Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

1/28/2022

O que é a PH?

Esta matéria encontra-se regulada nos art. 1414º a 1438º-A do CC. No entanto, este código não contém uma noção explícita de propriedade horizontal. Não obstante, da conjugação dos art. 1414º e 1415º depreende-se que se caracteriza por uma forma especial do direito da propriedade consistente na possibilidade de diversas fracções de que se compõem um edifício poderem pertencer a proprietários diferentes, desde que sejam susceptíveis de constituir unidades independentes, perfeitamente distintas e isoladas entre si, com saída própria para a via pública ou para uma parte comum do prédio e desta para a via pública.

Deste modo, as partes que se autonomizaram através do processo de constituição da propriedade horizontal ficam a pertencer em propriedade singular ao respectivo titular; as outras são as partes comuns do prédio que ficam a pertencer aos vários proprietários na proporção do valor da parte autónoma de cada um.

I. Requisitos

Para que um edifício possa ser submetido ao regime da PH este tem de ser constituído por fracções autónomas, independentes, distintas e isoladas entre si e que tais fracções tenham garantida uma saída própria para uma parte comum do prédio e dela para a via publica ou directamente para esta.

Estes são pois, os requisitos civis exigidos para que seja possível a constituição da propriedade horizontal. No entanto existem ainda os requisitos administrativos, impostos pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), decorrentes de exigências de segurança, salubridade, arquitectónica, estética, urbanística, tem de ser respeitadas, por condicionarem a construção de edifícios e a sua utilização.

Nesta factualidade, destacam-se os seguintes acórdãos:

  • Ac. da Relação do Porto, de 19/10/2015, Processo 1264/12, considera que Um corredor circunscrito a três fracções autónomas, que constitui parte comum do prédio, só poderá ser afecto ao benefício exclusivo dessas fracções se obter a autorização de todos os condóminos.
  • Ac. da Relação de Guimarães, de 9/4/2015, Processo 397/10, considera que tratando-se de um crédito emergente da celebração dum contrato promessa de compra e venda em que à data limite do cumprimento daquele as fracções a que a sociedade se comprometeu vender ao autor ainda não estavam concluídas, o direito de crédito deste constituiu-se com a celebração do contrato promessa.
  • Ac. do STJ, Secção Cível, de 26/2/2015, Processo 778/11.6TVLSB.L1.S1, considera que apesar da maioria dos condóminos terem votado contra a instalação de uma cadeira elevatória na escadaria comum do prédio, o regime de propriedade horizontal não deve impedir que o arrendatário que dela necessita, por via da sua condição física, o possa fazer.

II. Constituição da Propriedade Horizontal

A propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico, usucapião, decisão administrativa ou decisão judicial, proferida em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário (cfr. art. 1417º, nº 1 do CC).

Destaca-se os seguintes acórdãos:

  • Ac. da Relação de Lisboa, de 3/4/ 2014, Processo 1345/10, considera que se do título constitutivo da propriedade horizontal consta que a parte do prédio destinada ao uso e habitação da porteira era comum, tal circunstância não poderá ser alterada sem o acordo de todos os condóminos.

III. Requisitos do Título Constitutivo

Nos termos do art. 1418º é obrigatório no titulo constitutivo especificar as partes correspondentes às várias fracções, por forma que estas fiquem devidamente individualizadas e o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem do valor total do prédio.

Mas para além disso o nº 2 do ar. 1418º, aditado na revisão operada no DL nº 267/94, admite que no título constem facultativamente, outras menções, a saber:

  • a) fim a que se destina cada fracção ou parte comum;
  • b) regulamento do condomínio ;
  • c) estipulação de compromisso arbitral para resolução de litígios emergentes das relações de condomínio.

Por sua vez o art. 83º do Código do Registo Predial estabelece que a descrição de cada fracção autónoma deve conter:

a) O número de descrição genérica do prédio, seguido da letra da fracção, segundo a ordem alfabética;

b) De entre as menções gerais das descrições constates das al. c) a f) do nº 1 do artigo anterior (isto é, a denominação do prédio e a sua situação, a composição e a área, valor patrimonial ou, na sua falta, o valor venal e a indicação do artigo de matriz ou da sua omissão).

c) A menção do fim a que se destina, se constar do título (esta menção é facultativa de acordo com o CC).

Destacam-se os seguintes acórdãos:

  • Ac. do STJ, de 28/1/2016, Processo 3076/06, considero que não resultando do título constitutivo de propriedade horizontal quaisquer indicações quanto ao uso das lojas dos pisos térreos, apenas resultando que a maioria das fracções autónomas se destina a habitação, e outras a escritórios e garagens, não é admissível numa dessas lojas a instalação de um restaurante, não relevando o licenciamento camarário.
  • Ac. do STJ, Secção Cível, de 11/12/2014, Processo 833/11.2TVPRT.P1.S1, considera que perante a coincidência entre as áreas expressas no título constitutivo e no projecto de construção, e considerando que este último cataloga a parcela de terreno como integrante de uma fracção autónoma, a mesma deverá ser adstrita exclusivamente à respectiva fracção autónoma.
  • Ac. do STJ, de 11/2/2014, Processo 8284/07, considera que a construção de garagem privativa a ocupar lugar de garagem existente e ainda parte da caixa de elevadores, de natureza comum, embora implique alteração de projecto construtivo, não coloca em causa interesses de natureza e ordem pública, nem os interesses privados dos condóminos.

IV. Modificação do Título Constitutivo

A lei estabelece como principio geral que, havendo acordo de todos os condóminos, estes podem modificar o TCPH, desde que se observem os requisitos estabelecidos pelo art. 1415º do CC, isto é, desde que sejam susceptíveis de constituir unidades independentes, perfeitamente distintas e isoladas entre si, com saída própria para a via pública ou para uma parte comum do prédio e desta para a via pública.

Se o acordo constar de acta assinada por todos os condóminos, o administrador tem legitimidades para outorgar a escritura respectiva em representação do condomínio.

As modificações possíveis são:

  • a dos valores relativos das fracções, que podem ser redistribuídas em diferentes proporções das referidas no título constitutivo;
  • as que importem alteração da composição;
  • as que demandem alteração do destino das respectivas fracções.

Destacam-se os seguintes acórdãos:

V. Divisão e junção de fracções autónomas

O art. 1422º-A do CC, acerca da divisão e junção de fracções autónomas, veio determinar o seguinte:

1 – Não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas.

2 – Para efeitos do disposto no número anterior, a contiguidade das fracções é dispensada quando se trate de fracções correspondentes a arrecadações e garagens.

3 – Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.

4 – Nos caos previstos nos números anteriores, cabe aos condóminos que juntaram ou cindiram as fracções o poder de, por ato unilateral constante de escritura publica, introduzir a correspondente alteração no título constitutivo.

5 – A escritura pública a que se refere o número anterior deve ser comunicada ao administrador no prazo de 30 dias.

Quem tem interesse na junção de duas ou mais fracções numa só ou na divisão de uma fracção em novas fracções autónomas é o respectivo titular, mas só a junção é que não carece de autorização dos demais condóminos, dado que a divisão só é legalmente admissível se tiver sido autorizada no título constitutivo ou se o for pela assembleia de condóminos sem qualquer oposição.

A alteração do TCPH a que a junção ou a divisão dão lugar pode ser formalizada em escritura pública, por acto unilateral outorgado apenas pelo condómino que proceder à junção ou pelos condóminos que cindirem as fracções. Neste último caso, só em face do conhecimento dos outros condóminos e de documento camarário ou de projecto devidamente aprovado que comprove que a alteração introduzida respeitou os requisitos legais das fracções, desde que tal modificação exija obras de adaptação que necessitem de autorização camarária.

VI. Obrigações dos condóminos

As obrigações dos condóminos, para além do que resulta das limitações ao exercício do seu direito, referem-se sobretudo às partes comuns e podem reconduzir-se às seguintes categorias: encargos de conservação, uso e fruição, reparações, inovações e encargos fiscais.

Destacam-se os seguintes acórdãos:

  • Ac. da Relação de Guimarães, Secção Cível, de 12/2/2015, Processo 310.12.4TBCMN.G1, considera que tem o condomínio legitimidade para a acção em que peticiona a condenação dos réus a retirarem tudo o que afixaram na parede norte do prédio, retirarem a ligação que fizeram de tubo à caixa receptora e a procederem à reparação da parede, incluindo impermeabilização dos orifícios abertos e pintura de parede, devendo ser revogada a decisão do tribunal a quo que absolveu os réus da instância.
  • Ac. da Relação de Lisboa, de 5/3/2015, Processo 5570-12, considera que cada condómino tem legitimidade para defender o seu direito sobre parte comum do prédio constituído em propriedade horizontal contra quem tal direito ofenda.

