Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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16 junho 2025

ACTRP 10-1-13: Dividas presentes e futuras


Tribunal: TRP
Processo: 7855/11.1TBMAI.P1
Relatora: Teresa Santos
Sessão: 10 Janeiro 2013

Descritores:
  • Título executivo
  • Execução
  • Coligação passiva
  • Propriedade horizontal
Sumário:

I - As actas das reuniões das assembleias de condóminos constituem títulos executivos quando deliberem sobre o montante de contribuições devidas ao condomínio, já apuradas ou futuras, desde que sejam certas, líquidas e exigíveis.
II - O condomínio pode demandar, na mesma execução, vários condóminos que se encontrem em incumprimento.

Texto integral: vide aqui

03 junho 2025

Interrupção prescrições


Nos termos do art. 323º, nº 1, do CC, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial, de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o Tribunal seja incompetente.

Se a citação ou notificação se não fizer dentro de 5 dias depois de requerida, por causa não imputável ao requerente, a prescrição tem-se por interrompida logo que decorram os 5 dias (cfr. art. 323º, nº 2, do CC).

À citação ou notificação é equiparado qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento acto àquele contra quem o direito pode ser exercido (cfr. art. 323º, nº 4, do CC).

A prescrição será ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, feito perante o respectivo titular, por aquele contra quem o direito pode ser exercido (cfr. art. 325º, nº 1, do CC).

Nos termos do art. 325º, nº 2, do CC, “o reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam”.

Conforme resulta do disposto no art. 326º do CC, a interrupção é o efeito produzido por determinado facto que destrói e inutiliza um prazo em curso, determinando que o mesmo volte a correr de novo e por inteiro.

Importa desde logo salientar que a interrupção da prescrição distingue-se da suspensão da prescrição. A suspensão determina uma “paragem” no decurso do prazo que, quando cessa, retoma o seu curso, no exacto momento em que ocorreu, permitindo o aproveitamento do prazo anterior que tenha decorrido antes da suspensão. Já “a interrupção inutiliza todo o prazo anterior, obrigando a uma nova contagem a partir do zero” (assim, Menezes Cordeiro; Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo IV, Almedina, 2005, p. 195).

Numa determinada acção, entendeu o apelante – convocando os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de Guimarães e do Porto que para tanto, mencionou - que, tendo desencadeado a respectiva acção executiva para pagamento de quantia certa que, nos termos do art. 550º, nº 2, do CPC, segue a forma sumária – e em que a penhora precede a citação – a interrupção do prazo prescricional não se dava com a citação, nos termos do nº 1 do art. 323º do CC, mas sim, nos termos do nº 2 do mesmo preceito, ocorrendo a interrupção 5 dias após a instauração da acção executiva.

Dimana do Ac. do TRP de 27-05-2014 (Pº 4393/11.6TBVLG-A.P1, rel. VIEIRA E CUNHA) que: “Na exegese do disposto no artº 323º nº2 CCiv, entende-se que as razões de índole processual ou de organização judiciária irrelevam para a imputação de responsabilidade no atraso da citação ao requerente; tal é o caso de a citação se ver delongada pela necessária precedência da penhora."

E, na fundamentação deste aresto expendeu-se que:

Nos termos do art.º 323º nº2 CCiv, se a citação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias. Ou seja: só se atende ao momento da citação se a culpa da demora superior a cinco dias for de atribuir ao requerente (Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, Anotado, I – 3ª ed., pg. 289) – quaisquer outros factores, designadamente que sejam de imputar aos necessários trâmites processuais, não relevam para um juízo de responsabilidade do requerente no facto de a citação não ser feita em cinco dias.

A petição deu entrada em juízo 3 meses antes do termo final do prazo de prescrição (5 anos a contar de 23/3/07) – a citação foi antecedida de penhora, mas a demora do referido trâmite processual irreleva para um juízo de responsabilidade do requerente da citação. Ou seja, como se pronunciou o Ac. STJ, rel. César Marques, as razões de índole processual ou de organização judiciária irrelevam para a imputação de responsabilidade no atraso da citação ao requerente. Tal é o caso, por exemplo, de a citação se ver delongada pela necessária precedência da penhora – cf., nesse sentido, Ac.R.L. 13/1/09, pº 9584/2008-1, rel. Rijo Ferreira. 

E assim se conclui, apodicticamente, que, mesmo considerando o prazo de prescrição de cinco anos, a interrupção da prescrição, por aplicação do disposto no art.º 323º nºs 1 e 2 CC, se verificara já em momento anterior ao da efectiva citação dos Oponentes e sem que se mostrasse decorrido o citado prazo de prescrição do direito”.

Nesta mesma linha, se posicionaram, entre outras, as seguintes decisões:

- Ac. do TRG de 22-11-2018 (Pº 2504/13.6TJVNF-A.G1, rel. MARGARIDA FERNANDES): “Numa acção executiva, em que a penhora precede a citação, com pluralidade de executados, não é imputável ao exequente a citação pelo agente de execução dos executados embargantes quase três anos após a entrada da mesma ainda que a primeira penhora tenha ocorrido cerca de dois meses após esta data”;

- Ac. do TRL de 03-03-2020 (Pº 2747/08.4TBOER-C.L1-7, rel. LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA): “A ação executiva foi intentada em 24.4.2008 pelo que ocorreu a interrupção da prescrição no quinto dia subsequente à instauração da execução porquanto, de acordo com a lei aplicável então e com a factualidade provada, não ocorreu qualquer conduta processual da exequente que tenha determinado o atraso na citação da embargante/executada. A citação da executada para além de três anos sobre a data de vencimento da livrança deveu-se a razões de natureza processual atinentes ao regime da ação executiva, em que a penhora precede a citação, não havendo que imputar tal demora à exequente. A interpretação referida em I, decorrente dos Artigos 323º, nº2 e 327º, nº1, do Código Civil, não viola os princípios da confiança e da segurança jurídica porquanto trata-se de solução normativa estabilizada desde a entrada em vigor do Código Civil, a qual não sofreu alteração legislativa nem é objeto de dissídio jurisprudencial, sendo que do atraso na realização da citação, por via do regime próprio da ação executiva, não pode derivar uma expectativa legítima do executado de que já não terá de arcar com a sua responsabilidade patrimonial”;

- Ac. do TRG de 18-03-2021 (Pº 259/14.6TBBRG-B.G1, rel. ALEXANDRA MARIA VIANA PARENTE LOPES): “1. Aplica-se o regime de interrupção da prescrição do nº2 do art.323º do C. Civil às ações executivas para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo sumária, prevista nos atuais arts.550º/2-a) a d) e arts.855º ss do C. P. Civil de 2013, aprovado pela Lei nº41/2013, de 26.06.
1.1. O regime da interrupção da prescrição promovida pelo titular do direito, regulada no art.323º do C. Civil, na versão introduzida pelo DL nº47244, de 25.11.1966, aplicável a qualquer processo judicial nos termos do seu nº1, acautela, sobretudo, a inércia do titular, uma vez que, se as previsões dos seus nº1 e nº4 compatibilizam o direito geral do credor exigir o seu direito ao obrigado (acompanhado do dever de o fazer, para a interrupção do prazo de prescrição, através de ato judicial que, direta ou indiretamente, exprima a sua intenção de o exercer e antes de terminado o prazo de prescrição de que o obrigado beneficia) e do direito geral do devedor conhecer que aquele lhe exige o cumprimento da sua obrigação, as previsões do nº2 e do nº3 valorizam a iniciativa judicial do credor, em detrimento do conhecimento efetivo ou do conhecimento perfeito pelo devedor do direito contra si exercido, para efeitos da operância dos efeitos interruptivos, quando não é possível compatibilizar o exercício do direito e o conhecimento em 5 dias ou quando a citação ou a notificação são anuladas.
1.2. Desde a aprovação do regime do art.323º do C. Civil de 1966 encontram-se em vigor regimes processuais civis em que a citação não corresponde ao primeiro ato do processo (quer na redação inicial do Código de Processo Civil de 1961, aprovado pelo Decreto -Lei nº44129, de 28.12.1961, quer nas suas revisões posteriores e na redação do atual Código de Processo Civil de 2013, aprovado pela Lei nº41/2013, de 26.06, em que se alargaram os processos sem citação prévia), sem que estas ações tenham sido excluídas da operância dos efeitos ope legis do art.323º/2 do C. Civil, na redação inicial ou em alteração posterior.
2. Não é imputável ao credor, objetiva ou subjetivamente, de forma a afastar a aplicação do nº 2 do art.º 323º do C. Civil:
a) A organização judiciária e a existência de uma forma do processo em que a citação seja posterior à penhora; os erros ou as faltas de operadores judiciários (nomeadamente, a falta de cumprimento pelo agente de execução das notificações do art.750º/1, ex vi do 855º/4 do C. P. Civil).
b) As omissões pelo exequente, aquando e após instaurar ação executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo sumária: da nomeação dos bens à penhora no seu requerimento executivo inicial, uma vez que a previsão do art.724º/1-i) do C. P. Civil não é obrigatória; de pedir a citação urgente do executado, nos termos do art.561º do C. P. Civil, ex vi do art.551º/1 do C.P. Civil, quer na data da propositura da ação de 08.02.2014 (em que faltava um prazo superior a 2 anos e 10 meses para a obrigação cambiária prescrever, nos termos do art.º 70º, ex vi do art.77º da LULL), quer após a interrupção do prazo prescricional, nos termos do art.323º/2 do C. Civil; de pedir a notificação do art.855º/4, em referência ao art.750º/1 do C. C. Civil, de competência do agente de execução, quando este omitiu esse cumprimento, sem notificação do exequente do estado do processo.
3. Depois da interrupção do prazo prescricional numa ação executiva para pagamento de quantia certa, nos termos do nº2 do art.323º do C. Civil, operam os efeitos dos arts.326º e 327º do C. Civil, por se tratar de uma interrupção ocorrida num processo judicial que exige decisão final (…)”;

