Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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01 dezembro 2024

Adenda à acta


A adenda constitui-se como uma ferramenta determinante para garantir a actualização da informação vertida em sede da acta da reunião plenária do condomínio, seja para rectificar, seja para se acrescentar informação em falta. Ao permitir a inclusão de novas informações ou a modificação das existentes, ela assegura que a acta reproduza fielmente o que ocorreu ou se deliberou na assembleia geral, sem necessidade de se reescrever a acta integralmente.

Seguidamente, replica-se um singelo exemplo de uma minuta de adenda.


Adenda à acta nº ... atinente à assembleia geral ... (ordinária/extraordinária) de condóminos realizada no dia ..., do mês de ... de ... _(ano)

Verificando-se que, após a aprovação da acta da reunião plenária acima mencionada, foi detectada ... (a ausência de deliberação / informação incorrecta, erro de escrita, etc.) constante na minuta da referida acta, vem o administrador, na sua cumulativa qualidade de presidente da mesa, lavrar o presente aditamento que se anexa à referida acta:

... (teor do aditamento)

Presente a informação supra, para constar e devidos efeitos se lavrou a presente adenda à acta da reunião plenária acima mencionada, que depois de redigida e subscrita, vai ser devidamente assinada por mim, sendo subsequentemente lida e se achada conforme, vai ser assinada pelos condóminos presentes, sendo enviada cópia aos ausentes e ficando esta posteriormente apensa à acta da assembleia.

Aos ... dias do mês de ... de ... (ano)

O Presidente da mesa,


_________________________



13 outubro 2024

Acta assembleia universal

 

Assembleia-Geral Extraordinária de Condóminos

Acta nº (...)

Da assembleia plenária

Aos (...) dias do mês de (...) de (...), pelas (...) horas e (...) minutos, reuniu, na (...) do edifício, a Assembleia-Geral de Condóminos com carácter extraordinário, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, sito na direcção supra-mencionada.

Foi verificado estar presente e devidamente representada a totalidade dos condóminos representativos do capital investido, conforme lista de presenças que se anexa à presente acta e elaborada para a presente reunião plenária, pelo que foram dispensadas as formalidades prévias atinentes ao regime regra previsto no art. 1432º do CC.

Para competente deliberação, foi proposta, e por todos aceite, a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto único:  (...)

Do termo de abertura

Exerceu as funções de Presidente da Mesa da Assembleia, adiante designada por MAG, o senhor (...) que verificou se estavam reunidos todos os condicionalismos intrínsecos à efectivação da reunião plenária, mediante a certificação do cumprimento das disposições legais aplicáveis, nomeadamente, na verificação da regularidade da realização desta assembleia universal e da qualidade dos condóminos presentes.

A Assembleia-Geral extraordinária dos Condóminos houve-se constituída assim com a presença dos senhores condóminos que assinaram a competente lista de presenças, a qual será outrossim devidamente anexada à presente acta.

Havendo-se concluído que a mesma estava regularmente constituída e estava, por isso, em condições de validamente reunir e deliberar, o senhor Presidente da MAG, no uso da palavra, quis deixar um cumprimento de respeito e sentido de amizade aos senhores condóminos presentes, informando-os que esta poderia deliberar validamente, declarando consequentemente aberta a sessão plenária.

Do período antes da ordem de trabalhos

Seguidamente e no uso da palavra, o senhor Presidente da MAG, salientou que o senhor Administrador havia manifestado o interesse no uso da palavra, e que começaria a sua intervenção, transmitindo aos senhores condóminos uma nota prévia que considerava relevante.

(...)

Atento o que foi dito, pronunciaram-se, acto contínuo, os condóminos (...) e (...), que manifestaram (...).

Passada a palavra aos senhores condóminos presentes em plenário, foram apresentados, pelo condómino (...), os considerandos seguintes (...).

Submetidos ao crivo do contraditório, pronunciou-se o senhor condómino (...) para salientar que (...). Nesta factualidade, também o senhor condómino (...) foi de observar que (...) 

E, por ninguém mais ter manifestado o interesse em fazer uso da palavra, o senhor presidente da MAG declarou, sem mais, estar encerrado o período antes da ordem de trabalhos. 

Do período da ordem de trabalhos

O senhor Presidente da MAG procedeu subsequentemente à leitura do ponto único da ordem de trabalhos, sujeitou-o seguidamente à aprovação dos senhores condóminos, após a qual, se passou de imediato à apreciação e discussão da referida matéria atinente à ordem do dia.

(...)

Do termo de encerramento

Concluída a discussão do ponto constante da ordem de trabalhos, nada mais havendo a tratar, e ninguém mais tendo manifestado qualquer intenção de usar da palavra, o senhor Presidente da MAG solicitou um voto de confiança para que a acta por aquele fosse lavrada em momento oportuno, o qual lhe foi conferido com os votos favoráveis de todos os presentes.

Nesta conformidade, deu o senhor Presidente da MAG por concluídos os trabalhos desta assembleia, saudando finalmente os senhores Condóminos pela presença, manifesto interesse na matéria debatida, contribuição e deferência demonstrada para o bom andamento da reunião, dando assim por encerrada a presente sessão plenária.

Eram (...) horas e (...) minutos.

Para constar e devidos efeitos, na data infra, se lavrou a presente acta da assembleia, fornecendo todos os elementos necessários à apreciação da legalidade das deliberações nela tomadas, tendo-se esta composta por (...) folhas avulsas, impressas e com o verso em branco que, postas a aprovação de todos os condóminos presentes, após lidas, achadas conformes na sua redacção com o que de essencial se passou, vão ser as três primeiras rubricadas e a quarta assinada, em sinal de aprovação.

Devidamente subscrita e validada nesses termos, ter-se-à a mesma anexa ao respectivo livro, à guarda do senhor Administrador, que distribuirá cópias por quem as solicitar.

Aos (...) dias do mês de (...) de (...)

O senhor Presidente da MAG:


___________________________

O senhor Administrador:


______________________________

Os senhores Condóminos:

27 junho 2024

Art. 6º/5 DL 268/94, introduzido pela Lei nº 8/2022, de 10/01


O DL nº 268/94, de 25 de Outubro pretendeu, entre outros aspectos conseguir o “objectivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros” (cfr. o seu preâmbulo).Na sua versão original, o artº 6º, sob a epígrafe “dívidas por encargos de condomínio”, tinha a seguinte redação:

1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
2 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior.

A Lei nº 8/2022, de 10 de Janeiro, procedeu à revisão do regime da propriedade horizontal e alterou determinados preceitos do Código Civil, bem como do DL nº 268/94. Em particular, alterou o art. 6º, nos seguintes termos:

1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.
2 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no nº 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
3 - Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.
4 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no nº 1 e 3.
5 - A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.

Importa aqui atentar à interpretação do nº 5 deste art. 6º resultante desta alteração.