VII. Administração das partes comuns

A administração das partes comuns (e só de estas), encontra-se regulada pelos art. 1430º ao art. 1438º.

Com efeito, a assembleia de condóminos é constituída por todos os titulares de fracções autónomas, tendo cada um deles tantos votos quantos os correspondentes às unidades inteiras da permilagem ou percentagem da fracção ou fracções que possuir.

O administrador é o órgão executivo do condomínio, electivo, unipessoal e pode ser remunerado. Acresce ressalvar que este cargo não tem necessariamente de ser desempenhado por um condómino, podendo-o ser por um terceiro, pessoa individual ou colectiva.

Destacam-se os seguintes acórdãos:

  • Ac. da Relação de Évora, de 3/11/2016, Processo 1475, considera que tendo a alteração das permilagens sido aprovada por unanimidade pelos condóminos presentes, representativos de mais de dois terços do capital investido, tal alteração é válida.
  • Ac. da Relação do Porto, de 30/5/2016, Processo 45/14, considera que a obrigação de prestação de contas do mandatário, aplicável ao administrador do condomínio, só se extingue quando sejam aceites e aprovadas pelo mandante, não cessando com a simples prestação extrajudicial de contas, mas, apenas com a aprovação de tais contas por parte de quem tem o direito de as exigir.

1/27/2022

Junção de fracções autónomas

No que concerne à questão da junção de fracções autónomas, de acordo com o art. 1422º-A, nº 1 do CC "Não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas", sendo que o nº 2 determina que "Para efeitos do disposto do número anterior, a contiguidade das fracções é dispensada quando se trata de fracções correspondentes a arrecadações e garagens".

No caso em apreço, dimana do mesmo preceito que cabe ao condómino que juntou as fracções autónomas o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública ou documento particular autenticado, introduzir a correspondente alteração do título constitutivo (nº 4), sendo que o acto deve ser comunicado ao administrador no prazo de 30 dias (nº 5).

No entanto, e no domínio substantivo as normas que regulam a propriedade horizontal, importa desde logo ressalvar o princípio geral contido nos art. 1422º e 1422º- A, ambos do CC, que proíbem a junção ou anexação de fracções autónomas de edifícios diferentes e vedam, através da construção de obras novas, qualquer possibilidade de prejudicar a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, assim como a prática de quaisquer actos que tenham sido proibidos por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.

No âmbito do direito de mera propriedade o princípio consagrado na lei é o de que qualquer proprietário pode exigir judicialmente contra qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade com as consequências daí resultantes. A natureza absoluta deste direito permite que o proprietário goze, de modo pleno e exclusivo, dos direitos de uso, fruição e disposição do bem em causa, nos termos que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas (cfr. art. 1305º do CC).

Tudo isto para dizer que, não pode qualquer proprietário ser privado, lesado ou cerceado nos seus direitos, fora dos casos expressamente previstos na lei, e independentemente da qualidade atribuída ao lesante: quer este seja possuidor, quer mero detentor ou um qualquer proprietário.

Face ao que antecede, e ao que decorre quer da lei, enquanto mero direito de propriedade, quer do estatuto da propriedade horizontal, enquanto comproprietário, a conclusão que se impõe é a de que os condóminos podem proceder à junção de duas ou mais fracções autónomas, sem carecer de qualquer autorização do condomínio, contanto sejam contíguas (excepto se se tratar de arrecadações e/ou garagens), sem que tais obras importem numa violação do preceituado no art. 1422º do CC (isto é, a remoção de paredes - contanto não susceptíveis de colocar em causa a segurança do edifício -, não modificam a linha arquitectónica).

Divisão de fracções autónomas

No que se refere à questão da divisão de uma fracção autónoma, dimana do art. 1422º A, nº 3 do CC que “Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.”

No caso vertente, cabe ao condómino que cindiu a fracção autónoma o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública ou documento particular autenticado, introduzir a correspondente alteração no Título Constitutivo da Propriedade Horizontal (nº 4), devendo o acto ser comunicado - formalmente, sublinhe-se -, ao administrador no prazo de 30 dias (nº 5).

No mais, e face ao disposto no art. 1419º, nº 1 do CC – e não se verificando nenhuma das excepções previstas no art. 1422º-A do mesmo diploma -, a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal apenas é possível quando ocorra acordo expresso de todos os condóminos, devidamente formalizado em escritura pública ou documento particular autenticado e nunca através de decisão judicial. Daqui se conclui portanto que, exceptuando as ressalvas contidas no art. 1422º-A, a modificação do TCPH apenas pode ser efectuada em conformidade com o preceituado no art. 1419º, nº 1 do CC e não por decisão judicial.

Importa contudo salientar que, se autorizada pelo Título Constitutivo ou no silêncio deste, obtida a autorização em reunião plenária sem oposição, o condómino não carece do acordo de todos os condóminos (entenda-se, deliberação tomada por unanimidade) para poder proceder à modificação do documento constitutivo. Aliás, não faria qualquer sentido, o condómino obter a aprovação sem qualquer oposição e posteriormente surgisse algum condómino a opor-se à alteração do título.

Cumpre agora perguntar, as obras de divisão de uma fracção autónoma, podem também inserir-se no capítulo das inovações?

A este respeito, o Tribunal da Relação de Lisboa refere no seu acórdão de 15/12/2011 que:

“I – Em matéria de “obras novas” realizadas pelos condóminos o legislador optou por não definir o que são obras “inovadoras” nem consagrar na lei o que deve entender-se por inovação. 

II – Deixando, e bem, esse papel para a jurisprudência, que deverá, caso a caso, enquadrar no referido conceito as obras que os condóminos realizarem e que, em face do caso concreto e das circunstâncias fácticas apuradas, possam ser consideradas como tal. 

III – Se atentarmos no próprio significado etimológico da expressão, concluímos que “inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Portanto, obras inovadoras serão aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. 

IV – Inovadoras serão também aquelas obras que alteram a edificação no seu estado original, modificando o seu estado primitivo. Com alterações que tanto podem ser de substância, como de forma, em modificações relativas ao seu destino ou afectação da fracção do imóvel ou das partes comuns do edifício.”

1/26/2022

Diferença entre art. 1422º e 1425º CC

A aprovação da alteração da linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício ou das inovações, numa apreciação mais desavisada, parece apenas necessitar de uma aprovação por uma maioria representativa de 2/3 do capital do prédio, ainda que possam existir votos contra, de acordo com o disposto no art. 1422º nº 3 e no art. 1425º nº 1, ambos do Código Civil e que se passam a transcrever.

Artigo 1422º nº 3 do Código Civil

“As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.”

Artigo 1425º nº 1 do Código Civil

“Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.” 

De facto, em ambos se preceitua que a maioria qualificada exigida é a de 2/3 do capital investido (não do número de votos dos condóminos presentes e/ou representados em plenário), no entanto, importa atentar num singelo pormenor:


Artigo 1422º nº 3 do Código Civil

“maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.”

Artigo 1425º nº 1 do Código Civil

“maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.”

Portanto, no art. 1422º apenas é exigida uma maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio, enquanto que no art. 1425º, é exigida uma dupla maioria, a maioria dos condóminos (metade + 1), devendo essa maioria representar 2/3 do valor total do prédio.

Concretizando com um singelo exemplo de um edifício com 8 fracções: no primeiro caso, exige-se um vencimento com 67 ou 667 votos (consoante se delibere em percentagem ou permilagem), mesmo que sufragados pela minoria de condóminos (por exemplo 3, votando os outros 5 contra). No segundo, também é exigido um vencimento com os referidos 67 ou 667 votos, mas neste sufragados necessariamente pela maioria dos condóminos, que no caso, serão 5 (metade + 1).

De salientar que ambas estas maiorias qualificadas são exigidas tanto em primeira, como em segunda convocação da assembleia de condóminos.

Prazo caducidade AG sem convocação

O pressuposto do início da contagem do prazo de caducidade da acção de anulação de deliberações sociais é a de que a mesma tenha sido tomada mediante convocatória regular e válida do impugnante. Não existindo convocatória para a assembleia nem posterior comunicação da deliberação, o prazo de caducidade só começa a correr a partir do conhecimento da deliberação por parte do sócio ausente (cfr. Ac. Relação de Lisboa de 20/9/2012).
 