Ac. do TRL de 08-02-2022 (Pº 10858/16.6T8LRS-A.L1-7, rel. DINA MONTEIRO): “Nas ações executivas que têm como título executivo uma livrança em branco e que, atento o seu valor, seguem a forma sumária, não há lugar à citação prévia, devendo o requerimento executivo ser desde logo enviado ao Senhor Agente de Execução, como decorre do disposto nos artigos 855.º/ss do CPC Revisto. Nestes casos, em que o valor da ação condiciona o formalismo processual seguido, tem-se entendido que os prazos de prescrição que se encontrassem a correr termos, sempre ficariam suspensos cinco dias após a data da entrada da ação em Tribunal, em paralelismo com a interrupção que se verifica quando a ação se inicia pela citação”;

- Ac. do TRP de 07-03-2022 (Pº 16711/05.1YYPRT-A.P1, rel. FÁTIMA ANDRADE): “Conforme é entendimento consensual, interposta execução em que o executado não é citado nos cinco dias posteriores à sua instauração, porque a tramitação processual prevê que a citação seja posterior à penhora, beneficia o exequente da interrupção do prazo prescricional previsto no artigo 323º nº 2 do CC decorridos que sejam esses cinco dias, pois que lhe não é imputável a não citação em tal caso”;

- Ac. do TRC de 13-09-2022 (Pº 231/22.2T8LRA-A.C1, rel. HELENA MELO): “A lei pretendeu com a citação/notificação ficta, prevista no n.º 2 do art.º 323.º do CCiv., evitar que as vicissitudes posteriores à entrada do processo e não imputáveis à parte impeçam a produção dos efeitos interruptivos, uma vez que os efeitos da interrupção, pelo seu grande relevo, não podiam ficar dependentes de atos que escapam ao controlo do requerente. A interrupção verifica-se também na execução, ainda que esta se inicie com a penhora dos bens e só após haja lugar à notificação do executado”.

11 abril 2025

Cobrança extra-judicial de dividas

Pese embora o administrador do condomínio tenha à sua disposição um conjunto de meios judiciais para coagir os condóminos devedores a cumprir com as prestações a que se encontram adstritos, estes procedimentos podem ser demorados e dispendiosos, pelo que, pode aquele recorrer à cobrança extra-judicial da dívida, para a qual são competentes advogados e solicitadores, no sentido de contactar formalmente o devedor, interpelando-o ao cumprimento e, caso se justifique, propondo a celebração de um acordo de pagamento que seja favorável a ambas as partes. ​

Não obstante este primeiro expediente, o administrador tem à sua disposição um conjunto de meios tendentes à coerção dos condóminos devedores para cumprirem com as prestações a que estão adstritos. Nesta tessitura, pode aquele recorrer ao processo judicial de execução em que ocorrem as diligências para a penhora de rendimentos e bens dos devedores, necessários para cobrir as importâncias devidas e das custas do processo. No caso da penhora de bens, segue-se a venda executiva dos mesmos com a entrega do produto ao credor, que vê, assim, satisfeito o seu crédito.

No entanto, e como é consabido, os processos judiciais, caraterizam-se por serem excessivamente demorados e consideravelmente dispendiosos, pelo que, o administrador do condomínio pode e deve tentar a cobrança extra-.judicial, porquanto é do interesse do devedor optar pela via menos dispendiosa.

Neste concreto, a negociação tendente à cobrança de créditos é um acto próprio dos advogados e dos solicitadores com inscrição em vigor, sublinhe-se, sob pena de incorrerem num crime de procuradoria ilícita, porquanto tal prática está vedada aos demais representantes legais, empregados, funcionários ou agentes de pessoas singulares ou colectivas, públicas ou privadas, salvo se a cobrança de dívidas constituir a actividade principal destas pessoas.

Assim, será da competência dos advogados ou solicitadores, caso tal seja no maior interesse do administrador, proceder às diligências para efectivar a cobrança extrajudicial de créditos, antes de avançar com uma acção executiva para Tribunal que, desde logo, se pode demonstrar infructífera por inexistência de bens do devedor para executar. Atente-se que para averiguar da real possibilidade de recuperação de créditos no âmbito de uma acção executiva, será, também, possível o recurso ao PEPEX.

Em regra, antes de se recorrer a um procedimento judicial, o normal é enviar-se uma carta de interpelação aos condóminos devedores, concedendo-lhes um prazo tido por razoável (por exemplo, 15 dias) para procederem ao pagamento, sendo também expressamente advertindos das consequências em que podem incorrer por não o fazer, nomeadamente pelo recurso à acção executiva. Pese embora não exista uma regra estabelecida quanto à forma de envio da carta, no entanto, o mais avisado será optar-se pelo envio por correio registado com aviso de recepção.

Importa ressalvar que este procedimento de envio de uma carta de interpelação não é obrigatório, pois até pode não ser um meio favorável à satisfação do interesse do administrador. Pense-se nos casos em que os condóminos devedores possam estar a proceder à dissipação dos seus bens, onde será quase indispensável recorrer ao processo de execução, requerendo a dispensa de citação prévia (antes da penhora) dos mesmos.

Após o envio desta carta de interpelação, pode acontecer uma de três situações:
  • os condóminos devedor pagam voluntariamente, o que será o resultado ideal;
  •  não respondem, tornando-se inevitável o recurso à cobrança judicial;
  • respondem propondo um acordo de pagamento.
Nesta última hipótese, em regra, inicia-se uma fase de negociações entre o devedor e o administrador, por e-mail ou telefone, para se chegar a um compromisso favorável a ambas as partes, de modo a que os condóminos devedores possam quitar as dividas em prestações.

Finalmente, atente-se que, no caso de celebração de um acordo de pagamento, será do interesse do administrador elaborar um documento que tenha a força de título executivo, pelo que não basta a confissão de dívida constante de documento particular com a simples assinatura do devedor, sendo portanto exigida a confissão de dívida constante de documento autêntico ou autenticado.

Carta de interpelação

Antes de se avançar para uma acção em tribunal, será, em regra, prudente procurar uma resolução amigável do litígio, ou seja, tentar resolver a questão ainda num momento extrajudicial, oferecendo ao devedor oportunidades de quitação da dívida por parcelamento ou pagamento integral.

A carta de interpelação será, no fundo, um documento enviado, pelo credor, ao devedor concedendo-lhe determinado prazo (o mais comum são 10 dias, mas pode variar) para proceder ao cumprimento da prestação devida, seja o pagamento de uma quantia ou a entrega de uma coisa.

Ainda, no final da carta, o devedor deve ser advertido das consequências que podem advir da não colaboração com o credor, isto é, do não pagamento da dívida nesta fase de tentativa de resolução amigável, nomeadamente o recurso à via judicial para a resolução do litígio e a consequente obtenção do crédito, ou seja, a interposição de uma ação executiva, no âmbito da qual se realizam diligências de penhora e venda executiva dos bens do devedor.

Quanto ao envio desta carta de interpelação, não há uma regra fixa, mas será sempre mais seguro enviar por correio registado com aviso de receção.

