Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
Mostrar mensagens com a etiqueta Deliberações. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Deliberações. Mostrar todas as mensagens

07 março 2025

Anulabilidade, nulidade e ineficácia

A questão que se coloca neste escrito é da natureza do desvalor jurídico susceptível de afectar as deliberações.

Dispõe o nº 1 do art. 1433º do Código Civil (doravante, CC) que “as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado”

A este propósito, ressalva Sandra Passinhas em, "A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal", 2ª ed., pág. 250-251 que,

«Nos termos do artigo 1433º, nº 1, as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriores aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado. A sanção cominada é, portanto, a anulabilidade das deliberações. A lei não se refere às deliberações nulas, nem às ineficazes, que seguem o regime geral. Temos assim em matéria das deliberações da assembleia de condóminos, de distinguir os vícios que enfermam as deliberações de nulidade daqueles que as enfermam de anulabilidade: estas últimas são sanáveis com deliberações sucessivas e a invalidade deve ser feita valer no prazo estabelecido pelo artigo 1433º, sob pena de decadência.»

Por seu turno, Pires de Lima e Antunes Varela em, "Código Civil Anotado", Vol. III, 2ª ed., pág. 448, afirmam que:

«Quando a Assembleia infrinja normas de interesse e ordem pública (suponha, por. ex., que a assembleia autoriza a divisão entre os condóminos de alguma daquelas partes do edificio que o nº1 do art. 1421º considera forçosamente comuns; que suprime, por maioria, o direito conferido pelo nº1 do art. 1428º; que elimina a faculdade, atribuída pelo art. 1427º a qualquer condómino, de proceder a reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício; que suprime o recurso dos atos do administrador a que alude o art. 1438º; ou que dispensa o seguro do edifício contra o risco de incêndio, diversamente do que se dispõe no nº1 do art. 1429º), as deliberações tomadas devem ser consideradas nulas, e como tais, impugnáveis a todo o tempo e por qualquer interessado, nos termos do art. 286º. Se assim não fosse, estaria na mão dos condóminos derrogar os preceitos em causa (…)

Resulta daqui que quando a assembleia de condóminos delibere sobre assuntos para os quais não tem competência (tal será o caso em que, por exemplo, a assembleia sujeite ao regime das coisas comuns, sem o consentimento do respetivo titular, uma parte do prédio pertencente em propriedade exclusiva a um dos condóminos), a deliberção deve considerar-se ineficaz desde que a não ratifique, podendo o condómino afectado a todo o tempo arguir o vício de que ela enferma, ou por via de excepção, ou através de uma acção meramente declarativa. 

E este é, sem dúvida, o regime mais aconselhável, porquanto seria violento, com efeito, obrigar o condómino afectado a propor num curto prazo, e sob pena de convalidação do acto, uma acção anulatória de uma deliberação tomada sobre assunto estranho à esfera de competência da assembleia. De resto, a sanção da ineficácia é a que a lei comina para os actos praticados por um representante sem poderes (cfr. art. 268º, nº1 do CC), e as duas situações são em tudo análogas: em qualquer dos casos faltam ao autor ou autores do comportamento negocial os poderes necessários para interferir na esfera jurídica de outrem (…)».

Ainda a este propósito, Vítor Fernandes Rodrigues em, "Prédio Urbano em Regime de Propriedade Horizontal. Os Direitos e Deveres dos Condóminos", 2013, pág. 73-74, sistematiza assim os vícios das deliberações das assembleias de condóminos:

«As deliberações podem ser nulas, ineficazes e anuláveis. Ou seja, o art. 1433.º, n.º 1 do C.C., declara anuláveis as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados. Ao passo que o n.º 2 do artigo citado, faculta aos condóminos presentes que votaram contra e aos condóminos ausentes a possibilidade de exigirem ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.

Assim, são nulas as deliberações tomadas em reunião dos condóminos que infrinjam normas de caráter imperativo, por visarem a prossecução de interesses indisponíveis e de ordem pública, como exemplo as deliberações que violem o art. 1421º e 1422º do CC entre outros.

A deliberação cujo conteúdo colida com a norma imperativa é nula. Em caso de nulidade este vício poderá ser suscitado por qualquer interessado, condómino ou não, sem dependência do prazo (cfr. art. 286º do CC).

Deste modo, são anuláveis as deliberações da assembleia que, recaindo sobre o objecto que são da sua competência, incidam sobre as partes comuns do condomínio, ou seja, as normas que violem preceitos da lei material ou procedimental aplicáveis a regulamentos que se encontram em vigor.

Em conjunto das deliberações nulas e anuláveis temos ainda as deliberações ineficazes, cujo objecto dos assuntos excedem a esfera da competência da assembleia dos condóminos, seja porque dizem respeito à propriedade individual ou própria de qualquer proprietário, seja porque representam ou extravasam o domínio da administração individual que qualquer condómino tem sobre a sua fracção autónoma.

Também serão ineficazes, por exemplo, as deliberações que:
    • Admitem aos condóminos o direito de preferência na alienação de outras frações (cfr. art. 1423º do CC); 
    • As que autorizem inovações nas partes comuns do edifício que lesem a utilização, por parte de algum dos condóminos tanto das coisas próprias como as das comuns (cfr. art. 1425º, nº 2 do CC);
    • As privem um condómino do uso privativo de uma coisa, como tal considerada no título constitutivo da propriedade horizontal;
    • As que exijam obstar a que um condómino dê à sua fracção qualquer utilização lícita, desde que o título constitutivo não conste o fim específico a que a mesma se destina;
    • As que sujeitam ao regime das coisas comuns, sem ou contra a vontade do respetivo titular, uma parte do prédio, pertencente em exclusividade a um condómino, ainda que se trate de uma parte secundária da habitação, como seja, por ex., uma arrecadação ou arrumo, em lugar de parqueamento ou uma garagem».
Atento o que fica dito, entende-se outrossim que qualquer deliberação da assembleia de condóminos que tenha decidido afectar as receitas resultantes de um contrato de cessão de um espaço comum, ao pagamento de quotizações, ordinárias e/ou extraordinárias de que os próprios condóminos são devedores, prescindindo do assentimento de todos, padece do vício da ineficácia.

Com efeito, ao deliberar dessa forma, a assembleia de condóminos está a dispor do direito de propriedade dos condóminos sobre tais quantias, direito que não lhe pertence de todo, sendo certo que os mesmos não lhe cometeram a respectiva gestão, nem a afectação do mesmo resulta sequer de regulamento do condomínio. Assim, sem prejuízo dos autores ractificarem tais deliberações, os condóminos afectados pela ineficácia podem arguir tal vício a todo o tempo.

21 novembro 2024

Deliberações ineficazes

A ineficácia stricto sensu e as invalidades (nas suas variantes de nulidade, anulabilidade e inexistência) integram-se no género mais amplo da ineficácia lato sensu. Enquanto nas invalidades há sempre um vício que atinge a estrutura interna do contrato, na ineficácia stricto sensu nada há que inquire essa estrutura interna, ficando apenas suspensos os efeitos exteriores do contrato.

O regime insito no art. 268º do CC é o seguinte: 

a) celebrado o contrato, ele é ineficaz antes de o gerido o ractificar;  

b) o outro contraente pode em qualquer momento revogá-lo antes de ratificado, se não sabia da gestão, se sabia, não pode revogá-lo, tendo de esperar pela ratificação ou sua recusa, tornando-se então o contrato eficaz ou definitavamente ineficaz;

c) de qualquer modo, o outro contraente pode fixar ao gerido um prazo dentro do qual este tem o ónus de o ratificar ou recusar, de modo a não permanecer indefenidamente numa situação ambígua e à mercê da vontade e da arbitrariedade do gerido; não havendo ratificação do negócio nesse prazo, esta tem-se por recusada.

Nesta conformidade, a ractificação é uma declaração unilateral de vontade de natureza receptícia, pelo que só produz os seus efeitos quando é recebida por aquele a quem se dirige. Assim, na ineficácia negocial o regate é similar ao das invalidades absolutas: qualquer contraente pode requerer a declaração judicial da ineficácia do contrato.

Aqui, a nulidade é, pois, uma forma de ineficácia que procede de um vício na formação do negócio jurídico, da falta ou irregularidade de um dos elementos essenciais e internos desse negócio jurídico. A ineficácia (em sentido estrito) deriva assim de vício referente a circunstância externa do negócio jurídico, não emergente de vício de elemento interno do mesmo.

A ineficácia derivada do exercício da acção pauliana é um caso nítido de ineficácia relativa; porque impede a produção dos normais efeitos do negócio jurídico apenas em relação a certas pessoas, restringindo-se a estas a legitimidade para a invocar.

A procedência da impugnação pauliana mantém todos os efeitos jurídicos do negócio impugnado, designadamente os translativos da propriedade, excepto no respeitante ao impugnante e somente na medida da satisfação dos seus créditos invocados e reconhecidos, sem contudo sair do património do adquirente impugnado, enquanto que os efeitos da nulidade são a destruição, com retroactividade de todos os efeitos jurídicos do negócio jurídico, e obrigação do que tiver sido recebido em função dele.

Destarte, não sendo ilícito nem inválido o negócio celebrado pelo administrador sem poderes de representação, o mesmo é ineficaz (cfr. art. 268º, nº1 CC), abrindo-se então uma situação de pendência durante a qual não se sabe se o acto produzirá ou não efeitos, pendência da qual se sai através de ractificação promovida pelo mesmo ou de revogação ou rejeição pelo condómino que não aprovou.

