Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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10/24/2023

Produção de prova testemunhal


Toda e qualquer decisão judicial em matéria de facto, como operação de reconstituição de factos ou acontecimento delituoso imputado a uma pessoa ou entidade, esta através dos seus representantes, dependente está, da prova que em audiência pública, sob os princípios da investigação oficiosa (nos limites e termos em que esta é permitida ao julgador) e da verdade material, se processa e produz, bem como do juízo apreciativo que sobre a mesma recai por parte do julgador, nos moldes definidos nos art. 653, nº 2 e 655, nº 1, CPC – as regras da experiência e o princípio da livre convicção.

Submetidas ao crivo do contraditório, as provas são pois elemento determinante da decisão de facto.

Ora, o valor da prova, isto é, a sua relevância enquanto elemento reconstituinte dos factos em apreço, depende fundamentalmente da sua credibilidade, ou seja, da sua idoneidade e autenticidade.

Por outro lado, certo é que o juízo de credibilidade da prova por declarações, depende essencialmente do carácter e probidade moral de quem as presta, sendo que tais atributos e qualidades, como regra, não são apreensíveis mediante o exame e análise das peças ou textos processuais onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim através do contacto directo com as pessoas, razão pela qual o tribunal de recurso, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo formulado pelo tribunal recorrido.

Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador, mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de experiência”.

Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.

Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador, mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de experiência”.

Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.

Não se pode olvidar que existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em primeira instância e a efectuada em tribunal de recurso, ainda que com base nas transcrições dos depoimentos prestados, a qual, como é óbvio, decorre de que só quem o observa se pode aperceber da forma como o testemunho é produzido, cuja sensibilidade se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e observação directa dos comportamentos objectivados no momento em que tal depoimento é prestado, o que tudo só se logra obter através do princípio da imediação considerado este como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes de modo a que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da decisão.

As consequências concretas da aceitação de tal princípio definem o núcleo essencial do acto de julgar em que emerge o senso; a maturidade e a própria cultura daquele sobre quem recai tal responsabilidade. Estamos em crer que quando a opção do julgador se centre em elementos directamente interligados com o princípio da imediação (v. g. quando o julgador refere não foram (ou foram) convincentes num determinado sentido) o tribunal de recurso não tem grandes possibilidades de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.

Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, reacções imediatas, o contexto em que é prestado o depoimento e o ambiente gerado em torno de quem o presta, não sendo, ainda, despiciendo, o próprio modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo isso contribuindo para a convicção do julgador.

A comunicação vai muito para além das palavras e mesmo estas devem ser valoradas no contexto da mensagem em que se inserem, pois como informa Lair Ribeiro, as pesquisas neurolinguísticas numa situação de comunicação apenas 7% da capacidade de influência é exercida através da palavra sendo que o tom de voz e a fisiologia, que é a postura corporal dos interlocutores, representam, respectivamente, 38% e 55% desse poder - “Comunicação Global, Lisboa, 1998, pág. 14.

Já Enriço Altavilla, in Psicologia Judiciaria, vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12, refere que “o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras”.

Então, perguntar-se-á, qual o papel do tribunal de recurso no controle da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento?

O tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso, admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da imediação.

3/03/2023

Unidade de conta (UC) - Custas Processuais em 2023



A Unidade de Conta (UC) que serve de cálculo para as custas judiciais não terá qualquer atualização no ano de 2022, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2021.

Efetivamente, já o artigo 9º da Lei nº 99/2021, de 31 de dezembro, que aprovou "Contribuições especiais e valor das custas processuais para 2022" estipulou que:

“Artigo 9.º
Valor das custas processuais 
 
Mantém-se em 2022 a suspensão da atualização automática da unidade de conta processual prevista no n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2021."

O Orçamento de Estado para 2022, no seu artigo 174º confirmou a manutenção do valor da UC:

"Artigo 174.º
Valor das custas processuais 
 
Em 2022, mantém-se a suspensão da atualização automática da unidade de conta processual prevista no n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2020."

Assim, a Unidade de Conta (UC) fica fixada em €102,00 para vigorar no ano de 2022.
 
in, homepagejuridica.pt 

O Governo manteve os valores das custas processuais, assim, o valor a pagar para se aceder aos tribunais mantém-se inalterado. Segundo a lei do OE/2023, “mantém-se a suspensão da actualização automática da unidade de conta processual prevista no nº 2 do art. 5º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado em anexo ao DL nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2022”.

Se salientar que as custas judiciais ou processuais correspondem ao preço que o cidadão paga ao Estado pela prestação do serviço público nos tribunais em cada processo judicial. As custas processuais incluem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.

A taxa de justiça — a parta mais expressiva das custas — é expressa com recurso à unidade de conta processual (UC). A UC é actualizada anual e automaticamente de acordo com o indexante dos apoios sociais (IAS), devendo atender-se, para o efeito, ao valor de UC respeitante ao ano anterior. Actualmente cada UC corresponde a 102 euros. E assim vai continuar. A unidade de conta dos diversos tipos de processo varia entre o 1 e o 6. Ou seja: um cidadão tanto pode pagar apenas 102 euros por aceder aos tribunais, como 612 euros (no máximo).

Segundo os dados mais recentes disponibilizados pela Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ) — relativos a 2020 — o Estado tem recebido cada vez menos de custas judiciais. Os últimos dados revelam que em 2020, em plena pandemia, o Estado recebeu apenas cerca de 215 milhões de euros. Um valor bem mais baixo do que o recebido em 2016 (cerca de 258 milhões). A tendência desde 2016 até 2020 (dados mais recentes disponíveis) tem sido de diminuição (ver tabela em baixo).
 
O que é a taxa de justiça?

A taxa de justiça é o valor a pagar por cada interveniente num processo e o seu valor é calculado em função da complexidade da causa. Os valores estão fixados numa tabela publicada em Diário da República. A taxa de justiça pode ter uma redução de 90% nos processos em que o recurso aos meios eletrónicos não seja obrigatório, mas em que a parte entregue todas as peças processuais através dos meios eletrónicos disponíveis.

O pagamento da taxa de justiça poderá ser feito em duas alturas diferentes. Na primeira parte, e única em alguns casos, é paga a taxa de justiça inicial, ou sejam o valor devido até ao momento da prática do ato processual. A segunda parte é paga no prazo de 10 dias após a notificação para a audiência final. O pagamento é feito através do Documento Único de Cobrança (DUC).
 
O que são os encargos?

Os encargos correspondem às despesas concretas a que haja lugar no processo: por exemplo, os custos com correio e comunicações telefónicas, as compensações a testemunhas ou retribuição de peritos, os transportes em diligências no processo. Em certas circunstâncias, devem ser pagos antecipadamente pela parte requerente ou interessada nos atos que impliquem essa despesa.
 
O que são as custas de parte?