A resolução de litígios por via extrajudicial é uma questão particularmente sensível, pelo que se deve analisar a sua utilidade caso a caso. Ora, é possível que, sendo “avisado” por esta via, o devedor se apresse a dissipar os bens que possui, arriscando-se que o credor nada receba; nestes casos, o envio de uma carta de interpelação não será a via adequada de resolução.

Acordo de pagamento

Após a receção da carta de interpelação enviada pelo credor a conceder um prazo para o cumprimento da prestação devida, o devedor pode assumir uma de três posições:
  • Pode, desde logo, cumprir com a prestação devida, procedendo ao pagamento integral da quantia em dívida;
  • Pode manter-se em silêncio, não respondendo à comunicação efetuada pelo credor;
  • Pode, ainda, propor um acordo de pagamento faseado.
Na elaboração do acordo de pagamento, é necessário que sejam feitas cedências de ambas as partes. Na realidade, a resolução do litígio de forma amigável, através da celebração de um acordo de pagamento extrajudicial, é uma situação favorável:
  • Para o credor, existindo a vantagem de começar a ver a prestação a ser cumprida, ainda que de forma faseada, através de um plano de prestações;
  • Para o devedor, que tem a possibilidade de pagar a sua dívida em prestações, sendo, possivelmente, reduzidos os juros ou até parte da dívida perdoada.
  • Não é habitual que o credor reduza ao capital devido, mas já é muito frequente a cedência em relação aos juros, ainda que parcialmente, ficando a cláusula de renúncia a juros sujeita à condição do pagamento pontual das prestações acordadas.
Antes de 2013, este acordo de pagamento (enquanto documento particular), incluindo-se uma cláusula em que o devedor reconhecesse a existência da dívida, valia como título executivo, necessário para interpor uma ação executiva, enquanto meio destinado à cobrança judicial de um crédito.

Pelo contrário, atualmente, o acordo de pagamento em si mesmo não tem força executiva. De todo o modo, continua a ser possível dar a este acordo a natureza de documento autenticado, sendo-lhe aposto termo de autenticação por notário ou advogado em que se declara que o documento corresponde à vontade das partes. E, ainda que não tenha força executiva, será sempre um documento que pode ser apreciado pelo tribunal, dificultando a defesa do devedor, não devendo ser descurada a sua utilidade e viabilidade.

Título executivo

O título executivo é uma condição necessária à interposição de uma ação executiva, meio destinado à cobrança judicial de um crédito, tendo que acompanhar o requerimento executivo.

Este título executivo funciona como um documento que faz prova legal da existência do direito do credor, do crédito que este pretende executar. Assim, havendo título executivo, um documento que serve de base à execução, o direito do credor já está definido, não é necessária a interposição de uma injunção ou ação declarativa.

Ainda, é o título executivo que determina o fim e os limites exatos da dívida que se pretende cobrar, não podendo ser cobrado um valor superior ao que consta do título.

Apesar de constar sempre de um documento, o títulos executivo pode ter natureza distinta, podendo tratar-se de:
  • Títulos judiciais, como a sentença condenatória proferida em prévia ação declarativa, acórdão condenatório, despacho condenatório ou sentença homologatória de transação ou confissão de pedido;
  • Títulos negociais, como os títulos de crédito (letra, livrança ou cheque) ou documentos exarados ou autenticados por notário ou entidade equiparada, nomeadamente o advogado;
  • Títulos judiciais impróprios, como o requerimento de injunção em relação ao qual não exista oposição à injunção;
  • Títulos particulares, resultantes de certos documentos particulares a que se atribui força específica, como a ata de deliberação de assembleia de condóminos que determina o montante das contribuições devidas ao condomínio;
  • Títulos administrativos, resultantes de atividade administrativa, como títulos de cobrança de tributos, coimas, dívidas determinadas por ato administrativo, reembolsos ou reposições e outras receitas do Estado.
Acto próprio dos advogados e solicitadores

A Lei n.º 49/2014, de 24 de agosto, define o sentido e o alcance dos actos próprios dos advogados e dos solicitadores. Atente-se que apenas os licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados (OA) e os solicitadores inscritos na Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução (OSAE)  podem praticar os atos próprios dos advogados e dos solicitadores.

Assim, são actos próprios dos advogados e solicitadores:
  • O exercício do mandato forense, isto é, o mandato judicial conferido para ser exercido em qualquer tribunal, incluindo os tribunais judiciais, os tribunais ou comissões arbitrais e os julgados de paz;
  • A consulta jurídica, que consiste na actividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação de normas jurídicas mediante solicitação de terceiro;
  • A elaboração de contratos e a prática de actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
  • A negociação tendente à cobrança de créditos;
  • O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de actos administrativos ou tributários.
Há, todavia, uma excepção a este regime, relacionada com a negociação tendente à cobrança de créditos, nos casos em que a cobrança de dívidas constitua o objecto ou actividade principal de determinada pessoa singular ou colectiva, pública ou privada, existindo diversas empresas de cobranças de dívidas e recuperação de créditos.

22 julho 2024

Prescrição 5 e 20 anos


A obrigação do condómino de pagar as despesas normais atinentes à manutenção e conservação do imóvel, despesas essas necessárias para a conservação e fruição das partes comuns do condomínio, reconduzíveis a quotizações ordinárias (aqui se incluindo as atinentes a contribuições para o Fundo Comum de Reserva), resultantes da aprovação do orçamento anual de receitas/despesas do condomínio, repartidas pelos condóminos, porque se renovam anualmente enquanto durar o condomínio, prescreverão em 5 anos, nos termos do art. 310º, al. g) do CC e o prazo da prescrição começará a correr da data em que a prestação pode ser exigida — cfr. nº 1 do art. 306º do CC.

Assim, conforme se concluiu no Acórdão do TRP de 06-04-2017 (Pº 6756/16.1T8PRT-A.P1, rel. VIEIRA E CUNHA): “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais, nos termos do art.º 1424º CCiv, e, por isso, renovam-se anualmente, enquanto durar o condomínio – art.ºs 1424º e 1431º, prescrevendo no prazo de cinco anos – al. g) do art.º 310º CCiv.”.

Mas o embargado entende que as obrigações atinentes às quotas extraordinárias, por não se tratar de uma obrigação periodicamente renovável - mas sim, de uma despesa eventual/extraordinária - apenas poderá prescrever nos termos gerais, em 20 anos (cfr. art. 21º da contestação) – cfr. art. 309º do CC.

Será assim?

Neste ponto, subscrevemos as considerações expendidas a respeito desta temática no Acórdão do TRP de 04-02-2016 (Pº 2648/13.4TBLLE-A.P1, rel. ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA) do seguinte teor:

"Nos termos da al. g) estão sujeitos a um prazo de prescrição de 5 anos, entre outros, os créditos relativos a “prestações periodicamente renováveis”. Interessa pois determinar o que se deve entender por prestações periodicamente renováveis para efeitos desta norma.

Em função da influência do tempo sobre o seu objecto, é costume distinguir, usando a terminologia de Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, p. 85 e ss., entre as prestações instantâneas, as prestações duradouras e as prestações fraccionadas ou repartidas.

As prestações instantâneas são aquelas cujo objecto é realizado num único momento, ou seja, o comportamento exigível do devedor esgota-se num só momento (quae único actu perficiuntur). Ao invés, nas prestações duradouras a prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória uma influência decisiva na conformação global da prestação, ou seja, não só o devedor é chamado a efectuar diversos actos para satisfação do direito de crédito do credor, como a extensão desses actos depende decisivamente do factor tempo.

Dentro das obrigações duradouras distinguem-se ainda as prestações de execução continuada, que são aquelas cujo cumprimento é feito continuamente ao longo do tempo, e as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo que são aquelas que se renovam no fim de períodos temporais consecutivos, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos.

Existem ainda prestações fraccionadas ou repartidas que são aquelas cujo cumprimento se protela no tempo mas em que o facto tempo não tem influência sobre o objecto da prestação mas apenas sobre o modo da sua execução, isto é, o objecto da prestação foi fixado previamente e permanece inalterado ainda que, por acordo das partes, o seu cumprimento deva ser feito ao longo de tempo, em momentos separados dividido em fracções ou parcelas.

Quando a al. g) do art. 310º do CC se refere a prestações periodicamente renováveis está pois a reportar-se às prestações emergentes de obrigações duradouras que se classificam como prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, como é o caso da prestação de pagamento da renda a cargo do arrendatário ou da prestação de pagamento do consumidor de água ou electricidade a cargo do adquirente no contrato de fornecimento desse bens.