Alguma jurisprudência entende que o preceito impôs um novo pressuposto à cobrança judicial das dívidas por encargos de condomínio, ou seja, a acção só poderia ser intentada se o valor em dívida for igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais no respetivo ano civil. (1)

Começando pela letra da lei, o art. 6º constitui uma norma complexa, na medida em que estatui sobre matérias diversas, umas de índole substantiva, outras adjectivas. Assim:

● A epígrafe do preceito estabelece o âmbito, ou seja, regula sobre as dívidas por encargos de condomínio.
● O nº 2 confere força executiva à acta da reunião da assembleia de condóminos para efeitos de reagir contra o proprietário que deixar de pagar.
● No nº 1 estabelecem-se os requisitos para que essa acta tenha força executiva - a acta só constituirá título executivo se contiver o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações (condições de exequibilidade).
● No nº 3 refere-se que se consideram abrangidos pelo título executivo os juros de mora e as sanções pecuniárias. Contudo, também estabelece uma condicionante: os juros e sanções só integrarão o título executivo se (“desde que”) estiverem aprovados em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.
● Depois, no nº 4 impõe-se um comando ao administrador – é ele quem tem de instaurar a acção judicial para cobrar as quantias em dívida.
● Por fim, no nº 5 refere-se que essa acção judicial deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.

Daqui decorre que: (i) a acção judicial tem de ser instaurada no prazo de 90 dias a seguir ao primeiro incumprimento; (ii) só não o será se a assembleia tiver deliberado em contrário; (iii) a acção judicial só terá de ser instaurada nos 90 dias no caso em que o valor em dívida tenha já um montante igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respectivo ano civil.

Duas hipóteses se podem prefigurar:

i. a limitação do valor em dívida reporta-se à obrigação do administrador em instaurar a acção;
ii. a limitação do valor em dívida reporta-se à exequibilidade do título.

Em nosso entender, estamos perante a 1ª hipótese. A estipulação do valor em dívida por referência ao valor do indexante dos apoios sociais pretende referir-se à responsabilidade do administrador em propor a acção, e não às condições de exequibilidade do título.

Em termos gramaticais, o nº 5 do art. 6º constitui uma oração subordinada adverbial condicional que, como se sabe, exprime condição ou uma hipótese.(2)

Assim, a oração subordinada (“desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil”) tem de ser perspetivada em função da oração subordinante (“A acção judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino”).

Não faria sentido que esta oração subordinada do final do nº 5 estivesse a completar o sentido de uma outra oração (subordinante), designadamente das contempladas nos números 2 e 3 do preceito que são as que se referem à força executiva do título.

Cremos que esta interpretação é também a que melhor se enquadra no elemento sistemático de interpretação.

A Lei nº 8/2022 procedeu à revisão do regime da propriedade horizontal olhando-a como um todo, pelo que além do DL nº 268/94, alterou também preceitos do Código Civil (CC) e do Código do Notariado.

No que toca às funções do administrador do condomínio foram introduzidas inovações em termos de maior responsabilização.

Assim, nos termos da actual redacção do art. 1436º do CC, compete ao administrador exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, incluindo os juros legais devidos e as sanções pecuniárias fixadas pelo regulamento do condomínio ou por deliberação da assembleia (nº 1 al. f).

E, no nº 3 desse preceito, ficou expressamente consignado que o administrador de condomínio que não cumprir as funções que lhe são cometidas neste artigo, (…) é civilmente responsável pela sua omissão, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal, se aplicável.

Certamente que o legislador não desconhece que existem quotas mensais de condomínio de valor que se pode considerar “irrisório” (dívidas de pequeno valor), pelo que a posição dos administradores ficaria gravemente comprometida se tivessem de instaurar acções judiciais por todas e quaisquer quotas, independentemente do seu valor mensal, sob pena de incorrerem em responsabilidade civil. Além dos congestionamentos que uma tal imposição provocaria nos tribunais.(3)

Nessa medida, a estipulação do valor em dívida por referência ao valor do indexante dos apoios sociais funciona como uma limitação da obrigação imposta ao administrador em intentar acção de cobrança das dívidas.

Ou, noutra perspetiva, como uma delimitação da responsabilidade: o administrador só incorre em responsabilidade civil por omissão no caso de o valor das quotas em dívida igualar ou for superior ao indexante de cada ano civil.

Face ao exposto, conclui-se que tem existido erro na interpretação da lei.

Notas:

(1) Em 2024 é de 509,26€.
(2) «As conjunções subordinativas estabelecem uma relação de dependência entre duas orações, uma subordinante e uma subordinada, tendo esta última a função de completar o sentido da primeira (a subordinada depende da subordinante e, regra geral, pode ser anteposta)», podendo ser causais, temporais, condicionais, etc. - in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
(3) Pode ler-se na exposição de motivos do Projeto de Lei nº 718/XIV/2.ª, que deu origem à Lei nº 8/2022: «São evidentes as crescentes exigências que se apresentam a quem vive, trabalha ou simplesmente é proprietário de fracções autónomas em prédios em regime de propriedade horizontal, bem como as idênticas exigências que se colocam a quem, pessoa singular ou coletiva, tem a seu cargo a administração dos respetivos condomínios. Muitos dos condomínios apresentam um elevado número de fracções, o que, só por si, torna mais complexa a administração das partes comuns e, consequentemente, as deliberações acerca dos encargos de conservação e fruição que devem ser pagas por todos os condóminos. Tal realidade contribui, muitas vezes, para a criação de inúmeros obstáculos para quem administra os condomínios, o que, consequentemente, potencia o atraso nas decisões e, por isso, a deterioração dos prédios, acarretando prejuízo para todos os condóminos, nomeadamente prejuízos inerentes ao acréscimo de despesas futuras na recuperação dos mesmos. (…) Depois, o presente Projeto-Lei introduz mecanismos facilitadores da convivência em propriedade horizontal, nomeadamente agilizando procedimentos de cobrança, os quais a administração do condomínio pode e deve concretizar no sentido de responder às necessidades dos condóminos, de forma mais célere e eficaz.
Pretende-se também conferir um maior grau de responsabilidade, por um lado, aos próprios condóminos e, por outro lado, a quem administra o condomínio.
O diploma pretende ainda contribuir para a pacificação da jurisprudência que é abundante e controversa a propósito de algumas matérias, como, por exemplo, os requisitos de exequibilidade da ata da assembleia de condóminos, a legitimidade processual ativa e passiva no âmbito de um processo judicial e a responsabilidade pelo pagamento das despesas e encargos devidos pelos condóminos alienantes e adquirentes de frações autónomas, colocando fim, neste último aspeto, à vasta e sobejamente conhecida discussão acerca das características de tais obrigações.

25 junho 2024

Art. 6º DL 268/94 de 25/10



O art.º 703.º, n.º 1, alínea d), do CPC elenca como títulos executivos, entre outros, “Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.”

O DL nº 268/94, de 25/10 criou um destes títulos executivos especiais, procurando solução que tornasse mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros (tal como se lê no respectivo Preâmbulo).

O respectivo art. 6º dispunha que a Acta da reunião da assembleia de condóminos que tenha deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixe de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

Desta forma, o legislador passou a atribuir força executiva à Acta da assembleia de condóminos, permitindo ao condomínio instaurar acção executiva contra o proprietário da fracção, condómino devedor, relativamente à sua contribuição para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, na proporção do valor da sua fracção, sem que, previamente, tivesse que lançar mão ao processo de declaração a fim de obter o reconhecimento do crédito.

Apesar de este normativo ter, entretanto, sido alterado pela Lei nº 8/2022, de 10/01, continua a ser esta a redação aplicável ao caso em análise, já que era a vigente na data da Assembleia de Condóminos em que se produziu a Ata apresentada como título executivo.

Ao longo dos anos foi-se sedimentando na doutrina e na jurisprudência a interpretação deste normativo legal, no sentido de que apenas constitui título executivo a Acta que contenha deliberação sobre os montantes concretos das contribuições devidas ao condomínio em cada ano, a individualização da quota parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento de tais contribuições.