As custas de parte, por sua vez, são as despesas que cada parte foi fazendo com o processo — incluindo a taxa de justiça — e de que tenha direito a ser reembolsada pela parte vencida. Este reembolso deve ser pago diretamente à parte vencedora. O pagamento das custas no final do processo, em regra, cabe a quem ficou vencido, na proporção em que o for. No processo penal, o arguido só tem responsabilidade pelas custas quando é condenado. Em certos casos, devem ser pagas por quem se constituiu assistente (acompanhando a acusação como interessado) no processo, quando, por exemplo, o arguido for absolvido. O denunciante de crime que tenha feito a denúncia de má‑fé (com intenção de prejudicar ilegalmente a pessoa contra quem fez a denúncia) ou com negligência grave (prejudicando a pessoa pela falta de cuidado grosseira) também pode ser condenado nas custas.


2/14/2023

Acção especial de prestação de contas


Em termos gerais, a obrigação de prestar contas decorre da obrigação de informação consagrada no art. 573º do CC. 

Existe obrigação de informação sempre que o titular de um direito tenha dúvidas fundadas acerca do seu conteúdo e alguém esteja em condições de prestar as informações necessárias para dissipar essas dúvidas. A determinação das pessoas obrigadas a prestar contas não consta da legislação processual civil, mas de disposições substantivas. Entre outros, estão sujeitos à obrigação de prestar contas: 

- O administrador de associação sem personalidade jurídica (art. 172º do CC);
- O procurador com poderes de representação (art. 262º do CC);
- O gestor de negócios (art. 465º do CC);
- O administrador de sociedade civil (art. 987º do CC);
- O mandatário (art. 1161º do CC). 

A ação de prestação de contas é um processo especial regulado nos artigos 941º e segs. do Código de Processo Civil destinado a apurar o montante das receitas e das despesas que foram cobradas ou efectuadas, mas não verificar se houve ou não incumprimento do contrato.

Fundamentação

O dever de prestar contas pela forma legal - em forma de conta corrente, com deve e haver e concluindo-se por um saldo -, emerge quando alguém administra bens alheios – art. 941º do CPC – e conexiona-se com o dever de informação do art. 573º do CC.

Constituem doutrina e jurisprudência pacíficas que o processo de prestação de contas comporta duas fases distintas. Na inicial decide-se, antes de mais e tão só, se o réu deve prestar contas. Na subsequente, se a decisão for afirmativa, há lugar à prestação de contas, definindo-se os termos em que a mesma se deve processar. Só depois de proferida decisão a impor a obrigação de prestar contas, é que o autor tem de ser notificado para contestar as contas apresentadas pelo réu (neste sentido, Ac. do STJ de 30.01.2001).

Sendo que: «O ónus da prova da realização das despesas arroladas nas contas apresentadas cabe ao respectivo apresentante das contas» – Ac. do STJ de 03.10.2003.

Acresce que: 
 
«(...) para que o arbítrio no julgamento das contas possa ser prudente e avisado, é lícito ao juiz proceder a actos de instrução, por forma a habilitá-lo a negar a aprovação de verbas de receita que lhe parecerem baixas e às verbas de despesas que reputar exageradas.
Com vista à observância do julgamento segundo o seu prudente arbítrio, o juiz deverá:
i) Colher as informações que entender convenientes;
ii) Mandar proceder às averiguações que considerar úteis;
iii) Incumbir pessoa idónea de dar parecer sobre as contas» - Ac. cit., apud ALBERTO DOS REIS, Processos Especiais, Vol. I, 322 e 323.

Finalmente importa ter presente que:

« A acção especial de prestação de contas destina-se, tão só, a apurar e aprovar o conjunto das receitas efectivamente obtidas, durante um período de tempo determinado, a partir do conjunto de bens alheios administrado pela pessoa obrigada a prestar essas contas e das despesas realizadas por esse administrador nesse mesmo lapso temporal e, caso seja apurado um saldo patrimonial positivo, condenar o prestador de contas a pagá-lo.

A acção especial de prestação de contas não constitui o meio próprio para aquilatar do mérito da administração dos bens alheios em referência ou para determinar se, com um outro tipo de gestão do património em causa, poderiam ser obtidas receitas que o não foram e condenar o prestador de contas a pagar um qualquer saldo patrimonial não efectivamente apurado» - AC. da RL de 19.03.2013.

Vale isto por dizer que, primeiramente (1ª fase), urge apreciar se o réu (administrador do condomínio) é, ou não é, obrigado a prestar contas. Depois, se for obrigado e se os autores (condóminos) não concordarem com as mesmas, é que, porventura, estes factos poderão ser alegados e ter a sua relevância, nos termos, vg. do disposto no artº 945º nº 2 do CPC.

Nesta conformidade, estabelece o art. 941º do Código de Processo Civil que "a acção de prestação de contas pode ser proposta por quem tenha direito de exigi-las ou por quem tenha o dever de prestá-las e tem por objecto o apuramento e aprovação de receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administra bens alheios e a eventual condenação no pagamento do saldo que venha a apurar-se".

A obrigação de prestação de contas é estruturalmente uma obrigação de informação, que existe sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as informações necessárias (art. 573º do CC) e cujo fim é o de estabelecer o montante das receitas cobradas e das despesas efectuadas, de modo a obter-se a definição de um saldo e a determinar a situação de crédito ou de débito.

Como afirmava Alberto dos Reis, in Processos Especiais, vol.I, 1982, pag.303, pode formular-se o princípio geral de que "quem administra bens ou interesses alheios está obrigado a prestar contas da sua administração ao titular desses bens ou interesses". Ou seja, a obrigação de prestar contas tem lugar todas as vezes que alguém trata de negócios alheios ou de negócios, ao mesmo tempo, alheios e próprios, (cfr. Acórdão do STJ de 1975).

Assim, nos termos do art. 943º, nº 2 do CPC "se o Réu contestar a obrigação de prestar contas o autor pode responder e apresentar provas” e o juiz decide. 
 
O TRE em Ac. datado de 03.11.2006 decidiu que: «I- O processo é adequado quando através dele se pretende conseguir o fim indicado pela lei, sendo através da petição inicial que se deve aferir o propósito do Autor e, consequentemente, a adequação do processo ao que nesse articulado foi expresso. II- O processo especial de prestação de contas é o adequado ao fim pretendido pelo Autor e que vem espelhado na petição porquanto na versão aí descrita, incumbiu a Ré de “administrar” o seu imóvel sem que ela o tivesse esclarecido acerca do destino que deu às receitas que ele supõe terem sido geradas com o respectivo arrendamento. III- Visando a prestação de contas a definição de um quantitativo como saldo, só o processo de prestação de contas será adequado a tal finalidade quando aquele seja uma incógnita, i.e. quando quem as requer não esteja inteirado, por ausência de informação por parte de quem as deve prestar, do montante das receitas percebidas ou do das despesas efectuadas ou mesmo de ambas.»
 
