas, em atenção a certa coisa, a quem for titular desta.

Dada a conexão funcional existente entre a obrigação e o direito real, a pessoa do obrigado é determinada através da titularidade da coisa: é obrigado quem for titular do direito real.

O nº 3 do citado art. 1424º do CC estabelece uma excepção ao princípio geral dizendo que: “As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem”.

Quando a lei fala em escadas ou partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos quer referir-se, ao mencionar estes, às respectivas fracções autónomas, atribuindo a responsabilidade das despesas aos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns.

O legislador ao considerar os terraços como coisas comuns teve em vista a integração dos mesmos na estrutura do prédio e afectos à função de cobertura como de telhado se tratasse, seja de parte seja da totalidade do edifício. Fundamentalmente interessa a função de protecção do edifício contra os elementos atmosféricos.

Mesmo no quadro do direito anterior a 1994 (alteração legislativa) se entendia que o terraço mesmo que destinado ao uso exclusivo de um dos condóminos não deixava de ser forçosamente comum pela função capital de cobertura ou protecção do imóvel que no interesse colectivo exerce em relação a toda a construção.

A mesma posição manteve o Conselheiro Aragão Seia ao dizer que: “são considerados partes comuns os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção… os terraços de cobertura, que tanto se podem situar ao nível do primeiro andar, por servirem de cobertura… como ao nível de qualquer outro ou até do último piso, cobrindo parte do edifício, mesmo quando estejam afectos ao uso exclusivo de um condómino”.

Ora, em virtude daquela dúplice função, de terraço e de cobertura, a situação dos terraços de cobertura é algo diversa das situações previstas no nº 3 do art. 1424º do CC.

É que, se enquanto terraço é, são efectivamente de uso exclusivo de um dos condóminos, enquanto cobertura servem de forma capital a totalidade dos condóminos.

Como assim, não pode, de forma simplista, ter-se como aplicável aos terraços de cobertura o disposto no nº 3 do citado 1424º do CC para fazer recair sobre o condómino que deles tem o direito de uso exclusivo, toda a responsabilidade pela conservação e reparação dos mesmos.

Haverá sim de fazer-se uma interpretação que, atendendo à referida especificidade, conjugue o disposto no nº 1 do art. 1424º do CC com o disposto no nº 3 do mesmo preceito.

E essa interpretação não pode ser outra que não aquela que tem vindo a ser adoptada maioritária, senão mesmo uniformemente, pelos tribunais, no sentido de distinguir entre obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto tal, e as obras destinadas a reparar as deficiências estruturais dos terraços ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a função dos terraços enquanto cobertura.

E se enquanto às primeiras a responsabilidade pela sua realização e despesas associadas deve ser imputada aos condóminos que têm do terraço o uso exclusivo, atento o disposto no nº 3 do art. 1424º do CC, em relação às segundas a sua responsabilidade recai sobre todos os condóminos na proporção do valor da sua fracção, nos termos previsto no nº 1 do mesmo normativo.

Fazer recair a responsabilidade pelas despesas de conservação e fruição apenas sobre o proprietário da fracção que detém o uso exclusivo do terraço de cobertura, traduzir-se-ia em clamorosa injustiça já que, se enquanto terraço ele é de facto de uso exclusivo de um dos condóminos, enquanto cobertura ele é de uso comum e aproveita a todos os condóminos. E por isso mesmo ele é parte comum do prédio.

Como assim, tratando-se de parte comum que serve de cobertura ao edifício, não se verifica o pressuposto estabelecido no nº 3 do art. 1424º do CC, mesmo que afectada ao uso exclusivo de alguns condóminos, sendo por isso mesmo tais despesas efectuadas não só para viabilizar o uso mas também para reintegrar um elemento estrutural do edifício, em proveito de todos.

Desta forma, sendo as obras para reparar no terraço resultantes, não do uso normal das mesmas pelos condóminos que dele se servem em exclusividade, mas de deficiência na construção ou de não manutenção de materiais exteriores ao dito terraço, todos os condóminos devem participar no custo das reparações.

Não tem, assim, aplicação o nº 3 do art. 1424º do CC impondo-se a regra de que as despesas necessárias à manutenção do terraço, no que à sua impermeabilização respeita são, na ausência de deliberação em contrário, da responsabilidade de todos os condóminos na proporção “do valor das suas fracções”.

Só assim não seria se estivesse provado ter havido por parte dos condóminos que fruem dos terraços qualquer actuação anormal que tivesse dado origem às apuradas falhas de impermeabilização dos terraços, sendo que é sobre o Réu (utilizador), como facto impeditivo do direito do Autor (condomínio), que impende esse ónus probatório (cfr. art. 342º, nº 2 do CC).

14 março 2025

ACTRL 30.4.91: Sótão

Tribunal: TRL
Processo: 0035451
Relator: Joaquim Dias
Data: 30-04-1991

Descritores:

Propriedade horizontal
Parte comum

Sumário:

Em prédio constituído em propriedade horizontal as partes comuns podem ou não constar do respectivo título constitutivo.

As partes do prédio enunciadas taxativamente no art. 1421, n. 1 do CC são sempre comuns ainda que emitidas no título constitutivo ou neste incluidas como fazendo parte de determinada fracção autónoma.

Quanto às partes exemplificativamente enunciadas no art. 1421, n. 2 do CC, tem o autor do título constitutivo da propriedade horizontal a faculdade de moldar a sua natureza jurídica incluindo-a expressamente em qualquer fracção autónoma, como partes comuns, como partes comuns afectas ao uso exclusivo de determinada fracção ou nada declarar. No silêncio do título, são partes comuns.

O sótão - espaço compreendido entre o tecto da fracção ou fracções superiores e o telhado - não se confunde com o telhado, não faz parte da estrutura do edifício, não está compreendido no art. 1421, n. 1 b) do CC.

O sótão cabe no art. 1421 n. 2 b) do CC desde que nada se disponha em contrário no título constitutivo, o sotão presume-se parte comum quando não afecto ao uso exclusivo de uma das fracções autónomas.

Se o autor do título constitutivo da propriedade horizontal, antes de vender as fracções, afecta o sótão ao uso da fracção autónoma situada no piso mais alto, daí não decorre a propriedade de tal sótão pelo dono daquela fracção porque a declaração do autor do título, para ser válida e eficaz, tem que constar do título.

Na propriedade horizontal não há clandestinidade: as partes ou são próprias de cada condómino ou são comuns; as não incluídas no título como próprias, são comuns, não podem ser objecto de propriedade singular.

Para que uma parte comum do edifício possa ser objecto de uso exclusivo de um condómino (sem perder a sua natureza de parte comum) é necessário que seja previsto expressamente no título constitutivo do regime de propriedade horizontal ou autorizado por todos os condóminos.

A utilização do sótão - parte comum - do edifício por todos os condóminos pressupõe que ele seja, do ponto de vista constitutivo, adequado ao uso que se lhe queira dar / arrecadação, uso por pessoas, etc) e que com tal utilização se não ofenda o direito ao repouso do condómino do piso inferior o qual prevalece.

De outro modo, o sótão só poderá ser utilizado na sua função natural de caixa de ar do edifício.