Esta é também a nossa opinião.

Assim, Delgado de Carvalho refere “(…) a fonte da obrigação pecuniária do condómino relapso é a própria deliberação da assembleia de condóminos, vertida em acta, que aprova e fixa o valor a pagar de imediato e para o futuro, correspondente à sua quota-parte nas contribuições e nas despesas comuns.”

Por seu turno, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, no mesmo sentido, defendem que “Em bom rigor, o que se pretende é que a obrigação (na sua constituição inicial ou traduzindo a existência de um débito) conste da acta de assembleia de condóminos e a responsabilidade do executado seja apurável por simples cálculo aritmético por referência a cada um dos períodos considerados em dívida.”

Na jurisprudência, decidiu-se neste sentido designadamente no Acórdão do STJ de 14/10/2014, tendo como Relator Fernandes do Vale: “Para constituir título executivo, a acta da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, não dependente, pois, a respectiva força executiva, da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes) nem de, nela, ser explicitado aquele valor.”

Bem como no recente Acórdão do TRP de 27/11/23, tendo como Relator Miguel Baldaia de Morais: “Para valer como título executivo nos termos do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, a ata da assembleia de condomínio tem de conter a deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, a fixação da quota-parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento respetivo.”

Aliás, quaisquer eventuais dúvidas interpretativas foram, a nosso ver, ultrapassadas pela Lei nº 8/2022, de 10/01 que, substituiu o indicado art. 6º do DL n.º 268/94, de 25/10, pela seguinte redação: “1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações. 2 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no nº 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.”

Efectivamente, este diploma legal confere força executiva às deliberações que tenham por objeto “o montante das contribuições a pagar” contra o proprietário “que deixar de pagar”.

Ora, tais deliberações são efectuadas tipicamente nas Assembleias de Condóminos em que se aprova os orçamentos para o ano seguinte e/ou os orçamentos para a realização de obras ou pagamento de outros encargos do condomínio, por referência a um valor global.

Além disso, a expressão “deixar de pagar” refere-se a uma projecção para o futuro, a um potencial futuro incumprimento, levando-nos a considerar ser desnecessária a prévia constituição em mora do condómino.

Se o Condomínio Exequente apresentar como título executivo uma acta da Assembleia de Condóminos, constando da mesma, no último ponto da ordem de trabalhos, sob o título “Outros assuntos de interesse para o condomínio”, uma lista de meses em débito associada à fração devedora e aos executados, enquanto proprietários da mesma, identificando os meses e o total em dívida, seguida da declaração de que “…a assembleia após devida discussão mandatou o Exmo. sr. Administrador mande instaurar, nos termos legais, as respetivas acções judiciais destinadas a cobrar as prestações em dívida…”.

Assiste inteira razão ao Recorrido/Embargante ao defender que nesta acta não consta qualquer deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas por si ao condomínio, nem a fixação da sua quota-parte nem o prazo de pagamento respetivo relativamente aos anos em crise. Bem como não consta sequer qualquer deliberação no sentido da aprovação das dividas vencidas dos condóminos relapsos, particularmente das do Recorrido.

Isto é, a Acta apresentada como título executivo não reune as condições de exequibilidade consagradas na lei acima analisada.

Consequentemente, uma acção assim intentada tem como resultado a decisão de procedência da excepção de falta de título contra as executadas, com a absolvição das mesmas da instância executiva, nos termos dos arts. 577.º e 578.º do CPC, e inerente extinção da execução.

20 maio 2024

Os números por extenso na acta


No acto de lavramento de uma acta, os nomes numerais devem ter-se exarados por extenso?


Em Portugal, no domínio da legislação em vigor, e no que diz respeito ao Direito Privado, não existe qualquer disposição que imponha a obrigatoriedade de se escrever por extenso os números que ocorram no texto de uma acta.

Nesta conformidade, importa observar que, a regra é a da liberdade de forma. As únicas normas legais que impõem que nas actas os números devam ser escritos por extenso, são notariais.

Nesta tessitura, serão dois os motivos que justificam o acto de ser prática vulgar (muito embora não uniforme) de se escrever, nas actas, os números por extenso.

O primeiro motivo tem-se atinente ao espírito da cautela. Para se prevenirem eventuais erros ou lapsus calamis, recorre-se à grafia por extenso, na convicção de que, com este cuidado, a probabilidade de incorrer em erros ou lapsus é mais reduzida.

O segundo pode-se explicar pela vulgaridade deste recurso é a influência da escrita dos actos notariais, que funciona como paradigma para muitos instrumentos da vida jurídica. Em bom rigor, nestes, em regra, é obrigatório recorrer ao extenso – pese embora seja permitido o uso de algarismo em vários casos, nomeadamente nas menções aos números de polícia dos prédios, às inscrições matriciais e aos valores patrimoniais, na numeração de artigos e bem assim, nos parágrafos de actos redigidos sob forma articulada e nas referências a diplomas legais.'

Assim, com efeito, se, em várias áreas de actividade ou administração, os números continuam a escrever-se por extenso, é porque tal prática parece decorrer de normas internas decorrentes do que se julga poder aportar uma maior segurança que é dáda pela escrita por extenso e, por outro, a referida tradição notarial.

Acresce sublinhar que a publicação do novo Código do Procedimento Administrativo em 2015, conforme o Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de Janeiro, não trouxe quaisquer alterações ao preceituado no art. 34º, que, no que concerne às actas de reunião, não inclui nenhuma indicação quanto à necessidade de escrever os números por extenso.
 
O que diz o Código de Redacção Inter-institucional?

No entanto, segundo o Código de Redacção Inter-institucional, que contém as regras e as convenções de escrita harmonizada que devem ser utilizadas pelo conjunto das instituições, órgãos e organismos da União Europeia, na sua regra 10.9, dispõe que:

Geralmente, os nomes numerais (números) que se encontram num texto são considerados palavras e escrevem-se por extenso. Indicam certo número de pessoas, coisas, animais, acções, qualidades e estados:

faltam três dias para que a conferência tenha lugar; a semana tem sete dias; os quatro da vida airada

Escrevem-se por extenso os números que representam quantidades, percentagens, etc., quando aparecem no início de uma frase:

vinte e duas medidas foram votadas em assembleia

Nos quadros e enumerações, ou quando se comparam resultados estatísticos, os números escrevem-se com algarismos.

As percentagens, pesos e medidas escrevem-se numericamente:

7 % do volume de negócios; 3 litros

As centenas e milhares escrevem-se quer por extenso quer numericamente:

100 000 ou cem mil

Se os números citados forem superiores ao milhão, podem escrever-se as centenas numericamente e os milhares ou milhões por extenso:

250 milhões de toneladas; 34 mil milhões de euros

Os números fraccionários escrevem-se geralmente por extenso. Para as fracções a partir de onze (inclusive), emprega-se o sufixo avos:

um sexto; três quinze avos

Dos números multiplicativos apenas dobro, duplo, triplo e quádruplo são de uso corrente. A partir de cinco, usa-se o cardinal correspondente seguido da palavra vezes:

sete vezes maior

Deve evitar-se a colocação do ponto na separação dos milhares das centenas; é preferível deixar um espaço:

123 456 789

Os nomes numerais dividem-se em:

a) Cardinais: os que exprimem o número:

três, quinze, vinte e cinco

b) Ordinais: os que exprimem série ou ordem:

primeiro, sexto, milésimo

c) Multiplicativos ou proporcionais: os que indicam multiplicidade de pessoas, coisas ou animais:

— aumentativos:

duplo, triplo, etc.