E como proficientemente se escreveu no Acórdão do STJ de 9.2.2006:
I - A obrigação de prestação de contas é estruturalmente uma obrigação de informação, que existe sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as informações necessárias (art. 573.º do CC) e cujo fim é o de estabelecer o montante das receitas cobradas e das despesas efectuadas, de modo a obter-se a definição de um saldo e a determinar a situação de crédito ou de débito
II - Está obrigado a prestar contas o procurador que age com poderes de representação, administrando bens ou interesses do representado, independentemente da existência ou da natureza de negócio de que resultou a procuração.
III - Não é o fim para que a procuração é emitida nem o conteúdo dos poderes que dela constam como conferidos ao procurador, mas apenas os actos realizados, que justificam a prestação de contas.
IV - Do disposto nos art.s 1014.º (actual 941º) e seguintes do CPC infere-se que a prestação de contas só tem interesse para o requerente (representado) quando haja, em relação às partes, créditos e débitos recíprocos, não sendo de aplicar este processo quando o acto não tenha tido, nas relações entre mandatário e mandante, reflexos patrimoniais”.  (sublinhado meu).

4/14/2022

Julgados de Paz

Neste artigo poderá encontrar respostas às seguintes questões:

  • O que  é um Julgado de Paz
  • Que litígios podem ser submetidos a um Julgado de Paz
  • Recurso à decisão dos Julgados de Paz
  • Alterações à Lei dos Julgados de Paz 
  • Custas
  • Mediação
  • Funcionamento 
  • Diagrama da tramitação

O que é um Julgado de Paz (JdP)?

Um JdP é um tribunal dotados de características próprias de funcionamento e organização, cuja base legal de suporte foi dada pela Lei nº 78/2001, de 13/7 (Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz, comumente denominada Lei dos Julgados de Paz), a qual foi pela primeira vez alterada pela Lei nº 54/2013, de 31/7, tendo por base constitucional o art. 209º da CRP.

Os JdP funcionam num contexto de promoção de novas e diferentes formas de resolução de litígios, assentes em modelos agilizados e eficazes de jurisdição, em estreita colaboração com o Poder Local (autarquias) e numa perspectiva de proximidade entre a jurisdição e os cidadãos. Os JdP assentam, desta forma, numa parceria público/pública entre o Estado e as autarquias, sendo o respectivo financiamento partilhado entre essas duas entidades. No entanto, com as alterações introduzidas à Lei dos JdP, em 2013, passou a ser evidente que outras entidades públicas de reconhecido mérito podem também intervir na criação de julgados de paz.

Que litígios podem ser submetidos ao JdP?

No contexto legal actual, os JdP têm competência para apreciar e decidir acções declarativas cíveis, com excepção das que envolvam matérias de direito da família, direito das sucessões e direito do trabalho, cujo valor não ultrapassasse os € 15 000. As acções que podem ser resolvidas nos JdP, nos termos do disposto no art. 9º da Lei nº 78/2001, de 13/7, com as alterações introduzidas pela Lei nº 54/2013, de 31/7, são as seguintes:

  • Acções destinadas a efectivar o cumprimento de obrigações, com excepção das que tenham por objecto o cumprimento de obrigação pecuniária e digam respeito a contrato de adesão (exemplo: contratos, negócios unilaterais, gestão de negócios, etc.);
  • Acções de entrega de coisas móveis (exemplo: acções para entrega de documentos);
  • Acções resultantes de direitos e deveres dos condóminos, sempre que a respectiva AG não tenha deliberado sobre a obrigatoriedade de compromisso arbitral para a resolução de litígios entre condóminos ou entre condóminos e o administrador (exemplo: pagamento das obras dos telhados, instalações gerais de água, de elevadores);
  • Acções de resolução de litígios entre proprietários de prédios relativos a passagem forçada momentânea, escoamento natural de águas, obras defensivas das águas, comunhão de valas, regueiras e valados, sebes vivas; abertura de janelas, portas, varandas e obras semelhantes; estilicídio, plantação de árvores e arbustos, paredes e muros divisórios;
  • Acções de reivindicação, possessórias, usucapião e acessão e divisão de coisa comum;
  • Acções que respeitem ao direito de uso e administração da compropriedade, da superfície, do usufruto, de uso e habitação e ao direito real de habitação periódica;
  • Acções que digam respeito ao arrendamento urbano, excepto as acções de despejo (exemplo: acção de condenação para pagamento das rendas);
  • Acções que respeitem à responsabilidade civil contratual e extracontratual (exemplo: acções decorrentes de acidentes de viação, acções decorrentes de danos causados por coisas, animais ou actividades);
  • Acções que respeitem ao incumprimento civil contratual, excepto contrato de trabalho e arrendamento rural;
  • Acções que respeitem à garantia geral das obrigações (exemplo: acção de declaração de nulidade, acção de impugnação pauliana, etc.);
  • Acções relativas a pedidos de indemnização cível, quando não tenha sido apresentada participação criminal ou após desistência da mesma, emergente dos seguintes crimes: ofensas corporais simples, ofensa à integridade física por negligência; difamação; injúrias; furto simples; dano simples; alteração de marcos; burla para obtenção de alimentos, bebidas ou serviços.
Recurso à decisão dos Julgados de Paz

As decisões proferidas nos julgados de paz nos processos cujo valor exceda metade do valor da alçada do tribunal judicial de 1ª instância (a partir de € 2 500,01) podem ser impugnadas por meio de recurso a interpor para o tribunal judicial de comarca em que esteja sediado o julgado de paz. 
 
Alterações à Lei dos Julgados de Paz

A Lei nº 54/2013, de 31/7, introduziu cinco inovações fundamentais no que respeita à competência dos Julgados de Paz:
  • Aumentou-se a competência em razão do valor, passando de € 5 000 para € 15 000;
  • Alterou-se a competência em razão da matéria prevista na al. a) do nº 1 do art. 9., com vista a centrar a exclusão da competência não na qualidade da pessoa do demandante, mas no tipo contratual admitido;
  • Estabeleceu-se que, produzida a prova pericial, o tribunal judicial de 1ª instância deve remeter os autos ao JdP onde a acção corria termos para aí prosseguir o julgamento da causa;
  • Ampliou-se a competência dos JdP para a tramitação de incidentes processuais, desde que os mesmos não sejam expressamente vedados por outras disposições da lei;
  • Introduziu-se a possibilidade de serem requeridas providências cautelares junto dos JdP, tornando-se o recurso aos julgados de paz um meio mais completo de defesa dos direitos dos cidadãos que ao mesmo recorrem.
Foram também inseridas modificações nas normas relativas à mediação e alargou-se a nomeação dos juízes de paz, alargando-se, por um lado, o provimento destes servidores da justiça de 3 para 5 anos, estabelecendo-se que a renovação dos mesmos só pode operar mediante o respeito de determinados requisitos legalmente consagrados, mediante decisão do Conselho dos JdP.
 