Vamos supor que a assembleia de condomínio reune, sem se ter convocada nos termos fixados nos nºs 1 e 2 do art. 1432º do CC (foi convocada, por exemplo, com um papel afixado na parede da entrada do edifício). Nestas circunstâncias ocorre perguntar. Será que se aplica, mesmo assim, o dito prazo de 60 dias? Certamente que não.

O pressuposto do início da contagem do prazo de caducidade é, como já se disse, que a deliberação tenha sido tomada mediante convocatória regular e válida do condómino impugnante (de sublinhar que - como já fui de abordar em um outro meu escrito -, só pode impugnar quem não comparecer na reunião, sob pena de, não obstante a irregularidade, aquele se considerar, para todos os efeitos, convocado). 
 
A convocação da assembleia necessita de obedecer aos requisitos explicitamente discriminados no nº 1 e 2 do art. 1432º do CC e deve, além disso, ser dirigida a todos os condóminos, caso contrário a reunião será irregular e as suas deliberações susceptíveis de impugnação, nos termos do art. 1433º (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, Vol. III, págs. 380/381). A falta de envio da convocatória a todos os condóminos é causa de anulação das deliberações que a assembleia vier a tomar (cfr. Giuseppe Branca, “Comentário del Códice Civile, págs. 548 e 549, citado por Moitinho de Almeida, “Anulação e Suspensão de Deliberações Sociais”, 2ª edição, pág. 81).
 
Portanto, não existindo uma formal convocatória para a assembleia de condóminos nem uma posterior comunicação da deliberação, nos precisos termos fixados no art. 1432º, nº 6 do CC, o prazo de caducidade previsto no art. 1433º, nº 4, do CC (no caso, 60 dias) só começa a correr a partir do conhecimento da deliberação por parte do condómino ausente. É o que resulta da aplicação, por analogia (cfr. art. 10º do CC), do disposto no art. 396º, nº 3, do CPC, segundo o qual o prazo para requerer a suspensão de deliberação social só começa a contar a partir da data em que o requerente, não regularmente convocado para a assembleia, teve conhecimento da deliberação.

Como referido, é este o entendimento que se considera mais adequado à harmonia do sistema, pois que as finalidades supra elencadas, resultantes da alteração legislativa introduzida pelo DL 267/94, de 25/10 (designadamente a que pretende responsabilizar os condóminos menos atentos ou negligentes) só têm verdadeiro sentido se existe a prévia certeza de que foram validamente convocados para a assembleia, não se vendo qualquer incompatibilidade entre o disposto nos art. 1432º e 1433º do CC..

1/21/2022

Impugnações fora da alçada dos Julgado de Paz

Os condóminos podem recorrer aos Julgados de Paz para impugnarem as deliberações contrárias à lei porquanto o requerimento enquadra-se no diploma das atribuições dos mesmos, desde que o conteúdo das deliberações não exceda o valor da competência que lhes é atribuída.

Importa ressalvar que o valor da causa é fixado nos Julgados de Paz nos precisos termos do CPC aplicável por remissão do art. 63º da Lei dos Julgados de Paz. Assim, dispõe o art. 296º nº 1 do CPC que “a toda causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.

Resulta assim do citado preceito que a “utilidade económica” imediata do pedido, expressa em dinheiro, constitui o critério geral para a determinação do valor da causa. Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil anotado, vol. I, pág. 543) escreve que há, porém, que ter em conta que o pedido se funda sempre na causa de pedir, que o explica e o delimita. Dela – conclui aquele Mestre – não abstrai o critério da utilidade económica imediata do pedido, pelo que este não é considerado abstratamente, mas sim em confronto com a causa de pedir, para apuramento do valor da causa…Tal como o pedido desligado da causa de pedir não basta à determinação do valor da acção, também a causa de pedir, por si, não o determina…”(sublinhado nosso)  

Acresce que o art. 301º também do CPC preceitua que “quando a acção tiver por objecto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um acto jurídico, atender-se-à ao valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes”. Por outro lado, o art. 303º do mesmo código estabelece que “as acções sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais € 0,01”.

Nesta conformidade, caso a deliberação a anular tenha como base a validade da deliberação (por exemplo deliberação estranha à convocatória ou tomada com falta de quórum) ou um interesse não quantificável não nos parece possível fazer intervir o Julgado de Paz. Na verdade, as acções sobre interesses imateriais compreendem as acções cujo objecto não tem expressão pecuniária, as acções cujo benefício não pode traduzir-se em dinheiro (cfr. Alberto dos Reis, «Código de Processo Civil Anotado, I, 3.ª edição, pág. 414»).

Cumpre sublinhar que na nossa jurisprudência verifica-se uma unanimidade no sentido de se considerar que “numa cação em que é pedida a anulação de todas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, onde, entre outras, estão em causa questões inerentes à validade da sua convocatória, terá de se entender, para efeitos de atribuição do valor à acção, estarmos face a situação que visa a salvaguarda de valores imateriais, correspondendo-lhe, por isso, o valor de 30.000,01€" (cfr. Ac. da Relação de Lisboa 20-09-2013).

Encontramos na nossa jurisprudência uma situação algo idêntica, reportada a uma acção em que se pedia a anulação de deliberações sociais: «Estando em causa a anulação de deliberações sociais, tomadas em assembleia geral de uma sociedade, com fundamento na falta de qualidade de sócio de um dos presentes nessa assembleia geral, o valor da respectiva acção deve ser fixado de acordo com o disposto no art. 312º do CPC, pois estamos perante uma acção que visa sobre interesses imateriais.» (cfr. Ac. da Relação do Porto de 04-10-2001, Proc. nº 0130793, em que foi Relator o Desembargador, Dr. Camilo Camilo, disponível em www.dgsi.pt ).

Dação em cumprimento

A dação em cumprimento é um negócio jurídico do tipo de contratos bilaterais e onerosos utilizado pelo devedor para cumprir, total ou parcialmente perante o credor, as dívidas ou responsabilidades a que está obrigado. Muito utilizada pelos particulares como forma de extinguirem as suas dívidas. Normalmente os bens dados em cumprimento dessa dívida são bens imóveis, pelo que a escritura envolve o pagamento de IMT e Imposto de Selo.

A dação em cumprimento vem referida no art. 837° CC que refere que “a prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento. Daqui resulta que esta causa de extinção das obrigações tem dois pressupostos:

- a realização de uma prestação diferente da que for devida;

- o acordo do credor relativo à exoneração do devedor com essa prestação.

Enquanto no cumprimento o devedor realiza a prestação devida, produzindo assim a extinção da obrigação, na dação em cumprimento realiza um aliud em relação ao que está vinculado, ainda que com o fim de extinguir essa mesma obrigação. Tem sido, porém, questionado se o art. 837° do CC limita a dação em cumprimento às prestações de coisa e, dentro delas, à entrega de uma coisa de natureza diferente (por exemplo: a entrega um barco em lugar do carro prometido), ou se pode igualmente abranger qualquer tipo de prestação diferente da que for devida (por exemplo: a entrega de uma quantia de dinheiro em substituição do barco devido). Certo é que deste preceito não resulta qualquer tipo de limitação (cfr. também os art. 877° nº 3 e 1409° do CC que justificam esse facto).

É elemento essencial da dação em cumprimento que a prestação seja definitivamente realizada, não parecendo ser suficiente a mera celebração do acordo transmissivo do direito. Efectivamente, apesar de o art. 408° nº 1 do CC determinar que a transmissão do direito se dá com a mera celebração do contrato33, parece resultar do art. 837° do CC que a dação em cumprimento só se verifica com a efectiva realização da prestação (cfr. Leitão, Direito das obrigações, volume II, pág. 177).

A dação em cumprimento determina em primeiro lugar a extinção da obrigação que aquela visou satisfazer, com a consequente exoneração do devedor (cfr. art. 837° do CC). Sendo a obrigação solidária, a dação em cumprimento realizada por um dos devedores produz igualmente a extinção da obrigação dos outros devedores (cfr. art. 523° do CC), assim como a realização a um dos credores solidários produz igualmente a extinção da obrigação do devedor perante os outros credores (cfr. art. 532° do CC e relativamente à garantia contra vícios da coisa ou do direito transmitido os art. 837°; 892 e ss., 905° e ss., 913° e ss. e 587° CC. Em alternativa à garantia pelos vícios da coisa ou do direito transmitido nos termos da compra e venda, o credor pode optar pela prestação primitiva e pela repa-ração dos danos sofridos).

A dação pro solvendo ou dação em função do cumprimento, prevista no art. 840° CC, consiste na execução de uma prestação diversa da devida para que o credor proceda à realização do valor dela e obtenha a satisfação do seu crédito por virtude dessa realização por isso na dação pro solvendo o crédito subsiste até o credor venha a realizar o valor dele (por exemplo, através de uma venda do bem entregue ou da cobrança do credito cedido). 