As prestações relativas ao pagamento das despesas comuns do condomínio que incumbem ao condómino são prestações periodicamente renováveis?

Numa primeira aproximação, a resposta tende a ser afirmativa. Com efeito, essas despesas são normalmente relativas a encargos com a limpeza e a segurança do prédio, o seguro, a aquisição de água e electricidade para as necessidades e zonas comuns, os contratos de manutenção dos serviços comuns como os elevadores e os equipamentos energéticos. Tais despesas têm como causa bens e serviços utilizados ou produzidos quotidianamente, de forma paulatina mas constante, pelo que não apenas o respectivo custo está associado ao decurso do tempo e dele depende essencialmente, como a obrigação de as suportar se renova no fim de períodos temporais consecutivos, em regra a anuidade, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos (ainda que o regulamento do condomínio possa estabelecer que o pagamento pelo condómino seja feito, por exemplo, em duas prestações semestrais). Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os Acs. TRL de 22.4.2010, rel. Márcia Portela (p.º 5892/04.1YXLSB.L1-6), de 21.6.2011, rel. Amélia Ribeiro (pº 7855/07.6BOER-A.L1-7), da TRC de 14.11.06, rel. Artur Dias (p.º 3948/04.0TBAVR.C1), e da TRP de 27.05.2014, rel. Vieira Cura (pº 4393/11.6TBVLG-A.P1).

Pode suceder que o condomínio delibere a prática de um acto isolado gerador de uma despesa singular, designadamente com uma obra extraordinária de conservação ou reparação. Nessa situação, ainda que a despesa seja objecto de inclusão no orçamento e de repartição pelos condóminos na proporção das respectivas quotas a acrescer às despesas correntes e normais, parece questionável que a obrigação de pagamento dessa despesa singular possa ser classificada como prestação periodicamente renovável. Daí que tal como se entendeu no Acórdão desta Relação de 14.09.2015, relatado por Carlos Gil (proc. n.º 388/11.8TJPRT-A.P1) e com o que se concorda em absoluto, “as despesas de conservação, ainda que impostas legalmente com uma periodicidade mínima, não são necessariamente periódicas pois que, se podem ser fixadas a forfait, para serem cobradas anualmente, na veste das denominadas quotizações de condomínio, podem ter carácter pontual determinado em função do concreto custo das obras em causa e do momento em que se decide efectuar certa obra.

Como é sabido, a amplitude das obras de conservação necessárias em cada imóvel varia de acordo com uma multiplicidade de factores…. Daí que, por vezes, as contribuições do condomínio anualmente fixadas e o respectivo fundo comum de reserva não sejam suficientes para custear as obras de conservação necessárias em certo momento. (…) quando as obras de conservação têm carácter pontual e são adrede custeadas pelos condóminos e não a forfait, não é o tempo, o seu decurso que determina o custo de tais obras, mas sim as diversas vicissitudes relevantes para a sua concreta valorização…”.

Resulta assim justificado que as prestações para pagamento das despesas comuns do condomínio podem ou não ser prestações periodicamente renováveis. Se o forem, em princípio estão sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos. Caso contrário, o prazo de prescrição da dívida é o prazo ordinário de vinte anos.

Tendo a execução sido instaurada e estando incluídas na quantia exequenda dividas que se venceram mais de cinco anos antes (cfr. art. 323º, nº 2, do CC), aquela distinção carecia de ser concretizada. Porém, pelas razões que se explicam de seguida, isso não se mostra necessário para decidir a excepção.

Vejamos porquê.

Sob a epígrafe “direitos reconhecidos em sentença ou título executivo”, o art. 311º do CC, que sucede aos preceitos que fixam os prazos de prescrição ordinária (309.º) e de cinco anos (310.º), estatui o seguinte no seu nº 1:“O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.

Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição (…)”.

E, em conformidade, concluiu-se no referido aresto de 04-02-2016 que: “Em regra, as prestações do condómino para pagamento das despesas comuns do condomínio serão prestações periodicamente renováveis, sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos, mas isso não será assim quando se tratar de uma despesa singular gerada por um acto isolado, designadamente uma obra extraordinária de conservação ou reparação do edifício. Se após a constituição da dívida sujeita a prazo de prescrição de cinco anos, esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição.”

De igual modo, no Acórdão do TRP de 17-06-2021 (Pº 627/14.3TBVNG-B.P1, rel. JUDITE PIRES) concluiu-se que: “É de vinte anos o prazo prescricional quanto ao direito de crédito [fundado numa acta de assembleia de condóminos] que esteja a ser exercido por via de acção executiva”.

Revertendo estas considerações para o caso, verifica-se que o direito de crédito está a ser exercido por via de acção executiva, o que sucede em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 6º do DL nº 268/94, de 25 de Outubro: “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo”.

Ora, considerando a sua natureza de prestações periodicamente renováveis, pode concluir-se que a obrigação do condómino de pagar as despesas normais atinentes à manutenção e conservação do imóvel, despesas essas necessárias para a conservação e fruição das partes comuns do condomínio, reconduzíveis a quotizações ordinárias (aqui se incluindo as atinentes a contribuições para o Fundo Comum de Reserva), resultantes da aprovação do orçamento anual de receitas/despesas do condomínio, repartidas pelos condóminos, porque se renovam anualmente enquanto durar o condomínio, prescrevem no prazo de 5 anos, nos termos da al. g) do art. 310º do CC.

Sob a epígrafe “direitos reconhecidos em sentença ou título executivo”, o art. 311º do CC, que sucede aos preceitos que fixam os prazos de prescrição ordinária (309.º) e de cinco anos (310.º), estatui o seguinte no seu nº 1:“O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.

Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição (…).

Em regra, as prestações do condómino para pagamento das despesas comuns do condomínio serão prestações periodicamente renováveis, sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos, mas isso não será assim quando se tratar de uma despesa singular gerada por um acto isolado, designadamente uma obra extraordinária de conservação ou reparação do edifício. Se após a constituição da dívida sujeita a prazo de prescrição de cinco anos, esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição.

08 julho 2024

Prescrição dívidas


Conforme decorre do disposto no nº 1 do art. 298º do CC, a prescrição traduz-se no “não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei” de direitos que a lei não qualifique como indisponíveis ou declare dela isentos. Assim, a prescrição visa salvaguardar a segurança e a estabilidade das relações jurídicas, garantindo ao beneficiário da mesma a possibilidade de, transcorrido que seja, um determinado tempo fixado na lei, recusar o cumprimento que lhe venha a ser exigido, conforme decorre do art. 304º do CC que determina que, “uma vez completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.

Como refere Pais de Vasconcelos (Teoria Geral do Direito Civil, 5.ª Edição, Almedina, pag. 380), “a prescrição é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício, e traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita. Se o credor, ou o titular do direito, deixar de o exercer durante certo tempo, fixado na lei, o devedor, ou a pessoa vinculada, pode recusar o cumprimento, invocando a prescrição”.
Uma vez invocada, a prescrição constitui um facto impeditivo do direito invocado pelo credor daquele que a invoca.

É de salientar que a prescrição não configura um facto extintivo, na medida em que não extingue a obrigação prescrita, a qual subsiste, embora convertida em obrigação natural e, daí que, o nº 2 do art. 304º do CC estabeleça que, cumprida a obrigação prescrita, não há lugar à repetição do indevido.

A prescrição constitui uma excepção que permite ao devedor impedir o exercício do direito de crédito pelo credor (cf. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 9.ª Edição).

O prazo ordinário de prescrição é de 20 anos (art. 309º do CC), daí resultando que se não houver disposição legal que sujeite especificamente o crédito a um prazo de prescrição diferente, a prescrição do mesmo só ocorre uma vez ultrapassado aquele prazo. Todavia, no art. 310º do CC estabelecem-se diversos casos em que o prazo de prescrição é mais curto.

Destarte, pese embora o dito prazo ordinário da prescrição (20 anos), hão prazos mais curtos, excepcionais, de 5 anos (art. 310º do CC), de 6 meses (art. 316º do CC) ou de 2 anos (art. 317º do CC). 

O art. 310º, do CC, em especial, elenca várias situações que prescrevem as situações que se balizam no prazo de 5 anos [cfr. al. a) a f)], sendo que na al. g), refere-se expressamente que também prescrevem no mesmo prazo “…Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis...”.