Custas
  • A utilização dos JdP está sujeita a uma taxa única no valor de € 70 a cargo da parte vencida, sendo que o juiz também pode decidir repartir esse valor entre o demandante e o demandado, se for caso disso.
  • Caso haja acordo durante a mediação, o valor a pagar é de € 50, dividido por ambas as partes.
  • Nos casos previstos na lei, pode haver lugar a Apoio Judiciário nos processos que corram os seus termos nos JdP.
Mediação
  • A mediação só tem lugar quando as partes estejam de acordo e visa proporcionar às partes a possibilidade de resolverem as suas divergências através de uma forma amigável que conta com a intervenção do mediador, que é um terceiro imparcial. 
  • Ao contrário de um juiz ou de um árbitro, o mediador não tem poder de decisão, pelo que não impõe qualquer sentença. 
  • Enquanto terceiro imparcial, o mediador guia as partes, ajuda-as a estabelecer a comunicação necessária para que elas possam encontrar, por si mesmas, a base do acordo que porá fim ao conflito. 
  • As partes são assim responsáveis pelas decisões que constroem com o auxílio do mediador. 
  • Caso a mediação não resulte em acordo, o processo segue os seus trâmites e o Juiz tenta a conciliação. 
  •  Caso não se alcance conciliação há lugar ao julgamento, presidido pelo juiz de paz, sendo ouvidas as partes, produzida a restante prova e, finalmente, proferida a sentença pelo juiz de paz. Naturalmente, pode haver transacção entre as partes sozinhas, por sua exclusiva iniciativa.
A mediação nos JdP decorre da seguinte forma: 
  • Depois de iniciado o processo ocorre a pré-mediação em que as partes voluntariamente aceitam, ou não, resolver o conflito através da mediação. 
  • Uma vez aceite por todas as partes e seleccionado o mediador, inicia-se o processo de mediação que decorre numa sala reservada para esse efeito. 
  • Cada sessão de mediação tem lugar em data e hora acordada por todos. 
  • Cada parte terá a oportunidade de expor o seu caso e manifestar as suas necessidades e interesses.O acordo que possa vir a ser estabelecido será, posteriormente, homologado pelo juiz de paz, por sentença.
O mediador não tem poder de decisão, ele é um terceiro imparcial com formação específica, seleccionado pelo Ministério da Justiça, que guia as partes, ajuda-as a estabelecer o diálogo necessário para que elas possam encontrar, por si mesmas, a base do acordo que porá fim ao litígio.
 
Funcionamento
  • As partes devem comparecer pessoalmente, podendo, se o desejarem, fazer-se acompanhar por advogado, advogado estagiário ou solicitador. Todavia, a constituição de advogado é obrigatória nos casos especialmente previstos na lei e quando seja interposto recurso da Sentença.
  • Os horários de funcionamento dos JdP estão previstos nos respetivos regulamentos. Nos JdP não existem férias judiciais, porque são tribunais, mas não são judiciais e releva, fundamentalmente, a disponibilidade.
  • Atualmente estão em funcionamento 25 JdP, com uma abrangência alargada face a agrupamentos de concelhos.
  • Quando não haja JdP no concelho que seria territorialmente competente, os interessados podem utilizar qualquer JdP, embora só para mediação, e se as partes não a recusarem.
Diagrama da tramitação
 
Nos JdP a tramitação processual tem uma forma própria e simplificada, podendo, inclusive, as partes apresentarem as peças processuais oralmente. Os litígios que dão entrada nestes Tribunais podem ser resolvidos na decorrência de mediação, conciliação, transação ou por meio de julgamento e consequente sentença. 


3/15/2022

Inconstitucionalidade art. 1433º, nº 4, do CC

Jurisprudência do TC

Processo n.º 441/2010
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrida a Administração do Condomínio do prédio sito na …, n.º .., na Amadora, foi interposto recurso de constitucionalidade da sentença daquele Tribunal, para apreciação da inconstitucionalidade da norma do art. 1433º, nº 4, do CC, na interpretação segundo a qual «o prazo para intentar acção de anulação de deliberação do condomínio é de sessenta dias, indistintamente quer para condóminos presentes, quer para os ausentes, a partir da data da deliberação, e não da data da comunicação ao condómino ausente, comunicação essa, aliás, obrigatória nos termos do art. 1432°, nº 6, do mesmo diploma», por violação dos art. 2º, 13º e 20º da CRP.

2. O recorrente apresentou alegações onde conclui o seguinte:

«1- O acórdão recorrido faz uma interpretação desconforme com a Constituição do normativo inserto na parte final do art. 1433º, nº 4, do CC, ao afirmar que o prazo para e condómino ausente impugnar deliberação da assembleia de condóminos se conta a partir da data da deliberação, mesmo para os condóminos ausentes e independentemente do conhecimento das deliberações.

2- A obrigatoriedade de comunicação acta da assembleia ao condómino ausente, que impende sobre o administrador do condomínio, destina-se a dar conhecimento das deliberações ao condómino ausente para que possa exercer os direitos que a lei consagra, designadamente o direito de impugnar as deliberações ilegais não havendo fundamento material bastante para estabelecer uma distinção entre o direito a impugnar a deliberação, por um lado, e os direitos de exigir a convocação de assembleia extraordinária, recorrer a centro de arbitragem ou manifestar a estar sua discordância ou assentimento relativamente a deliberações que exijam unanimidade.

3- Entendimento diverso, ao impor sobre o condómino ausente um ónus de se informar, pelos seus próprios meios, do teor da deliberação da assembleia de condóminos, deixando-o na dependência de terceiros, e criando um regime menos favorável do que vigora para os condóminos presentes, com risco de, sem culpa sua ficar impossibilitado de impugnar uma deliberação ilegal, viola os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da confiança e do acesso aos tribunais, princípios ínsitos na ideia de Estado de Direito Democrático.

4- O prazo de sessenta dias para o condómino ausente impugnar a deliberação da assembleia de condóminos deve ser contado a partir da notificação da deliberação ao condómino ausente. Normas violadas: art. 2º, 13° e 20° da Constituição da República. Termos em que o art. 1433°, n°4, do CC, deve ser julgado materialmente inconstitucional na interpretação que lhe foi dada pelo acórdão recorrido ao dispensar o conhecimento da deliberação para o início da ontem do prazo para instauração da acção de impugnação, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!»

3. O recorrido contra-alegou, concluindo o seguinte: «Em resumo, dir-se-á que: Basta estar atento — como atento terá que estar no caso de haver lugar à 2.ª reunião da assembleia, a qual se considera convocada para uma semana depois, na mesma hora e local (nº 4 do art. 1432º do CC) - para não deixar esgotar o prazo de 60 dias a contar da data da deliberação que pretende impugnar (...)” — reitera-se. Porquanto, em relação à caducidade do direito de propor a acção anulatória, deixou de haver distinção entre condóminos presentes e condóminos ausentes” (reitera-se).