08 março 2025

ACTRL 23-03-12: Construção pérgula terraço


Tribunal: TRL
Processo: 6862/10.6TBALM.L1-6
Relator: Tomé Ramião
Data: 23/03/2012

Descritores:

Propriedade horizontal
Condomínio
Condóminos
Obras
Inovação
Assembleia de condóminos
Autorização

Sumário:

1.- Está vedado aos condóminos realizar obras na respetiva fração predial que prejudiquem a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício, salvo se for obtida prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, de acordo com o preceituado no art.º 1422.º/2, al. a) e 3 do C. Civil.

2. - Por linha arquitetónica entende-se o “conjunto dos elementos estruturais de construção que, integrados em unidade sistemática, lhe conferem a sua individualidade própria e específica” e o arranjo estético do edifício “ao conjunto de características visuais que conferem unidade sistemática ao conjunto”.

3 - Prejudica o arranjo estético de prédio urbano com 10 andares, a construção duma pérgola de madeira no terraço privativo da fração correspondente ao 10.º andar, pelo respetivo condómino, atenta a natureza dessa estrutura, suas dimensões e configuração, bem visível do exterior, sem autorização prévia da assembleia de condóminos, quando todas as restantes frações desse piso foram fechadas com marquises.

Texto integral: vide aqui

24 janeiro 2025

ACTRP 03-06-2019: Telhado exclusivo


Tribunal: TRP
Processo: 3124/17.1T8MTS.P1
Relatora: Fernanda Almeida
Data: 03/06/2019

Descritores:

Deliberações da assembleia de condóminos
Propriedade horizontal
Parte comum
Obras de conservação

Sumário:

Estando em causa despesas de conservação e fruição relativas a telhado que serve em exclusivo uma fração do prédio constituído em propriedade horizontal, estabelece o art. 1424.º, n.º 3, CC, ser por elas responsável apenas o respetivo titular.

Texto integral: vide aqui

22 janeiro 2025

Uso da coisa comum


Nos termos do art. 1414º do Código Civil (diploma a que pertencerão as demais disposições legais que vierem a ser citadas sem menção da sua origem), “As fracções de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal”, estabelecendo ainda a lei que “Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício” (cf. art. 1420º, nº 1).

O regime das fracções autónomas é disciplinado pelas regras da propriedade sobre imóveis, ao passo que as partes comuns se encontram subordinadas ao regime estabelecido para a compropriedade, conforme resulta do preceituado, respectivamente, nos art. 1405º e 1406º.

De acordo com o art. 1405º nº 1, os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção da suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.

Ainda segundo o art. 1406º nº 1 do mesmo diploma legal, na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito

Nos termos destes último preceito, qualquer condómino pode legitimamente servir-se da coisa - ou parte - comum, contanto que a não use para um fim diverso daquele a que a mesma se presta ou destina e não prive os outros condóminos do uso a que igualmente têm direito.

Destarte, o que houver sido acordado entre os interessados, tanto pode constar do título constitutivo da propriedade horizontal, como resultar de acordo posterior, ditado pelo consenso unânime dos interessados ou pela simples maioria dos consortes, nos termos em que esta decida - apenas - sobre a administração da coisa.

Nesta conformidade, a maioria dos condóminos, nunca poderá privar qualquer dos consortes, sem o seu respectivo consentimento, do uso da coisa a que tem direito. Apenas lhe será lícito (ao administrador e em último caso, à assembleia) disciplinar esse uso, de modo a procurar evitar (tanto quanto possível) conflitos e choques de interesses entre os vários comproprietários.

Resulta, pois, da disposição legal em análise que ao condómino é portanto, consentido o uso da coisa comum, mas já não a sua ocupação (com obras), ainda que parcial, na medida em que dela sempre resultaria a privação do uso por banda dos demais comproprietários.

21 janeiro 2025

Uso partes comuns (art. 1406º)


Tribunal: TRL
Processo: 6044/08.7TMSNT.L1-8
Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Data: 03-07-2014

Sumário:

1. - De acordo com o artº 1405º nº 1 do Código Civil, os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção da suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.
2. -Segundo o artº 1406º nº 1 do mesmo diploma legal, na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito.
3. - O que houver sido acordado entre os interessados, tanto pode constar do título constitutivo da compropriedade, como resultar de acordo posterior, ditado pelo consenso unânime dos interessados ou pela simples maioria dos consortes, nos termos em que esta decide sobre a administração da coisa.
4. - A maioria, porém, nunca poderá privar qualquer dos consortes, sem o respectivo consentimento, do uso da coisa a que tem direito. Apenas lhe será lícito disciplinar esse uso, de modo a evitar conflitos e choques de interesses entre os vários comproprietários.

Texto integral: vide aqui  

17 dezembro 2024

Afixação publicidade na fachada


A publicidade pode conter-se nas seguintes modalidades:

i) Mensagens afixadas ou inscritas em bens que são propriedade privada do interessado (condómino ou arrendatário) e que não são visíveis ou audíveis do espaço exterior, como por exemplo, a exibição de placas ou anúncios a divulgar algo no interior do espaço sem que seja visível ou audível do espaço exterior;

ii) Mensagens afixadas ou inscritas em bens que são propriedade privada do interessado (condómino ou arrendatário), e que são visíveis ou audíveis do exterior, mas não o ocupam, como por exemplo, a exibição de mensagens em vinil ou a utilização de meios sonoros na parte interior de uma montra;

iii) Mensagens afixadas e que ocupam o espaço exterior, como por exemplo, uma placa publicitária ou ementa cravejada na fachada e que se pode projectar para o espaço público;

iv) Mensagens publicitárias que ocupam sempre o espaço público contíguo ao estabelecimento, como por exemplo, a utilização de um tripé de uma ementa junto a um determinado estabelecimento.

No presente escrito, debruço-me sobre a publicidade afixada na fachada de um edifício.

Primeiramente, impera a necessidade de esmiuçar os conceitos chave em crise, nomeadamente, sobre o conceitos de propriedade horizontal, partes comuns, fachada do edifício e compropriedade.

A propriedade horizontal é uma figura típica dos direitos reais que se traduz na situação em que as fracções independentes de um edifício, como estrutura unitária, pertencem a proprietários diversos, exclusivos em relação a tais fracções e comproprietários das respetivas partes comuns, em quadro de incindibilidade desses direitos (cfr. art. 1414º e 1420º, ambos do Código Civil).

A propriedade horizontal traduz-se (cfr. art. 1420º e 1421º do CC) na coexistência de um direito real de propriedade singular, que tem por objecto fracção autónoma do edifício, com um direito de compropriedade que tem por objecto as partes comuns mencionadas no art. 1421º do CC (conjunto de direitos que é incindível – nº 2 do citado art. 1420º do mesmo diploma legal), entende que o condomínio “é a figura definidora da situação em que uma coisa materialmente indivisa ou com estrutura unitária pertence a vários titulares, mas tendo cada um deles direitos privativos ou exclusivos de natureza dominial-daí a expressão condomínio-sobre fracções determinadas” e, nesta medida, dever-se-á estender a personalidade judiciária a este determinado património autónomo.

A noção de propriedade horizontal não deve ser confundida com a figura jurídica da compropriedade. Com efeito, cada condómino detém, para além do direito de propriedade sobre a sua fração, a compropriedade das partes comuns do prédio. Ora, nos termos do artigo 1421.º, n.º 1, alínea a) do Código Civil, constituem partes comuns do prédio a fachada e o revestimento das fachadas, quando consideradas na qualidade de paredes mestras e integrarem a estrutura do prédio.