Decorre do art. 268º, nº 1 do CC que: O negócio (prática de um acto) que uma pessoa (no caso, a assembleia), sem poderes de representação (sem autorização de todos os condóminos), celebre em nome de outrem (dos condóminos que não aprovaram a deliberação) é ineficaz em relação a este (os referidos condóminos que não aprovaram), se não for por ele ratificado (vide art. 1432º do CC). Entre parêntesis, comentários nossos.

A actuação em nome de outrem constitui o ponto central da representação em sentido próprio. O representante age para vincular o representado com contemplatio domini (art. 258.º CC). Mas o acto pode ser praticado em nome e por contra de outra pessoa sem que, para tanto, existam os necessários poderes de representação. Nesse caso, rege o art. 268º, nº1 do CC: o negócio é ineficaz relativamente ao dominus, se este o não ratificar.

É certo que, à partida, por falta de legitimidade do procurador, o negócio deveria ser nulo, mas a verdade é que pode ser favorável ao dominus e, se o for, este pode ractificá-lo e o negócio segue válido e eficaz.

A ineficácia distingue-se da invalidade (nulidade e anulabilidade) uma vez que na primeira o negócio, sendo válido, não produz os efeitos ou todos os efeitos a que tenderia, segundo as declarações negociais que o compõem. Na invalidade, verifica-se a total ausência de efeitos jurídicos, desde a respetiva formação.

No caso da representação sem poderes, a ineficácia não é absoluta, não operando erga omnes, mas relativa, verificando-se apenas em relação ao representado, falando-se assim em inoponibilidade. Deste modo, os negócios feridos de ineficácia relativa produzem efeitos “mas não estão dotados de eficácia relativamente a certas pessoas. Daí que sejam, por vezes, apelidados de negócios bifronte ou com cabeça de Jano (C. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Ed., p. 607).

Não sendo ilícito nem inválido o negócio celebrado sem poderes de representação, salienta Oliveira Ascensão que:

«celebrado o acto, abre-se uma situação de pendência, durante a qual não se sabe se o acto produzirá ou não efeitos. Dessa pendência sai-se através de:
- ratificação
- revogação ou rejeição pela outra parte.
De facto, não se compreenderia que a outra parte ficasse permanentemente na indefinição. A lei dá-lhe assim dois meios de sair daquela situação:
a) Fixar prazo para a ratificação, sem o que a ratificação se considera negada (art. 268/3),
b) pôr termo potestativamente à situação, revogando ou rejeitando o negócio (art. 268/4).»

Tratando-se de uma situação de ineficácia, não lhe é aplicável o disposto no art. 291º do CC que se refere a negócios inválidos, protegendo, não os contraentes no negócio invalidado, mas os terceiros adquirentes.

Atento o que ficou dito, não constitui abuso de direito pretender-se ractificar fora de prazo um contrato ineficaz, contudo, o Tribunal pode, mesmo em sede de recurso, declarar a ineficácia ainda que o pedido tenha sido (erradamente) o da nulidade.

Acresce sublinhar para o caso que, pedindo o autor a invalidade por nulidade ou anulabilidade do negócio celebrado por quem não tinha direitos de representação, mas tratando-se de negócio ineficaz relativamente ao putativo representado (cfr. citado art. 268º, nº 1 CC), deve o tribunal corrigir oficiosamente esse erro e declarar tal ineficácia, nos termos do art. 5º, nº 3 do CPC.

02 julho 2024

Deliberações unânimes e assembleias universais


O art. 54º nº1, do Código das Sociedades Comerciais (CSC) consagra as figuras das deliberações unânimes por escrito e das assembleias totalitárias ou universais, permitindo, respectivamente, que a vontade social se manifeste fora do conclave ou em assembleia não regularmente convocada, ou sobre assunto não previamente tabelado.

Este art. 54º CSC, sob a epígrafe «Deliberações unânimes e assembleias universais», regula dois tipos de situações: A primeira é a possibilidade de, em qualquer sociedade, os sócios poderem «tomar deliberações unânimes por escrito». Trata-se de uma forma de deliberação em que se prescinde da reunião (vulgo, “assembleia geral”) dos sócios e do método colegial. Precisamente porque este método ou forma afasta o método ou forma tradicional (reunião da assembleia geral) a lei exige que todos os sócios concordem com as propostas de deliberação. A segunda situação regulada é a das assembleias gerais universais, também chamadas “totalitárias”.

Essas assembleias gerais caracterizam-se por serem reuniões em que não foram observadas as formalidades legais relativas à sua convocação, mas em que, estando presentes todos os sócios ou representados todos os sócios e todos manifestando a vontade de que a reunião se constitua como assembleia geral para deliberar sobre determinado ou determinados assuntos, tal é legalmente admissível.

Bem se compreende que quer a deliberação unânime por escrito quer a assembleia universal só sejam viáveis em sociedades com um reduzido número de sócios. Diferente é a deliberação por voto escrito, prevista no art. 247º nºs 1 e 2, também do CSC, só admissível nas sociedades por quotas ou em nome colectivo.

Contudo, no que aqui nos aproveita, sempre se pode dizer que, no âmbito da propriedade horizontal, o voto por escrito, dentro ou fora do conclave, e que "in casu", irreleva, não é admissível, porquanto, inexistindo dialéctica, não há troca de opiniões, de argumentos e de novas informações.

No que concerne à assembleia universal, esta pressupõe a presença de todos os condóminos - pessoalmente ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - e de estar ínsito o propósito de deliberar sobre assuntos de interesse para o condomínio e existir acordo unânime no sentido de se deliberar sobre determinado(s) assunto(s).

Nesta factualidade, importa desde logo salientar que a deliberação final da assembleia totalitária não exige a unanimidade, sendo aprovada nos termos gerais (maiorias simples ou qualificadas quando a matéria em discussão assim o exija).

Trata-se pois, este, de um procedimento concludente e inequívoco da vontade de os condóminos se reunirem sem a necessidade de se observarem os exigidos requisitos havidos fixados no art. 1432º do CC, e de deliberar, pelo que, nenhum terá legitimidade para colocar em crise o que se decidir em plenário, argumentando, no caso, que enferma a assembleia de anulabilidade por vício por a assembleia não ter sido regularmente convocada, ou, sendo-o, com discussão de assuntos não incluídos previamente na ordem de trabalhos.

A assembleia totalitária ou universal justifica-se por, face à presença do universo dos condóminos, estar garantida uma plena participação para se lograr a obtenção de deliberações válidas, independentemente de, a montante, não existir uma convocatória formalmente regular ou de o assunto não estar previamente inscrito na respectiva ordem de trabalhos.

Aduz-se daqui, obviamente que, havendo a assembleia convocada nos termos fixados na lei, e contanto estejam presentes e/ou representados por mandatários, todos os condóminos que reúnam a totalidade do capital investido no prédio, nada obsta a que, havendo o acordo de todos, se incluam novas matérias na ordem de trabalhos e sobre as mesmas se delibere.

Vale isto por dizer que, são requisitos de regularidade da assembleia universal a presença de todos os condóminos - por si, ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - o estar ínsito o propósito de deliberarem sobre assuntos com interesse para o condomínio e o acordo unânime de se deliberar sobre essas determinadas temáticas.

Porém, já não será de exigir a unanimidade na tomada de deliberações subsequentes, as quais que serão aprovadas nos termos gerais - cfr. neste sentido douta opinião do Dr. Pedro Maia "Deliberações dos sócios" in "Estudos de direito das sociedades", 5ª ed., 2002, 175, e Cons. Pinto Furtado, "Deliberações dos Sócios".


21 novembro 2023

Legitimidade locatário financeiro


Os locatários financeiros não têm legitimidade para intervir e deliberar em assembleia de condóminos. Em seu apoio os acórdãos do TRP de 26.10.2006 e de 6.5.2008 e o acórdão do STJ de 24.6.2008. Em sentido contrário, o acórdão do TRP, de 02/23/2012 e o acórdão do STJ de 6-11-2008.

Os corpos jurídicos a convocar para a resolução da questão são o regime da propriedade horizontal e o regime da locação financeira. As versões vigentes à data dos factos não alteraram as disposições citadas na jurisprudência que antecede.

Da banda do primeiro, sabemos que as fracções de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de PH (art. 1414º do CC), que “A propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico, usucapião, decisão administrativa ou decisão judicial, proferida em acção de divisão de coisa comum ou em processo de inventário” (art. 1417º do CC), que o respectivo título constitutivo deve conter (art. 1418º do CC) a especificação das “(…) partes do edifício correspondentes às várias fracções, por forma que estas fiquem devidamente individualizadas, e será fixado o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem, do valor total do prédio”. Pode ainda conter as menções descritas no nº 2 do mesmo preceito, a saber entre outras, “o fim a que se destina cada fracção ou parte comum e o regulamento do condomínio”. Sabemos também que (art. 1419º) “1 - Sem prejuízo do disposto no nº 3 do art. 1422.º-A e do disposto em lei especial, o título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado por escritura pública ou por documento particular autenticado, havendo acordo de todos os condóminos”.

Por outro lado, o art. 1420º do CC estipula que cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, sendo o conjunto dos dois direitos incindível, sendo que (art. 1424º do CC) “1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”, regra que se aplica também ao custeio das obras inovatórias – art. 1426º nº 1 do CC – e que igualmente vinculam os condóminos que não tenham aprovado as obras salvo recusa fundamentada.