Conforme ensinam Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, vol. I, pag. 280), “não se trata, nestes casos, de prescrições presuntivas, sujeitas ao regime especial estabelecido nos art. 312º e seguintes, mas de prescrições de curto prazo, destinadas essencialmente a evitar que o credor retarde demasiado a exigência de créditos periodicamente renováveis, tornando excessivamente pesada a prestação a cargo do devedor”.

Como refere a doutrina, a razão de ser da fixação deste prazo curto, tem por finalidade evitar que o credor, retardando a exigência dos créditos periodicamente renováveis, os deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor. E, no mesmo sentido, vai a jurisprudência, como é o caso do Ac. do STJ, de 02.05.2002, onde, a propósito de uma situação de prescrição a curto prazo, se decidiu que:

“O prazo da prescrição, começa a contar-se da exigibilidade de cada prestação. Tal prescrição, interrompe-se, todavia, pela citação ou qualquer acto que exprima a intenção de se exercer o direito. A razão de ser de um prazo curto de prescrição das prestações periodicamente renováveis é evitar que o credor as deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor...”. 

Ora, salvo o devido respeito, e no seguimento do entendimento que temos como a melhor doutrina e jurisprudência, afigura-se-nos ser esta, justamente, a situação atinente às quotas de condomínio, ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos, constituem obrigações reais, que ambulatórias ou não ambulatórias, são prestações periodicamente renováveis.

Na verdade, não nos parece curial a tese no sentido de que as prestações em dívida constituam per si prestações instantâneas fraccionadas. Estas ocorrem quando, existindo uma única prestação, instantânea por natureza, esta é realizada por partes, ou seja, executada por diversas parcelas, em consequência de convenção das partes. 

O objecto global da prestação é, neste caso e ao invés do que sucede na prestação duradoura, desde o início fixado, mas a execução é escalonada no tempo, realizando-se por diversas fracções ou prestações. Ao invés, quando, todavia, em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam — posto que decorrentes de uma só relação obrigacional — diversas prestações (isto é, prestações repetidas) a satisfazer regularmente ou sem regularidade exacta, teremos as chamadas prestações «reiteradas, repetidas, contrato sucessivo» ou «periódicas» («lato sensu»). 

Por outras palavras, no domínio das chamadas prestações duradouras, isto é, aquelas que não se esgotam num só momento, antes se distendendo no tempo, uma prestação diz-se periódica quando, protelando-se no tempo, tem de ser realizada em momentos sucessivos, com espaçamento em regra regular. 

Entende-se ser este o caso das ditas despesas condominiais, ou melhor dizendo, “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum”, como é referido no art. 1424º, nº 1, do CC, que integram, assim, a situação prevista na já referida al. g) do art. 310º, do CC, estando, pois, sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos.

Como ensina Aragão Seia “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do art. 1424º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio — art. 1424º e 1431º. Assim sendo, prescrevem no prazo de cinco anos - al. g) do art. 310º - e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida — cfr. nº 1 do art. 306º CC (…)”.

Mas, todavia, conforme se sublinhou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-07-2019 (Pº 7503/16.3T8FNC-A.L1-7, rel. DIOGO RAVARA), não é forçoso que assim seja:

Com efeito, se é verdade que aquelas despesas sejam impostas com periodicidade mínima, não é forçoso que as mesmas sejam periódicas, porquanto se podem ser fixadas a forfait e cobradas anual, trimestral, ou mensalmente, também podem ter caráter pontual (como sucede relativamente a despesas decorrentes de obras de conservação extraordinárias) – neste sentido cfr. acs. RP de 14-05-2015 (Carlos Gil), p. 388/11.8TJPRT-A.P1, e de 04-02-2016 (Aristides Rodrigues de Almeida), p. 2648/13.4TBLLE-A.P1.

De qualquer modo, como bem apontaram ARAGÃO SEIA e ABÍLIO NETO, as “quotas” ou contribuições fixadas e cobradas com aquele ritmo anual, semestral, trimestral ou mensal têm natureza periódica e por isso ficam sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos previsto na al. g) do art.º 310º do CC – No sentido exposto cfr., entre outros, os arestos já citados, bem como os acs. RL 21-06-2011 (Mª Amélia Ribeiro), p. 7855/07.6TBOER-A.L1; RP 27-05-2014 (Vieira e Cunha), p. 4393/11.6TBVLG-A.P1; e RE 14-05-2015 (Francisco Xavier), p. 3202/09.0TBLLE-A.E1”.

Haverá, pois, que apurar se o objecto da prestação é determinado em função do respectivo tempo de duração (prestação duradoura, de execução continuada ou periódica), ou antes se é essencialmente determinado em função do valor do bem adquirido (prestação fraccionada), sendo que, só para as prestações duradouras de natureza reiterada ou periódica valerá a prescrição de 5 anos a que se reporta o disposto no art. 310º al. g) do CC, enquanto que, as prestações fraccionadas ou repartidas cairiam no âmbito da prescrição ordinária de 20 anos.

Trata-se de uma evidência que as obrigações não reais, respeitantes a direitos disponíveis, se encontram sujeitas a prazos de prescrição, sendo o mais longo de 20 anos, aspecto que não é posto em causa pelo instituto da propriedade horizontal. A obrigação exequenda reporta-se a uma obrigação pecuniária e não tem natureza real.

27 junho 2024

Art. 6º/5 DL 268/94, introduzido pela Lei nº 8/2022, de 10/01


O DL nº 268/94, de 25 de Outubro pretendeu, entre outros aspectos conseguir o “objectivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros” (cfr. o seu preâmbulo).Na sua versão original, o artº 6º, sob a epígrafe “dívidas por encargos de condomínio”, tinha a seguinte redação:

1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
2 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior.

A Lei nº 8/2022, de 10 de Janeiro, procedeu à revisão do regime da propriedade horizontal e alterou determinados preceitos do Código Civil, bem como do DL nº 268/94. Em particular, alterou o art. 6º, nos seguintes termos:

1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.
2 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no nº 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
3 - Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.
4 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no nº 1 e 3.
5 - A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.

Importa aqui atentar à interpretação do nº 5 deste art. 6º resultante desta alteração.

Alguma jurisprudência entende que o preceito impôs um novo pressuposto à cobrança judicial das dívidas por encargos de condomínio, ou seja, a acção só poderia ser intentada se o valor em dívida for igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais no respetivo ano civil. (1)

Começando pela letra da lei, o art. 6º constitui uma norma complexa, na medida em que estatui sobre matérias diversas, umas de índole substantiva, outras adjectivas. Assim:

● A epígrafe do preceito estabelece o âmbito, ou seja, regula sobre as dívidas por encargos de condomínio.
● O nº 2 confere força executiva à acta da reunião da assembleia de condóminos para efeitos de reagir contra o proprietário que deixar de pagar.
● No nº 1 estabelecem-se os requisitos para que essa acta tenha força executiva - a acta só constituirá título executivo se contiver o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações (condições de exequibilidade).
● No nº 3 refere-se que se consideram abrangidos pelo título executivo os juros de mora e as sanções pecuniárias. Contudo, também estabelece uma condicionante: os juros e sanções só integrarão o título executivo se (“desde que”) estiverem aprovados em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.
● Depois, no nº 4 impõe-se um comando ao administrador – é ele quem tem de instaurar a acção judicial para cobrar as quantias em dívida.
● Por fim, no nº 5 refere-se que essa acção judicial deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.

Daqui decorre que: (i) a acção judicial tem de ser instaurada no prazo de 90 dias a seguir ao primeiro incumprimento; (ii) só não o será se a assembleia tiver deliberado em contrário; (iii) a acção judicial só terá de ser instaurada nos 90 dias no caso em que o valor em dívida tenha já um montante igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil.

Duas hipóteses se podem prefigurar:

i. a limitação do valor em dívida reporta-se à obrigação do administrador em instaurar a acção;
ii. a limitação do valor em dívida reporta-se à exequibilidade do título.

Em nosso entender, estamos perante a 1ª hipótese. A estipulação do valor em dívida por referência ao valor do indexante dos apoios sociais pretende referir-se à responsabilidade do administrador em propor a acção, e não às condições de exequibilidade do título.

Em termos gramaticais, o nº 5 do art. 6º constitui uma oração subordinada adverbial condicional que, como se sabe, exprime condição ou uma hipótese.(2)

Assim, a oração subordinada (“desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil”) tem de ser perspetivada em função da oração subordinante (“A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino”).

Não faria sentido que esta oração subordinada do final do nº 5 estivesse a completar o sentido de uma outra oração (subordinante), designadamente das contempladas nos números 2 e 3 do preceito que são as que se referem à força executiva do título.