A fachada é cada uma das faces aparentes do edifício, constituída por uma ou mais paredes exteriores directamente relacionadas entre si, identificando-se usualmente pela sua orientação geográfica (fachada norte, fachada sul, etc.) ou relativamente à entrada principal do edifício, tomando neste caso as designações: fachada principal (onde se localiza a entrada principal), fachadas laterais (esquerda e direita), e fachada de tardoz ou fachada posterior. Um edifício pode ter várias fachadas com a mesma orientação geográfica, em distintos planos, sendo que, as fachadas que se desenvolvem em planos mais recuados são vulgarmente designadas por fachadas recuadas.

Do ponto de vista urbanístico, para efeitos de definição da edificabilidade, têm sobretudo relevância as fachadas que se desenvolvem a partir do nível do solo e confrontam com a via pública ou com logradouros. O controlo das fachadas recuadas pode ser efetuado através dos parâmetros de edificabilidade que regulam a altura da edificação.

Sendo os condóminos comproprietários das partes comuns do prédio, é-lhes aplicável nesta relação jurídica, o disposto nos art. 1406º, 1420º e 1422º, todos do CC, encontrando-se assim sujeitos às limitações que os mencionados dispositivos legais estipulam.

Dimana do art. 1406º que a qualquer condómino é permitido o uso da parte comum do prédio contanto que não a empregue para fim diferente a que a coisa se destina e que o uso que faça dessa parte comum não impeça os restantes condóminos de o fazerem.

Aqui chegados, pode-se concluir que tem o proprietário ou arrendatário de uma fracção comercial legitimidade para proceder à afixação de um reclame publicitário, encontrando-se contudo esta vedada sempre que tal resulte na alteração da linha arquitectónica, no arranjo estético do edifício, ou mesmo que a sua colocação represente uma alteração da funcionalidade da fachada do prédio onde será colocada a mesma.

Atento o quadro factual, a resposta definitiva dependerá sempre de uma análise casuística de cada situação. Assim, nas situações em que a dimensão do reclame publicitário não ultrapasse o perímetro da fachada da loja ou se colocado fora do mesmo, em nada prejudique o arranjo estético da fachada, não aparenta existir qualquer objecção legal à colocação do mesmo. A contrário, o mesmo já não será válido nos casos em que o tamanho do reclame seja manifestamente desproporcional e, consequentemente, prejudique o arranjo estético do prédio.

Dito isto, prima facie, o proprietário ou arrendatário de uma fração autónoma destinada a um fim comercial não pode ver vedado o seu direito de publicitar a sua actividade comercial por uma deliberação tomada em Assembleia Geral de Condóminos, no entanto, esta pode e deve disciplinar sobre a forma (padronizar o formato - p.ex. devem ser todos rectangulares), dimensões (uniformizar o tamanho - p.ex. devem ter todos o mesmo comprimento e altura) e localização (balizar o espaço ocupar - p.ex. devem ser colocados sobre as vitrinas ou parte da arcada) dos reclames publicitários.

Caso o proprietário ou arrendatário pretenda uma solução que não se enquadre nesta disciplina, podem os condóminos, em plenário conciliar todos os interesses, aprovando a afixação da pretendida publicidade na fachada mediante o pagamento ao condomínio de uma pequena renda compensatória pela utilização de um espaço comum extra.

Sem prejuízo de tudo o exposto, esta problemática pode e deve sempre ser aferida e apreciada atentas as circunstâncias de cada caso em concreto em sede de Assembleia Geral de Condóminos.

09 dezembro 2024

Obras no terraço


De acordo com o preceituado no art. 1422º, nº 2, al. a) e 3 do CC, está vedado aos condóminos realizar obras na respectiva fracção predial que prejudiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, salvo se, sendo as obras susceptíveis de prejudicar, for obtida prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

Decorre do art 1422º, nº 1, do CC, que “os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às frações que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis. E reza o nº 2, al. a) que “é especialmente vedado aos condóminos prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício".

Porém, as obras que prejudiquem a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio – seu nº 3.

Este preceito legal visa fundamentalmente as obras realizadas nas frações autónomas, aquelas que pertencem aos condóminos em propriedade exclusiva ( P. Lima e A. Varela, in Código Civil Anotado, Vol. III, pág. 425; e Ac. do STJ, de 17/2/2011, Proc. nº 881/09.2TVLSB.L1.S1, e Ac. T. R. Lisboa, de 20/1/2011, Proc. n.º 6484/04.4.0TVLSB.L1-2).

Tem-se entendido que a linha arquitetónica reporta-se ao “conjunto dos elementos estruturais de construção que, integrados em unidade sistemática, lhe conferem a sua individualidade própria e específica” e o arranjo estético do edifício “ao conjunto de características visuais que conferem unidade sistemática ao conjunto” (entre outros, os Ac. do STJ de 20/7/82; e de 17/2/2011, Proc. nº 881/09.2TVLSB.L1.S1, citando Aragão Seia, “Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 105).

Ora, como escreve P. Lima e A. Varela, ob. citada, pág. 425, “quanto às limitações relativas à estética do edifício, é evidente que apenas se aplicam aos elementos da fração autónoma visíveis do exterior (porta ou portas de acesso, janelas, persianas, varandas, etc.). Um condómino, por exemplo, não pode vedar a sua varanda, transformando-a num compartimento fechado, ou substituir as janelas por outras que não se harmonizem com as demais frações”.

Com efeito, de acordo com o nº 3 do mesmo normativo, as obras que sejam suscetíveis de modificar a linha arquitetónica ou o arranjo estético do prédio, não sendo absolutamente proibidas, apenas podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de 2/3 do valor do prédio.

Destas sortes, é patente que, com excepção das obras realizadas no pavimento e no paramento de uma varanda ou terraço, que não sejam visíveis do exterior do prédio, as demais (as visíveis do exterior) por alterarem as características visuais daquele edifício, não se enquadrando no conjunto. Com efeito, quer pela tipologia de materiais usados, quer pela sua dimensão, as referidas obras destoam das demais obras realizadas nas restantes frações do prédio.

De facto, se a cada condómino fosse lícito decorar as respetivas varandas ou terraços da forma que mais lhe aprouvesse, facilmente seríamos conduzidos à situação de cada edifício ser facilmente confundido com uma verdadeira torre de babel, sem qualquer unidade sistemática entre si.

Como se decidiu no Ac. do TRL de 20/1/2011, proc. nº 6484/04.4.0TVLSB.L1-2, “Já a «avaliação do prejuízo ou da modificação da linha arquitetónica de um prédio ou do seu arranjo estético implica um juízo de valor que há de ser formado através do paralelo que se possa estabelecer entre o seu estado e fisionomia atuais e aqueles que detinha antes das obras efetuadas. Para isso, será fundamental que o julgador tenha conhecimento, através da matéria de facto provada, não só da descrição pormenorizada das obras efetuadas, mas, também, do impacto que as mesmas tiveram tanto ao nível estrutural como estético do prédio”.