Ora, relativamente às partes comuns, o art. 1430º do CC prevê que “1. A administração das partes comuns do edifício compete à assembleia dos condóminos e a um administrador. 2. Cada condómino tem na assembleia tantos votos quantas as unidades inteiras que couberem na percentagem ou permilagem a que o art. 1418.º se refere”.

Donde, conjugado o art. 1420º com o art. 1430º, ambos do CC, o proprietário de uma fracção é condómino e pode por isso participar na assembleia de condóminos, deliberando segundo os seus votos, o que aí houver a deliberar ou impugnando as deliberações tomadas contra a sua vontade.

Ora, como proprietário, o condómino “goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição da coisa que lhe pertence dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas.” (art. 1305º do CC).

Destes preceitos decorre que o condómino, como a própria palavra de origem latina o indica, é o dono, proprietário da coisa própria e comproprietário da coisa comum. Como comproprietário pode inclusive, alterar, com o acordo de todos os outros condóminos, o título constitutivo da propriedade horizontal, introduzir alterações, inovações à coisa comum. Como proprietário pode alienar o bem, onerá-lo, introduzir-lhe inovações, enfim praticar todos os actos constitutivos do direito de propriedade.

Podem estes extensos poderes ser assumidos integralmente pela pessoa do locatário financeiro?

Da banda do regime jurídico da locação financeira, aprovado pelo DL 149/95 de 24.6 com as alterações dos DL 265/97 de 2.10, DL 285/2001 de 3.11 e DL 30/2008 de 25.2, sabemos que:
A “Locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados” – art. 1º. A locação financeira tem como objecto quaisquer bens susceptíveis de serem dados em locação, e portanto também imóveis – art. 2º, nº 1.

Nos termos do art. 7º “Findo o contrato por qualquer motivo e não exercendo o locatário a faculdade de compra, o locador pode dispor do bem, nomeadamente vendendo-o ou dando-o em locação ou locação financeira ao anterior locatário ou a terceiro”.

O art. 9º estabelece que são obrigações do locador, “a) Adquirir ou mandar construir o bem a locar; b) Conceder o gozo do bem para os fins a que se destina; c) Vender o bem ao locatário, caso este queira, findo o contrato” Nos termos do nº 2 do mesmo preceito, “2 - Para além dos direitos e deveres gerais previstos no regime da locação que não se mostrem incompatíveis com o presente diploma, assistem ao locador financeiro, em especial e para além do estabelecido no número anterior, os seguintes direitos: a) Defender a integridade do bem, nos termos gerais de direito; (…)”.

Por parte do locatário, a lei estipula as suas obrigações nos termos do art. 10º que aqui apenas referiremos na parte relevante: - “b)- Pagar, em caso de locação de fracção autónoma, as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum;” c) Facultar ao locador o exame do bem locado; d) Não aplicar o bem a fim diverso daquele a que ele se destina (…) salvo autorização do locador; e) Assegurar a conservação do bem e não fazer dele uma utilização imprudente; f) Realizar as reparações, urgentes ou necessárias, bem como quaisquer obras ordenadas pela autoridade pública;
(…) i) Avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios no bem ou saiba que o ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos em relação a ele, desde que o facto seja ignorado pelo locador; j) Efectuar o seguro do bem locado, contra o risco da sua perda ou deterioração e dos danos por ela provocados; k) Restituir o bem locado, findo o contrato, em bom estado, salvo as deteriorações inerentes a uma utilização normal, quando não opte pela sua aquisição”.

O mesmo preceito estabelece, no seu nº 2 o seguinte: “Para além dos direitos e deveres gerais previstos no regime da locação que não se mostrem incompatíveis com o presente diploma, assistem ao locatário financeiro, em especial, os seguintes direitos: (…)
b) Defender a integridade do bem e o seu gozo, nos termos do seu direito; c) Usar das acções possessórias, mesmo contra o locador; d) Onerar, total ou parcialmente, o seu direito, mediante autorização expressa do locador; e) Exercer, na locação de fracção autónoma, os direitos próprios do locador, com excepção dos que, pela sua natureza, somente por aquele possam ser exercidos; (…)”.

Resulta ainda do art. 12º que “O locador não responde pelos vícios do bem locado ou pela sua inadequação face aos fins do contrato, salvo o disposto no art. 1034.º do CC” e resulta do art. 13º que “13 O locatário pode exercer contra o vendedor ou o empreiteiro, quando disso seja caso, todos os direitos relativos ao bem locado ou resultantes do contrato de compra e venda ou de empreitada”.

Finalmente, o art. 15º estipula que “Salvo estipulação em contrário, o risco de perda ou deterioração do bem corre por conta do locatário”.

Percorrido este regime, vemos que no contrato de locação financeira coexistem dois tipos contratuais: a compra e venda de um bem e a sua locação, existindo normalmente uma relação triangular, envolvendo o fornecedor, o locador financeiro e o locatário.

A propriedade da coisa locada transfere-se apenas no termo do contrato, optando o locatário pela sua aquisição e pagando o respectivo valor residual. Trata-se no entanto de uma mera opção do locatário, no termo do contrato, que pode não ser exercida (art. 9º do referido DL).

O locatário financeiro não é pois o titular do direito de propriedade, que permanece na esfera do locador. Aliás, se o locador adquiriu para o locatário, se o bem reverte para ele se o locatário não o quiser adquirir no final, se o locatário tem de conservar o bem, se o locador tem o direito de examinar o bem e o direito de defender a sua integridade, tudo indica que juridicamente o locador é o proprietário, nos termos dos art. 1302º e 1305º ambos do CC.

Tem porém sido discutido na nossa jurisprudência e doutrina se efectivamente o locatário financeiro pode ser considerado condómino para efeitos de qualquer tipo de deliberação social ou de impugnação de deliberações sociais.

Tem sido defendido por alguma da nossa jurisprudência que condómino não pode ser o locatário financeiro, mas apenas o locador, proprietário do bem e que se mantém como tal até ao exercício dessa opção. (neste sentido vidé o Ac. do S.T.J. de 24/06/2008 proferido no âmbito do proc. nº 08A1755, disponível para consulta in www.dgsi.pt, relatado pelo Sr. Conselheiro Moreira Camilo, contendo um voto de vencido e Ac. do TRP de 26/10/06 proc. nº 0635535, igualmente disponível para consulta in www.dgsi.pt). Em sentido contrário temos o Ac. do TRP de 23/02/2012, proferido no Proc. nº 5564/10.8, disponível para consulta in www.dgsi.pt, igualmente com um voto de vencido.

No mesmo sentido deste acórdão, veja-se Sandra Passinhas, “A Assembleia de Condóminos e a Administração na Propriedade Horizontal”, Almedina, a pág. 230, defendendo que “nos termos do artº 10º, nº1, al. e) do DL nº 149/95, de 24 de Junho [..], o locatário exerce, na locação da fracção, os direitos próprios do locador, com excepção dos que, pela sua natureza, somente possam por aquele ser exercidos. No direitos próprios do locador, entendemos que cabe o direito de voto na assembleia de condóminos” - sublinhado nosso. (Ac. do TRP de 26/10/06 proc. nº 0635535, disponível para consulta in www.dgsi.pt, embora este acórdão se pronuncie pela negativa, interpretando a afirmação da supra referida autora, como a negação do direito de locatário votar, o que nos parece ser o contrário do por ela defendido).

Nasce esta discordância da aplicação do mencionado regime da PH, que define como condómino o proprietário, confrontado com o disposto no regime especial da locação financeira, mormente no art. 10º do DL 149/95, e sobretudo da al. e) do nº 2, que estipula os direitos do locatário, reservando porém os direitos que só pelo locador pudessem ser exercidos.

Vem este diploma e preceito na sequência do que se dispunha no âmbito do DL 10/91 (artº 9) que possibilitava aos locatários financeiros participar e votar em assembleias gerais, podendo inclusivamente ser eleitos para cargos, referindo-se expressamente este preceito à propriedade horizontal.

Tal disposição não foi vertida nos seus precisos e claros termos para a actual lei, conforme decorre da versão do artº 10 nº2 e) do DL 149/95, referindo-se na actual disposição ao direito do locatário de exercício dos direitos próprios do locador, excepto aqueles que somente possam ser por ele (locador) exercidos.

Entendemos no entanto, que o exercício dos direitos próprios do locador inclui o direito de voto, excepto naqueles casos em que estão em causa direitos que só pelo proprietário do bem possam ser exercidos, como a alteração do título constitutivo, ou a introdução de inovações ou alterações das partes comuns, matéria que entendemos excluída dos direitos do locatário financeiro, por se repercutirem no direito de propriedade do locador.

Entendemos ainda que ao locatário financeiro está-lhe vedado deliberar quanto a obras de inovação no prédio com que o locador pudesse estar em desacordo, bem como dar o seu acordo para a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, por se tratarem de direitos que só pelo locador podem ser exercidos.

De resto, repare-se que algumas obras de inovação podem mesmo exigir posteriormente a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal.

12 outubro 2023

Regime jurídico das deliberações da AG


Conclusão
 
O estudo do regime jurídico das deliberações das assembleias de condóminos permitiu-nos chegar a, não uma, mas várias conclusões. Apresenta-se, desde já, a mais vaga, mas também a mais importante e evidente de todas: é premente uma reforma legislativa no que a esta matéria diz respeito.
 