Pois, entendimento diverso — no sentido de a contagem do prazo de caducidade da acção anulatória se iniciar só com a comunicação nos termos do nº 6 do art. 1432º do CC — que trata de situações diferentes, propiciará o laxismo, absentismo e a indefinição das questões condóminas, ao contrário do que, naturalmente, é pretendido pela lei e que o legislador pretendeu abolir com a reformulação introduzida em 1994.

O Acórdão recorrido, seguiu na esteira da jurisprudência e doutrina maioritárias, que os condóminos têm de diligenciar no sentido de conhecerem o teor das deliberações, para, se o desejarem, poderem impugná-las no prazo dilatado de 60 dias (repare-se que o primitivo prazo de 20 dias foi alargado) sobre a data da deliberação. Não da comunicação da deliberação, como primitivamente se estipulava, regime alterado e reformulado pelo DL 256/4, de 24.10. 

O objectivo é claro, e jurisprudencialmente aceite, que a aspiração é: “(...) de se privilegiarem os meios extrajudiciais (a assembleia extraordinária) ou parajudiciais (o centro de arbitragem) para a apreciação e eventual revogação das deliberações anuláveis a que se reporta o nº 1 do art. 1433º, do CC”.

Ao assegurar a defesa dos seus direitos aos condóminos, através quer de meios judiciais, extrajudiciais e parajudiciais, não se observa como pode estar a ser violado o princípio constitucional do acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no art. 20º da CRP. Os condóminos faltosos terão de cuidar diligentemente de se informar sobre se teve ou não lugar a assembleia e se novo dia foi efectivamente designado e terão, de igual modo, de diligenciar no sentido de conhecerem o teor das deliberações, para, se o desejarem, poderem impugná-lo no prazo dilatado de 60 dias (repare-se que o primitivo prazo de 20 dias foi alargado) sobre a data da deliberação e, não da comunicação da deliberação, como primitivamente se estipulava, mas regime de prazo que foi revogado e sublinhado por outro.

É manifesto, assim, que a impossibilidade de recurso a juízo, com êxito, surgiu como resultado da negligência do recorrente em propor a acção, se bem que por escassos dias, o que se presume que este da lei tinha conhecimento. Entende o recorrido que deve ser mantida a interpretação, dada ao art. 1433º, nº 4 do CC, no sentido de que o prazo de caducidade para interpor a acção de anulação é de 6 dias para todos os condóminos, sendo o prazo a quo, contado da data da deliberação da assembleia de condóminos, não só porque foi este o teor literal dado pelo legislador ordinário, com pelo facto de esta interpretação não violar nenhum dos preceitos com consagração constitucional e invocados pelo recorrente, nomeadamente os art. 2º, 13º e 20º da CRP, sufragando in totum a interpretação da lei feita pelo STJ e constante do aresto.

Nestes temos, há que concluir pela não inconstitucionalidade:
a) Da parte final do nº 4, do art. 1433º do CC; ou,
b) Do referido artigo 1433º, nº 4, por não ser materialmente inconstitucional na interpretação que lhe foi dada pelo Acórdão recorrido, quando consagra que a contagem do prazo para a instauração da acção de anulação, se conta da data da deliberação, negando-se assim provimento ao recurso, com o que se fará como sempre a costumada JUSTIÇA!»

II - Fundamentação

4. O art. 1433º do CC, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 267/94, de 25/10, estabelece o seguinte:

«Artigo 1433.º (Impugnação das deliberações)
1. As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.
2 - No prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.
3 - No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.
4 - O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação.
5. Pode também ser requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei de processo.
6. A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.»

Constitui objecto do presente recurso a norma do nº 4 deste preceito legal, quando interpretada no sentido de que o prazo para intentar a acção de anulação de deliberação da assembleia do condomínio é de 60 dias, tanto para a os condóminos presentes como para os ausentes, contando-se o prazo a partir da data da deliberação e não da data da comunicação ao condómino ausente.

Alega o recorrente que fazer coincidir o termo inicial do prazo para o exercício do direito de anulação com a data da deliberação tem como consequência que ao condómino ausente seja coarctado “o direito de impugnar judicialmente a deliberação da assembleia, criando um regime menos favorável ao que vigora para os condóminos presentes”.

O tratamento uniforme, quanto a este ponto, de acordo com a interpretação impugnada, de condóminos presentes e ausentes na assembleia de condomínio corresponde ao teor literal do actual nº 4 do art. 1433º do CC, introduzido pelo DL 267/94, de 25/10. Esta norma veio afastar o anteriormente disposto - desde a redacção inicial do CC – no nº 2 do mesmo artigo, nos termos do qual «o direito de propor a acção caduca, quanto aos condóminos presentes, no prazo de vinte dias a contar da deliberação e, quanto aos proprietários ausentes, no mesmo prazo a contar da comunicação da deliberação.» Isto é, se, quanto à duração do prazo de caducidade, a nova lei o alongou para 60 dias, no que se refere ao início da sua contagem, fê-lo coincidir com a data da deliberação, sem qualquer distinção entre condóminos presentes e condóminos ausentes.

Este último aspecto, e não obstante a enunciação expressa desse termo inicial, suscitou controvérsia interpretativa, sustentando parte da doutrina – cfr. Sandra Passinhas, A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal, 2.ª ed., Coimbra, Almedina, 2002, págs. 249-250, n. 626, e Aragão Seia, Propriedade horizontal, 2.ª ed., Coimbra, Almedina, pág. 179 – e da jurisprudência – cfr., por exemplo, o acórdão do STJ, de 21 de Janeiro de 2003 - que, para os condóminos ausentes, releva a data da comunicação, e não a da deliberação.

Excede a competência do TC - restrita, no domínio da fiscalização concreta, a decidir, em último recurso, questões de constitucionalidade - pronunciar-se sobre a interpretação que melhor cabe ao segmento normativo em causa, em face dos elementos hermenêuticos disponíveis. O Tribunal é apenas chamado a ajuizar da conformidade constitucional da interpretação efectivamente seguida e aplicada na decisão recorrida. O que, no caso, implica decidir se a contagem do prazo de caducidade de propositura da acção de anulação a partir da data da deliberação e não da sua comunicação aos condóminos ausentes viola ou não algum princípio constitucional ou algum direito constitucionalmente garantido.

5. Para a formulação de um tal juízo, importa ter presente que o DL nº 267/94 não se limitou, em matéria de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos, à alteração assinalada. Na verdade, para além da já anteriormente admitida impugnação judicial, através da competente acção de anulação, aquele diploma consagrou novas vias alternativas de reacção a deliberações inválidas ou ineficazes, por qualquer condómino que não as tenha aprovado. Elas constam, na redacção actual, dos nº 2 e 3 do art. 1433º do CC, conferindo, o primeiro, a faculdade de exigir ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária para revogação de tais deliberações, e outorgando, o último, o poder de “sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem”.