— diminutivos ou fraccionários:

meio, um terço, etc.

d) Colectivos: os que designam no singular um grupo de seres:

a dezena, uma quinzena

N.B.: Todos os multiplicativos são esdrúxulos, excepto duplo, dobro e triplo.

No entanto, se no texto houver muitos dados numéricos, os números escrevem-se com algarismos, normalmente árabes, às vezes romanos, para facilitar a leitura e compreensão ou para realçar as diferenças.
 
Que conclusão?
 
Pese embora não exista a obrigatoriedade legal de, no lavramento do texto de uma acta, se exararem os nomes numerais por extenso, nada obsta a que o relator lance mão do Código de Redacção da UE (aqui replicado na parte que nos aproveita), atento o facto de que, com este expediente tem-se menos propensa a susceptibilidade para se incorrer em involuntários lapsos.
 
Nesta conformidade, na redacção da acta, pode o presidente da mesa da assembleia de condóminos utilizar tanto os nomes numerais por extenso como os algarismos, utilizar uns ou outros, consoante os casos, ou ainda. utilizá-los cumulativamente, isto é, usa os algarismos e entre parenteais, os números por extenso.


03 agosto 2023

Rectificação da acta


Segundo o disposto no art. 362º do CC diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto, como é o caso de um papel onde se desenharam caracteres da linguagem escrita para expressar declarações de vontade dos respectivos subscritores.

Por seu turno, o documento é autêntico quando foi exarado, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividades que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; e é particular em todas as demais situações (cfr. art. 363º, nº 2 do CC).

Por outro lado, ainda, os documentos particulares podem ser autenticados, quando se mostrem confirmados pelas partes, perante notário, nos termos prescritos nas leis notariais (cfr. art. 363º, n.º 3 do CC).
 
Uma vez que são diferentes as formas como são exarados e distintos os graus de segurança quanto ao teor do que se faz constar do documento, os documentos têm forças probatórias diferenciadas.
 
No caso dos documentos autênticos, a força probatória plena está associada ao que foi praticado ou percepcionado pela autoridade ou oficial público que o lavrou. No caso dos documentos particulares, a força probatória depende da atitude que a parte a quem o documento é imputado toma perante este quando é apresentado em juízo como meio de prova.
 
Nestes termos, o art. 376º estabelece, por sua vez, no nº 1 que o documento particular cuja autoria seja reconhecida, designadamente porque não foi impugnada, faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento. Por seu turno, o nº 2 do mesmo preceito estipula que os factos compreendidos na declaração se consideram provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante.
 
Ora, como se referiu, resulta do art. 374º, nº 2 do CC que «se a parte contra quem o documento [particular] é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.» 

Salvo sempre melhor opinião, é de se considerar que as actas de reuniões das assembleias de condóminos, reúnem as características de um documento particular, contanto as mesmas sejam susceptíveis de, por si próprias, revelar, com a segurança requerida, os factos, e, sejam outrossim exaradas com as formalidades legais pelo presidente da mesa no domínio da sua competência, possuindo assim força probatória plena dos factos nelas referidos.

Assumindo a acta de uma assembleia de condóminos a natureza de documento autêntico (art. 370º do CC), ela faz plena prova dos factos que integram o seu conteúdo, constituindo a assinatura do presidente da mesa da assembleia e dos condóminos presentes, a garantia da fidelidade da sua reprodução, pelo que a força probatória da mesma só poderá ser ilidida através da prova da falsidade dos actos a que se reporta, em sede de incidente de falsidade, nos termos do art. 169º do CPP, que dispõe: "Consideram-se provados os factos materiais constantes de documento autêntico ou autenticado enquanto a autenticidade do documento ou a veracidade do seu conteúdo não forem fundadamente postas em causa".

Porém, a falsidade (art. 372º do CC) pode ocorrer de forma não propositada, involuntariamente. Neste caso, o erro material susceptível de desencadear ou permitir a rectificação de uma acta:
- é um erro ocorrido na expressão, não no pensamento, situação em que pela simples leitura do teor da acta se torna evidente que o relator, ao procurar manifestar o seu pensamento, fez uso de nomes, palavras ou algarismos diversos daqueles que deveria ter usado de forma a exprimir fiel e correctamente as ideias que tinha em mente; ou,
- é um erro de cálculo cometido aquando da formulação das operações matemáticas numéricas para se obter um determinado valor, que pode ser também simplesmente rectificado com o refazer das operações aritméticas erradamente executadas.

Por conseguinte, a falsidade consiste na alteração propositada do teor da acta, que tende a ficar desprovida da verdade dos factos, com o intuito de enganar terceiros, enquanto que, o erro material é uma desconformidade que fica a dever-se, fundamentalmente, a uma desatenção ou a um engano ocorrido no acto de redacção da acta. Tem-se, pois, este último, um vício de menor gravidade, facilmente rectificável.

Nesta factualidade, se a acta não retratar com fidelidade o que se passou na reunião plenária, deve o condómino, com legitimidade para tanto, peticionar a competente rectificação da mesma, tratando-se de simples lapso, ou deduzir o incidente da sua falsidade, se for, pois, o caso.

No primeiro caso, o que aqui nos aproveita, pode o condómino impugnar as deliberações por vício na genuinidade do teor do documento, Porém, se a pessoa que na assembleia de condóminos tenha intervindo como presidente - competindo-lhe consequentemente redigir a acta -, for cumulativamente administrador do condomínio, o condómino pode optar pela referida impugnação (art. 1433º do CC) ou recorrendo o acto daquele (art. 1438º do CC).

Importa salientar que é ónus da parte contra quem o documento é apresentado alegar e provar os vícios que impedem a utilização do documento como meio de prova com força probatória plena A falta de correspondência das declarações neles constantes com a realidade pode ser demonstrada por qualquer meio de prova admitido em direito (ac. TRE de 27-09-2012, proc. nº 581/08.0TBOLH.E1).

02 agosto 2023

A inobservância da forma legal da acta


No âmbito, por exemplo, de uma acção executiva, o condómino apelante pode defender que a(s) acta(s) da(s) assembleia(s) de condóminos dada(s) à execução houve(ram-)se lavrada(s) ao arrepio do disposto no nº 1 do art. 1.º do DL nº 268/94, de 25.10, pelo que, nos termos do art. 220º do CC, aplicável às actas por força do art. 295º do CC, a(s) acta(s) enferma(m) de nulidade.

Esta questão, estando relacionada, nomeadamente, com a omissão de assinaturas, a resposta é, pois, negativa: a falta, na acta da assembleia de condóminos, da assinatura de alguns dos participantes nessa reunião não põe em causa a validade das deliberações aí tomadas e apenas afectará a eficácia dessas deliberações se o tribunal, pela análise casuística que fizer, não der tal irregularidade como irrelevante ou suprida, nomeadamente por outros elementos de prova que coadjuvem a regularidade da narração de factos constante da acta, pelas restantes assinaturas nela apostas.

Ora, se das actas constam apenas algumas assinaturas e se o seu teor não foi desmentido pelo condómino executado, por meio dessas assinaturas hão igual número de condóminos que atestam que as actas reproduzem fielmente o que se passou e foi deliberado nessas assembleias (se na execução, o executado questionar a fidelidade das actas, nomeadamente que as deliberações foram efectivamente tomadas, nas circunstâncias consignadas nas actas, estes factos serão apreciados casuisticamente pelo juiz), a ausência das referidas assinaturas assume-se como irregularidade irrelevante, devendo as deliberações ser consideradas como devidamente consignadas em acta, obrigando todos os condóminos, incluindo a executada, nos termos previstos no nº 2 do art. 1º do DL nº 268/94, de 25.10.