A elaboração da presente exposição iniciou-se com diversas questões que, na sua maioria, se encontravam relacionadas com a interpretação das normas civilísticas que regem a propriedade horizontal. É que estamos perante um regime não raras as vezes insuficiente, deixando nas mãos do intérprete uma excessiva tarefa de interpretação, muitas vezes com recurso à analogia. O resultado: um emaranhado de soluções doutrinais e jurisprudenciais que tentam apertar a desafogada malha da lei, levando frequentemente a soluções distintas e até contraditórias entre si. 
 
Todo este quadro gera uma incerteza e uma insegurança jurídicas que afectam o verdadeiro destinatário do instituto – o condómino -, pondo em causa a estabilidade do condomínio e até mesmo as relações entre os moradores e/ou proprietários das fracções autónomas. 
 
Concretizemos.
 
Da mera leitura da lei poder-se-ia retirar que tão-só as exigências de unanimidade (mitigada) e de maioria simples para aprovação de deliberações são susceptíveis de uma flexibilização em segunda convocatória. Porém, entendemos que a possibilidade de convocar uma segunda reunião deve ser reconhecida também perante deliberações que careçam de maioria qualificada e, por outro lado, considerámos estar, neste aspecto, perante uma lacuna, a preencher com respeito pelo espírito da lei e por aquela que haveria de ser a vontade do legislador. 
 
Recorrendo à analogia, concluímos que o cumprimento da maioria qualificada em dois momentos distintos deve ser permitido, ainda que com as devidas adaptações, à semelhança do que acontece perante as outras exigências de aprovação.
 
Relativamente aos vícios nas deliberações, reconhecemos a existência de deliberações nulas, anuláveis, ineficazes e inexistentes, explanando as devidas distinções. Tivemos ainda oportunidade de ver que nem todas as deliberações que violam disposições imperativas são necessariamente nulas e que, por isso, o nº 1 do art. 1433º não deixa de se aplicar quando estejam em causa normas injuntivas. 
 
Concluímos, por outro lado, que a jurisprudência não faz a devida compartimentação entre os vícios que se reconduzem ao art. 280º, nº 1 e aqueles aos quais se aplica o art. 294º. 
 
Na mesma linha de raciocínio, deixámos algumas sugestões para o intérprete perceber se está perante normas inderrogáveis ou não e, se sim, em que casos é que a sua violação justifica a nulidade. 
 
Parece-nos que esta é uma das matérias que mais carece de reforma, sendo necessário o recurso a muitos conceitos gerais, não sendo, por isso, suficientemente clara para o aplicador leigo que é, muitas vezes, o próprio administrador.
 
Por fim, foi possível aludir aos meios não judiciais, cuja aplicação deve (ou, pelo menos,deveria) ser preferível, não só pela celeridade que os caracteriza, mas também por não serem potenciadores de conflitos entre condóminos. 
 
Quanto às vias judiciais, concluímos que o prazo para propositura de acção de anulação se inicia na data da deliberação, independentemente de se tratar de condómino presente ou ausente, salvo se este último não tiver sido regularmente convocado. Também aqui reconhecemos que a formulação adoptada pelo CPC se afigura muito mais clara e objectiva, pelo que seria importante a sua importação, com as devidas adaptações, para o Código Civil.
 
Em relação aos prazos de caducidade das duas vias estudadas, considerámos que estes não são de conhecimento oficioso e que correm em paralelo. 
 
Quanto à legitimidade, entendemos que é reconhecida legitimidade formal ao administrador do condomínio para determinadas acções, não se colocando a questão da sua legitimidade processual, aferida em concreto. Por outro lado, defendemos que o administrador não tem legitimidade passiva, pelo que deverão ser demandados todos os condóminos que aprovaram a deliberação inquinada, ainda que possam ser representados judiciariamente por aquele.
 
É evidente que muitas outras conclusões foram tendo lugar ao longo de todo este “relatório”, pelo que se mencionam aqui apenas as que assumem maior relevância.

O apelo é, reitere-se, o da reforma legislativa de um instituto que se mantém inalterado há quase vinte e cinco anos e que, infelizmente, não tem acompanhado o boom da construção em altura sujeita ao regime da propriedade horizontal. 

11 outubro 2023

Suspensão das deliberações - Decisão


4.2.2.6 Suspensão das deliberações - Decisão
 
No que diz respeito à decisão, o facto de uma deliberação ser contrária à lei ou aos estatutos não determina, automaticamente, que ela irá ser suspensa. Com efeito, o juiz deve pesar os dois pratos na balança, colocando, num lado, o prejuízo provável do(s) condómino(s) requerente(s) com a execução da deliberação, cuja alegação e prova terão de ser feitas por ele(s) e, no outro lado, o prejuízo provável do(s) condómino(s) requerido(s), que igualmente têm o ónus de o provar (art. 381º, nº 2, CPC)(228). 
 
Ao contrário do que acontece no procedimento cautelar comum, não é necessário que se verifique um excesso considerável do prejuízo do(s) requerido(s) em relação ao prejuízo do(s) requerente(s) – “basta que ele seja superiora este para que o juiz, consideradas as circunstâncias do caso, possa recusar a providência” (229). Em consonância com a posição adoptada relativamente à legitimidade passiva, não podemos aqui aceitar o entendimento de Sandra Passinhas que, no seguimento da sua doutrina, considera que o juízo de ponderação a ser feito tem, de um lado, o interesse do condómino impugnante e, do outro, o “condomínio resistente em não ver prejudicada, por comportamentos dilatórios, a funcionalidade da gestão da coisa comum” (230).
 
É que, como temos vindo a defender, os réus desta providência cautelar haverão de ser os condóminos que aprovaram a deliberação e, nesse sentido, não se pode considerar, sem mais, que é do lado passivo que se encontra o interesse do condomínio enquanto colectividade. Contudo, entendemos que o interesse do condomínio não deve ser descurado, devendo o juiz, no exercício do seu prudente arbítrio, indagar sobre o que será mais prejudicial para a comunidade de condóminos.
 
Ainda no âmbito do art. 381º do CPC,o legislador estabeleceu que a citação suspende, de imediato, a execução da deliberação até à decisão de primeira instância, sendo ilícito ao condomínio executá-la durante esse período (cfr. nº 3). Trata-se de um modo que o legislador encontrou para fazer face ao periculum in moraque resulta do próprio procedimento cautelar e de uma forma de responsabilizar aqueles que pratiquem actos de execução da deliberação depois da citação (231). A gravidade desta consequência implica, portanto, que o juiz proceda a um exame mais consciente e rigoroso do requerimento,já que a sua decisão no sentido de citar o administrador pode levar a que um pedido infundado de uma deliberação paralise, injustamente (232) – ainda que de modo provisório -, a vida condominial.

Posteriormente,com a decisão de primeira instância, cessa o efeito legal de suspensão imposto pelo nº 1 do art. 383º. Ora, havendo recurso de tal decisão, o efeito da sua subida vai depender do sentido que aquela tenha tomado. Assim, sendo decretada a suspensão da deliberação, o eventual recurso tem efeito meramente devolutivo (nº 1 do art. 647º, CPC). Tal significa que a decisão é imediatamente exequível e, obrigando à suspensão,a deliberação não pode, novamente, ser executada até que haja uma decisão em contrário. Não obstante, nos termos do arts. 649º, nº 2 ex vi 647º, nº 4, CPC, o recorrente que pretenda executar a deliberação enquanto aguarda pela decisão do tribunal a quo pode requerer a prestação de caução (233).

Ainda que nos pareça uma hipótese remota, o recorrente terá de “procurar convencer o tribunal de que a suspensão (...) da decisão recorrida evitará prejuízo considerável que pode emergir da atribuição de efeito meramente devolutivo” (234). A título exemplificativo, a assembleia delibera a implementação de ascensores no prédio e tal deliberação é suspensa por decisão de primeira instância. Ora, tendo a apelação, neste caso, efeito meramente devolutivo, tal significa que a decisão tem de se cumprir e, portanto, a deliberação não pode ser executada. Não obstante, se o recorrente requerer a prestação de caução e a decisão de suspensão da deliberação passara ter efeito suspensivo, tal significa que não se extraem efeitos jurídicos da decisão antes do  seu trânsito em julgado, pelo que os condóminos podem seguir com a implementação dos ascensores. 
 
Trata-se de um exemplo meramente académico, na medida em que a prestação de caução num caso destes só se justificaria se houvesse muita probabilidade de a decisão de primeira instância ser revogada, o que, naturalmente, é de muito difícil previsão. Não sendo decretada a providência,a deliberação da assembleia passa a poder ser executada imediatamente, uma vez que se encontra ultrapassado o momento previsto no art. 381º, nº 3, CPC. 
 
Havendo recurso de tal decisão judicial,refere a al. d) do nº 3 do art. 647º, CPC que este terá efeito suspensivo. Neste sentido, Abrantes Geraldes e Teixeira de Sousa afirmam que “nenhum efeito prático se extrai de tal regime” (235). É que a situação que se verifica após a instauração de recurso de decisão que não decrete a providência é, efectivamente, igual à que se verifica após ser proferida essa mesma decisão, já que em qualquer dos momentos é permitida a execução da deliberação da assembleia. Com efeito, está previsto o efeito suspensivo da decisão negativa, mas efeito suspensivo de quê se nada foi ordenado pela decisão recorrida?  Trata-se de uma mera negação do pedido de suspensão e, por isso, os efeitos que haveriam de se suspender por força do art. 647º, nº 3, d), CPC simplesmente não existem. 
 