Cremos que esta interpretação é também a que melhor se enquadra no elemento sistemático de interpretação.

A Lei nº 8/2022 procedeu à revisão do regime da propriedade horizontal olhando-a como um todo, pelo que além do DL nº 268/94, alterou também preceitos do Código Civil (CC) e do Código do Notariado.

No que toca às funções do administrador do condomínio foram introduzidas inovações em termos de maior responsabilização.

Assim, nos termos da actual redacção do art. 1436º do CC, compete ao administrador exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, incluindo os juros legais devidos e as sanções pecuniárias fixadas pelo regulamento do condomínio ou por deliberação da assembleia (nº 1 al. f).

E, no nº 3 desse preceito, ficou expressamente consignado que o administrador de condomínio que não cumprir as funções que lhe são cometidas neste artigo, (…) é civilmente responsável pela sua omissão, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal, se aplicável.

Certamente que o legislador não desconhece que existem quotas mensais de condomínio de valor que se pode considerar “irrisório” (dívidas de pequeno valor), pelo que a posição dos administradores ficaria gravemente comprometida se tivessem de instaurar acções judiciais por todas e quaisquer quotas, independentemente do seu valor mensal, sob pena de incorrerem em responsabilidade civil. Além dos congestionamentos que uma tal imposição provocaria nos tribunais.(3)

Nessa medida, a estipulação do valor em dívida por referência ao valor do indexante dos apoios sociais funciona como uma limitação da obrigação imposta ao administrador em intentar acção de cobrança das dívidas.

Ou, noutra perspetiva, como uma delimitação da responsabilidade: o administrador só incorre em responsabilidade civil por omissão no caso de o valor das quotas em dívida igualar ou for superior ao indexante de cada ano civil.

Face ao exposto, conclui-se que tem existido erro na interpretação da lei.

Notas:

(1) Em 2024 é de 509,26€.
(2) «As conjunções subordinativas estabelecem uma relação de dependência entre duas orações, uma subordinante e uma subordinada, tendo esta última a função de completar o sentido da primeira (a subordinada depende da subordinante e, regra geral, pode ser anteposta)», podendo ser causais, temporais, condicionais, etc. - in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
(3) Pode ler-se na exposição de motivos do Projeto de Lei nº 718/XIV/2.ª, que deu origem à Lei nº 8/2022: «São evidentes as crescentes exigências que se apresentam a quem vive, trabalha ou simplesmente é proprietário de fracções autónomas em prédios em regime de propriedade horizontal, bem como as idênticas exigências que se colocam a quem, pessoa singular ou coletiva, tem a seu cargo a administração dos respetivos condomínios. Muitos dos condomínios apresentam um elevado número de fracções, o que, só por si, torna mais complexa a administração das partes comuns e, consequentemente, as deliberações acerca dos encargos de conservação e fruição que devem ser pagas por todos os condóminos. Tal realidade contribui, muitas vezes, para a criação de inúmeros obstáculos para quem administra os condomínios, o que, consequentemente, potencia o atraso nas decisões e, por isso, a deterioração dos prédios, acarretando prejuízo para todos os condóminos, nomeadamente prejuízos inerentes ao acréscimo de despesas futuras na recuperação dos mesmos. (…) Depois, o presente Projeto-Lei introduz mecanismos facilitadores da convivência em propriedade horizontal, nomeadamente agilizando procedimentos de cobrança, os quais a administração do condomínio pode e deve concretizar no sentido de responder às necessidades dos condóminos, de forma mais célere e eficaz.
Pretende-se também conferir um maior grau de responsabilidade, por um lado, aos próprios condóminos e, por outro lado, a quem administra o condomínio.
O diploma pretende ainda contribuir para a pacificação da jurisprudência que é abundante e controversa a propósito de algumas matérias, como, por exemplo, os requisitos de exequibilidade da ata da assembleia de condóminos, a legitimidade processual ativa e passiva no âmbito de um processo judicial e a responsabilidade pelo pagamento das despesas e encargos devidos pelos condóminos alienantes e adquirentes de frações autónomas, colocando fim, neste último aspeto, à vasta e sobejamente conhecida discussão acerca das características de tais obrigações.

25 junho 2024

Art. 6º DL 268/94 de 25/10



O art.º 703.º, n.º 1, alínea d), do CPC elenca como títulos executivos, entre outros, “Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.”

O DL nº 268/94, de 25/10 criou um destes títulos executivos especiais, procurando solução que tornasse mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros (tal como se lê no respectivo Preâmbulo).

O respectivo art. 6º dispunha que a Acta da reunião da assembleia de condóminos que tenha deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixe de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

Desta forma, o legislador passou a atribuir força executiva à Acta da assembleia de condóminos, permitindo ao condomínio instaurar acção executiva contra o proprietário da fracção, condómino devedor, relativamente à sua contribuição para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, na proporção do valor da sua fracção, sem que, previamente, tivesse que lançar mão ao processo de declaração a fim de obter o reconhecimento do crédito.

Apesar de este normativo ter, entretanto, sido alterado pela Lei nº 8/2022, de 10/01, continua a ser esta a redação aplicável ao caso em análise, já que era a vigente na data da Assembleia de Condóminos em que se produziu a Ata apresentada como título executivo.

Ao longo dos anos foi-se sedimentando na doutrina e na jurisprudência a interpretação deste normativo legal, no sentido de que apenas constitui título executivo a Acta que contenha deliberação sobre os montantes concretos das contribuições devidas ao condomínio em cada ano, a individualização da quota parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento de tais contribuições.

Esta é também a nossa opinião.

Assim, Delgado de Carvalho refere “(…) a fonte da obrigação pecuniária do condómino relapso é a própria deliberação da assembleia de condóminos, vertida em acta, que aprova e fixa o valor a pagar de imediato e para o futuro, correspondente à sua quota-parte nas contribuições e nas despesas comuns.”

Por seu turno, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, no mesmo sentido, defendem que “Em bom rigor, o que se pretende é que a obrigação (na sua constituição inicial ou traduzindo a existência de um débito) conste da acta de assembleia de condóminos e a responsabilidade do executado seja apurável por simples cálculo aritmético por referência a cada um dos períodos considerados em dívida.”

Na jurisprudência, decidiu-se neste sentido designadamente no Acórdão do STJ de 14/10/2014, tendo como Relator Fernandes do Vale: “Para constituir título executivo, a acta da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, não dependente, pois, a respectiva força executiva, da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes) nem de, nela, ser explicitado aquele valor.”

Bem como no recente Acórdão do TRP de 27/11/23, tendo como Relator Miguel Baldaia de Morais: “Para valer como título executivo nos termos do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, a ata da assembleia de condomínio tem de conter a deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, a fixação da quota-parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento respetivo.”

Aliás, quaisquer eventuais dúvidas interpretativas foram, a nosso ver, ultrapassadas pela Lei nº 8/2022, de 10/01 que, substituiu o indicado art. 6º do DL n.º 268/94, de 25/10, pela seguinte redação: “1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações. 2 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no nº 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.”

Efectivamente, este diploma legal confere força executiva às deliberações que tenham por objeto “o montante das contribuições a pagar” contra o proprietário “que deixar de pagar”.

Ora, tais deliberações são efectuadas tipicamente nas Assembleias de Condóminos em que se aprova os orçamentos para o ano seguinte e/ou os orçamentos para a realização de obras ou pagamento de outros encargos do condomínio, por referência a um valor global.

Além disso, a expressão “deixar de pagar” refere-se a uma projecção para o futuro, a um potencial futuro incumprimento, levando-nos a considerar ser desnecessária a prévia constituição em mora do condómino.

Se o Condomínio Exequente apresentar como título executivo uma acta da Assembleia de Condóminos, constando da mesma, no último ponto da ordem de trabalhos, sob o título “Outros assuntos de interesse para o condomínio”, uma lista de meses em débito associada à fração devedora e aos executados, enquanto proprietários da mesma, identificando os meses e o total em dívida, seguida da declaração de que “…a assembleia após devida discussão mandatou o Exmo. sr. Administrador mande instaurar, nos termos legais, as respetivas acções judiciais destinadas a cobrar as prestações em dívida…”.

Assiste inteira razão ao Recorrido/Embargante ao defender que nesta acta não consta qualquer deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas por si ao condomínio, nem a fixação da sua quota-parte nem o prazo de pagamento respetivo relativamente aos anos em crise. Bem como não consta sequer qualquer deliberação no sentido da aprovação das dividas vencidas dos condóminos relapsos, particularmente das do Recorrido.