Enquanto na dação em cumprimento se verifica uma causa distinta de extinção das obrigações, na dação pro solvendo há apenas um meio de facilitar o cumprimento das obrigações. Se a dação tem por objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma dívida presume-se igualmente feita pro solvendo (cfr. art. 840° nº 2 CC). Em consequência desta disposição será igualmente qualificada como dação pro solvendo a entrega de um cheque para o pagamento de uma dívida.

A escritura da dação em cumprimento

De sublinhar que, a escritura de dação em cumprimento pressupõe sempre o acordo das partes quanto ao valor a atribuir ao bem entregue para pagamento da dívida. Assim, os bens normalmente dados em cumprimento podem incluir imóveis, prédios rústicos ou urbanos, quotas ou acções de sociedades, veículos automóveis e obras de arte. No entanto podem ser dados quaisquer outros bens, desde que as partes sobre isso cheguem a acordo.

Assim, se o valor do bem for inferior ao valor da dívida, esta fica parcialmente extinta e o devedor poderá entregar ao credor a diferença em dinheiro ou através de outros bens que possua para extinção total da dívida.

Nesta factualidade, na dação em função do cumprimento, o crédito só se extingue quando for satisfeito e na medida respectiva. No mais, e no âmbito das escrituras de dação em cumprimento o Cartório procede à emissão das guias de IMT e de Imposto de Selo quando devidas, obtém toda a documentação necessária relativa aos bens a dar em cumprimento, realiza a escritura e procede ao registo dos bens a favor do novo titular, sejam quotas, veículos automóveis ou prédios.

Pelo acima exposto, os proprietários que tenham adquirido uma fracção autónoma mediante um crédito hipotecário, podem desobrigar-se do ónus da dívida, através deste instrumento. Pese embora os bancos não sejam forçados a aceitar (regra geral, não existe um acordo entre a avaliação que ambas as partes fazem ao imóvel), já existe uma acção julgada nos nossos tribunais onde a entidade financeira viu-se na obrigação de aceitar a entrega da casa pelo devedor, no entanto, este caso não faz necessariamente, jurisprudência.

Esta deverá ser contudo, a solução de último recurso, após esgotada uma possível renegociação do crédito, consolidação de créditos ou a alienação.

Quanto ao valor do imóvel, se a avaliação for inferior ao valor da dívida, o cliente poderá ter que formalizar a contratação de um crédito pessoal para pagar o valor remanescente. Pelo contrário, se a avaliação se tiver superior ao valor de mercado do imóvel, o banco é obrigado a devolver ao cliente a diferença. Importa não olvidar que, ao valor em dívida, acrescem todas as demais despesas relativas aos custo do processo.

O art. 1422º do Código Civil

 Artigo 1422.º
(Limitações ao exercício dos direitos)

1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.

2. É especialmente vedado aos condóminos:

a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;

b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;

c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada;

d) Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou, posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.

3 - As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

4 - Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

(Alterado pelo Art. 1.º do Decreto-Lei n.º 267/94 - Diário da República n.º 247/1994, Série I-A de 1994-10-25, em vigor a partir de 1995-01-01).

Notas: 

A redacção da al. d) e os nº 3 e 4 foram introduzidos pelo art. 1º do DL 267/94 de 25/10. O preceito tem origem parcial no art. 12º do Decreto-Lei nº 40 333, 14 Outubro 1955 e 124º do Anteprojecto de Pires de Lima (no Bol. Min. Just., nº 123, p. 273). O preceito tem origem parcial no art. 12 do Decretyo-Lei nº 40 333, de 14 Outubro de 1955.

A redacção anterior da al. d) era "Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou, posteriormente, por acordo de todos os condóminos."

Fontes:

Anteprojecto: 

art. 124º

1ª Revisão Ministerial

art. 1410º

Salvo ligeiras diferenças que não alteraram, a redacção proposta neste artigo, coincide com o texto originário do Código, salvo a da alínea c) do nº 2 que, em ambos, é do seguinte teor:

"Dar-lhes uso contrário ao fim a que foi destinada, salvo consentimento de todos os proprietários ou o competente suprimento judicial."

Projecto: 

art. 1422º

Tem a mesma redacção do texto original do Código.

Direito anterior:  

DL nº 40 333, 14 Outubro 1955

art. 12º

No exercício do seu direito devem os proprietários suportar as limitações necessárias ao bem de todos, em virtude das relações de vizinhança, da compropriedade nas coisas comuns e da circunstância de as fracções pertencerem ao mesmo edifício.

§ único. Em especial, é vedado aos condóminos:

1º Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparações adequadas, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;

b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos à moral ou aos bons costumes;

c) Dar-lhe uso contrário ao fim que foi destinada a fracção, salvo a autorização de todos os condóminos ou o competente suprimento judicial quando injustamente negada.

art. 14º

Os proprietários podem usar os bens comuns, em conformidade com o respectivo fim, e sem inibirem os consortes do exercício de igual direito.

art. 15º

O direito dos proprietários aos bens comuns será, na falta de título em contrário, representado por uma quota igual à percentagem ou permilagem prevista no nº 2 do art. 3º.

1/19/2022

Impugnação após 60 dias

A questão colocada prende-se com a contagem do prazo de caducidade, previsto no nº 4 do art. 1433º do Código Civil, da acção anulatória das deliberações das assembleias de condóminos contrárias à lei ou aos regulamentos (nº 1 do mesmo artigo), proposta pelo condómino ausente (embora notificado para comparecer na assembleia). 

Há duas grandes correntes doutrinais e jurisprudenciais sobre tal matéria.
 
No Ac. TRL, de 22/6/1999, CJ 1999 III-121 e do STJ, de 11/1/2000 – defendeu-se que o início de contagem do prazo se faz a partir da data da deliberação impugnada. Ou seja, “actualmente os condóminos faltosos terão de diligenciar no sentido de conhecerem o teor das deliberações para, se o desejarem, poderem impugná-las no prazo dilatado de 60 dias sobre a data da deliberação e não da comunicação da deliberação, como primitivamente se estipulava”.
 
É esta a tese que melhor se coaduna com uma interpretação histórico-actualista, sistemática e teleológica (racional), onde se presume que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nº s 1 e 3).
 
Por sua vez, outra tese – estribando-se no acórdão do STJ, de 21/1/2003 e na opinião de autores como Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2ª edição, página 86 e Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos", página 241 - vai no sentido de que a contagem de tal prazo só se inicia a partir da comunicação da deliberação impugnada
 
Como é sabido, a actual redacção do artigo 1433º do Código Civil - aplicável foi-lhe dada pelo DL 267/94 de 25/10. Na anterior redacção, o nº 2 do referido artigo não deixava margem para dúvidas, ao prescrever expressamente que o prazo em causa se contava da comunicação da deliberação ao condómino ausente.

Numa interpretação literal, o correspondente número (o nº 6) do actual 1433º também não nos deixa margem de dúvida, pois que não faz qualquer referência a essa comunicação como início da contagem do prazo, fazendo apenas distinção entre os prazos para a propositura das acções – 60 dias para a anulação da primitiva deliberação e 20 dias para a anulação da deliberação da assembleia extraordinária.

Dispõe o art. 1433º:
- «as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado» (nº 1);
- «no prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes» (nº 2);
- «no prazo de 30 dias contados nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem» (nº 3);
- «o direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação» (nº 4).

Como se vê, a lei fez iniciar a contagem do prazo para o condómino ausente requerer, quer a assembleia extraordinária, quer a intervenção do centro de arbitragem, da comunicação - que lhe deve ser feita, nos termos do nº 6 do art. 1432º do CC - da deliberação impugnanda. Mas - claramente - já não usa o mesmo critério relativamente ao prazo de caducidade das acções anulatórias. Seguramente foi pensado pelo legislador.

Se é certo que a interpretação da lei não deve ser meramente literal (cfr. nº 1 do art. 9º do CC), não é menos verdade que não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, sendo sempre de presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr. nºs 2 e 3 do mesmo artigo).

Ora, o legislador de 1994 foi tão minucioso nas alterações que introduziu ao regime da propriedade horizontal, através do referido DL 267/94, que só podemos entender como sendo querida expressamente esta diferença de regime.