A interposição do recurso não vem, portanto, provocar qualquer alteração na ordem jurídica conformada pela decisão da primeira instância, podendo a deliberação ser executada como se não existisse qualquer recurso contra aquela. No exemplo supracitado, perante a decisão que não suspenda a deliberação de implementação dos ascensores, o facto de a apelação ter
efeito suspensivo nada vai alterar e, por isso, os condóminos podem praticar actos de execução da deliberação.

Notas

226. Ac. TRE de 19/05/2016.
227. Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 98.
228. Rui Pinto Duarte, “O procedimento...”, p. 33: “Julgo que o poder dado ao juiz deve ser interpretado como um poder-dever. O mesmo é dizer que o juiz deve comparar dois danos possíveis: o resultante da execução e o resultante da suspensão da execução.”
229. Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit.,p. 100.

230. Sandra Passinhas, op. cit., p. 262.
231. “Em vez de a decisão de improcedência do pedido cautelar funcionar como causa extintiva de efeitos suspensivos já produzidos é, ao invés, a decisão de procedência do pedido cautelar que, operando um efeito retroactivo, sujeita a responsabilidade civil desde a citação (...) o executor da deliberação impugnada; este tomará ou não o risco da execução consoante a apreciação que dele faça”, Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 101 e Lobo Xavier, “O conteúdo...”, pp. 84 a 90.
232. Para Rui Pinto Duarte, “O procedimento...”, p. 34, “esta é talvez a norma que mais merecia reforma. O seu conteúdo é paradoxal, (...) é fonte de gravíssimos prejuízos injustos, resultantes da lentidão da marcha dos procedimentos. Se o efeito inibidor em causa durasse um mês, a entidade citada para o procedimento não sofreria, na maior parte dos casos, prejuízos graves por força de tal inibição. Como o efeito inibidor costuma durar muitos meses ou até anos, as entidades
citadas são intensamente prejudicadas, optando amiúde por ignorar esse efeito, preferindo suportar as eventuais consequências daí decorrentes.” “Por isso, (...) sugeri, em alternativa ao regime vigente, a atribuição ao juiz do poder de, no despacho de citação, ordenar a suspensão intercalar de todos ou alguns dos actos de execução da deliberação impugnada.” Ainda que subscrevamos em absoluto os argumentos aduzidos pelo autor, a verdade é que os mesmos se reportam à suspensão das deliberações sociais e, portanto, à marcha dos processos nos juízos de comércio. Porém, não podemos deixar de referir que a realidade que nos foi dada a conhecer no juízo local cível de Amarante não corresponde àquelas preocupações, uma vez que os prazos – quer para decidir acções definitivas, quer para decidir procedimentos cautelares – foram sempre, durante o estágio realizado, devidamente respeitados.
233. José António De França Pitão e Gustavo França Pitão, op. cit., p. 447.
234. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, p. 234.

235. Abrantes Geraldes, Recursos..., p. 232 e Teixeira de Sousa, “Reflexões sobre a reforma dos recursos em processo civil”, in Cadernos de Direito Privado, n.º 20, outubro-dezembro de 2007, p. 6.  

Suspensão das deliberações - Tramitação


4.2.2.5 Suspensão das deliberações - Tramitação
 
Relativamente ao iter processual, deve o requerimento da suspensão ser instruído com cópia da acta da reunião em que as deliberações foram tomadas, que deve ser fornecida ao requerente, pelo administrador, no prazo de 24 horas (art. 1º, DL 268/94, de 25 de Outubro, e art. 1436º, al. m)). 
 
Se o requerente alegar que não lhe foi fornecida cópia da acta, o administrador (ou o representante especial designado para o efeito) é citado com a cominação de que deverá apresentar a acta juntamente com a contestação, sob pena de rejeição desse articulado (art. 381º, nº 1, CPC), sendo que a consequência será, como se sabe, a de se terem por admitidos os factos alegados pelo requerente (arts. 567º, nº 1 ex vi 366º, nº 5, CPC). 
 
Além disso, não sendo apresentada a acta da assembleia, o ónus da prova inverte-se, passando a impender sobre os requeridos (arts. 417º, nº 2 ex vi 430º, CPC e 344º, nº 2). Note-se que esta cominação “não pode ser aplicável se a administração em exercício não foi notificada para apresentar qualquer documentação, não foi demandada, nem o autor alegou nos autos ter junto dela requerido a entrega de qualquer documentação, nem que essa solicitação lhe tivesse sido recusada” (226). 
 
Além disso, “caso a citação não seja feita com aquela cominação, não obstante o requerente o ter pretendido na petição inicial, não joga a consequência cominatória, não obstante o requerente, verificada a falta, poder insistir em que a citação seja correctamente efectuada”.(227)

Notas

226. Ac. TRE de 19/05/2016.
227. Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 98
 

10 outubro 2023

Suspensão das deliberações - Inversão do contencioso

4.2.2.4 Suspensão das deliberações - Inversão do contencioso
 
O procedimento cautelar em causa permite o instituto da inversão do contencioso (arts. 369º e 382º ex vi 383º, nº 1, CPC), o que significa que, havendo requerimento nesse sentido, a decisão que decrete a suspensão poder-se-à consolidar (224) se o requerido não demonstrar, em acção por ele proposta, que a decisão cautelar não se deverá tornar definitiva. 
 
A providência de suspensão das deliberações, por admitir a inversão do contencioso, não deixa de ser instrumental da tutela definitiva, antes se verificando uma “dispensa do ónus de propositura da açcão principal pelo requerente e a consequente atribuição desse ónus ao requerido que pretenda evitar a consolidação da providência decretada”.
 
Neste sentido, o juiz haverá de decretar a inversão do contencioso se formar “convicção
segura da existência do direito acautelado”, sendo insuficiente a probabilidade séria da existência de tal direito (225).
 
Por outro lado, sendo negado o pedido de inversão do contencioso, o prazo de caducidade previsto no nº 4 do art. 1433º reinicia-se a partir do trânsito em julgado da decisão (cfr. nº 3 do art. 369º, CPC). Estamos, aqui, perante uma excepção ao que dissemos supra sobre a não interrupção do prazo para propositura de acção, o que se entende – e vem reforçar a posição acima adoptada –, já que o art. 328º determina que os prazos de caducidade são insusceptíveis de suspensão ou interrupção, salvo nos casos em que a lei o determine.

Notas

224. A este propósito, citamos Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 92, quando referem que “a suspensão da deliberação tem função conservatória da situação (de não execução) existente à data da citação, mas não deixa também de ter função antecipatória de parte dos efeitos da decisão de procedência definitiva a proferir na acção de que depende. Efectivamente, embora a sentença que julgue a acção procedente tenha conteúdo diferente do da mera suspensão da execução da deliberação, o seu efeito, mais amplo – tem a ver com a validade ou com a eficácia total da deliberação impugnada -, abrange a não produção dos seus efeitos, a qual é antecipada, a título provisório, pela decisão de suspensão.”
225. Vide, neste sentido, Miguel Teixeira de Sousa, As Providências Cautelares e a Inversão do Contencioso, pp. 9 e 10. 

09 outubro 2023

Suspensão das deliberações - Prazos


4.2.2.3 Suspensão das deliberações - Prazos
 
Relativamente ao prazo, os condóminos dispõem de 10 dias para instaurar tal procedimento (380º, nº 1 ex vi 383º, nº 1, CPC), tratando-se igualmente de um prazo de caducidade que não pode ser conhecido oficiosamente por em causa estarem direitos disponíveis dos condóminos. 
 
O prazo conta-se desde a data da assembleia ou desde a data em que o requerente teve conhecimento dessa deliberação, se não tiver sido regularmente convocado para a assembleia (nº 3 do art. 380º, CPC)(218). Surge, porém, uma questão semelhante à que foi discutida acerca da cação de anulação, atinente à contagem deste prazo no caso de o requerente não ter comparecido à assembleia e só ter tomado conhecimento da deliberação depois de decorridos os 10 dias. “Neste caso, é necessário apreciar, desde logo, se o requerente foi devidamente convocado e, em caso afirmativo, se há causa justificativa do conhecimento tardio, nomeadamente justo impedimento ou falta de acesso à ata imputável (...) (ao administrador), violando o seu dever de informação dos (...) (condóminos)”(219). Não tendo sido devidamente convocado, a própria lei – ao contrário do que acontece no preceito civilístico – responde à questão.

Ainda sobre o prazo, questiona-se se o prazo para propor a acção principal se suspende com a instauração da providência. Neste aspecto, tendemos a seguir os ensinamentos de Lebre de Freitas (220) e de Lobo Xavier (221), no sentido de o prazo não se suspender com a propositura do procedimento cautelar, “ambos correndo paralelamente”.
 
Com efeito, as duas vias judiciais têm finalidades distintas, na medida em que o pedido de suspensão de deliberação não é uma mera antecipação da decisão da açcão principal, antes visando evitar os danos resultantes da deliberação; por seu turno,o pedido principal visa apenas aferir a sua (i)legalidade (222).
 