Isto é, a Acta apresentada como título executivo não reune as condições de exequibilidade consagradas na lei acima analisada.

Consequentemente, uma acção assim intentada tem como resultado a decisão de procedência da excepção de falta de título contra as executadas, com a absolvição das mesmas da instância executiva, nos termos dos arts. 577.º e 578.º do CPC, e inerente extinção da execução.

20 junho 2024

Responsabilidade pelas custas



Estabelece o nº 1 do art. 1424º do CC que, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações”.

A jurisprudência dominante tem qualificado as contribuições dos condóminos nos termos da citada disposição legal como prestações periódicas, visto que o seu montante depende da aprovação, pela assembleia geral de condóminos, a qual, reúne pelo menos uma vez por ano – vide art. 1431º, nº 1, do CC.

E, efetivamente, em regra, as contribuições dos condóminos para a satisfação das despesas comuns têm efectivamente uma natureza que se pode considerar tanto regular, como periódica.

Aliás, como salienta Aragão Seia (Propriedade Horizontal; 2.ª ed., Almedina, 2022, pag. 131, nota 9), “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do artigo 1424.º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio – artigos 1424.º e 1431.º".

Enquanto condóminos, estão estes obrigados a comparticipar para as despesas tidas por necessárias à conservação e fruição das partes comuns do prédio e bem assim, ao pagamento de serviços de interesse comum (cfr. art. 1424 CC).

Cumpre contudo perguntar: E as despesas de contencioso e com honorários de um solicitador ou advogado motivadas pela instauração de ações contra um condómino que não procedeu, por exemplo, ao pagamento das comparticipações para o condomínio, constituem despesas a realizar pelo condomínio?

Como regra, a responsabilidade pelo pagamento das custas assenta no princípio da causalidade e, subsidiariamente, no princípio da vantagem ou do proveito processual: um processo não deve causar prejuízos à parte que tem razão, sendo por isso as custas pagas pela parte vencida, e na medida em que o for; ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito da demanda.

Ora, de facto, estamos face a despesas que operam evidentemente no interesse comum, pela importância que tais comparticipações assumem para suportar os encargos com as partes comuns do prédio. Nessa medida, podem e devem as despesas de contencioso e honorários de solicitador ou advogado, considerarem-se despesas que se inserem no âmbito do pagamento de serviços de interesse comum.

No entanto, podem os condóminos, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, assumir tal encargo (cfr. art. 559º/1 a) CC), ou, pode a assembleia de condóminos deliberar um diferente critério de pagamento de tal serviço, sem que tal deliberação contenda com o estabelecido no regulamento ou com o regime legal da propriedade horizontal.

Como se começou por referir o art. 1424º/1 CC estabelece uma norma supletiva quanto à forma de repartição das despesas. A assembleia de condóminos pode deliberar noutro sentido e atribuir ao condómino o pagamento das despesas de contencioso e honorários com solicitador ou advogado, quando aquele dá causa à acção destinada, por exemplo, a cobrar as prestações para o condomínio. 

Uma tal deliberação, representa uma norma que se enquadra na esfera de poderes conferidos à assembleia de condóminos por estar ainda em causa uma deliberação sobre pagamento de despesas efectuadas no interesse comum.

Conclui-se, assim, que a deliberação que prevê a constituição de mandatário para promover acções judiciais no sentido de obter, por exemplo, a cobrança das comparticipações em divida ao condomínio e faz repercutir as despesas com contencioso e honorários a solicitador ou advogado sobre o respetivo condómino faltoso, insere-se nos actos de gestão da assembleia pois são as comparticipações que permitem suportar os encargos e fruição das partes comuns do prédio. 

Se a promoção de tais acções decorre do interesse comum e constitui uma das funções do administrador do condomínio (cfr. art. 1436º/e) CC), já as despesas inerentes não o são e por isso, justifica-se que tais encargos sejam suportados por quem deu causa às mesmas, como se haja decidido em deliberação.

18 junho 2024

Prescrição dividas

 

A prescrição de dívidas é um instituto jurídico que estabelece um prazo após o qual o credor perde o direito de exigir o pagamento de uma dívida ao devedor. Este prazo varia de acordo com o tipo de dívida e as circunstâncias específicas envolvidas. No que às dívidas condominiais importa, estas podem estar sujeitas ao prazo ordinário de 20 anos (cfr. art. 310º CC), ou o especial, de 5 anos (cfr. art. 309º/g) CC).

Conforme resulta do art. 303º do CC, para que a prescrição de dívidas produza efeitos, deverá ser invocada pelo devedor, de forma judicial ou extra-judicial. Pelo exposto, caso o condómino tenha dívidas prescritas, poderá opor-se ao pagamento, primeiramente pela via extra-judicial, para tanto, enviando uma carta registada (com aviso de receção, se pretender) para o administrador do condomínio.

Importa ressalvar que, a prescrição de uma dívida produz os seguintes efeitos:
  • Extingue-se o direito do credor poder proceder à sua cobrança: Portanto, após a prescrição, o administrador perde o direito de poder exigir o pagamento da dívida ao condómino devedor.
  • Libertação do devedor da obrigação de pagar: Vale por dizer que o condómino devedor não é pode ser obrigado a pagar a dívida prescrita, mesmo que o condomínio ainda a considere válida.
  • Invocação da prescrição face à cobrança judicial: Nada impede que o administrador intente a cobrança judicial para exigir o pagamento de uma dívida prescrita, porém, pode esbarrar na oposição do condómino, caso este invoque a prescrição.


Minuta da carta

(Nome a morada completa remetente)

(Identificação administrador e condomínio)

Carta registada

Assunto: Prescrição de dívida

Exmo Senhor Administrador, após ter sido interpelado(a) em (data) para proceder voluntariamente ao pagamento da(s) comparticipações correspondentes ao mês de (mês) de (ano), até ao mês de (mês) de (ano) no valor de (€...), acrescido de juros/penas no valor de (€...), a que corresponde o valor global de (€...). 

Nesta tessitura, importa ressalvar que tais comparticipações, por se tratarem de prestações periodicamente renováveis, encontram-se prescritas, atenta a disposição especial contida no disposto no art. 310º, al, g) do CC, que fixa o prazo prescricional em 5 anos. 

Deste conspecto e nos termos tuteladores do art. 304º (efeitos da prescrição) e em conformidade com o disposto no art. 303º (invocação da prescrição), ambos do CC, serve a presente missiva para invocar a prescrição que sobre aquelas comparticipações impende, e consequentemente de usar da faculdade de me opor ao exercício daquele prescrito direito. 

Com os melhores cumprimentos,

Local e data

(Nome e assinatura manuscrita)

10 janeiro 2024

Alterações ao regime da PH - art. 1424º e 1424-A - III


4. A NOVIDADE DO ARTIGO 1424º-A, Nº 1 E 2 
 
Nos termos do art. 1424º-A/1 do CC, actualmente a escritura ou o documento particular autenticado de alineação da fracção tem de ser instruída com a declaração emitida pelo administrador da qual conste o montante de todos os encargos de condomínio, em vigor relativamente à fracção, com especificação da sua natureza, respectivos montantes e prazos de pagamento, bem como, caso se verifique, das dívidas existentes, respectiva natureza, montantes, datas de constituição e vencimento (28). 
 
De acordo com o nº 2 do citado artigo, o alienante antes da alienação terá de requerer ao administrador a dita declaração, que este emitirá no prazo máximo de 10 dias, e que será um documento instrutório obrigatório da escritura ou do documento particular autenticado de alienação da fracção em causa (salvo o disposto no nº 3). Esta declaração, por um lado terá de descrever todas as obrigações inerentes ao condomínio no que concerne aos encargos e por outro lado terá de conter as obrigações reais vencidas e não vencidas. 
 
Pretendeu assim, o legislador com esta imposição assegurar que o adquirente tome conhecimento das suas obrigações, enquanto condómino. Preocupante parece-nos o constante do art. 1424º-A/3 do CC que consigna que será civilmente responsável o administrador de condomínio se não emitir a declaração, não a emitir a atempadamente, ou não a emitir de forma exacta e completa. Na verdade, a imposição desta obrigação e as consequências advenientes do seu incumprimento, farão com que muitos condóminos venham a recusar assumir o cargo de administrador, com receio de não conseguirem cumprir de forma adequada a sua obrigação e incorrerem em litígios judiciais indesejáveis. 
 