Prescreve o art. 334º do CC, que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

Como ensina Pedro Pais de Vasconcelos, “Teoria Geral de Direito Civil”, 3.ª Edição, págs. 663 a 668, a doutrina tem vindo a construir vários tipos de condutas ativas e omissivas que constituem o exercício abusivo do direito subjetivo, sendo os mais comuns o exceptio doli, caso em que o demandado invoca um comportamento fraudulento do titular do direito, e que decorre do dever de honeste (bene) agere, e corresponde ao brocardo fraus omnia corrumpti; o denominado venire contra factum proprium, que traduz comportamentos contraditórios e de frustração de expectativas criadas e nas quais outrem haja legítima e razoavelmente confiado; o exercício em desequilíbrio, que traduz o exercício danoso do direito, nomeadamente quando o titular é movido pela intenção exclusiva de prejudicar ou de fazer mal a outrem (exercício cumulativo), ou quando o exercício do direito não representa qualquer vantagem para o seu titular, enquanto dele resulte para outrem um sacrifício injusto (exercício danoso inútil ou injustificado), ou é abusivo o exercício do direito sempre que a vantagem dele resultante para o titular é mínima e desproporcionada com o sacrifício severo de outrem (desproporção no exercício).

Também Menezes Cordeiro, “Tratado de Direito Civil Português”, 2ª Edição, pág. 249, entende que “a conceção geral do abuso de direito postula a existência de limites indeterminados á atuação jurídica individual. Tais limites advêm de conceitos particulares como os de função, de bons costumes e da boa-fé “.

Há abuso de direito quando um determinado direito – em si mesmo válido –, é exercido de modo que ofenda o sentimento de justiça dominante na comunidade social (Ac. TRL de 16/5/1996, Proc. nº 0012472). Já para Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 6.ª ed., pág. 516, "para que haja lugar ao abuso do direito, é necessária a existência de uma contradição entre o modo ou fim com que o titular exerce o seu direito e o interesse a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito”.

Daí que o exercício de um direito só seja tido por abusivo quando exceda manifesta, clamorosa e intoleravelmente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico do direito, ou seja, quando esse direito seja exercido em termos clamorosamente ofensivos da justiça ou do sentimento jurídico socialmente dominante - Pires de Lima e Antunes Varela, C.C. Anotado", Vol. I, 4ª edição, pág. 299.

E acrescentam: “A nota típica do abuso de direito reside, por conseguinte, na utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse que exorbita o fim próprio do direito ou do contexto em que ele deve ser exercido” – pág. 300.

10 maio 2024

Responsabilidade do administrador na realização de obras


O órgão «assembleia dos condomínios» (cfr. art. 1430º nº 1 CC), entendido como o conjunto de todos os condóminos, enquanto titular dos direitos administrativos relativos às partes comuns do edifício, responde concomitantemente pelas obrigações relativas a essas mesmas partes.

Sucede, no entanto, que não existe na regulamentação da propriedade horizontal norma legal que directamente imponha, mesmo relativamente às partes comuns, de forma clara a obrigação do condomínio ou do administrador de reparar as partes comuns.

Com efeito, a al. a) do nº 2 do art. 1422º do CC apenas impede os condóminos de prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, ou seja, a falta de reparação só é proibida se e na medida em que tiver por consequência a afectação da segurança, da linha arquitectónica ou do arranjo estético do prédio, o que não emerge da factualidade provada, sem sequer está em causa na presente acção.

Por outro lado, a al. f) do art. 1436º do CC define como função do administrador, não propriamente a execução de obras de reparação das partes comuns, mas apenas a realização dos actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns. Em tal perspectiva, diga-se que, salvo deliberação da assembleia de condóminos nesse sentido, o administrador, enquanto órgão executivo do condomínio - que não pode invadir a esfera de competência deliberativa do condomínio através da respectiva assembleia -, não está directamente obrigado perante o condómino cuja fracção seja afectada por vícios ou patologias existentes nas partes comuns a realizar as obras de reparação necessárias à sua eliminação.

Na verdade, se é indiscutido que o administrador incorre em responsabilidade civil perante os condóminos ou perante terceiros, quando excede os limites das suas atribuições, quando faz mau uso dos poderes-deveres que a lei lhe confere, quando deixa de fazer o que a lei ou o regulamento do condomínio lhe impõem que faça ou, ainda, quando não dá cumprimento às deliberações da assembleia – e que lhe incumbe executar nos termos do art. 1436º, al. h) do CC -, já não incorre em responsabilidade civil se não providencia ele próprio pelas reparações urgentes nas partes comuns que causem danos em bens de terceiro ou na própria fracção autónoma de cada um dos condóminos. (1)

O administrador, a esse nível, pode fazer essas obras, mas não está obrigado a substituir-se ao condomínio e à respectiva assembleia e a executá-las, ainda que perante si sejam reclamadas; Ao invés, a responsabilidade pela execução de tais obras nas partes comuns, cabendo ao condomínio no seu conjunto, através da respectiva assembleia, a administração das partes comuns (art. 1430º, nº 1 do CC), e cabendo ao mesmo conjunto de todos os condóminos, na proporção do valor das suas respectivas fracções, suportarem as despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício (art. 1424º, nº 1 do CC), recairá, pois, sobre o condomínio, entendido este como o conjunto de todos os condóminos. 

Aliás, um tal princípio decorre do preceituado no art. 1411º do CC, relativo directamente à compropriedade mas aqui aplicável no que concerne às partes comuns, o qual estabelece que os comproprietários devem contribuir, na proporção das respectivas quotas, [no caso da propriedade horizontal, em função do valor relativo das suas fracções no valor do conjunto do edifício], para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum.

Destarte, como se salienta no Ac. do TRP de 16.01.2014, se é certo que inexiste norma legal expressa que consagre esta obrigação do condomínio quanto à reparação das partes comuns, resulta do nosso sistema jurídico que estando o imóvel constituído em propriedade horizontal é obrigação do condomínio diligenciar pela conservação e reparação das partes comuns, encetando as diligências necessárias a tal fim, designadamente deliberando sobre a sua realização e consequente adjudicação, incumbindo, depois, por seu turno, à administração, enquanto órgão executivo, providenciar pelo efectivo cumprimento de tal deliberação e consequente execução das obras de reparação ou conservação aprovadas.

Ora, se o condomínio, através da sua administração, toma conhecimento de que ocorreram infiltrações de águas e humidades no interior de uma fracção, provenientes, por exemplo, do respectivo terraço de cobertura, é evidente que terá de se considerar que sobre o condomínio impendia, por força da lei, o dever de actuar no sentido de proceder às obras de reparação no dito terraço comum que se mostrassem necessárias para pôr termo às aludidas infiltrações de águas e humidade nessa fracção, bem como, ainda, o dever de proceder à reparação dos danos já existentes no interior da fracção e que, conforme também informado, punham em causa a utilização da fracção para o fim a que a sua proprietária a destinava, ou seja o respectivo arrendamento, sob pena de responder pelos prejuízos decorrentes dessa sua omissão ilícita.

Por conseguinte, é de concluir que o condomínio está vinculado ao dever de manter, conservar e reparar as zonas comuns do edifício, que incumpriu esse dever por omissão negligente do zelo e cuidado que lhe eram exigíveis e possíveis na perspectiva e segundo o critério do bom pai de família (art. 487º, nº 2 do CC), e que por isso está obrigado a indemnizar o condómino dos danos que lhe sobrevieram como consequência directa da sua omissão ilícita e culposa quanto à realização das obras em causa.

No que se refere já aos administradores, e como resulta do que já antes se expôs, a sua responsabilidade perante o condómino, não decorre da não realização das reclamadas obras de reparação, pois que a tal não está obrigado, mas antes de não terem os mesmo, como deviam, segundo o mesmo critério do bom pai de família, ou seja de um administrador normalmente cuidadoso e diligente, nas circunstâncias do caso, na sequência da comunicação das infiltrações de águas existentes na fracção a partir do terraço comum e dos seus efeitos quanto à inviabilidade de uso da fracção atingida, providenciado, pelo menos, pela marcação, no mais curto espaço de tempo possível, pela realização de uma assembleia geral extraordinária de condóminos onde a reclamação fosse exposta e submetida à competente apreciação deliberativa dos condóminos.