No Ac. do TRG, proferido no processo n.º 825/13.7TBBCL-A.G1, de 17.12.2014, decidiu que a acta da assembleia de condóminos não tem de estar assinada por todos os condóminos participantes para ter força executiva. Caso contrário, se a validade das actas estivesse dependente da assinatura de todos os condóminos, os que não concordassem com uma qualquer deliberação apenas teriam que se negar a assinar a acta para fazerem valer a sua posição, inviabilizando a execução dessa deliberação.

20 julho 2023

Recusa assinatura da acta


Pode um condómino, que tenha estado presente na reunião plenária do condomínio, recusar-se a assinar a acta?

Estatui o DL nº 268/94 de 25/10, no seu art. 1º, nº 1 que "São obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha intervindo como presidente e subscritas por todos os condóminos nelas presentes". Por seu turno, dimana do no 3 que "A eficácia das deliberações depende da aprovação da respectiva acta, independentemente da mesma se encontrar assinada pelos condóminos".

Da conjugação destes preceitos, verifica-se que as actas devem ser assinadas, quer pelo presidente da Mesa da Assembleia de Condóminos, como pelos presentes (condóminos, seus representantes ou terceiros titulares de direitos sobre as fracções), porém, a eficácia das deliberações, depende da aprovação da acta e não das assinaturas.

Destas sortes, a recusa de um condómino em assinar uma acta não constitui motivo bastante para obstar à validade e eficácia da mesma. No entanto, perante a recusa de assinar de um condómino que tenha participado na assembleia de condóminos, se se verificar que a mesma se dever ao facto de o condómino considerar que a acta não reproduz com verdade o que efectivamente foi deliberado na reunião, deve o teor da acta ser reapreciado e votado, sendo que, se se tiver aprovado pela maioria, prima facie, considera-se que os argumentos do condómino não colheram.

O Código das Sociedade Comerciais
 
Perante este facto, considerando-se que a recusa é, pois, injustificada, há quem defenda que deve o condómino faltoso ser judicialmente notificado para o fazer em prazo não inferior a oito dias. Nesta factualidade, o condómino é notificado judicialmente, pode então invocar, justificando e provando em juízo, a falsidade da acta (cfr. art. 63º, nº 3, do CSC). Acresce que nos termos deste mesmo diploma, a recusa injustificada da assinatura da acta é punível com sanção de multa até 240 dias (art. 521º do CSC).
 
No âmbito do regime das sociedades comerciais, área do direito privado onde a figura da acta mereceu desenvolvido tratamento, realça-se que a acta, definível como “o instrumento técnico em princípio usado para a documentação dos acontecimentos ocorridos nas reuniões dos órgãos colegiais das sociedades comerciais, como de um modo geral de todos os outros entes colectivos, tenham ou não personalidade jurídica” (Pinto Furtado, “A acta e o instrumento notarial de documentação das reuniões de assembleia das sociedades comerciais”, separata da RDES, ano XXV, n.ºs 1-2, 1980, pág. 1), “é um documento que serve de suporte ou instrui a historicidade contemporânea de uma acção” (Pinto Furtado, “A acta…”, pág. 5), cuja função é dar notícia das ocorrências na reunião e não dar forma a essas ocorrências, designadamente às deliberações sociais (Pinto Furtado, “A acta…, pág. 19).
 
Antes da publicação do CSC, a maioria da doutrina entendia que a regra, no domínio da documentação das deliberações sociais, era a da liberdade de forma e em face do disposto no art. 397º do CPC (possibilidade da deliberação social ser suspensa sem apresentação da acta) a acta não era, em regra, sequer uma exigência de prova, de que dependia a eficácia das deliberações tomadas, mas apenas um meio normal de documentar os acontecimentos ocorridos na assembleia, sem interferir com a validade das deliberações (cfr., com menção da posição dos vários autores, v.g., Pinto Furtado, “A acta…”, págs 46 a 52; Albino Matos, “A documentação das deliberações sociais no Projecto do Código das Sociedades”, Revista do Notariado, 1986, nº 1, pág. 43 e ss; Luís Brito Correia, Direito Comercial, 3º vol., AAFDL, 1989).
 
Com a publicação do CSC, passou a ficar estipulado que “as deliberações dos sócios só podem ser provadas pelas actas das assembleias ou, quando sejam admitidas deliberações por escrito, pelos documentos donde elas constem” (nº 1 do art. 63º). Por outro lado, o art. 59º nº 4 do CSC, atinente à acção de anulação das deliberações, mantém a solução de que a proposição da acção de anulação não depende de apresentação da respectiva acta (nº 4), bem assim que o prazo para a propositura da acção se conta, em regra, a partir da data em que foi encerrada a assembleia geral (nº 2, al. a), independentemente da elaboração da acta.
 
A falta da acta não consta do elenco taxativo das nulidades das deliberações (art. 56º do CSC), pelo que se confirma que essa omissão não acarreta a nulidade da deliberação. Por outro lado, os termos peremptórios do art. 63º, nº 1, do CSC, obstam a que se admita a possibilidade, própria da anulabilidade, da sanação do vício através da mera caducidade do direito de impugnar a deliberação (pelo que a falta da acta não constituirá um caso de anulabilidade da deliberação).
 
Por conseguinte, a falta da acta torna a deliberação ineficaz (Albino Matos, “A documentação…, págs 73 a 75; Luís Brito Correia, “Direito Comercial, 3.º volume, páginas 241, 346 e 348; Pinto Furtado, “Comentário…, págs 668 a 674), ineficácia essa resultante da exigência legal de que a prova da deliberação se faça por meio da acta. A acta constitui, relativamente à deliberação, em teoria pura, uma formalidade ad probationem, mas como a lei exige que essa prova se faça exclusivamente através da acta, a situação é semelhante à da formalidade ad substantiam, acabando a destrinça em causa por não ter relevo para o efeito do disposto no art. 364º do CC (Castro Mendes, Teoria Geral de Direito Civil, III, FDL, 1973, págs 100 e 101).

O Regime da Propriedade Horizontal
 
Reportando-nos às deliberações da assembleia de condóminos, afigura-se-nos que lhes são plenamente aplicáveis as considerações supra expostas quanto à distinção entre a formação das deliberações, a sua validade intrínseca, e a elaboração da acta, encarada como documento informativo do teor dessas deliberações. No dizer de Aragão Seia, “a acta é a documentação do deliberado, ou seja, o relato escrito dos factos juridicamente relevantes que tiveram lugar na assembleia, com menção das pessoas que estiveram presentes e intervieram nas deliberações, elaborada por aqueles com legitimidade para o fazer. Dela devem constar as deliberações tomadas, em nada contribuindo, contudo, para a sua formação ou validade; é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular – art. 376º” (Propriedade horizontal, pág. 180).
 
Às deliberações das assembleias de condóminos são aplicáveis as regras da suspensão das deliberações sociais (art. 398º nº 1 do CPC), pelo que a suspensão pode ser requerida e até decretada sem que a acta contendo a deliberação seja apresentada. A própria acção de anulação de deliberação tomada pela assembleia de condóminos deve ser intentada no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação (para o caso dos condóminos que estiveram presentes) ou no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária que tiver sido convocada, sem que a lei exija a prévia elaboração da acta (art. 1433º do CC).
 