A intenção do legislador foi fundamentalmente, de privilegiarem os meios extrajudiciais (a assembleia extraordinária) ou para judiciais (o centro de arbitragem) para a apreciação e eventual revogação das deliberações anuláveis a que se reporta o nº 1 do art. 1433º do CC. Aragão Seia, ob. cit., páginas 185/186 escreveu que com tal alteração se pretendeu:
-«obstar a recurso a tribunal, evitando o inconveniente de criar antagonismos entre os condóminos e de protelar no tempo a eficácia definitiva da decisão, permite-se no prazo de 10 dias"exigir ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária"»;
-« procurar evitar o recurso a tribunal permite-se que possa sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.».
 
Esta finalidade tem a sua plena expressão no caso de condómino ausente que só tenha tido conhecimento da deliberação através da comunicação a que alude o nº 6 do art. 1432º e já depois de decorridos os 60 dias referidos no nº 4 do art. 1433º, ou seja, sobre a data daquela, como diz a lei.

Neste caso e no nosso entender, porque já não pode intentar a acção anulatória dessa deliberação, para a revogar tem necessariamente de, nos respectivos prazos legais, recorrer:
-ou à assembleia extraordinária;
-ou ao centro de arbitragem.

E se, lançar mão da assembleia extraordinária, a respectiva deliberação lhe vier a ser desfavorável, ainda poderá recorrer aos meios judiciais, instaurando a respectiva acção de anulação desta deliberação extraordinária, no prazo de 20 dias, contados sobre ela, como permite o nº 4 do art. 1433º do CC.

A deliberação extraordinária se for confirmatória da primitiva deliberação – sendo revogatória não há fundamento para a intervenção judicial, como é óbvio, o objecto da acção de anulação é aquela e não esta. O direito de anulação da primitiva deliberação morreu com o decurso do prazo de 60 dias - prazo este que, evidentemente, jamais poderá renascer.

O que nasce com a deliberação extraordinária é o prazo de 20 dias para o condómino ausente pedir a anulação judicial desta mesma deliberação e não da primitiva (não obstante esta ter sido objecto daquela). Se o condómino ausente optar pelo recurso ao centro de arbitragem, precludirá o seu direito à acção anulatória, pois que a decisão arbitral tem, nos termos do art. 26º da Lei nº31/86, de 29 de Agosto, a mesma força e os mesmos efeitos jurídicos que uma sentença judicial.

Em suma, o condómino ausente nunca ficará cerceado no seu direito de recorrer aos tribunais para anular as deliberações das assembleias de condóminos que considere anuláveis à luz do nº 1 do art. 1433º do CC. Basta estar atento – como atento terá que estar no caso de haver lugar à 2ª reunião da assembleia, a qual se considera convocada para uma semana depois, na mesma hora e local (cfr. nº 4 do art. 1432º do CC), para não deixar esgotar o prazo de 60 dias a contar da data da deliberação que pretende impugnar e, por sua iniciativa (independentemente da comunicação que lhe deve ser feita nos termos do nº 6 do art. 1432º do mesmo Código), tomar conhecimento do respectivo teor.

De qualquer forma, se não tiver esse cuidado e só vier a ter conhecimento da deliberação através da referida comunicação e depois de decorrido o prazo de 60 dias sobre ela, ainda assim lhe restará a possibilidade da sua (indirecta) apreciação judicial, caso a assembleia extraordinária a que necessária e previamente terá que recorrer, nos termos legais atrás explanados – não a revogue.

Entendimento diverso - no sentido de a contagem do prazo de caducidade da acção anulatória se iniciar só com a comunicação nos termos do nº 6 do art. 1432º do CC - propiciará o laxismo/absentismo e a indefinição das questões condominiais, ao contrário do que, naturalmente, é pretendido pela lei. 

Nesta conformidade, concluindo-se, como se conclui, que o prazo de caducidade de 60 dias a que alude o nº 4 do art. 1433º do CC se conta a partir da data da deliberação, mesmo para os condóminos ausentes.

Convocatória por 25% capital

Como é consabido, a assembleia é convocada pelo administrador do condomínio, no entanto, existem duas excepções a esta regra, sendo que neste artigo, debruço-me sobre a primeira, plasmada no art. 1431º, no seu nº 2, determina que a assembleia reunirá quando para o efeito se tiver convocada por condóminos que representem, pelo menos, vinte e cinco por cento do capital investido.

Ora, sendo a assembleia geral extraordinária convocada nos termos do citado preceito do Código Civil, tal significa que a mesma deverá ter-se subscrita, com inclusão na respectiva convocatória e no próprio acto, pelos condóminos que representam, pelos menos, 25% do capital investido do prédio.

Na medida em que, esta convocatória não cumpra o evocado requisito legal, isto é, não contenha as assinaturas de todos os condóminos convocadores, carece a mesma de qualquer validade, inquinando, por conseguinte, a assembleia geral extraordinária que por essa via se pretendia convocar? 

Atento o exposto, tal situação não significará que qualquer deliberação que, porventura, venha a ser no respectivo âmbito tomada em plenário, estará necessariamente sujeita à respectiva impugnação, com fundamento no vício de que enfermará a convocatória que lhe está subjacente, impugnação essa a exercer nos termos e ao abrigo do disposto no art 1433º do CC.

Atente-se que na convocatória, o art. 1432º, nº 1, do Código Civil não prevê como requisito a assinatura da convocatória, exigindo apenas que seja feita “por meio de carta registada, com dez dias de antecedência, ou mediante aviso convocatório feito com a mesma antecedência, desde que haja recibo de recepção assinado pelos condóminos”. No que respeita ao conteúdo da convocatória, verifica-se que o regime é semelhante, exigindo-se apenas que indique o dia, hora, local e ordem de trabalhos da reunião (cfr. art. 1432º, nº 2, do CC).

No entanto, se se vier a verificar que a assembleia não foi convocada pelo número de subscritores exigido, um condómino não convocado, ou que não se considere convocado por a convocatória se ter irregular, não pode nem deve comparecer (ou fazer-se representar) e exercer os seus direitos de participação/representação na assembleia, sem que estes seus actos tenham como consequência a sanação imediata de qualquer irregularidade que enferme a convocatória e que queira mais tarde invocar (neste mesmo sentido, Ac. RL de 20/3/2013).

Nesta conformidade, se a convocatória não estiver feita por um número de condóminos, que representem, pelo menos, um quarto do valor total do prédio, qualquer condómino que não tenha sido convocado, ou tendo-o sido, não comparece em plenário, pode aquele impugnar as deliberações aprovadas por enfermarem aquelas de vício. No entanto, se esse condómino decidir comparecer na assembleia, a sua presença, ainda que se retire momentos depois, provocará o saneamento da irregularidade.

Repare-se que marcando presença, o condómino não só se considera convocado, por comparecer (podendo ou não assinar a lista de presenças), bem como usar do seu direito de palavra (i.e. participação) em assembleia, ainda que para declarar as razões porque entende não dever participar, a justificação do seu abandono àquele acto e a pretensão de impugnar.
 
Destas sortes, se a convocatória estiver subscrita, apenas por um, ou por alguns dos convocadores, tal não é motivo bastante para se impugnar as deliberações. Coisa diversa resultará se a assembleia geral extraordinária se tiver convocada por um grupo de condóminos que representem um numero inferior a um quarto do valor total do prédio. Neste caso, só os condóminos que não compareçam na dita assembleia, podem impugná-la nos termos da lei.

Quórum constitutivo e deliberativo


Se à primeira convocação estiverem presentes e/ou representados por competente procurador em plenário os condóminos representativos da maioria do capital investido, é assim que se seguirão os correspondentes termos até final, não se interrompendo e convocando a assembleia em segunda convocatória pelo facto de algum ou alguns dos condóminos inicialmente presentes posteriormente se ausentarem, ficando o plenário com menos de metade dos condóminos.

Há quem defenda que as deliberações tomadas em assembleia iniciada em primeira convocatória sempre se regerão e até ao final pelo vertido no art. 1432º, nº 3 do CC, isto é, só podem ser tomadas por maioria dos votos representativos do capital investido e não do capital presente, porém, esta ideia não colhe.
 
No entanto, se em segunda convocação estiverem presentes e/ou representados por competente procurador os condóminos representativos de pelo menos, um quarto do valor total do prédio, é assim que se seguirão os correspondentes termos até final, interrompendo-se os trabalhos se algum ou alguns dos condóminos inicialmente presentes posteriormente se ausentarem, ficando o plenário com menos de 25% do capital investido. 

Este entendimento estriba-se no que dimana do nº 4 do art. 1432º do CC: "se não comparecer o número de condóminos suficiente para se obter vencimento e na convocatória não tiver sido desde logo fixada outra data, considera-se convocada nova reunião para uma semana depois, na mesma hora e local, podendo neste caso a assembleia deliberar por maioria de votos dos condóminos presentes, desde que estes representem, pelo menos, um quarto do valor total do prédio".
 