Na verdade, não podia a administração do condomínio à data deixar de saber que é sua incumbência convocar a assembleia de condóminos sempre que tal se mostre conveniente (como era, manifestamente, o caso, perante a reclamação por patologias nas partes comuns do edifício que lhe causavam danos significativos na fracção autónoma de sua propriedade – cfr. arts. 1431º, nº 2 e 1436º, al. a) do CC), sendo certo que à própria autora, por si só, não seria possível provocar a realização dessa assembleia, pois que para tanto seria necessário que a convocatória fosse subscrita por, um mínimo, de condóminos que representassem 25% do valor do prédio – cfr. art. 1431º, nº 2 do CC.

Por consequência, nestas circunstâncias, não convocando a administração a aludida assembleia extraordinária de condóminos como lhe foi solicitado e não estando o condómino em condições de o fazer por si só e declinando o administrador a possibilidade de o condomínio realizar essas obras – remetendo a sua realização para a iniciativa e responsabilidade do próprio condómino -, a esta última apenas lhe restava – para além da opção de ser ela própria a realizar as obras em causa e a suportar o risco quanto ao retorno de tal investimento, a que não estava, a nosso ver, manifestamente, obrigada (2) – a alternativa de aguardar a paulatina degradação da sua fracção pela continuação das infiltrações de águas na mesma e provindas das fachadas e do terraço comum de cobertura, com o consequente avolumar dos consequentes prejuízos.

Ora, com o devido respeito, uma tal posição não pode ser por nós sufragada.

O administrador pode responder civilmente perante os condóminos, nos termos gerais da responsabilidade civil (arts. 483°, 562° e 563º do CC). Deste modo a significar - e sempre no horizonte legal do que se consagra, em particular, também, nos art. 1436º (Funções do Administrador) e 1437º (Legitimidade do Administrador) do CC - que o administrador responde quando exceder os limites das suas atribuições, quando usa mal os poderes-deveres conferidos pela lei, ou quando não realiza aquilo que a lei ou regulamento impõem.

Pouco importa que os danos tenham sido causados pelo administrador directamente ou por terceiros encarregados por ele de efectuarem certas tarefas, quer provenham de actos positivos quer de omissões.

Quanto a saber, por exemplo, se o administrador é responsável se não realiza as reparações extraordinárias urgentes, o Ac. do TRC de 24/3/2015 decidiu que haverá de referir que estas reparações excedem a administração ordinária e, por isso, não entram na competência normal do administrador. É certo que o administrador tem o poder de intervir quando há uma reparação urgente e indispensável, mas não tem a obrigação. Tal significa que, se tal reparação não é ordinária, a actuação correcta é levar a sua matéria à primeira assembleia ou, se houver necessidade, convocar extraordinariamente a assembleia.

A sua obrigação é avisar e expor a necessidade urgente da reparação. Só no caso de ver e não avisar, haverá má administração, tornando-se, portanto, culpado (cfr. Rodrigues Pardal Dias da Fonseca, Da Propriedade Horizontal, Código Civil e Legislação Complementar, 6ª Edição Revista e Actualizada, 1993, pp. 301-302 e 305-306).

Tal tessitura de apreciação pressuponente, significa que ao não realizar quaisquer obras que se hajam necessárias, implica uma omissão da responsabilidade do condomínio, mas não por parte do administrador que é apenas o órgão executivo do condomínio.

Ou seja, o administrador não pode, por si só, executar obras nas partes comuns do condomínio se para tal não for mandatado pela assembleia uma vez que tal constituiu um acto de administração que extravasa o âmbito das funções que a lei lhe atribui. Conclusão que se retira da interpretação conjunta dos arts. 1436º e 1437º do CC.

No caso vertente, decidiu o RTP em Ac. de 23.4.2018 (972/14.8T8GDM.P1) que o administrador de condomínio, como consagrado, nunca poderia ser responsabilizado pela não realização de obras, para o efeito claramente urgentes, mas em referencial classificatório, manifestamente extraordinárias, mais ainda quando estejam dependentes da proacção actuante do condomínio, depois de ordenar o seu empreendimento.

Notas

(1) Vide, neste sentido, por todos, L. P. Moitinho de Almeira, “ Propriedade Horizontal ”, 2ª edição, pág. 118 e Abílio Neto, op. cit., pág. 363.

(2) Como referem em comentário ao art. 1427º do CC P. LIMA, A. VARELA, III volume, cit., pág. 437, «Quando, porém, não haja administrador, ou este se encontre impedido, e se mostre necessário proceder, com urgência, a reparações indispensáveis, qualquer dos condóminos pode tomar, por si, a iniciativa das obras, cujas despesas serão repartidas segundo os critérios estabelecidos no art. 1424º.» [sublinhado e negrito nossos]O que vale, pois por dizer, que, como já antes se salientou e ao contrário do sufragado na decisão recorrida, a iniciativa quanto à realização de obras urgentes terá de ficar na estrita disponibilidade e critério do próprio condómino [que pode entender que a situação de urgência justifica essa sua intervenção imediata, sem prévia autorização ou deliberação da assembleia ou do administrador], mas não lhe pode ser imposta ou exigida, nomeadamente por parte do condomínio ou da respectiva administração e para escusa da sua obrigação legal quanto à realização das mesmas.

09 maio 2024

Piscinas em terraços


Quais são as condicionantes a observar para a montagem de uma piscina no terraço de uma fracção autónoma num edifício constituído em regime de propriedade horizontal?

Autorização da assembleia dos condóminos

A PH caracteriza-se pela co-existência em simultâneo da propriedade singular – sobre a fracção autónoma e a compropriedade – sobre as partes comuns, constituindo assim uma figura distinta da compropriedade, sendo por isso alvo de tratamento pela lei em capítulo à parte. Resulta do nº1 do art. 1420º do CC que: “cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns.

Em matéria jurídica dos direitos e encargos dos condóminos está especialmente vedado a estes prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício – art. 1422º, nº 2, al. a), do CC.

Por sua vez, em matéria de inovações, estabelece o art. 1425º do citado código que: “As obras que constituem inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio” – seu nº 1.“Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns” – cf. seu nº 2. Ou seja, o campo de aplicação de cada norma varia em função do tipo e natureza de obras realizadas.

No que respeita às que integram a qualificação de “inovações”, constata-se que as obras aqui previstas são aquelas que dizem respeito às partes comuns – cf. seu nº 2, conjugado com o nº 1, onde se exige a aprovação da maioria dos condóminos, devendo representar dois terços do valor total do prédio. Já se se tratar de obras nas fracções pertença exclusiva de um ou cada um dos condóminos rege o art. 1422º, nº 2, al. a).
 
Contudo, tratando-se de uma piscina insuflável (infantil) ou desmontável (portanto, sem partes fixas ao pavimento), não carecerá da autorização condominial.