As deliberações da assembleia de condóminos assumem manifesto relevo, pois provêm do órgão máximo do condomínio, que decide de todas as questões que têm a ver com as partes comuns do prédio. Essas deliberações são vinculativas não só para os condóminos que estiveram presentes como para os ausentes, posto que as não tenham impugnado. As deliberações estão sujeitas a determinadas maiorias, definidas na lei. Assim, assume especial relevância a certeza acerca do que se passou na assembleia, designadamente para que se saiba qual o exacto conteúdo das deliberações, quem, de entre os presentes, as aprovou e se foram respeitadas as necessárias maiorias. Tal certeza atinge-se, nos termos da lei, através da elaboração de uma acta, onde se relatará o que se passou na reunião e quais as deliberações tomadas.
 
Sandra Passinhas, afirma que “do regime legal não se retira qualquer indicação no sentido de que a acta tenha valor meramente probatório” e defende que a acta é uma formalidade ad substantiam (“A assembleia de condóminos…, páginas 265 a 267).
 
Pelas razões supra expostas, afigura-se-nos que o regime tido em vista pelo legislador para a propriedade horizontal aproxima-se do das sociedades comerciais: embora a sua falta não afecte a validade das deliberações da assembleia de condóminos, a acta é a única forma admissível para provar tais deliberações, pelo que a sua ausência as torna ineficazes, em termos tais que, embora no ponto de vista teórico a acta se apresente como uma formalidade ad probationem, na prática a sua omissão tem a consequência prevista no art. 364º nº 1 do CC (não pode ser substituída por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior).

Para o já citado juiz conselheiro, ARAGÃO SEIA, Propriedade Horizontal, Almedina, 2ª ed., 172 a 175, a acta “é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular – art. 376º. (…) A recusa de um condómino em assinar a acta não pode decretar a invalidade da deliberação. Se assim fosse, encontrado estava um meio de qualquer condómino obstar continuamente à validade das decisões da assembleia. Recusando-se um condómino a assinar deve ser isso consignado na acta, sendo assinada pelos demais que hajam participado na assembleia. É, aliás, o que acontece quando um condómino sai no decurso desta, antes de lavrada e assinada a acta. Se se recusa a assinar, depois de elaborada a acta e assinada pelos demais, deve-se lavrar um “em tempo”, assinado por todos os outros condóminos que participaram na assembleia. Se já não for possível colher a assinatura de todos os que assinaram a acta deve ser notificado como se de ausente se tratasse. Poderá, assim, vir a impugnar as deliberações, verificados os necessários pressupostos, ou a arguir a falsidade da acta em tribunal”.

Neste sentido, o TRP, em Ac, datado de 15-11-2007 (processo nº 0733938), decidiu que:

"I – A acta da assembleia de condóminos é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular.
II – A lei não sancioina expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia, designadamente com a inexistência, ineficácia ou nulidade de uma acta lavrada sem tais assinaturas, não sendo aplicável a disciplina que rege as sociedades comerciais, já que se está perante um instituto (propriedade horizontal) com regime específico no direito civil.
III – O condómino que se recuse a assinar a acta deve, em última instância, ser notificado como se de ausente se tratasse, podendo, nesse caso, vir a impugnar as deliberações, verificados os necessários pressupostos, ou arguir a falsidade da acta em tribunal."

Em sentido análogo, o TRL no seu Ac. de 07-04-2016 (processo nº 2816/12.6TBCSC-A.L1-2), acrescenta que: Considera-se, portanto, que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil, porque a ela deu causa ou aceitou a forma como a mesma foi elaborada.

Portanto, a jurisprudência conhecida tem, quase unanimemente, defendido que a acta da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem e a falta de assinatura de condóminos que nela participaram é uma mera irregularidade que, não sendo oportunamente reclamada, não afecta a deliberação tomada nem a exequibilidade do título. Apela-se para o preâmbulo do DL 268/94, onde se diz que o mesmo teve como objectivo “procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”. Defende-se que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no art. 334º do CC, porque a ela deu causa ou não quis remediar. Lembra-se que nos termos do disposto no art. 1413º do CC as deliberações contrárias ou não à lei ou regulamentos anteriormente aprovados tornam-se definitivas se não for requerida a anulação por qualquer condómino que as não tenha aprovado nos prazos e pelo modo aí referidos. Tornando-se definitivas, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções – nº 2 do art. 1º do DL 268/94. Realça-se que a lei não sancionou expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia. Designadamente, não comina com a inexistência, ineficácia ou nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas. Mais se diz que não se compreenderia que a acta seja vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia (uma vez que lhes sejam comunicadas) e não se considerar a mesma válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta (cfr., v.g., Ac TRL, de 02.3.2004, processo 10468/2003-1; TRP, 18.4.2006, processo 0621451, 18.12.2003, processo 0336205, e 06.3.2003, processo 0330883).

15 julho 2023

A assinatura da acta executiva


Debruçando-nos sobre o domínio das sociedades comerciais, constata-se que, quanto às sociedades anónimas, “as actas das reuniões da assembleia geral devem ser redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido como presidente e secretário” (nº 2 do art. 388º do CSC), mas “a assembleia pode, contudo, deliberar que a acta seja submetida à sua aprovação antes de assinada nos termos do número anterior” (nº 3 do art. 388º).
 
Quanto às sociedades em nome colectivo e às sociedades por quotas, as actas das assembleias gerais devem ser assinadas por todos os sócios que nelas tenham participado (art. 189º nº 5 e 248º nº 6 do CSC).
 
O art. 63º nº 3 do CSC estipula que “quando a acta deva ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e alguns deles não o faça, podendo fazê-lo, deve a sociedade notificá-lo judicialmente para que, em prazo não inferior a oito dias, a assine; decorrido esse prazo, a acta tem a força probatória referida no nº 1, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na assembleia, sem prejuízo do direito dos que a não assinaram de invocarem em juízo a falsidade da acta.”
 
Pinto Furtado critica a exigência, relativamente a algumas espécies de sociedades comerciais, de que a acta seja assinada por todos os sócios que tenham participado da reunião, considerando-a excessiva e injustificada. Excessiva, por originar as complicações resultantes de falta de assinatura. E injustificada porque, no fundo, não servirá para mais do que impedir que os sócios que efectivamente assinaram a acta depois arguam a sua falsidade não superveniente (Comentário…, pág. 696).
 
Seja como for, no que concerne às sociedades comerciais o legislador prevê o processo a adoptar para reagir relativamente à omissão de assinatura da acta, processo esse que acaba por levar à conclusão de que a exigência de assinatura de todos os sócios é meramente programática, convertendo-se na exigência menor de assinatura apenas pela maioria dos sócios presentes (Comentário…, pág. 698).
 