Acresce que, no caso das deliberações anuláveis, não se deverão confundir os prazos de caducidade previstos no nº 4 do art. 1433º e no art. 380º, nº 1, CPC, tratando-se de prazos autónomos e independentes. De resto, não existe nenhum motivo razoável que justifique que o legislador quisesse que o prazo de propositura da acção anulatória fosse mais amplo quando se requeresse a suspensão, até porque, como temos vindo a repetir, uma das grandes preocupações no âmbito das deliberações das assembleias é que estas adquiram estabilidade no mais curto espaço de tempo e “tal desiderato não se compadece com o aguardar o decretamento da providência que (...) em virtude de vicissitudes várias pode demorar vários meses”(223)

Importa ainda ter em mente que, não sendo instaurada antes, e havendo decisão que decrete a suspensão da deliberação, o seu requerente passa a dispor de 30 dias desde a data em que a decisão lhe seja comunicada para propor a acção principal, sob pena de a providência caducar (art. 373º, n.º 1, a).

Em síntese, o condómino legitimado – para efeitos de simplificação, consideraremos que foi regularmente convocado – dispõe de 10 dias a contar da data da deliberação para requerer a sua suspensão e, tratando-se de deliberação anulável, de 60 dias a contar da mesma data para instaurar a respectiva acção de impugnação. Porém, caso a suspensão seja decretada – e independentemente do vício que enferme a deliberação em crise -, esta caducará se o condómino não propuser a acção principal no prazo de 30 dias a contar da data em que a decisão lhe seja comunicada

Notas

218. Rejeitamos aqui a posição defendida por Sandra Passinhas (op. cit., pp. 260 e 261), quando refere que o pedido de suspensão deve ser feito no prazo de 10 dias a contar da data da deliberação ou, “se o requerente esteve ausente da reunião, da data em que ele teve conhecimento da deliberação (sob pena de o procedimento cautelar se tornar mais exigente que a cação principal)”. Entende a autora que só depois de ter conhecimento da deliberação é que o condómino está em condições de fazer valer os seus direitos, daí que o prazo previsto para presentes e ausentes seja distinto. Na sua opinião, o art.1433º/2, ao dispor que o prazo de 10 dias para os condóminos ausentes exigirem a convocação de assembleia extraordinária só conta a partir da comunicação da deliberação, vem reforçar tal entendimento. Parece-nos existir aqui uma confusão entre as disposições substantivas e adjectivas, deturpando-se aquilo que vem estabelecido no CPC para a providência cautelar de suspensão das deliberações.
219. Neste sentido, José António De França Pitão e Gustavo França Pitão, Código de Processo Civil Anotado, Tomo I – Artigos 1º a 702º, Quid Juris, Lisboa, 2016, em anotação ao nº 1 do art. 380º, p. 446. No mesmo sentido, ac. TRE de 27/09/2012.

220. Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 97.
221. Lobo Xavier, Anulação...,p. 95.
222. Ac. STJ de 13/05/2004.
223. Ac. TRE de 28/06/2018, que destacamos pelas várias referências jurisprudenciais que sustentam o mesmo entendimento.
 

06 outubro 2023

Suspensão das deliberações - Pressupostos


4.2.2.2 Suspensão das deliberações - Pressupostos 
 
Diz-nos o ac. TRP de 11/05/2015 que “são requisitos cumulativos da providência cautelar de suspensão das deliberações da assembleia de condóminos, constitutivos do direito do requerente:

a) deliberação contrária à lei, estatutos ou contrato; 
b) a qualidade de condómino; e 
c) a alegação que da execução da deliberação pode decorrer dano apreciável”.
 
No que concerne ao primeiro pressuposto, correspondente ao fumus boni iuris, para o qual basta fazer prova sumária,cremos não haver nada mais a acrescentar.

Relativamente à legitimidade activa, entendemos que também aqui, perante uma deliberação anulável, deverá ser feita uma leitura conjugada dos nºs 1 e 5 do art. 1433º, exigindo-se que, além da qualidade de condómino (ou qualquer outra que lhe dê legitimidade)(209), o requerente não tenha aprovado a deliberação anulável (ou porque votou contra, ou porque se absteve, ou porque nem sequer esteve presente nem se fez representar). 
 
Quanto à legitimidade passiva, apesar de o art. 383º, nº 2, CPC referir que “é citada para contestar a pessoa a quem compete a representação judiciária dos condóminos na acção de anulação” (ou seja, o administrador ou a pessoa que a assembleia designar para esse efeito/representante especial, à semelhança do que acontece na acção principal – arts. 12º, e), CPC e art. 1433º, nº 6), a suspensão deverá ser requerida contra todos os condóminos que votaram a favor da deliberação, individualmente considerados (210)(211). 
 
O condómino que queira lançar mão deste meio processual tem de alegar e apresentar prova suficiente para que, numa lógica de summaria cognitio, demonstre a existência de um vício na deliberação que cause um dano apreciável, um periculum in mora. Para a tomada de decisão não se exige, naturalmente, o grau de certeza que se exige numa decisão definitiva, mas é necessário que exista uma “probabilidade muito forte de que a execução da deliberação possa causar o dano apreciável que, com a providência, se pretende evitar”(212).
 
Note-se que a exigência de um dano apreciável não se deve confundir com a de um dano irreparável ou de difícil reparação, de resto exigida para a providência cautelar comum (art. 362º, nº 1, CPC), pelo que se pode tratar de dano reparável (213), desde que seja visível, de aparente dignidade e estimável (214). O requisito do dano apreciável traduz-se, assim, num“conceito indeterminado, carecido de densificação através da alegação e comprovação de factos de onde possa extrair-se a conclusão de que a execução da deliberação acarretará um prejuízo significativo, de importância relevante” (215), pelo que exige alguma valoração por parte do juiz.
 
Não basta, portanto,um dano abstracto que qualquer deliberação ilegal é susceptível de produzir, exigindo-se um dano que, em face de factos materiais concretos - cuja prova constitui ónus do requerente - deva ter-se por apreciável (216)(217). Tal dano pode dizer respeito ao próprio condómino (se for de estrita natureza patrimonial/económica, por exemplo) ou ao condomínio, no seu todo (se se verificar na estrutura física do prédio, podendo mesmo tratar-se de questões estéticas ou arquitectónicas).

Notas

208. A este propósito, Pinto Furtado, op. cit., pp. 775 a 777
209. Designadamente o locatário no contrato de leasing para habitação e em caso de constituição do direito de usufruto, uso ou habitação sobre uma determinada fracção [apesar de, em princípio, ter direito de voto o nu proprietário, o mesmo direito pode, em alguns casos, caber aos titulares daqueles direitos reais limitados (quando se trate da administração ordinária ou do gozo da coisa e dos serviços comuns)] - cfr. Sandra Passinhas, op. cit., pp. 235 a 237.
210. Neste sentido, Abílio Neto, op. cit., p. 735 e ac. TRE de 19/05/2016: “Em sede de providência cautelar de suspensão de deliberação (condominial), tendo sido indicados como requeridos os condóminos individualmente considerados e não tendo sido estes citados, não podia ser proferida decisão a decretar a providência, mesmo que se admita que possam e devam ser representados em juízo pelo administrador do condomínio.”
211. Cfr. «Legitimidade Passiva»., sobre a legitimidade passiva para as acções de anulação

212. José Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II: arts. 381º a 675º, 2ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2008, p. 95 e ac. TRL de 16/12/2008.
213. Idem, ibidem.
214. António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol.IV: Procedimentos Cautelares Especificados, 4.ª ed. revista e actualizada, Almedina, Coimbra, 2010, p. 100.
215. Ac. TRL de 20/11/2014.
216. Abrantes Geraldes, Temas..., pp. 99 a 101, Abílio Neto, op. cit., p. 734 e ac. TRL de 28/02/2008.
217. João Vasconcelos Raposo, op. cit., p. 70 entende que tem de existir “claramente algum prejuízo especial do condómino requerente, objectivamente aferível”, dando o exemplo de uma deliberação que estabelece que uma determinada obra ao prédio deverá ser suportada única e exclusivamente pelo condómino requerente. Por outro lado, afasta a deliberação que determine que a realização de uma obra necessária no prédio deve ser suportada por todos os condóminos, mesmo que o condómino requerente alegue não ter possibilidade de pagar, por questões relacionadas com a sua situação económica. Entende o autor, posição que sufragamos, que não existe “dano grave para estes efeitos, sendo uma responsabilidade expectável, decorrente da situação de condomínio, embora, evidentemente, tal esteja dependente de apreciação casuística”

04 outubro 2023

Suspensão das deliberações - Objecto


4.2.2 Suspensão das deliberações - Objecto
 
De forma a impedir os prejuízos que a execução de uma deliberação possa originar, os condóminos podem ainda lançar mão de um procedimento cautelar, designadamente da suspensão de deliberações da assembleia de condóminos, estando essa faculdade expressamente prevista no nº 5 do art. 1435º. Apesar de esta via ter sido admitida desde cedo com o §2.º do art. 32º do DL 40 333, de 14 de Outubro de 1955, só em 1967 veio a reflectir-se no CPC.(191).
 
O seu regime processual consta, actualmente,dos arts. 380º a 382º do CPC, aplicáveis por força da remissão do art. 383º do mesmo diploma. Em tudo o que não esteja especialmente previsto, dever-se-à obedecer ao preceituado na secção relativa ao procedimento cautelar comum (arts. 362º e ss., CPC), aplicando-se ainda, subsidiariamente, os arts. 293º a 295º ex vi nº 3 do art. 365º.