Sustentabilidade

Antes de se projectar e instalar a piscina num terraço e antes de se considerar aspectos como os sistemas construtivos, os materiais a usar e custos envolvidos, é essencial avaliar a viabilidade da instalação e a capacidade de suportar o peso necessário. Importa, pois, primeiramente, aferir quais as cargas que a laje portante do terraço está dimensionada a suportar. Esta informação pode ser obtida junto do construtor, de um engenheiro de estruturas que consiga avaliar a qualidade dos materiais e o estado da habitação no tempo e no espaço, ou de instituições como o Laboratório Nacional de Engenharia Civil ou o Instituto da Construção da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

A cada 10 cm de altura da água, a carga no piso aumenta em 100 kg/m². Portanto, para uma altura de água de:
  • 20 cm, a carga será de 200 kg/m²;
  • 50 cm, a carga será de 500 kg/m²;
  • 100 cm, a carga será de 1000 kg/m².
Depois de conhecer a carga por metro quadrado transmitida pela piscina, é possível fazer uma primeira avaliação, comparando-a com as cargas acidentais de projecto dos pisos. Se a altura da água exceder 20 cm, a carga acidental de projecto (geralmente estimada em cerca de 200 kg/m²) pode ser excedida. No entanto, é importante notar que a carga acidental de projecto é geralmente considerada distribuída em toda a superfície do piso, enquanto a carga da piscina está localizada em uma área específica do telhado.

Alguns projectistas, para aumentar a segurança, podem considerar uma carga acidental de 400 kg/m² para terraços, pois são locais potencialmente lotados. No entanto, essa prática não é uma regra universal. Na ausência de documentação específica, por precaução, pode-se presumir que o piso do terraço foi projectado para suportar uma carga acidental de 200 kg/m².

Além do peso da água, é importante considerar o peso da estrutura da própria piscina. Enquanto para piscinas insufláveis esse peso pode ser negligenciado, para piscinas com estrutura fixa, como aquelas com sistemas de hidro-massagem, o peso estrutural pode variar em torno de 100 kg/m², a ser somado ao peso da água.

O aumento das tensões no piso também depende da superfície da piscina e da sua posição em relação às vigas e pilares da estrutura. A carga linear transmitida pela piscina ao piso também depende da forma da piscina em planta. No caso de uma piscina rectangular, a carga por unidade de comprimento que actua na faixa de piso considerada será constante. No caso de uma piscina circular, a carga linear será variável.

Em tese, e no caso de edifícios construídos mais recentemente, a capacidade de carga do terraço, geralmente corresponde a um mínimo de 200 kg por metro quadrado e pode atingir um máximo de 400 kg por metro quadrado. Nesta conformidade, caso os valores apurados fossem superiores, ter-se-ia de efectuar trabalhos estruturais, ou distribuir o peso por uma área maior.

Assim, para descobrir a capacidade de carga de um terraço, temos de multiplicar o valor fixo determinado pelo engenheiro de estruturas pelo tamanho total do terraço. Por exemplo, teríamos de multiplicar a capacidade de carga por metro quadrado de 200 kg x 20 metros quadrados de dimensão de terraço, resultando num peso total sustentável de 4 000 kg.

Legislação

Existe um vazio legal para as piscinas de lazer em condomínios, alojamentos locais ou espaços particulares para utilização doméstica.

06 dezembro 2023

Limitações a que os condóminos estão sujeitos

 A regra geral, formulada no art. 1420º do CC, é a de que cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence.

Em princípio, portanto, ele goza essa fracção como qualquer outro proprietário singular pode fruir a coisa de que é dono.

Segundo o art. 1305º do CC, "o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem", contudo, sendo este um direito pleno, não é absoluto, porquanto, tem de ser exercido "dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas".

O direito de propriedade não é pois, como se disse, absoluto, porquanto está este limitado pela função social ou económica que desempenha.

No caso da PH, a sua peculiar fisionomia requer especial atenção à interdependência dos condóminos no uso e fruição do prédio, com relevo para a comodidade e tranquilidade destes e para a sua segurança e a do próprio edifício,

Daí que, para além das restrições que de um modo geral a lei assinala ao direito de todo o proprietário, se torne indispensável a imposição de outras que atendam àquelas circunstâncias, sem que isso leve a desvirtuar o domínio pleno do condómino, pois se trata apenas de manifestação do princípio consignado naquele art. 1305º.

É precisamente a essas restrições que este artigo se refere.

Em lugar de formulação genérica e de certo modo vaga que fora dada no art. 12º do DL 40 333, o nº 1 deste art. 1422º veio dispor, de forma objectiva, que os condóminos sofrem as limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários das coisas imóveis, consoante esteja em causa o exercício do seu direito sobre a fracção autónoma ou sobre as partes comuns.

O facto de o preceito não se ter referido, como fazia a lei anterior, ao bem de todos a dever nortear o exercício do direito dos condóminos não quis significar desatenção a essa circunstância, pois é ela uma das que se devem ter em conta por exigência da regra geral do art. 334º, que taxa de ilegítimo o exercício de um direito"quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".

A estas circunstâncias devem, pois, os condóminos atender sempre e como regra geral ao exercerem o seu direito quer como proprietários singulares, quer como comproprietários.

 De um modo especial, e naquela primeira qualidade, devem observar as regras dos seguintes preceitos:

Artigo 1346.º
(Emissão de fumo, produção de ruídos e factos semelhantes)

O proprietário de um imóvel pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores, cheiros, calor ou ruídos, bem como à produção de trepidações e a outros quaisquer factos semelhantes, provenientes de prédio vizinho, sempre que tais factos importem um prejuízo substancial para o uso do imóvel ou não resultem da utilização normal do prédio de que emanam.

Nota: A expressão "prédio vizinho", pode e deve ler-se, no âmbito do regime da PH, como "fracção vizinha", seja ela contígua ou situada no mesmo edifício.

Artigo 1347.º
(Instalações prejudiciais)

1. O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei.
2. Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua inutilização só é admitida a partir do momento em que o prejuízo se torne efectivo.
3. É devida, em qualquer dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.

Nota: A expressão "no seu prédio", pode e deve ler-se, no âmbito do regime da PH, como "no interior da sua fracção", englobando esta a área habitacional, garagem, arrecadações. etc..

Artigo 1348.º
(Escavações)

1. O proprietário tem a faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer escavações, desde que não prive os prédios vizinhos do apoio necessário para evitar desmoronamentos ou deslocações de terra.
2. Logo que venham a padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos serão indemnizados pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as precauções julgadas necessárias.

Nota: Embora não se antevejam situações frequentes entre os condóminos que devam ser reguladas por este preceito, certo é que elas se poderão verificar, sobretudo em prédios onde os condóminos tenham a fruição exclusiva de um logradouro de certa extensão.

Artigo 1349.º
(Passagem forçada momentânea)

1. Se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos.
2. É igualmente permitido o acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de coisas suas que acidentalmente nele se encontrem; o proprietário pode impedir o acesso, entregando a coisa ao seu dono.
3. Em qualquer dos casos previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido.

Artigo 1350.º
(Ruína de construção)

Se qualquer edifício ou outra obra oferecer perigo de ruir, no todo ou em parte, e do desmoronamento puderem resultar danos para o prédio vizinho, é lícito ao dono deste exigir da pessoa responsável pelos danos, nos termos do artigo 492.º, as providências necessárias para eliminar o perigo.

Artigo 1351.º
(Escoamento natural das águas)

1. Os prédios inferiores estão sujeitos a receber as águas que, naturalmente e sem obra do homem, decorrem dos prédios superiores, assim como a terra e entulhos que elas arrastam na sua corrente.
2. Nem o dono do prédio inferior pode fazer obras que estorvem o escoamento, nem o dono do prédio superior obras capazes de o agravar, sem prejuízo da possibilidade de constituição da servidão legal de escoamento, nos casos em que é admitida.