Julgamos que, sendo o negócio realizado entre o alienante e o adquirente da fracção, deveria ser o alienante, ao abrigo do princípio da boa-fé, a fornecer as informações constantes da dita declaração e não o administrador, que não é sequer um dos contratantes. Por outro lado, esta solução legal provocará uma crescente profissionalização da administração de condomínio, que penalizará os pequenos edifícios, com encargos crescentes. 
 
Tal como anteriormente se referiu, é responsável pelo pagamento das dividas, o proprietário da fracção no momento em que as mesmas deveriam ter sido liquidadas, mas de forma surpreendente, o art. 1424º-A/3 estabelece que se o adquirente expressamente declarar, na escritura ou no documento particular autenticado que titule a alienação da fracção, que prescinde da declaração do administrador, aceitará, em consequência, a responsabilidade por qualquer dívida do vendedor para com o condomínio. 
 
Temos dificuldade em aceitar esta solução como equilibrada e correcta. Isto significa que na sequência de tal declaração, o adquirente irá assumir a responsabilidade pelo pagamento de serviços e despesas dos quais não beneficiou, nem irá beneficiar (29). 
 
Para além disso, o regime do direito das obrigações em geral, particularmente quanto à transmissão singular de dívidas - art. 595º e ss. do CC (assunção de dívida) que exige a intervenção do credor ratificando ou intervindo contratualmente - é aqui preterido, sendo uma alteração que retira coerência e unidade ao sistema jurídico. 
 
5. A INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 6º, Nº 5 DO DL 268/94 ALTERADO PELA LEI 8/2022 
 
O artigo 6º nº 5 do DL 268/94 com a redacção que lhe foi dada pela lei 8/2022 de 10 de Janeiro pretende “obrigar” o administrador a cobrar os créditos do condomínio, fixando-lhe para tal um prazo de 90 dias, a partir do primeiro incumprimento. No entanto, mais uma vez, a sua redacção não nos parece a mais feliz, levantando-se dúvidas interpretativas, senão vejamos: consta do referido nº 5 que “A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil”. 
 
Ora, o legislador pretende impor duas condições cumulativas para que o administrador não tenha de interpor a acção, nomeadamente a existência deliberação e estar perante dívidas de pequeno valor. A exigência de duas condições cumulativas parece resultar da utilização do “e”? Ou pelo contrário, basta estarmos perante uma dívida de pequeno montante para o administrador não esteja obrigado a intentar a acção? De igual forma, se existir apenas a deliberação da Assembleia já não será o administrador obrigado a intentar acção, independentemente do valor do crédito? 
 
Na verdade, parece que o legislador terá tido a intenção de obrigar o administrador a intentar acção judicial no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento, sem necessidade de qualquer autorização da Assembleia, quando que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil. 
 
O administrador só não estará obrigado a fazê-lo quando a Assembleia deliberar no sentido da não cobrança judicial. Assim o refere Márcia Passos, uma das autoras do Projecto de Lei 718/XIV/2 (30). Se esta foi a intenção de legislador parece-nos que a redacção do nº 5 do art. 6º do DL 268/94 deveria ter sido outra, pelo que deveria ter constado: A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos. 
 
Em conclusão se dirá que, a interpretação do pensamento legislativo que parece mais adequada, será no sentido de que:
 - Se o administrador se deparar com um primeiro incumprimento superior a 90 dias, de valor inferior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil, não está obrigado a intentar acção judicial; 
- Estando perante valor inferior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil, só poderá intentar a competente acção se a assembleia deliberar nesse sentido, conferindo-lhe poderes para o efeito. 
- Se a dívida for superior ao valor indexante de apoios sociais do respectivo ano civil e se o primeiro incumprimento do condómino for superior a 90 dias, não só o administrador não necessita de deliberação ou autorização, como estará obrigado a intentar acção (salvo deliberação da Assembleia no sentido da não cobrança).

6. CONCLUSÃO 
 
Da análise que fizemos às alterações introduzidas nas normas referidas, cumpre salientar em conclusão que não nos parece necessária, nem feliz a alteração efectuada ao art. 1424º/1 do CC tanto mais que esta norma já definia quem era o responsável pelo pagamento das despesas condominiais, embora não o fizesse em caso de alienação. 
 
Acresce que, a redacção constante do art. 1424º/1 do CC, encontra-se em contradição com os nº 3 e 4 do art. 1424-A, o que veio provocar dúvidas quanto à sua interpretação, que poderão fomentar a litigiosidade dentro e fora dos tribunais. Não podemos afirmar que o nº 1 do art. 1424º estabelece a regra, e que o nº 3 e 4 do art. 1424º-A, contêm uma excepção, uma vez que o art. 1424º/1 do CC e o art. 1424º-A nº 3 e 4 tratam agora da mesma questão de saber quem será o responsável pelo pagamento das dívidas ao condomínio, em caso de alienação. 
 
De qualquer forma, o art. 1424º-A do CC vem estabelecer que a responsabilidade pelas dívidas existentes é aferida em função do momento em que as mesmas deveriam ter sido liquidadas (nº 3) e os montantes que constituam encargos do condomínio, independentemente da sua natureza, que se vençam em data posterior à transmissão da fracção, são da responsabilidade do novo proprietário (nº 4). 
 
Neste sentido, em caso de alienação da fracção, resulta que o adquirente só será responsável pelo pagamento das dividas condominiais que se vençam após a sua aquisição. Foi assim abandonada a doutrina e a jurisprudência dominante que efectuavam uma análise casuística tendo em atenção a clássica relação entre a obrigação de cumprimento e o gozo da coisa, o que permitia uma solução justa e equilibrada. No entanto, em abono da verdade, a solução legal ao terminar com a análise casuística permite uma maior segurança e certeza na aplicação do direito. 
 
O constante do art. 1424º-A/3 do CC consigna que será civilmente responsável o administrador de condomínio se não emitir a declaração, não a emitir atempadamente, ou se a emitir de forma inexacta e incompleta. A imposição desta obrigação e as consequências advenientes do seu incumprimento, farão com que muitos condóminos venham a recusar assumir o cargo de administrador, provocando uma maior profissionalização da administração de condomínio e um aumento de despesa para os condóminos. 
 
É responsável pelo pagamento das dividas, o proprietário da fracção no momento em que as mesmas deveriam ter sido liquidadas, mas o art. 1424º-A/3 estabelece que se o adquirente expressamente declarar, na escritura ou no documento particular autenticado que titule a alienação da fracção, que prescinde da declaração do administrador, aceitará, em consequência, a responsabilidade por qualquer dívida do vendedor ao condomínio. 
 
Temos dificuldade em aceitar esta solução como equilibrada e correcta. Isto significa que o adquirente irá suportar o pagamento de serviços e despesas dos quais não beneficiou, nem irá beneficiar. Acresce que a punição sofrida pelo facto de não ter pedido uma declaração – suportar o pagamento de dívida alheia - não se mostra adequada, nem razoável. No que diz respeito ao art. 6º, nº 5 do DL 268/94 com a redacção que lhe foi dada pela Lei 8/2022, podemos concluir que se administrador se deparar com um primeiro incumprimento superior a 90 dias, de valor inferior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil, não está obrigado a intentar acção judicial. 
 
Por outro lado, estando perante valor inferior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil, só poderá intentar a competente acção se a assembleia deliberar nesse sentido, conferindo-lhe poderes para o efeito. Por fim, como já se referiu, se a dívida for superior ao valor do indexante de apoios sociais do respectivo ano civil e se o primeiro incumprimento do condómino for superior a 90 dias, não só o administrador não necessita de deliberação ou autorização, como estará obrigado a intentar acção (salvo deliberação da Assembleia no sentido da não cobrança).
 
Notas:

28 Em consonância foi alterado o Código do Notariado - art. 54º/3:” Os instrumentos pelos quais se partilhem ou transmitam direitos sobre prédios, ou se contraiam encargos sobre eles, não podem ser lavrados sem que se faça referência à declaração prevista no nº 2 do art. 1424º-A do CC, sem prejuízo do disposto no nº 3 do mesmo artigo.” 
29 Veja-se a este propósito, Margarida Costa Andrade na exposição de 4/5/2022, efectuada online, denominada “Alterações ao regime da propriedade horizontal – Lei 8/2022 de 10 de janeiro” acedida em 5/9/2022 em https://www.youtube.com/watch?v=prBpoywiLmY
30 Assim o refere Márcia Passos, uma das autoras do Projecto de Lei 718/XIV/2 - https://observatorio.almedina.net/ index.php/2022/01/13/propriedade-horizontal-resumo-das-alteracoes-ao-regime-lei-n-o-8-2022-10-01/. Consultado em12/05/2022