Atente-se que o legislador, na parte final do nº 4, permite que se delibere em segunda convocação, com um número de votos que represente, pelo menos, 25% do capital investido, sendo portanto, este o quórum deliberativo mínimo para todas as deliberações que careçam de aprovação por maioria simples (as deliberações que careçam de maiorias qualificadas, terão que ser sempre aprovadas  pelo número de votos exigidos). Salvo melhor opinião, é esta a tese que melhor se coaduna com uma interpretação histórico-actualista, sistemática e teleológica (racional), onde se presume que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr. art. 9º, nº s 1 e 3) do CC.
 
De salientar que, se em qualquer momento deixar de haver, em definitivo, quórum deliberativo, deve o Presidente da Mesa da Assembleia Geral dar por encerrados os trabalhos, lavrando seguidamente a competente acta. Importa contudo sublinhar que, se durante o plenário, um condómino se ausentar momentaneamente, tal não implica o encerramento da sessão, mas antes a interrupção da deliberação que estiver em curso.
 
Destas sortes, perante a impossibilidade de se deliberar por falta de quórum deliberativo, nada invalida que o administrador (cfr. al. a) do art. 1436º), de condóminos que representem 25% do capital investido (cfr. art. 1431º, nº 2 do CC) ou por um condómino recorrente dos actos do administrador (cfr. art. 1438º do CC), proceda à convocatória de uma nova assembleia geral extraordinária, nos termos dos nºs 1 a 4 do art. 1432º do CC.

1/18/2022

A excepção de não cumprimento


É consabido que o cumprimento do pagamento das comparticipações havidas orçadas e aprovadas em sede plenária para suportar as despesas de fruição, conservação e serviços de interesse comum, são a obrigação primeira dos condóminos, sob pena de, incorrendo no não cumprimento, se sujeitarem às sanções previstas no Regulamento do condomínio ou na lei aplicável.

No entanto porém, existem excepções à regra, isto é, existem algumas (poucas) situações nas quais, os condóminos podem furtar-se à obrigação do cumprimento, sem com isso, incorrerem em incumprimento e nas sanções previstas para o mesmo, como por exemplo, no caso replicado infra, do Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 3/11/2016, que ensina:

"A excepção de não cumprimento do contrato (cfr. art. 428º do CC) é aplicável, não apenas aos contratos bilaterais, mas as todos os casos em que, por força da lei, se crie entre as partes uma situação análoga, o que nomeadamente sucederá perante obrigações proper rem, como a obrigação do condómino participar nas despesas de conservação e fruição das partes comuns do edifício (uma vez que o sinalagma que é fundamento do funcionamento da exceptio tem mais relação com o aspecto funcional do que com o aspecto genético das obrigações em causa).

Nesta conformidade, não actua em abuso de direito (cfr. art. 334º do CC), por exemplo, um condómino que se recuse o pagamento de prestações de condomínio (v.g. quotas mensais) reportadas a um determinado período de meses ou anos, enquanto o condomínio, não efectuar obras de impermeabilização da cobertura do edifício, por forma a fazer cessar as infiltrações, humidades e escorrências que, desde esse mesmo período de incumprimento, impedem a utilização conveniente da sua fracção autónoma".

Nesta conformidade, lê-se, a propósito, no art. 428º, nº 1 do CC que, «se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo», logo, o funcionamento da exceptio non adimpleti contractus a que se refere este artigo pressupõe a existência de um contrato com prestações correspectivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra (o que se verifica nos chamados contratos bilaterais ou sinalagmáticos).

Por outras palavras, mercê da sua própria natureza, esta excepção é aplicável apenas aos contratos bilaterais com obrigações reciprocamente interligadas por um sinalagma genético-funcional, já que só aí o contraente fiel pode sustar o cumprimento da sua prestação como meio idóneo de coagir a contraparte a cumprir também a sua prestação sinalagmática. Mas pressupõe igualmente que não estejam fixados prazos diferentes para as prestações, já que, devendo uma delas ser cumprida antes da outra, a exceptio não teria razão de ser.

Contudo, «a fórmula legal “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimentos das prestações” não é inteiramente rigorosa, pois o que a excepção supõe é que um dos contraentes não esteja obrigado, pela lei ou pelo contrato, a cumprir a sua obrigação antes do outro: se não estiver, pode ele, sendo-lhe exigida a prestação, recusá-la, enquanto não for efectuada a contraprestação ou lhe não for oferecido o cumprimento simultâneo desta. Por conseguinte, a excepção pode ser oposta ainda que haja vencimentos diferentes, dado poder sê-lo pelo contraente cuja prestação deva ser feita depois da do outro contraente, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro» (cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 105, pag. 283, e ano 108, pag. 155).

Vem-se, ainda, precisando que, sendo os contratos bilaterais o âmbito natural da excepção de não cumprimento, a mesma poder-se-á ainda aplicar a outras situações em que se esteja perante obrigações que se justifiquem reciprocamente, não necessariamente por um sinalagma genético (em que a correspectividade se refere ao momento constitutivo, não podendo uma obrigação surgir sem a outra), mas sim por um sinalagma funcional (em que a correspectividade se refere a obrigações já constituídas, significando que elas se vão desenvolver solidariamente).

Será precisamente esse o caso das obrigações reais ou propter rem, isto é, das obrigações a que o respectivo titular está vinculado, não por via de um contrato, mas por ser titular de um determinado direito real, que não deixam por isso de consubstanciar verdadeiras relações obrigacionais (cfr. Rui Pinto Duarte, Curso de Direitos Reais, pag. 21).

Com efeito, «o entendimento de que as obrigações “propter rem” fazem parte do conteúdo do “ius in re” não significa que, por esse motivo, elas devam ser qualificadas como relações de natureza real, ou de natureza mista, ou como figuras de fronteira entre os “iura in re” e as obrigações. Estruturalmente, é de verdadeiras obrigações que se trata, ou seja, de vínculos jurídicos por virtude dos quais uma pessoa, na qualidade de titular de um direito real, fica adstrita a realizar uma prestação em benefício de outra» (cfr. M. Henrique Mesquita, Obrigações Reais e Ónus Reais, pag. 102 e 103).

Logo, apesar da letra do art. 428º do CC e da sua inserção na disciplina dos contratos, poder inculcar o contrário, definindo o art. 397º do mesmo diploma a obrigação sem fazer qualquer menção à sua origem, admite-se que a excepção de não cumprimento seja aplicável às obrigações propter rem, uma vez que o sinalagma que é fundamento do funcionamento da exceptio tem mais relação com o aspecto funcional do que com o aspecto genético das obrigações em causa, isto é, mais com a reciprocidade das obrigações do que com a sua origem (cfr. Ac. da RL, de 08.05.2008, Pedro Lima Gonçalves, Processo nº 1824/2008-8. No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406, Almeida Costa, RLJ, ano 119, p. 143, e Menezes Cordeiro, Da Boa Fé no Direito Civil, Vol. II, p. 847. Na jurisprudência, e em sede da obrigação do condómino concorrer para os encargos de conservação e fruição de partes comuns de um edifício, verdadeira obrigação propter rem, Ac. da RP, de 01.04.1993, CJ, Ano 1993, Tomo II, p. 201, e Ac. da RL, de 09.05.1996, CJ, Ano 1996, Tomo III, p. 87).

Desta forma, pode «dizer-se, de um modo geral, que a “exceptio” tem ainda aplicação nos casos em que, por força da própria lei, embora contra a vontade das partes, se cria entre elas uma situação análoga à proveniente de um contrato bilateral» (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 1979, pag. 271, nota 3). Dir-se-á assim, agora com maior rigor, que a excepção peremptória de não cumprimento do contrato é uma excepção de direito material, que se destina a permitir que o contraente fiel não cumpra enquanto o contraente faltoso não cumprir também. Não legítima, por isso, o incumprimento definitivo do contrato pelo contraente fiel, mas apenas o cumprimento dilatório do contraente fiel como forma de coagir o contraente faltoso a cumprir também aquilo que tem que cumprir. Pressupõe, por isso, que o cumprimento das obrigações interconexionadas ou seja simultâneo, ou que a obrigação do excipiente deva ser cumprida em último lugar já que então - à data do respectivo adimplemento - ele sabe se a contraparte cumpriu, ou não a prestação, a que está vinculada (cfr. Ac. do STJ, de 18.02.2003, Azevedo Ramos, CJ AcSTJ, Ano 2003, Tomo I, p. 103-106; e Ac. do STJ, de 18.11.2004, Borges Soeiro, in www.dgsi.pt).