Nota: Embora não se antevejam situações frequentes entre os condóminos que devam ser reguladas por este preceito, certo é que elas se poderão verificar, sobretudo em prédios onde os condóminos tenham a fruição exclusiva de um logradouro de certa extensão.

Artigo 1352.º
(Obras defensivas das águas)

1. O dono do prédio onde existam obras defensivas para conter as águas, ou onde, pela variação do curso das águas, seja necessário construir novas obras, é obrigado a fazer os reparos precisos, ou a tolerar que os façam, sem prejuízo dele, os donos dos prédios que padeçam danos ou estejam expostos a danos iminentes.
2. O disposto no número anterior é aplicável, sempre que seja necessário despojar algum prédio de materiais cuja acumulação ou queda estorve o curso das águas com prejuízo ou risco de terceiro.
3. Todos os proprietários que participam do benefício das obras são obrigados a contribuir para as despesas delas, em proporção do seu interesse, sem prejuízo da responsabilidade que recaia sobre o autor dos danos.

Destas sortes, como comproprietários, os condóminos estão sujeitos à regra geral do nº 1 do art. 1406º do CC, em razão do que, na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer deles "é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito".

19 julho 2023

Esplanada em parte comum



Decidiu o TRP, em Ac. datado de 11/7/2012 que "No conceito de inovação cabem tanto as alterações introduzidas na substância ou na forma da coisa, como as modificações na afectação ou destino da coisa comum. A instalação de uma esplanada, mesmo que amovível, numa parte comum do prédio consubstancia inovação para os efeitos do art. 1425° do Cód. Civil".

Destarte, a autorização requerida para a instalação de uma esplanada numa determinada parte de uma área comum, por força da citada disposição, carecerá, não da unanimidade, mas de uma aprovação composta por uma dupla maioria qualificada: a maioria dos condóminos (metade mais um), devendo essa maioria representar 2/3 do valor total do prédio (67 ou 667 votos, consoante se delibere em percentagem ou permilagem).

No entanto, se se provar que a esplanada prejudica a utilização das partes comuns por algum dos condóminos (e aqui tem que haver um manifesto prejuízo, não basta discordar da inovação), então, carecerá a autorização da unanimidade dos condóminos. Neste sentido, o Ac. do TRE de 11/9/2014: "Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das coisas comuns, pelo que quando assim seja, nem com o voto de maioria qualificada se pode fazer a inovação contra a vontade de qualquer condómino que se tenha por lesado (artº 1425º n.º 2 do CC, na redacção aplicável)."

No limite, o administrador executivo do condomínio pode e deve disciplinar o uso daquele espaço (cfr. al. g) do art. 1436º do CC), nomeadamente, estabelecendo um perímetro que possibilite a normal utilização da entrada para o prédio por parte dos senhores condóminos (cfr. com devida analogia parte final do nº 2 art. 1406º do CC).

Acresce sublinhar que, disciplinando-se o uso, onde cada parte deve ceder na medida do necessário para que ambos os efeitos (o de livre circulação vs o de esplanada), produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes (cfr. nº 1 art. 335º do CC), podendo a assembleia prever penas pecuniárias para o incumprimento desse balizamento (cfr. art. 1434º do CC).

03 fevereiro 2023

Corrimão parte próprio ou comum?



Nos termos do art. 1421º, nº 1, alínea a), do Código Civil:
“São comuns as seguintes partes do edifício:
O solo, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio”.
 
Conforme referem Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, 1987, págs 416 a 417: “Não só o espaço geométrico, porém, constitui objecto do direito de propriedade. Tudo o que se contenha neste espaço e não seja considerado comum (pela lei ou pelo título constitutivo), pertence ao titular da fracção: paredes divisórias que não sejam paredes mestras, revestimento interior destas, revestimento das placas correspondentes ao chão (ladrinhos, tacos de madeira, etc.) e ao tecto de cada fracção autónoma, portas interiores, louças, banheiras e outros materiais dos quartos de banho, bancas de cozinha, etc. 
 
Deverão considerar-se também propriedade do respectivo condómino a porta ou portas de acesso à fracção autónoma, as varandas ou sacadas nestas existentes e as janelas, com tudo o que integra (caixilhos, vidros, persianas, etc.), pois trata-se de elementos destinados ao uso exclusivo do condómino a cuja fracção respeitam. Em sentido contrário, poderá dizer-se que, encontrando-se estes elementos implantados em paredes comuns, deverá caber-lhes a mesma natureza jurídica. 
 
Esta consideração, porém, conforme sublinham alguns autores (cfr., por exemplo, F. Aeby) peca por excesso de lógica, não ponderando devidamente a realidade. Com efeito, os elementos em questão, alguns de natureza muito frágil, estão sujeitos ao uso contínuo por parte dos utentes da fracção em que se integram, dependendo o seu estado, essencialmente, do modo como cada um se sirva dele e os conserve. Há toda a conveniência, por isso, em atribuir-lhes natureza privativa”. (no mesmo sentido, vide Aragão Seia, in “Propriedade Horizontal”, Almedina, Fevereiro 2001, a págs 60 a 61). 
 
Entendendo que todo o revestimento do edifício é comum, tal como as varandas, vide Rui Pinto Duarte, in “Curso de Direitos Reais”, Principia Editora, Lda., 2ª edição, Fevereiro de 2007, a pág. 110.
 
Escreve o citado autor in “A Propriedade Horizontal”, Almedina 2019, a pág. 46: “Se se entender (como nos parece que se deve entender) que todo o revestimento dos edifícios é comum, nenhum condómino poderá, sem autorização do conjunto de condóminos, intervir (mesmo que essa intervenção não reentre nas proibições do nº 2 do art. 1422º) na parte exterior do edifício, mesmo “apenas” para aí colocar equipamento de ar condicionado, placas publicitárias, estendais de roupa, etc... Na doutrina, Jorge Alberto Aragão Seia (ob. cit. a pág. 72 e Sandra Passinhas (ob. cit., pág. 33) são claros na defesa de que todas as paredes exteriores (ainda que não mestras) são partes comuns.”. 
 
Ora, a figura da varanda entendida como “um prolongamento, normalmente, em suspensão, da edificação de que faz parte, desprovida de uma base de sustentação que a suporte” (vide a noção constante do acórdão do STJ de 15 de Maio de 2012 (relator Hélder Roque) e ainda a do acórdão do TRL de 2 de Julho de 2015 (relator Tomé Ramião), ambos publicados in www.dgsi.pt, revestirá, enquanto parte interior (chão) destinada à sua exclusiva utilização pelo condómino respectivo, a natureza parte própria da fracção autónoma pertencente ao condómino respectivo, e não parte comum objecto da compropriedade de todos os condóminos.
 
Escreve, sobre esta matéria, Henrique Mesquita, in “Revista de Direito e Estudos Sociais”, Ano XIII, a págs 112 a 113: “Sendo comuns as paredes mestras do prédio, e tudo o mais que constitua a estrutura deste (colunas, pilares, placas de cimento, telhado, terraços de cobertura, etc.) o direito de propriedade sobre as fracções autónomas como que fica esvaziado de conteúdo material. O seu objecto é fundamentalmente constituído, como salientam alguns autores, por um espaço geométrico, um volume ou um cubo de ar. Este espaço é erigido pelo legislador à categoria de objecto autónomo de direitos, com todas as consequências que daí resultam, em matéria de, v.g., alienação (mediante negócio jurídico inter vivos ou mortis causa), oneração (com direitos de gozo ou de garantia), penhora, expropriação, etc.”. 
 