Para além disso, o art. 1432º passou a integrar, entre outras alterações, uma norma, dispondo que «as deliberações têm que ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, por carta registada com aviso de recepção, no prazo de 30 dias» (nº 6). Do conjunto destas disposições resulta que, perante uma deliberação anulável, um condómino, para tal habilitado pela não aprovação dessa deliberação, tem, hoje, ao seu dispor, para além da propositura da acção de anulação, outros dois meios de atacar a deliberação: a exigência de convocação de uma assembleia extraordinária e a possibilidade de accionar uma decisão arbitral. E, no caso de um condómino ausente, qualquer dos prazos estabelecidos para estas duas iniciativas – 10 dias, quanto à primeira; 30 dias, quanto à segunda – se conta a partir da comunicação da deliberação – comunicação que, já vimos, deve ser feita por carta registada com aviso de recepção, portanto, com sólida garantia de cognoscibilidade do seu conteúdo, por parte do destinatário. Acresce que, se a deliberação da assembleia extraordinária não for no sentido da revogação da deliberação impugnada, ela pode ser objecto de uma acção de anulação, a propor no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária (1ª parte do nº 4 do art. 1433º). Sublinhe-se, ainda, que a eventual não convocação, pelo administrador, da assembleia extraordinária, é suprível pelo mecanismo geral de recurso, predisposto no art. 1438º do CC, de convocação directa e individual pelo próprio condómino.
 
Feita a necessária articulação da 2ª parte deste preceito com essas outras disposições do bloco normativo em que está integrada, também relevantes do ponto de vista da satisfação do interesse em impugnar uma deliberação anulável, apura-se um resultado não coincidente com o que obteríamos mediante a leitura isolada daquele segmento normativo. De facto, dado que os prazos de caducidade dos meios alternativos de impugnação só começam a contar da data da comunicação da deliberação, está excluído que o prazo de 60 dias se esgote sem que o interessado já tenha tido, ou venha a ter, uma possibilidade efectiva de reagir judicialmente contra a decisão anulável.

Explicitando melhor. Dado que a comunicação deve ser feita no prazo de 30 dias e os prazos de caducidade previstos no nº 2 e 3 do art. 1433º são substancialmente mais curtos do que o do nº 4, corresponderá à normalidade, se a gestão do condomínio se processar com regularidade, que, no termo daquele período, já tenham também decorrido os prazos de 10 e de 30 dias, a contar da comunicação. Se assim for, já não é exercitável o direito de impugnar, por qualquer das vias previstas. Mas esse resultado não pode ser imputado à falta de garantias de cognoscibilidade da deliberação.

Na hipótese contrária, de, no termo final do prazo de 60 dias, ainda não terem começado a contar ou não terem ainda findado aqueles prazos, devido a omissão de comunicação ou comunicação tardia da deliberação ao condómino ausente, a situação não importa a definitiva preclusão da satisfação do interesse em impugnar, pois subsiste a possibilidade de recurso aos meios alternativos. Na realidade, esse prazo de 60 dias – em face dos termos da estatuição do nº 4 e da sua inequívoca adstrição unicamente ao direito nele previsto - não pode valer, independentemente do que possa ter sido a intenção legislativa, como um prazo-limite objectivo para todas as vias de impugnação, mas apenas o prazo especificamente aplicável à propositura directa da acção de anulação, pelo que o seu decurso total em nada prejudica o exercício do direito de impugnação, pelos meios previstos no nº 2 ou nº 3 do art. 1433º, dentro dos respectivos prazos. E nem sequer importa o afastamento do recurso à via judicial, pois, se o condómino optar pela convocação de uma assembleia extraordinária, a deliberação desta (que, obviamente, recaiu sobre a deliberação primitiva) é anulável judicialmente; se optar pelo recurso a um centro de arbitragem, a decisão arbitral terá, sem mais, a força e produzirá os efeitos de uma decisão judicial (art. 26º, nº 2, da Lei 31/86, de 29/8).

Significa isto que o não aproveitamento do prazo de 60 dias, por eventual desconhecimento da deliberação e do seu teor, resultante de não ter sido efectuada comunicação tempestiva dela, não tem como consequência a extinção do direito de impugnar, em juízo, essa deliberação (ou, o que vem dar ao mesmo, a deliberação que não a revogou). Esse direito fica sempre salvaguardado, ainda que já não se possa suscitar directamente a intervenção de uma instância judicial estadual.

Num plano infraconstitucional, é legítimo questionar o bem fundado da indiferenciação de tratamento de condóminos presentes e ausentes, quanto ao início de contagem do prazo de 60 dias para propor a acção de anulação da deliberação, contrariamente ao estabelecido na redacção anterior e ao consagrado nos actuais nº 2 e 3 do art. 1433º, quanto aos prazos aí previstos. Pode, até, suscitar-se dúvidas quanto à coerência interna do sistema, tendo particularmente em conta a obrigatoriedade de comunicação das deliberações aos ausentes. Mas a interpretação normativa contestada não acarreta a perda irremediável do direito dos condóminos ausentes à tutela jurisdicional efectiva do seu interesse em impugnar, nem sequer, a dificultação excessiva do seu exercício.

6. É certo que estes condóminos podem efectivamente vir a dispor de um período de tempo mais curto do que o utilizável pelos condóminos presentes para ponderarem e tomarem uma decisão quanto à impugnação judicial, no caso de só terem tido conhecimento da deliberação, através da comunicação, quando decorrido parte do período de 60 dias. Ou, se não quiserem recorrer a um centro de arbitragem, podem, mesmo, verem-se obrigados, contra a sua vontade, a lançar mão previamente da exigência de convocação de uma assembleia extraordinária, no caso (anómalo, há-de convir-se, e configurando um incumprimento grosseiro do prazo legal) de a comunicação não ser efectuada em tempo útil, antes de extinto aquele prazo.

Mas nenhuma destas desvantagens comparativas é de molde a sobrecarregar o condómino ausente com ónus gravosamente desproporcionados. A convocação obedece à forma de carta registada (nº 1 do art. 1432º) e, pelo menos quando a impossibilidade de comparência pessoal é antecipadamente previsível, o condómino pode fazer-se representar, preservando, assim, as vantagens da participação na assembleia e do conhecimento imediato das deliberações. Se não o fizer, pode ainda diligenciar para obter informações sobre o resultado da assembleia, antes de receber a comunicação na forma legal.

Reconhece-se que o exercício do direito de impugnar com recurso directo a uma acção de anulação pode exigir do condómino ausente uma diligência acrescida, quer na recolha de dados quanto à tomada e ao teor das deliberações, quer, sobretudo, na rapidez das iniciativas a desenvolver com vista à propositura dessa acção. Em casos-limite, pode, até, ver inviabilizado, pelo decurso do prazo, o acesso directo a um tribunal judicial. Mas, resultando a ausência de uma factor da esfera pessoal, e mesmo quando ela não proceda de desinteresse ou incúria, mas antes de uma razão objectivamente justificativa, não se afigura que o princípio da igualdade imponha ao legislador medidas legais compensatórias, de forma a colocar o ausente, em todos os planos e para todos os efeitos, exactamente na mesma posição do condómino presente.