Logo, «a exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral. Por isso ela vigora, não só quando a outra parte não efectua a sua prestação por que não quer, mas também quando ela a não realiza ou a não oferece porque não pode» (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406). 

Compreende-se, assim, que se afirme que «a excepção do contrato não cumprido não pressupõe a culpa do devedor da contraprestação no seu atraso. A inexecução por parte deste pode ser-lhe imputável ou não, isto é, tanto pode ele constituir-se em mora como não. Ainda que o incumprimento não lhe seja imputável, antes obedeça a circunstâncias fortuitas, independentes da vontade, a excepção é invocável pelo outro contraente» (cfr. João José Abrantes, A excepção de não cumprimento do contrato no Direito Civil, p. 88).

Também no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso é comummente aceite pela doutrina o recurso à exeptio non rite adimpleti contractus: a mesma «vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227º e 762º, nº 2», ambos do C.C. (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406).

Com efeito, a doutrina e a jurisprudência têm realçado que, no aferir da legitimidade da invocação da excepção de não cumprimento do contrato, importa ponderar: a regra da boa fé; e a verificação da proporcionalidade (ou do equilíbrio) entre as prestações. É que, por um lado, «seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo»; e, por outro, «na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quando se torne necessário para garantir o seu direito» (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, «Anotação ao Ac, do STJ, de 11 de Novembro de 1984», RLJ, ano 119, 1986/1987, p. 144).

Assente, e face à sua invocação, o contraente a quem é oposta a excepção do não cumprimento tem de provar que cumpriu a sua prestação para obviar aos respectivos efeitos substantivos (cfr. Ac. do STJ, de 24.06.1999, Noronha do Nascimento, CJ AcSTJ, Ano 1999, Tomo II, p. 163, com bold apócrifo). Deverá por isso, para obstar ao seu válido exercício, oferecer o cumprimento simultâneo, em termos completos e rigorosos.

Por fim, a excepção de não cumprimento do contrato tem de ser invocada pela parte que se pretende valer da mesma, de forma expressa ou tácita, não podendo ser conhecida oficiosamente pelo juiz (cfr. Calvão da Silva, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, p. 334). A sua invocação tácita terá de resultar de factos alegados pelo excipiente que inequivocamente a exprimam (cfr. Ac. da RC, de 08.06.93, Francisco Lourenço, CJ, Ano 1993, p. 55; e Ac. da RG, de 09.04.2003, Arnaldo Silva, CJ, Ano 2003, Tomo II, p. 281).


1/15/2022

O cumprimento das obrigações

Conforme refere o art. 762° nº 1 CC, o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que esta vinculado. Resulta assim pacífico afirmar-se que o cumprimento pode ser definido como a realização da prestação devida, pelo que, com a satisfação do interesse do credor, extingue-se a obrigação, com a consequente libertação do devedor. 
 
Ora o regime do cumprimento das obrigações obedece principalmente a três princípios gerais que têm referência na lei: 
  • o princípio da pontualidade;
  • o princípio da integralidade; e
  • o princípio da concretização e da boa fé.
O princípio da pontualidade
 
O princípio da pontualidade encontra-se consagrado no art. 406° nº 1 CC, que estipula que o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (sobre o princípio da pontualidade no âmbito de um contrato promessa cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/01/2005, Processo n° 04B4389, in: http://www.dgsi.pt)
 
Deste princípio resulta a proibição de qualquer alteração à prestação devida. O devedor tem o dever de prestar a coisa ou o facto exactamente nos mesmos termos em que se vinculou, não podendo o credor ser constrangido a receber do devedor coisa ou serviço diferente, mesmo que possuam um valor monetário superior à prestação devida.
 
Excepto se o credor aceitar coisa ou serviço diferente extingue-se a obrigação, situação jurídica denominada por dação em cumprimento. Neste concreto, o cumprimento produz sempre em relação ao credor a extinção do seu crédito, como contrapartida da prestação recebida. Normalmente o cumprimento produz igualmente em relação ao devedor a libertação da sua obrigação, tendo eficácia extintiva da obrigação a que respeita. No entanto, em certos casos o cumprimento pode desencadear a sub-rogação do crédito (cfr. art. 589° e ss. CC), caso em que crédito não se extingue, antes se transmite para o terceiro que realiza a obrigação, ficando o devedor vinculado perante este.
 
Do princípio da pontualidade resulta também a irrelevância da situação económica do devedor, não podendo o devedor, com esse fundamento, solicitar a redução da sua prestação ou a obtenção de outro benefício. Dos art. 601° e 604° do CC consta que mesmo em caso de insuficiência, o património do devedor continua a responder integralmente pelas dívidas assumidas, apenas se excluindo da penhora certos bens que se destinam à satisfação de necessidades imprescindíveis (cfr art. 822° e 823° CPC).
 
Somente em certo tipo de obrigações periódicas pode haver uma alteração do montante fixado tomando em consideração a situação económica do devedor (cfr. art. 2004° e 2012° do CC (obrigações de alimentos) e o art. 567° do CC (indemnização em renda))
 
O princípio da integralidade
 
O princípio da integralidade encontra-se expresso no art. 763° nº 1 do CC e significa que o devedor deve realizar a prestação de uma só vez, ainda que se trate de prestação divisível. Se o devedor oferecer apenas uma parte da prestação, o credor pode recusar o seu recebimento sem incorrer em mora ("Quem nessa situação incorre em mora é o devedor", cfr. Bastos, Notas, volume III, pág. 216.)
 
A lei admite, aliás, que o credor decida exigir apenas uma parte da prestação, esclarecendo, que tal não impede o devedor de oferecer a prestação por inteiro (cfr. art. 763 nº 2 do CC). A regra geral é que só pode haver uma prestação em partes no caso de um acordo entre os contraentes nesse sentido. É o que ocorre nas obrigações fraccionadas (cfr. arti. 781° do CC) (O inadimplemento do devedor, quebrando a relação de confiança em que assenta o plano de pagamento escalonado no tempo, justifica a perda do benefício do prazo quanto a todas as prestações previstas para o futuro, cfr. neste âmbito o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/2006, Processo n.º 05A3869, in: http://www.dgsi.pt), como a venda a prestações prevista no art. 934° do CC. 
 
Mas existem algumas excepções: 
 
O credor terá que aceitar o pagamento parcial no caso da imputação do cumprimento prevista no art. 784° nº 2 do CC, no caso de pluralidade de fiadores, que gozem do benefício da divisão (cfr. art. 649° do CC) e ainda quando exista compensação com divida de menor montante (cfr. art. 847° nº 2 do CC). Finalmente, poderá haver lugar ao pagamento parcial quando tal situação resulta dos usos ou da boa fé. 
 
Se por exemplo, o montante devido consiste em € 1000 e o devedor prestar € 998, é controvertido na doutrina se a recusa do recebimento pelo credor origina um comportamento contrário à boa fé (neste sentido alguns autores portugueses e alemães, cfr. art. 762° nº 2 do CC e § 242 BGB: "Der Schuldner ist verpflichtet, die Leistung so zu bewirken, wie Treu und Glauben mit Rücksicht auf die Verkehrssitte es erfordern"). 
 
Trata-se de situações que têm de ser apreciadas caso a caso (cfr. Neto, Código Civil anotado, pág. 578-579).
 
Os princípios da boa fé e da concretização
 
Como já foi assinalado, o princípio da boa fé encontra-se referido no artigo 762° nº 2 do CC (§ 242 BGB). Desta norma resulta que para se considerar verificado o cumprimento da obrigação não basta a realização da prestação devida em termos formais, sendo antes necessário o respeito dos ditames da boa fé, quer por parte de quem executa, quer por parte de quem exige a obrigação. 
 
Fazem parte destes deveres o dever de protecção, informação e lealdade, podendo-se ainda mencionar a concretização como princípio do regime do cumprimento das obrigações. 
 
O princípio da concretização significa que a vinculação do devedor deve ser concretizada numa conduta real e efectiva. 
 
A lei prevê vários pressupostos para o cumprimento efectivo: capacidades das partes, disponibilidade das coisas dadas em prestação, legitimidade, lugar e tempo do cumprimento. 
 
Para que o cumprimento da obrigação possa efectivamente ocorrer haverá que respeitar toda a disciplina específica que regula o seu modo de realização. 
 
Capacidade para o cumprimento 
 
Do art. 764° do CC consta que não é exigido a capacidade do devedor, a menos que a própria prestação consista num acto de disposição. A capacidade do devedor é exigida se a prestação consistir num acto de disposição, como sucede sempre que o cumprimento implique a celebração de um novo negócio jurídico (como na hipótese da realização do contrato de escritura prometido em relação ao contrato de promessa de compra e venda), ou dele resulte directamente a alienação ou oneração do património do devedor. A lei protege o incapaz. 
 