No caso da acta que não está assinada (sempre no domínio das sociedades comerciais), Pinto Furtado entende que a mesma fica ferida de nulidade (A acta…, pág. 52). Albino Matos parece incluir a falta de assinatura no conjunto de elementos da acta cuja omissão poderá acarretar a anulabilidade das deliberações, sendo a melhor solução “a de se remeter ao prudente arbítrio judicial a apreciação da relevância do vício para a integridade do documento e a validade ou eficácia das deliberações”, podendo conceder ou negar a anulação que se lhe peça com fundamento na falta de qualquer um desses elementos (A documentação… páginas 59 e 60). Brito Correia entende que a falta da assinatura do presidente da mesa ou do secretário, quando necessária, implica que a acta perde força probatória, ficando consequentemente afectada a eficácia das deliberações tomadas (Direito comercial… pág. 352). Moitinho de Almeida inclui as irregularidades da acta da assembleia na categoria das irregularidades do funcionamento da assembleia, as quais geram a anulabilidade das deliberações nelas tomadas, nos termos do art. 58º nº 1 al. a) do CSC (Anulação e suspensão de deliberações sociais, 3 edição, Coimbra Editora, 3.ª edição, pág. 98).
 
No âmbito da propriedade horizontal o legislador estabelece que as actas das assembleias de condónimos serão redigidas e assinadas por quem neles tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado (nº 1 do art. 1º do DL nº 268/94). Não incluiu nenhum preceito específico tendente a suprir a omissão de assinaturas de condóminos que tenham participado na assembleia. Também não prevê nenhuma consequência específica para tal omissão. Será de aplicar o disposto no art. 366º do CC (“a força probatória do documento escrito a que falta algum dos requisitos exigidos na lei é apreciada livremente pelo tribunal”). Tal preceito implica que o tribunal fará uma apreciação casuística do documento, com base nos demais elementos pertinentes obtidos, nomeadamente outros elementos de prova, para dar ou não como provada a situação factual que o documento se destinava a comprovar e daí extrair as possíveis consequências.
 
Não existindo uma total falta de assinaturas das actas, através das existentes, atesta-se que a acta reproduz correctamente o que se passou na assembleia de condóminos, incluindo as deliberações tomadas. Aquela acta, bem como as que com ela se conjugam, são bastantes para deixar prosseguir a execução, não havendo lugar a rejeição do requerimento executivo pela secretaria ou ao seu indeferimento liminar pelo juiz, por não ser manifesta a insuficiência do título (arts 811º nº 1 al. b) do CPC e 812º nº 2 al. a) do CPC) – rejeição e indeferimento liminar que, de resto, não ocorreram.

29 junho 2023

Falta de assinaturas nas actas


Prevê o art. 703º (art. 46º do CPC de 1961) do CPC, que, entre outros, podem servir de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva. Disposição de tal natureza é a que se mostra prevista no art. 6°, n° 1, do DL 268/94, de 25/10, que estatui que "A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante de contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e, fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte".

Como vem sendo dito e resulta do preâmbulo do diploma citado, teve-se em vista com o mesmo, procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da PH, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros. Ora, com o objectivo de alcançar tal desiderato, um dos instrumentos de que o legislador se socorreu foi o de atribuir força executiva às actas das reuniões das assembleias de condóminos, nas quais se fixem os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota-parte de cada condómino. Mas logo no art. 1º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Deliberações da assembleia de condóminos” estatuiu-se o seguinte:

1 - São obrigatoriamente lavradas atas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha intervindo como presidente e subscritas por todos os condóminos nelas presentes.
2 - A ata contém um resumo do que de essencial se tiver passado na assembleia de condóminos, indicando, designadamente, a data e o local da reunião, os condóminos presentes e ausentes, os assuntos apreciados, as decisões e as deliberações tomadas com o resultado de cada votação e o facto de a ata ter sido lida e aprovada.
3 - A eficácia das deliberações depende da aprovação da respetiva ata, independentemente da mesma se encontrar assinada pelos condóminos.
4 - As deliberações devidamente consignadas em ata são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às frações.
5 - Incumbe ao administrador, ainda que provisório, guardar as atas e facultar a respetiva consulta, quer aos condóminos, quer aos terceiros a que se refere o número anterior.
6 - A assinatura e a subscrição da ata podem ser efetuadas por assinatura eletrónica qualificada ou por assinatura manuscrita, aposta sobre o documento original ou sobre documento digitalizado que contenha outras assinaturas.
7 - Para efeitos do disposto no presente artigo, vale como subscrição a declaração do condómino, enviada por correio eletrónico, para o endereço da administração do condomínio, em como concorda com o conteúdo da ata que lhe tenha sido remetida pela mesma via, declaração esta que deve ser junta, como anexo, ao original da ata.
8 - Compete à administração do condomínio a escolha por um ou por vários dos meios previstos nos números anteriores, bem como a definição da ordem de recolha das assinaturas ou de recolha das declarações por via eletrónica, a fim de assegurar a aposição das assinaturas num único documento.


Não tendo todos os condóminos, ditos participantes na assembleia, assinado a respectiva acta, coloca-se a questão de saber se a mesma vale ou não como título executivo, de harmonia com o disposto no art. 6º do citado DL nº 268/94. A resposta da jurisprudência, tanto quanto se conhece e alguma dela invocada pela embargada, tem sido sempre em sentido afirmativo.
 
Invoca-se geralmente que a acta da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem e a falta de assinatura de condóminos que nela participaram é uma mera irregularidade que, não sendo oportunamente reclamada, não afecta a deliberação tomada nem a exequibilidade do título. E fundamenta-se, essencialmente, na circunstância de que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no art. 334° do CC, porque a ela deu causa ou não quis remediar.

E argumenta-se ainda que nos termos do disposto no art. 1413° do CC as deliberações contrárias ou não à lei ou regulamentos anteriormente aprovados tomam-se definitivas se não for requerida a anulação por qualquer condómino que as não tenha aprovado nos prazos e pelo modo aí referidos. Tornando-se definitivas, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções – n° 4 do art. 1° do DL n° 268/94.

Para além disso é recorrentemente invocado que a lei não sancionou expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia, não tendo, designadamente, cominado com a inexistência, a ineficácia ou a nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas. E acrescenta-se que não se compreenderia que a acta seja vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia (uma vez que lhes sejam comunicadas) e não se considerar a mesma válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta (v., entre muitos outros, acórdão TRL, de 15.02.2007, processo n° 9207/2006-2, que referencia vários acórdãos desta e de outras Relações sobre a matéria e ainda os acórdãos do TRP de 19.03.2001, de 6.03.2003, de 18.12.2003 e mais recentemente de 16.05.2007, também publicados em www.dgsi.pt/jtrp). 
 
Ora, nesta seara, o TRL em acórdão datado de 08-11-2007 (processo nº 9687/2006-6), decidiu que, não obstante se ter como aparentemente mais sedutora uma interpretação mais rígida do estatuído no art. 1º nº 1 do DL 268/94 (face ao próprio teor do seu nº 4 e sobretudo à sua inserção naquele diploma - que visou essencialmente atribuir força executiva à acta das assembleias de condóminos) afigurou-se a este tribunal porém que, atentas as razões de simplificação enunciadas no preâmbulo e as demais razões invocadas pela jurisprudência citada, não pode deixar de se entender que a qualidade de título executivo das actas das assembleias de condóminos decorre tão só das mesmas conterem os requisitos indicados no art. 6º, basicamente atinentes à liquidez e exigibilidade das dívidas.

Assim, a omissão das exigências formais constantes do dito art. 1º constituem meras irregularidades, que ficam sanadas se não houver tempestiva impugnação da deliberação tomada, (cfr. art. 1432º nºs 6, 7 e 8 do CC), o que no caso os autos não evidenciam que tenha acontecido.

28 junho 2023

Aprovação das actas


A lei é omissa quanto ao momento em que se deve proceder à feitura da acta da reunião. Do nº 1 do art. 1º do DL 268/94 de 25/10, apenas resulta que "São obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha intervindo como presidente e subscritas por todos os condóminos nelas presentes".