Em último termo, o condómino ausente tem sempre garantido, em qualquer circunstância, o que é essencial: uma oportunidade efectiva em exercitar o seu direito de impugnar, com garantia de intervenção, ainda que em via de recurso, de uma instância judicial.

III - Decisão

Pelo exposto, acordam em:

a) Não julgar inconstitucional a norma do art.1433º, nº 4, do CC, quando interpretada no sentido de que o prazo para intentar acção de anulação de deliberação do condomínio é de sessenta dias, indistintamente quer para condóminos presentes, quer para os ausentes, a partir da data da deliberação, e não da data da comunicação ao condómino ausente; b)Consequentemente, negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 UC.

Lisboa, 9 de Dezembro de 2010.- Joaquim de Sousa Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.

4/21/2021

Resolução alternativa de conflitos - Arbitragem

ART. 1418º do CC
(Conteúdo do título constitutivo)


1. (...)
2. Além das especificações constantes do número anterior, o título constitutivo pode ainda conter, designadamente:
a) (...)
b) (...)
c) Previsão do compromisso arbitral para a resolução dos litígios emergentes da relação de condomínio.
3. (...)

Art. 1434º do CC
(Compromisso arbitral)


1. A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios entre condóminos, ou entre condóminos e o administrador (...).
2. (...)

Art. 324º do CC
(Compromisso arbitral)


1. O compromisso arbitral interrompe a prescrição relativamente ao direito que se pretende tornar efectivo.
2. Havendo cláusula compromissória ou sendo o julgamento arbitral determinado por lei, a prescrição considera-se interrompida quando se verifique algum dos casos previstos no artigo anterior.

Quanto ao Centro de Arbitragem

O recurso a um Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo é uma forma alternativa para a resolução dos conflitos entre os condóminos, entre estes e o administrador ou entre o condomínio e terceiros prestadores de serviços diversos, não tendo os inconvenientes dos tribunais, tais como os elevados custos, a complexidade do processo judicial e a sua reconhecida lentidão.

Esta solução pode revelar-se de grande utilidade, nomeadamente, quando não houver um Julgados de Paz situado no concelho onde se situa o condomínio ou, havendo-o, se o valor da causa exceder o montante limite estabelecido para a sua competência (valores que não ultrapassem os € 15 000).
 
A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios entre condóminos, ou entre estes e o administrador, mediante disposição contida no regulamento do condomínio (cfr. art. 1429ºA do CC) ou do TCPH (cfr. art. 1418, nº 2, al. b) do CC), aprovada por unanimidade e nos termos do art. 1432º, nº 5 e segs. do CC.

No entanto, no âmbito do consumo, o art. 15º, nº 1, da Lei nº 23/96 aplica-se mesmo que não tenha sido celebrado um contrato entre as partes, podendo o litígio de consumo resultar de uma relação pré-contratual ou até mesmo não contratual, sendo, para tanto, essencial que exista uma relação entre as partes.

O condomínio tem assim legitimidade para iniciar uma acção arbitral num centro de arbitragem de consumo desde que possa ser qualificado como consumidor, o que sucede sempre que, numa perspectiva objectiva, o bem ou o serviço em causa possa ser considerado um bem ou um serviço de consumo para uma das pessoas que o condomínio representa, como é o caso do condomínio do demandante.
 
O processo corre os seus termos em conformidade com o Regulamento do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo (Autorizado por despacho do Secretário de Estado da Justiça nº 20778, de 8 de Setembro de 2009, publicado no Diário da República, 2ª série, de 16 de Novembro de 2009, pp. 37874 e 37875), e pode concretizar-se de duas formas: (i) através de pessoas escolhidas de comum acordo pelas partes (árbitros); ou (ii) através de centros especializados.

No primeiro caso, os condóminos terão necessariamente que observar o cumprimento de algumas regras, designadamente: (i) Ambas as partes têm o direito de serem tratadas com igualdade; (II) A parte contra quem é proposta a acção tem o direito a apresentar a sua defesa; e (III) Antes de proferida a decisão, as partes conflituosas podem pronunciar-se, oralmente ou por escrito.

Acresce ressalvar que, salvo convenção em contrário, a decisão deve ser proferida dentro de um prazo de 6 meses após a designação do último árbitro, a qual deve ser fundamentada e definir qual a repartição dos custos do processo. Importa outrossim salientar que, regra geral, as decisões da arbitragem têm o mesmo valor de uma sentença proferida por um tribunal de primeira instância.
 
Como funciona o processo de arbitragem?

O demandante pode deslocar-se pessoalmente, enviar os documentos por correio electrónico ou preencher um formulário disponibilizado na página do site do Centro, onde alega em síntese os factos, juntando toda a prova que lograr produzir e que sustente os mesmos, documentos estes que serão juntos ao processo.
 
Os juristas começam por avaliar se o caso pode ir a julgamento. Caso afirmativo será subsequentemente designado o árbitro signatário por despacho da coordenação do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo.

A parte demandada é citada para contestar no prazo de 10 dias, nos termos do art. 14º, nº 2, do Regulamento, para apresentar, se assim o entender, a sua contestação. Se não contestar no prazo havido definido, é proferido um despacho pelo tribunal arbitral, dando nota da ausência de contestação por parte da demandada.

Contestando, segue-se o processo de arbitragem propriamente dita. Subsequentemente e nos termos do art. 14º do Regulamento do CNIACC, o juiz considera, no despacho que estando reunidos todos os elementos para decidir, convida as partes a vir ao processo, no prazo de 10 dias a contar da notificação daquele despacho, e apresentarem, querendo, alegações finais.

Além da questão material, o juiz pode dar nota que pode importar, ainda, resolver, no âmbito do processo, como questões prévias, a competência do Centro (saber se existe um litígio de consumo entre as partes) e a legitimidade substantiva do demandante (por um lado, saber se é condómino, administrador ou terceiro titular de direitos sobre as fracções (se não declarar primitivamente a sua qualidade); por outro lado, saber se o direito à indemnização pode ser exercido por aquele ou se tem de ser exercido pelo condomínio, na pessoa do seu legítimo administrador).

O despacho é então notificado às partes. O demandante pode então juntar novos documentos de prova (nomeadamente da sua qualidade) e bem, acrescentar as suas alegações finais, sendo a parte demandada notificada destes elementos, a qual, por seu turno, também pode responder, juntando os documentos de prova que julgar oportunos. Desta alegação será também notificada a parte demandante.

Concluídos estes expedientes, o juiz estará em condições de decidir. Porém, antes de analisar qualquer outra questão, o juiz começa por verificar se o tribunal arbitral é competente para a resolução daquele litígio.