Objecto

Em primeiro lugar, importa referir que o âmbito de aplicação do nº 1 do art. 383º não é consensual. Com efeito, se por um lado há quem entenda que a providência cautelar em análise só se pode requerer perante deliberações anuláveis,(192) por outro há quem defenda que tal requerimento é independente do vício que enferme a deliberação, seja ele a anulabilidade, a nulidade, a ineficácia ou a inexistência.(193)
 
Há ainda quem considere que o procedimento é aplicável às deliberações anuláveis, nulas e ineficazes, mas não às inexistentes.(194) Ora, defendem os primeiros que a suspensão das deliberações se destina apenas à paralisação dos efeitos jurídicos das deliberações. Assim, se a deliberação for nula não produzirá quaisquer efeitos e, sendo ineficaz, não produzirá efeitos relativamente aos condóminos que a não tenham aprovado.(195) Por isso, em relação às deliberações nulas e ineficazes deverá ser requerido procedimento cautelar inominado.(196)

Em sentido diverso, outros autores entendem que apesar de o nº 1 do art. 383º, CPC se referir apenas às “deliberações anuláveis”, seria inconcebível que deliberações com um vício menos grave fossem susceptíveis de suspensão e deliberações que pusessem em causa, por hipótese, a ordem pública, pudessem produzir efeitos – ainda que materiais – até ser declarado o seu vício em processo principal. Além disso, referem que qualquer deliberação inquinada – inexistente, ineficaz, nula ou anulada – é facto legitimador de danos ilícitos e, portanto, em qualquer dos casos, o objectivo é evitar que esses danos se produzam.
 
É que, mesmo que a deliberação não produza efeitos jurídicos – como, de resto, acontece nas deliberações anuláveis -, ela há-de ter efeitos práticos e, portanto, será esse o objecto da providência que preceda uma acção de declaração de nulidade ou de ineficácia.(197).
 
Acrescentam que em cada uma das hipóteses, a providência de suspensão visa evitar que o condómino atingido “se veja privado do exercício dos seus direitos enquanto se discute a existência, eficácia ou validade da deliberação”.(198) Para melhor entender a questão, importa chamar à colação uma outra controvérsia, desta feita acerca da interpretação do conceito de “execução” das deliberações para efeitos da sua integração no objecto da providência cautelar de suspensão de deliberações. 
 
Assim, para autores como Abílio Neto,(199) deliberações imediatamente executadas, como sejam a de designação ou exoneração de administrador, não podem ser suspensas. Rui Pinto Duarte (200), Alexandre Soveral Martins (201) e Pinto Furtado (202) têm outro entendimento sobre a questão, ainda que com base em diferentes fundamentos (203). Com efeito, a posição tradicional da jurisprudência fazia uma leitura “formalista ou restritiva” – nas palavras de Rui Pinto Duarte - do conceito de “execução”, reconduzindo aos actos de execução apenas aqueles em que se produz o efeito típico da deliberação, o efeito imediato direto ou ainda os actos complementares necessários para a produção do efeito jurídico.
 
Por outro lado, através de uma leitura “substancialista ou ampla”, consideram-se também actos de execução os efeitos indirectos da deliberação, i.e., todos os efeitos danosos, sejam directos, indirectos, laterais, complementares, secundários ou meramente práticos. Vasco Lobo Xavier sugeriu, a este propósito,que se considerasse como objecto da providência cautelar algo mais amplo do que a sua mera eficácia executiva. Para este autor, bem como para Alexandre Soveral Martins, a providência visa paralisar os efeitos jurídicos da deliberação e não apenas os efeitos executivos.
 
Diferentemente, Pinto Furtado entende que o objecto da suspensão cautelar se reconduz à paralisação da execução e não, propriamente, à eficácia. Refere este autor que o conceito de eficácia diz respeito à “mera aptidão jurídica concreta para produzir efeitos, não à produção, em si, dos efeitos”. Por seu turno, a ideia de execução reconduz-se ao “fluir dos efeitos” que brotam “automaticamente do acto” ou que requerem,“para se produzirem, que sejam praticados outros actos” (204). Por outras palavras, a execução diz respeito à “prática de actos de realização material dos efeitos jurídicos”. Assim, de acordo com este autor – posição que sufragamos -, a suspensão das deliberações deverá ser decretada sempre que a sua execução/materialização implique a criação de um estado de coisas irreversível, um “dano apreciável”, tendo, portanto, em vista, assegurar a tutela jurisdicional efectivados direitos e interesses legítimos dos condóminos (cfr. arts. 6º, nº 1, CEDH e 202º, CRP).
 
Destaca-se também, pela sua pertinência – e por a sua consequência prática ser consonante com a doutrina de Pinto Furtado - a posição intermédia adoptada por Rui Pinto Duarte (205), de acordo com a qual a solução para esta questão implica que se tome em consideração a pretensão a deduzir na acção principal – não fosse a providência cautelar instrumental desta. Deste modo, a providência de suspensão pode acompanhar tanto uma acção de anulação como, de igual modo, uma acção de declaração de nulidade, ineficácia ou inexistência, sendo que, quando acompanhe acção de anulação, poder-se-à entender como seu objecto apenas os efeitos jurídicos da deliberação e, nos restantes casos, dever-se-à atender aos seus efeitos práticos.
 
Pelo exposto, rejeitamos a tese de acordo com a qual deliberações como a de designação do administrador do condomínio não podem ser suspensas por os seus efeitos se esgotarem assim que aquele tome posse do cargo. É que tal deliberação vai sendo executada à medida que o administrador vai exercendo as suas funções e, portanto, “enquanto esse exercício não terminar, é possível – e tem sentido útil – suspender a deliberação” (206)(207). O mesmo se diga, a título exemplificativo, a propósito de deliberações que alterem o título constitutivo ou o regulamento do condomínio, uma vez que as mesmas vão sendo executadas à medida que as novas cláusulas forem sendo aplicadas. 
 
Quanto à primeira questão assinalada – sobre a susceptibilidade de suspender, ou não, deliberações nulas, ineficazes ou inexistentes -, e considerando todo o exposto, haverá de se concluir208que a categorização das deliberações como anulável, nula,ineficaz ou inexistente não assume, para este efeito, qualquer relevância. É que, sendo à execução prática da deliberação que se remete o objecto da providência, só se poderá rejeitar a suspensão quando não haja, efectivamente, mais nada a paralisar, quando o último acto da sua execução material já estiver concluído. 
 
Em conclusão, entendemos que importa aqui fazer uma interpretação extensiva do art. 383º, CPC, chamando ainda a atenção para o correspondente preceito substantivo - nº 5 do art. 1433º - que permite, desde logo, concluir que não era intenção do legislador limitar este procedimento cautelar específico às deliberações anuláveis.

Notas

189. A este propósito, vide nota de rodapé 157.
190. Abílio Neto, op. cit., p. 733.
191. “O alargamento do procedimento (...) aos condóminos (...) (visou) coordenar o CPC com o CC de 1966, que, lembre-se, prevê, desde a sua primeira versão, a possibilidade de (...) anulação e de suspensão das deliberações da assembleia de condóminos”, Rui Pinto Duartte, “O procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais (e não só sociais...) e o novo CPCl”, in Direito das Sociedades em Revista, ano 5, vol. 10, semestral, Setembro 2013, p. 22

192. Sandra Passinhas, op. cit., p. 260, nota 646, Vasco da Gama Lobo Xavier, “O conteúdo da providência de suspensão de deliberações sociais”, in Revista de Direito e Estudos Sociais, nº 22, 1975, pp. 57 e 247.
193. Abílio Neto, op. cit., p. 734, Rui Pinto Duarte, “O procedimento...”, pp. 30 e 31 e Pinto, Furtado op. cit., pp. 777. Na jurisprudência, vide ac. TRL de 20/11/2014, este último alargando o procedimento apenas às deliberações nulas.
194. Alexandre Soveral Martins, “Suspensão de deliberações sociais de sociedades comerciais: Alguns problemas”, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 63, Abril de 2003. Para este autor, “não se pode recorrer ao procedimento de suspensão de deliberações sociais relativamente a deliberações inexistentes porque aquele procedimento pressupõe uma efectiva deliberação. Para reagir cautelarmente contra uma deliberação inexistente, seria ainda assim possível recorrer a uma providência cautelar não especificada”. No nosso entendimento, aceitar tal argumento implicaria recusar também, por igualdade de fundamentos, o recurso a uma providência cautelar inominada.
195. Sandra Passinhas, op. cit., p. 260, nota 646.
196. Lobo Xavier, “O conteúdo...”, p. 376

197. “A suspensão terá lugar quando a sua execução for susceptível de causar dano apreciável. O que causará o dano será a execução da deliberação, que se quer impedir, e não verdadeiramente os efeitos jurídicos a que tende. E tanto as deliberações anuláveis, como as nulas e as ineficazes podem implicar actos de execução. Seriam então estes actos de execução que se pretenderia(m) evitar com a providência cautelar.” Alexandre Soveral Martins, op. cit.
198. Rui Pinto Duarte, “O procedimento...”, p. 31.
199. Op. cit., p. 735.
200. “O procedimento...”,pp. 28 e 29.
201. Op. cit., na esteira da doutrina de Lobo Xavier.
202. Pinto Furtado, op. cit., pp. 764 e ss

203. Ainda que os argumentos sejam esgrimidos a propósito das deliberações sociais, é possível importá-los para as deliberações das assembleias de condóminos.
204. Pinto Furtado, op. cit., p. 772. Vide, no mesmo sentido, ac. TRL de 04/06/2009.