E seguidamente, na nota 82, refere o mesmo autor: “Deverão considerar-se também propriedade do respectivo condómino a porta ou portas de acesso à fracção autónoma, as varandas ou sacadas nesta existentes e as janelas, com tudo o que as integra (caixilhos, vidros, persianas, etc.), pois trata-se de elementos destinados ao uso exclusivo do condómino a cuja fracção respeitam. 
 
Em sentido contrário, poderá dizer-se que, estando estes elementos colocados em partes comuns, deverá caber-lhes a mesma natureza jurídica”. Trata-se portanto – a parte interior daquele espaço - de uma parte própria e não comum, como se nos afigura claro, inequívoco e indiscutível. 
 
Todavia, o gradeamento metálico (corrimão) que circunda a varanda, delimitando-a, não fazendo parte da zona interior desta, mas antes da sua parte exterior e destinando-se basicamente a prevenir a segurança dos respectivos utentes, tem, nessa mesma medida, uma objectiva e directa correspondência física com a fachada do edifício, bem como com o seu traço arquitectónico próprio e singular. 
 
Se a parte interior da varanda (chão), como parte privativa e simples prolongamento da sua própria fracção (com ela se confundindo indissociavelmente, inclusive do ponto de vista material), serve exclusivamente os interesses do respectivo condómino, já o equipamento metálico (corrimão) que a delimita e “fecha”, integrando-se de pleno na parte exterior dessa mesma varanda e do próprio edifício tomado enquanto unidade, não tem outra utilização definida e específica que não a de completá-la e circunscrevê-la, no âmbito próprio da respectiva fachada, em cuja visualização global se integra, coerente e harmoniosamente. 
 
Entendemos, por conseguinte, que tal gradeamento metálico – entendido nesta exacta perspectiva, isto é, enquanto elemento da parte exterior da varanda em causa e do prédio constituído em regime de propriedade horizontal - deverá receber a qualificação de parte comum do edifício, cuja responsabilidade pela manutenção e conservação impende sobre o Condomínio em geral e não sobre o condómino respectivo em particular. 
 
Ou seja, trata-se de um equipamento autónomo colocado da parte de fora da varanda – não se destinando propriamente a ser usufruído enquanto tal (isto é, enquanto local de disfrute, lazer ou distracção do condómino), mas a servir simplesmente de apoio protector a quem utilize tal espaço. 
 
Trata-se assim de um simples elemento estrutural de segurança, sem outro significado em termos do seu gozo e fruição por parte do condómino a quem cabe o uso exclusivo da respectiva varanda. 
 
Por esta razão o dever de manutenção e conservação do dito gradeamento metálico não é da responsabilidade dos condóminos que individualmente o utilizam, enquanto proprietários das fracções respectivas, mas do conjunto de todos eles enquanto Condomínio, entidade que ao mesmo deve estar atenta e pelo ele deve cuidar e zelar, uma vez que se integra arquitectónica na estrutura do edifício, comportando problemas de protecção e segurança que são indiscutivelmente comuns, sem descurar, todavia, que é ao condómino da fracção respectiva que incumbe, em especial e compreensivelmente, o acrescido dever de sinalizar e diligenciar pela rápida e pronta superação de qualquer problema urgente que detecte neste espaço de edifício. 
 
Esta qualificação jurídica da parte exterior da varanda como parte comum, da responsabilidade de manutenção e conservação a cargo do condomínio, não tem a ver, propriamente e em rigor, com a obrigação de cada um dos condóminos de respeitar a arquitectura e a estética do edifício, em termos da aparência da respectiva fachada, a qual não recai apenas sobre as partes comuns do prédio, mas que se impõe imperativamente às modificações (ditas inovações – cfr. art. 1425º do CC) que cada um dos condóminos tente operar nas suas partes privativas. 
 
O art. 1422º, nº 2, al. a), do CC, onde se consigna que “É especialmente vedado aos condóminos (...) prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício”, reporta-se igualmente – ou mesmo em especial - às obras que venham a ser introduzidas nas partes próprias da titularidade exclusiva de cada condómino. 
 
Daí não poder subscrever-se o argumento constante da decisão recorrida no sentido de que “o gradeamento de uma varanda, na propriedade horizontal é propriedade dos condóminos” uma vez que “o direito de alterar ou modificar esse gradeamento cabe à comunidade, e não apenas ao proprietário desse andar, a quem está vedada a possibilidade de o alterar a seu belo prazer, sob pena de subverter a fachada do prédio”, tratando-se “de uma parte, forçosamente, comum, pela função capital de elemento estético da fachada do imóvel que, no interesse colectivo, exerce em relação a toda a construção”. 
 
Tal circunstância trata-se, ao invés, de uma obrigação de natureza geral que impende sobre todos e cada um dos condóminos com referência, precisamente, às suas partes próprias, relativamente às quais existirá, à partida, a possibilidade e a maior facilidade de – por serem da sua titularidade exclusiva – introduzirem as modificações que bem lhes aprouver. 
 
O que acontece é que tal gradeamento metálico (corrimão) pertencente à parte exterior da varanda e inerente à configuração física de todo o prédio tomado como uma unidade, bem como à sua imagem visual própria aprovada pelas entidades oficiais competentes, deverá qualificar-se juridicamente como elemento pertinente à própria estrutura do prédio, concretamente à fachada e às suas paredes exteriores. 
 
Logo, constitui, a nosso ver, uma parte comum do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, em termos da responsabilidade pela sua manutenção e conservação, não obstante se encontrar, como é óbvio, totalmente afecto ao uso exclusivo do condómino titular dessa mesma fracção, com exclusão de todos os demais, que nem sequer à mesma têm acesso, uma vez que a parte interior e exterior da varanda são, em si, materialmente indissociáveis.
 
O que significa que a respectiva obrigação de manutenção e conservação competia ao condomínio e não ao condómino. (Neste mesmo sentido, vide a seguinte jurisprudência:
- acórdão do STJ de 18 de Março de 1986 (relator Lopes das Neves), cujo sumário é do seguinte teor: “o condomínio deve contribuir para as despesas de conservação e reparação do prédio, certo é que as varandas, na sua parte exterior, são partes comuns”.
- acórdão do TRP de 13 de Março de 2012 (relator Vieira e Cunha), publicado in www.dgsi.pt, onde se referencia as obras realizadas como denominadas “frente das varandas” como partes comuns.
- acórdão do TRL de 7 de Março de 1985 (relator Calixto Pires), cujo sumário está publicado in www.dgsi.pt, nos seguintes termos: “As varandas, como componentes da fachada do edifício, são comuns. O que da varanda está exclusivamente ao serviço do condómino proprietário da fracção que dá acesso é a sua base, a sua parte interior. Sendo as obras, a reparar nas varandas, consistentes em fendas pronunciadas, resultantes, não do uso normal, mas de deficiència na construção das paredes externas, todos os condóminos devem participar no custo das mesmas, na proporção do valor das suas fracções”. 
 
Em sentido contrário – e amplamente minoritário – vide o acórdão do TRL de 19 de Abril de 1995 (relator Silva Caldas), publicado in Colectânea de Jurisprudência/STJ, Ano III, tomo II, páginas 44 a 46).