Quando consiste num acto de disposição, o cumprimento não esta ao alcance do incapaz, devendo antes ser realizado pelo seu representante legal. Quando para a prestação se exija a capacidade do autor do cumprimento e este não a possua o cumprimento da obrigação pode ser anulado nos termos gerais (cfr. art. 125° e 139° do CC). 
 
Quando o cumprimento é realizado pelo devedor, o credor pode, porém, paralisar esse pedido através de uma excepção, demonstrando que o devedor não teve prejuízo com o cumprimento (cfr. art. 764 nº 1, 2ª parte CC). O credor tem de ter capacidade para receber a prestação. Se a prestação for realizada por um incapaz, o seu representante legal poderá solicitar a sua anulação e a realização de uma nova prestação pelo devedor. 

Legitimidade para o cumprimento

Em relação ao autor do cumprimento, a lei generaliza o princípio da legitimidade activa, atribuindo-a a todas as pessoas, quer estas tenham interesse directo no cumprimento da obrigação, quer não (cfr. art. 767° nº 1 do CC). Assim, a prestação pode ser realizada por terceiro, sem que o credor se possa opor. O terceiro só não terá legitimidade para cumprir se a prestação tiver carácter infungível, por natureza ou por convenção das partes (cfr. art. 767° nº 2 do CC), caso em que o credor não poderá ser constrangido a receber de terceiro a prestação, poden-do recusa-la e exigir que o cumprimento seja realizado pessoalmente pelo devedor. 
 
Se o terceiro tiver legitimidade para o cumprimento, o credor não pode recu-sar a prestação por ele oferecida, e se o fizer incorre em mora perante o devedor como se tivesse recusado a prestação deste (cfr. art. 768° n.º 1 e 813° do CC). A lei apenas admite a recusa por parte do credor se o devedor se opuser ao cumprimen-to, desde que o terceiro não tenha interesse directo na satisfação do crédito, por ter garantido a obrigação ou por qualquer outra causa (cfr. art. 768° nº 2 e 592° do CC). 
 
Se o terceiro for directamente interessado, o credor não pode recusar o cumprimento por este, mesmo com a oposição do devedor, dado que esta situação envolveria prejuízo para o terceiro. No entanto, a simples oposição do devedor ao cumprimento nunca obsta a que o credor aceite validamente a prestação do terceiro (cfr. art. 768° nº 2 do CC). A regra geral é, portanto, que o cumprimento por terceiro provoca a extinção da obrigação.
 
Legitimidade passiva

Quanto à legitimidade para receber a prestação, o art. 769° do CC estabelece que a prestação deve ser efectuada ao credor ou ao seu representante. Todas as outras pessoas são consideradas terceiros, pelo que a prestação que a estes for realizada não importará em princípio a extinção da obrigação, podendo o devedor ser condenado a realizá-la novamente (cfr. art. 770° do CC em conexão o art. 476° nº 2 do CC). 
 
No entanto, importa ressalvar que, se a prestação for realizada a terceiro, a obrigação não se extingue, podendo o autor da prestação exigir a sua restituição com fundamento no enriquecimento por prestação.
 
Existem, porém, alguns casos em que se verifica a extinção da obrigação com a sua recepção por terceiro (cfr. art. 770° do CC). São estas: (i) se tal tiver sido estipulado ou consentido pelo credor (al. a)); (ii) se o terceiro vier a adquirir legitimidade superveniente para a sua recepção, o que acontece se o credor ratificar o cumprimento (al. b)); (iii) Se vier a ocorrer posteriormente a junção na mesma pessoa das qualidades de credor da prestação e devedor da sua restituição, o que acontece se o terceiro adquirir posteriormente o crédito (al. c)), ou o credor for herdeiro de quem recebeu a prestação, por cujas obrigações responde (al. e)); (iv) se o credor não tiver interesse em novo cumprimento da obrigação, o que acontece ele vier a aproveitar-se do cumprimento (al. d)) e, finalmente, (v) se a lei considerar, por outro motivo, liberatória a prestação feita a terceiro (al. f)) 

Tempo do cumprimento

A doutrina portuguesa (e também a jurisprudência) distinguem entre dois momentos distintos: o momento em que o devedor pode cumprir a obrigação, forçando o credor a receber a prestação, sob pena de o credor entrar em mora, e o momento em que o credor pode exigir do devedor a realização da prestação, sob pena de o devedor entrar em mora. 
 
Os art. 777° e ss. do CC determinam tanto a pagabilidade como o vencimento da divida. Distinguem-se as obrigações puras das obrigações em prazo. As obrigações puras são aquelas cujo cumprimento pode ser exigido ou realizado a todo o tempo. As obrigações a prazo são aquelas em que a exigibilidade do cumprimento ou a possibilidade da sua realização é diferida para um momento posterior. A regra geral é a de as obrigações não terem prazo certo estipulado, sendo, portanto, obrigações puras. Neste caso o credor tem o direito de exigir a todo o tem-po o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode a todo o tempo exonerar-se dela (cfr. art. 777° nº 1 do CC). 
 
Neste caso o devedor apenas entra em mora com a exigência do cumprimento pelo credor, nos termos do art. 805° nº 1 do CC. Pode, porém, acontecer que as partes ou a lei tenham estabelecido um prazo de cumprimento (cfr. art. 777° n. 1 proémio). Nesse caso, está-se perante obrigações com prazo certo, as quais se caracterizam por o decurso do prazo constituir o deve-dor em mora (cfr. art. 805° nº 2 al. a) do CC).
 
A possibilidade de a prestação ser realizada ou exigida em momento posterior constitui um benefício. Pergunta-se a quem compete o benefício do prazo. Nos ter-mos do art. 779° do CC a regra é a de que o benefício compete em princípio ao devedor. Isto significa que o credor não pode exigir a prestação antes do fim do prazo, mas o devedor tem o direito de proceder à sua realização a todo o tempo, renunciando ao benefício do prazo.

Lugar do cumprimento

Veremos agora onde deve ser realizada a prestação. É usual estabelecer no direito português, a propósito do lugar do cumprimento, uma distinção entre as obrigações de colocação, obrigações de entrega e obrigações de envio.
 
Na parte que nos aproveita, aplica-se apenas a segunda obrigação. Nas obrigações de entrega, o devedor tem efectivamente que entregar a coisa ao credor no domicílio deste, ou no lugar com este acordado (tratando-se de uma empresa de administração de condomínios, será no seu escritório). Neste caso a prestação só se considera adequadamente realizada se chega ao domicílio do credor dentro do prazo acordado, havendo mora do devedor no caso contrário (cfr. art. 804° do CC).
 
Prova do cumprimento
 
A prova do cumprimento compete em princípio ao devedor, uma vez que o cumprimento constitui um facto extintivo do direito do credor que deve ser demonstrado pela parte contra quem o crédito é invocado (cfr. art. 342° nº 2 do CC).
 
Atente-se que, no âmbito, por exemplo, de um contrato de compra e venda, uma vez provada a celebração de compra e venda, em acção movida pelo vendedor ao comprador, fundada no contrato, visando a condenação do segundo no pagamento do preço, incumbe ao réu o ónus da prova do cumprimento desta obrigação legal (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/11/2003, Processo n.º 02B3469, in: http://www.dgsi.pt)
 
No entanto o cumprimento não pode ser provado por testemunhas (cfr. art. 395° do CC), pelo que o modo mais adequado de proceder a essa prova consiste em o autor do cumprimento exigir do credor uma declaração escrita de que recebeu a prestação em dívida. A essa declaração dá-se o nome de quitação, uma quitação que através dela o credor exprime que o devedor se encontra quite para com ele (cfr. Pires de Lima/Antunes Varela, CC anotado, volume II, pág. 34). Quando a quitação consta de um documento avulso, costuma dar-se a esse documento o nome de recibo. 
 
A quitação é um direito atribuído por lei a qualquer pessoa que cumpre a obrigação, devendo a quitação constar de documento autêntico ou autenticado ou ser provido de reconhecimento notarial se aquele que cumpriu tiver nisso interesse legítimo (cfr. art. 787° nº 1 Cdo C). Pode-se assim exigir sempre do credor um recibo e, caso este não se disponha a passá-lo, o cumprimento pode legitimamente ser recusado (cfr. art. 787 nº 2 do CC). O recibo pode igualmente ser exigido mesmo depois de a prestação já ter sido efectuada (cfr. art. 787 nº 2 do CC).