205. “O procedimento...”, p. 28, defendendo que a noção de “execução” é “plástica”.
206. Rui Pinto Duarte, “O procedimento...”, p. 29.
207. Note-se que, mesmo que se entenda que a suspensão das deliberações das assembleias de condóminos visa paralisar apenas os efeitos jurídicos, a resposta a esta questão é a mesma, na medida em que um administrador do condomínio, após a sua nomeação, pode praticar diversos actos com efeitos jurídicos.

208. A este propósito, Pinto Furtado, op. cit., pp. 775 a 777 

03 outubro 2023

Legitimidade passiva


4.2.1.3 Legitimidade passiva
 
Quanto à questão de saber quem deve ser demandado numa acção de impugnação de deliberações condominiais (ou no respectivo procedimento cautelar, como veremos) não existe, uma vez mais, consenso na doutrina nem na jurisprudência. Se por um lado há quem entenda que devem ser demandados os condóminos que aprovaram a deliberação em causa, representados pelo administrador (tese que não reconhece personalidade judiciária ao condomínio nas acções de anulação), por outro há quem defenda que o condomínio tem personalidade judiciária nas acções de anulação e, como tal, deve a acção ser instaurada contra o próprio, representado, também aqui, pelo administrador.
 
Por outras palavras, há quem entenda que nas acções de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos não se está no âmbito dos poderes funcionais do administrador e quem defenda que a personalidade judiciária do condomínio abrange as acções de anulação das deliberações da assembleia, por considerarem que as mesmas integram o “âmbito dos poderes” do administrador. Esta problemática chama novamente à colação os arts. 12º, e), CPC, 1433º, nº 6 e 1437º, nº 1. 
 
Para os defensores da tese da personalidade judiciária do condomínio nas acções para anulação das deliberações da assembleia de condóminos,(179) é o condomínio que deve ser demandado, representado pelo administrador que deve ser citado nessa qualidade. 
 
Como argumentos aponta-se o facto de ter sido concedida personalidade judiciária ao condomínio com a reforma processual de 1995/96,(180) que se manteve no art. 12º, e), CPC, pelo que deixa de haver razão para demandar os condóminos individualmente; as deliberações exprimirem a vontade do condomínio, do grupo, e não dos condóminos (individualmente considerados) ou dos que aprovaram a deliberação;o legislador ter dito, no art. 1433º, nº 6, menos do que queria dizer, devendo ser feita uma interpretação extensiva e ler-se “a representação judiciária do conjunto dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador”; um dos poderes do administrador ser precisamente a representação judiciária dos condóminos contra quem sejam propostas acções de anulação das deliberações, pelo que este age em nome e no interesse do condomínio; esta solução evitar uma série de problemas decorrentes da necessidade de demandar os condóminos em litisconsórcio necessário, como o possível elevado número de condóminos e a frequente impossibilidade de identificar, na acta da assembleia, os condóminos que votaram a favor de tal deliberação.

Por seu turno, a tese negatória da personalidade judiciária do condomínio, com forte apoio jurisprudencial,(181) entende que o condomínio apenas tem personalidade judiciária quando a lei ou a assembleia atribuem ao administrador determinadas competências funcionais, das quais se excluem as acções de impugnação das deliberações condominiais. Assim, para as acções que excedam os limites dos poderes conferidos ao administrador para personalizar o condomínio processualmente é obrigatória a intervenção singular dos condóminos, tal como decorre do art. 1433º, nº 6. Do mesmo preceito legal resulta que aqueles devem ser representados judiciariamente pelo administrador do condomínio ou por pessoa que a assembleia designar para esse efeito.

Sendo esta última a tese que sufragamos, apresentaremos os argumentos pela doutrina aduzidos.(182) Em primeiro lugar, mesmo tendo elementos para personalizar a propriedade horizontal,(183) o legislador nunca optou por reconhecer personalidade jurídica ao condomínio que, a ser reconhecida, significaria a sua personalidade judiciária (art. 11º, nº 2, CPC). Por outro lado, a já referida reforma processual de 1995/96 relativa ao reconhecimento de personalidade judiciária do condomínio e a manutenção dos seus termos até hoje só vem reforçar a posição do legislador no sentido de limitar a personalidade judiciária do condomínio ao que se encontre no âmbito dos poderes do administrador. 
 
Não existindo um reconhecimento legislativo da generalização das competências do administrador, não faz sentido fazer uma interpretação extensiva do nº 6 do art. 1433º. Com efeito, é verdade que as acções em análise respeitam à formação da vontade da assembleia geral de condóminos, só que nestas votações não entra a vontade do administrador enquanto órgão executivo. 
 
Quanto à jurisprudência,(184) o principal argumento – e também aquele que é, a nosso ver, o mais importante e esclarecedor, tendo sido já mencionado – é o de que o exercício do direito de impugnação das deliberações tomadas em assembleia de condóminos se encontra fora do âmbito demarcado dos arts. 12º, e),CPC e do art. 1437º, por não respeitar directamente ao condomínio a se - ente sem personalidade jurídica própria, e com a limitada personalidade judiciária assinalada -, mas antes aos condóminos entre si, enquanto membros do órgão deliberativo que é a dita assembleia de condóminos. Estamos, assim, no âmbito do nº 6 do art. 1433º, pelo que o autor da acção poderá pedir a citação dos condóminos na pessoa do administrador ou de representante ad hoc.(185)(186)
 
Numa última nota, no que concerne aos condóminos que devem ser demandados, ainda que não exista, também aqui, consenso na jurisprudência, partilhamos novamente do entendimento vertido no ac. STJ de 06/11/2008,(187) quando refere que “só devem ser demandados, na acção de anulação da deliberação, os condóminos que, estando presentes ou representados na assembleia em que foi tomada a deliberação anulanda, votaram a favor da sua aprovação”. Com efeito, são estes os únicos que têm interesse em contradizer e aos quais podem ser imputados quaisquer vícios de que a deliberação eventualmente enferme, porque foi com os seus votos que tal deliberação nasceu.(188)

Poder-se-ia colocar a dúvida relativamente àqueles que, não tendo estado presentes nem representados, vieram a comunicar o seu assentimento ou se silenciaram sobre a sua posição, pois que também eles se consideram favoráveis à deliberação. Porém, a deliberação terá sido aprovada mesmo sem os votos dos condóminos ausentes, pelo que estes não detêm
legitimidade passiva. Outro entendimento não se afigura materialmente possível, já que o condómino ausente, ao dispor de um prazo que pode exceder os 120 dias( cfr. nºs 6 (189) e 7 do art. 1432º) para manifestar a sua concordância ou discordância com a deliberação aprovada em assembleia poderá, na sua resposta (ou falta dela) ultrapassar os 60 dias previstos para propositura da acção de anulação (contados desde a data da deliberação). “Haveria, pois, uma insanável contradição intrassistemática do regime de anulabilidade das deliberações em apreço”.(190)

Notas

179. Vide, a título de exemplo, ac. STJ de 29/05/2007; ac. TRL de 25/06/2009; acs. TRP de 19/11/2009, de 08/09/2014 e de 13/02/2017; ac. TRE de 18/09/2008; acs. TRG de 06/01/2011, de 03/04/2014 e de 30/11/2016. Na doutrina: Aragão Seia, op. cit., pp. 216 e ss., Sandra Passinhas, op. cit., p. 337 e José Lebre de Freitas / Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2017, p. 41.
180. DL nº 329-A, de 12 de Dezembro, com a redacção do DL nº 180/96, de 25 de Setembro

181. Acs. STJ de 02/02/2006, de 29/11/2006, de 24/06/2008, de 06/11/2008 e de 13/07/2017; acs. TRL de 18/10/2006, de 12/02/2009, de 28/04/2009, de 13/07/2010, de 25/01/2011, de 31/03/2011 e de 03/05/2011; acs. TRP de 27/01/2011, de 04/10/2012, de 03/02/2014 e de 24/03/2014; acs. TRE de 17/10/2013 e de 19/05/2016; acs. TRG de 09/03/2017 e de 24/11/2016.
182. Abílio Neto, op. cit., p. 731, João Vasconcelos Raposo, op. cit., p. 69, Rui Vieira Miller, op. cit., p. 280, Menezes Leitão, op. cit., p. 302.
183. Elemento pessoal (condóminos), elemento patrimonial (prédio) e elemento teleológico (o seu aproveitamento) – Pais de Vasconcelos, op. cit., p. 128.
184. A título de exemplo, ac. STJ de 06/11/2008 e ac. TRL de 12/02/2009.

185. A designação de representante especial é bastante comum, uma vez que a assembleia, antes de deliberar, prevê a possibilidade de impugnação das suas deliberações. Além disso, caso o administrador seja o autor da acção - o que, como referimos supra, entendemos só poder acontecer quando este seja também condómino -,deixa de ser possível a sua citação como representante dos réus,daí que seja de todo o interesse a designação de representante especial, pois que, não existindo esta pessoa, então o autor terá de citar individualmente todos os réus.
186. “Destina-se essa representação, permitida por lei, a facilitar o desenvolvimento da acção e a evitar a intervenção efectiva de todos, o que significa que o autor poderá requerer a citação de todos os réus apenas na pessoa do administrador ou do representante especial, se o houver” –a c. TRG de 24/11/2016. No mesmo sentido,vide ac. STJ de20/09/2007.
187. Com o mesmo entendimento, ac. TRP de 27/01/2011.
188. Em sentido contrário, ac. STJ de 22/09/2016.

189. A este propósito, vide nota de rodapé 157.
190. Abílio Neto, op. cit., p. 733.