Este poderá decidir que o demandante submeteu o presente litígio à apreciação daquele tribunal arbitral ao abrigo do art. 15º, nº 1, da Lei nº 23/96 (Lei nº 23/96, de 26/7, alterada pelas Leis nº 5/2004, de 10/2, 12/2008, de 26/2, 24/2008, de 2/6, 6/2011, de 10/3, 44/2011, de 22/6, e 10/2013, de 28/1), que estabelece que “os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à apreciação do tribunal arbitral dos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados”.

Seguidamente observa se foi celebrado qualquer contrato entre o demandante e a demandada. Não o existindo e segundo o entendimento generalizado de que não é fundamental que exista um contrato entre as partes, para que o art. 15º, nº 1, da Lei 23/96 seja aplicável, podendo o litígio de consumo resultar de uma relação pré-contratual ou até mesmo não contratual.

Finalmente, importa sublinhar que nas acções contra terceiros, deve agir quem tiver uma relação com a entidade demandada e, portanto, nestes casos só o condomínio poderia – e poderá, se assim o entender, através do administrador – iniciar o processo de arbitragem ao abrigo do art. 15º, nº 1, da Lei, até porque, a verificar-se uma eventual indemnização pelos factos subjacentes ao processo deve ser atribuída ao condomínio –e não a cada um dos condóminos –, que depois decidirá o destino a dar ao valor em causa, sob pena da absolvição da demandada da instância por incompetência do tribunal arbitral. 
 
Quanto custa recorrer aos Centros de Arbitragem de Conflitos?

Se pensa que recorrer a este tribunal pode ser dispendioso, vamos aos custos: 
- Para se inscrever tem de se pagar 10 euros. 
Se a mediação não resultar e for preciso comparecer perante um juiz:
- Se o bem comprado ou serviço prestado for inferior a 200 euros, o queixoso não paga nada;
- Se o bem comprado ou serviço prestado for até 1 000 euros, o custo é de 20 euros;
- Se o bem comprado ou serviço prestado for entre os 1 001 e 2 000 euros, paga 30 euros;
-
Se o bem comprado ou serviço prestado for entre 2 001 e 5 000 euros, paga um máximo de 40 euros.
 
Atente contudo que cada centro pode ter as suas próprias taxas, pelo que pode consultar as tabelas do que fica mais próximo. Não é preciso contratar um advogado, pelo que o queixoso pode defender-se a si próprio. Em conflitos de água, luz, gás, telecomunicações e bancos (em algumas situações), as empresas são obrigadas a comparecer neste tribunal. As outras só comparecem se quiserem, sendo muito raro haver uma recusa.
 
Para mais informação, os condomínios podem:

Consultar o Regulamento do Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo.

Ou contactar directamente o Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo:

Endereço: R. Dom Afonso Henriques Nº1, 4700-030 Braga
Telefone: 253 619 107
E-mail: geral@cniacc.pt
Horário: Segunda a Sexta, das 9h às 16h

4/15/2021

Das decisões dos tribunais

Como em todos os sectores de actividade, sobre as decisões dos tribunais impende uma imprevisibilidade na orientação das suas decisões o que, para os condóminos e administradores de condomínios mais desavisados, transparece que julgam de forma diversa para situações análogas.

Neste concreto, há que considerar que no nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido (cfr. art. 655º do CPC).

Perante o estatuído neste artigo pode concluir-se, por um lado, que a lei não considera o juiz como um autómato que se limita a aplicar critérios legais apriorísticos de valoração. Mas, por outro lado, também não lhe permite julgar apenas pela impressão que as provas produzidas pelos litigantes produziram no seu espírito. Antes lhe exige que julgue conforme a convicção que aquela prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação (cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175).

Na verdade prova livre não quer dizer prova arbitrária, caprichosa ou irracional. Antes quer dizer prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente, posto que em perfeita conformidade com as regras da lógica e as máximas da experiência (cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245).

Por outro lado há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas, pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.

Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» (cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003). Acresce sublinhar que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais (cfr. Ac. do STJ de 20.09.2004).

Efetivamente, com a produção da prova apenas se deve pretender criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente num grau de probabilidade o mais elevado possível, mas em todo o caso assente numa certeza relativa, porque subjetiva, do facto. Uma tal convicção existirá quando e só quando o Tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável (cfr. Figueiredo Dias, in Dto. Processual Penal I Pág. 205).

Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade, e, até, falibilidade, vg. no que concerne á decisão sobre a matéria de facto. Mas tal é inelutável e está ínsito nos próprios riscos decorrentes do simples facto de se viver em sociedade onde os conflitos de interesses e as contradições estão sempre, e por vezes exacerbadamente, presentes, havendo que conviver - se necessário até com laivos de algum estoicismo e abnegação - com esta inexorável álea de erro ou engano.

O que importa, é que se minimize o mais possível tal margem de erro. O que passa, tendencialmente, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum. 

É que a verdade que se procura, não é, nem pode ser, uma verdade absoluta -porque assente em premissas de cariz matemático-, mas antes uma verdade político-jurídica, a qual é consecutida se a sentença convencer os interessados diretos: as partes – e, principalmente, a sociedade em geral, do seu bem fundado: isto é, a sentença valerá acima de tudo se for validada e aceite socialmente.

Nesta perspetiva há que considerar que a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas, nem pode significar a desvalorização da sentença de 1ª instância, que passaria a ser uma espécie de "ensaio" do verdadeiro julgamento a efetuar pelo Tribunal da Relação. 

Na verdade e como dimana do preâmbulo do DL nº 39/95, de 15 de Fevereiro: «a intenção do legislador, ao permitir um «2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, não é a pura e simples repetição das audiências perante a Relação, mas mais singelamente, a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento» (cfr. Acs. do STJ de 02.12.2008 e de 05.09.2011).

A função do Tribunal da 2ª Instância deverá circunscrever-se a "apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1º grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos (cfr. Ac. do Tribunal Constitucional de 3.10.2001, in Acórdãos do TC vol. 51º, pág. 206 e sgs e Ac. da Rel. de Lisboa de 16.02.05).

«Assentando a decisão recorrida na atribuição de credibilidade a uma fonte de prova em detrimento de outra, com base na imediação, tendo por base um juízo objectivável e racional, só haverá fundamento válido para proceder à sua alteração caso se demonstre que tal juízo contraria as regras da experiência comum» (cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 18.08.04).

Neste contexto, em recurso compete apenas sindicar a decisão naquilo em que de modo mais flagrante se opuser à realidade, pois há que pressupor que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade que se presume já que por virtude delas na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis (cfr.  Ac. do STJ de19.05.2010).

Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade -, mais importante do que a validade científica dos mesmos, pois que o julgador pode não estar habilitado a avaliá-los nesta vertente (cfr. Acs. do STJ de 19.05.2005 e de 23-04-2009).

Destas sortes, o respeito pelas decisões dos tribunais é um dever cívico para o cidadão e uma obrigação política e administrativas para as autoridades pública.