Desta sorte, não sendo possível lavrar a acta no termo da respectiva reunião, os condóminos podem conferir um voto de confiança ao presidente da MAG para que esta possa proceder posteriormente ao devido acto.

Contudo, as actas, com um resumo do texto das deliberações mais importantes podem ser aprovadas em minutas, no final das reuniões, desde que tal seja deliberado pela maioria dos membros presentes, sendo assinadas, após aprovação.

Importa contudo salientar que as deliberações dos condóminos só adquirem eficácia depois de aprovadas e assinadas as respectivas actas ou depois de assinadas as minutas, nos termos do número anterior.

Os condóminos podem fazer constar da acta o seu voto de vencido e as razões que o justifiquem, bem como referir a sua desconformidade ao que dela conste, no entanto a simples aprovação por maioria significa de modo inequívoco que quem a aprova, considera falsos ou, pelo menos, irrelevantes, os fundamentos dessa discordância.

Não participam na aprovação das actas os condóminos que não tenham estado presentes nas reuniões a que elas respeitam, excepto se a sua intervenção for necessária, podendo neste caso, o seu silêncio valer como assentimento do que se ouver deliberado..

Devidamente subscritas e validadas nos presentes termos, as actas ficarão à guarda do administrador, que as comunicará obrigatoriamente aos ausentes, no prazo de 30 dias, contados da data da realização da AG, por carta registada com aviso de recepção (vide art. 1432º do CC) ou entrega em mão com assinatura de competente protocolo de recepção, e distribuirá cópias por quem as solicitar.

Uma vez aprovadas e exaradas em acta, as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para todos os condóminos e terceiros titulares de direitos sobre as fracções autónomas, mesmo para os que não tenham participado na reunião ou que, tendo participado, se abstiveram de votar ou votaram contra, e ainda para aqueles que ingressem no condomínio após a sua aprovação.

10 maio 2022

Livro de actas no condomínio

Estatuía o art. 36º do DL nº 40 333 de 14 de Outubro de 1955 (publicado no Diário do Governo nº 223/1955, Série I de 1955-10-14) que,

«O administrador terá os seguintes livros:
  • De receitas e despesas;
  • De actas;
  • De inventario dos bens de propriedade comum.»
No entanto, com a aprovação do DL nº 47 344, de 25 de Novembro de 1966, o legislador não efectuou qualquer ressalva quanto `obrigatoriedade da existência do livro de actas.

O decreto-lei nº 40 333, de 14 de Outubro de 1955 veio regular, pela primeira vez entre nós, de forma global, o regime da propriedade horizontal, prevendo no seu art. 36º que o administrador tinha que possuir, entre outros, um livro de actas.

O DL nº 47.344, de 25 de Novembro de 1966, que aprovou o Código Civil actualmente vigente, dispôs no seu art. 3º que desde “que principie a vigorar o novo Código Civil, fica revogada toda a legislação civil relativa às matérias que esse diploma abrange, com ressalva da legislação especial a que se faça expressa referência.”

É discutível a vigência do art. 36º do DL nº 40.333, de 14 de Outubro de 1955 após a entrada em vigor do Código Civil, cuja problemática divide a nossa jurisprudência, dando origem a decisões contraditórias. Por um lado, há quem considere que dada a sua natureza processual, continuou a vigorar após a entrada em vigor do Código Civil actualmente vigente. Por outro lado, quem considere que o DL nº 40 333 tinha sido revogado tacitamente com a entrada em vigor do actual Código Civil.

Ao invés, parece que tal previsão terá antes carácter interpretativo, visando pôr termo ao dissídio jurisprudencial até então existente, pelo que em nada colidirá com a interpretação da sobrevivência do citado art. 36º. Certo é que o "livro" é obrigatório, seja qual for a sua forma.

A título meramente ilustrativo e entrando no capítulo das Sociedades Comerciais, procurando-se simplificar os procedimentos de constituição das sociedades e melhorar o ambiente de negócios, a Lei nº 7/21, de 14 de Abril, aboliu a obrigatoriedade da legalização dos livros de actas das AG por parte do Conservador do Registo Comercial. 

Nesta conformidade, os livros de actas apenas precisam ser rubricados (i) pela administração, (ii) pelos membros do órgão social a que respeitam, ou (iii) pelo Presidente da Mesa da AG da sociedade, os quais ficarão igualmente responsáveis por lavrar os respectivos termos de abertura e encerramento.

Acresce sublinhar que, sempre que forem compostos por folhas soltas, estas actas poderão ser encadernadas ou mantidas em uma pasta de arquivo própria, depois de utilizadas e ter sido lavrado o respectivo termo de encerramento.


Retomando as menções ao Código Comercial, este dispõe, no art. 37º (Livros das actas das sociedades), que os livros ou as folhas das actas das sociedades servirão para neles se lançarem as actas das reuniões de sócios, de administradores e dos órgãos sociais, devendo cada uma delas expressar a data em que foi celebrada, os nomes dos participantes ou referência à lista de presenças autenticada pela mesa, os votos emitidos, as deliberações tomadas e tudo o mais que possa servir para fazer conhecer e fundamentar estas, e ser assinada pela mesa, quando a houver, e, não a havendo, pelos participantes.

Finalmente, o CCom. preconiza, ainda e respetivamente, nos art. 39º (Requisitos externos dos livros de actas) e 40º (Obrigação de arquivar a correspondência, a escrituração mercantil e os documentos), que “Sem prejuízo da utilização de livros de actas em suporte electrónico, as actas devem ser lavradas sem intervalos em branco, entrelinhas ou rasuras e que no caso de erro, omissão ou rasura deve tal facto ser ressalvado antes da assinatura”, e que “Todo o comerciante é obrigado a arquivar a correspondência emitida e recebida, a sua escrituração mercantil e os documentos a ela relativos, devendo conservar tudo pelo período de 10 anos, podendo os mesmos ser arquivados com recurso a meios electrónicos”.

Quanto aos livros de actas de outros órgãos (de administração ou de fiscalização ou órgão consultivo) – serão os respetivos membros, e nos termos referidos no art. 31º do CCom., a numerar e a rubricar as respetivas folhas e a lavrar os termos de abertura e encerramento, não estando sujeitos, conforme se encontra acima explicitado, a imposto do selo.

É, porém, no CSC, nomeadamente no seu art. 63º (Actas), que vem estabelecido com muito mais pormenor, não só a justificação da sua imprescindibilidade como os requisitos mínimos que as mesmas devem conter. Assim, e segundo o estabelecido no nº 1 deste artigo, “As deliberações dos sócios só podem ser provadas pelas actas das assembleias ou, quando sejam admitidas deliberações por escrito, pelos documentos donde elas constem.”

Por sua vez, o número 2 estabelece que a acta deve conter, pelo menos:

a) A identificação da sociedade (recordamos que, relativamente a esta “identificação da sociedade”, deve ser tido em atenção o disposto no art. 171º do CSC, pois a sua omissão, segundo o nº 2 do art. 528º, também do CSC, será punida com coima de 250 a 1 500 euros, pelo que aconselhamos a sua leitura para que os requisitos nele constantes fiquem expressos nas correspondentes atas), o lugar, o dia e a hora da reunião;

b) O nome do presidente (significa esta disposição que as AG devem ser sempre presididas por um sócio, normalmente pelo que detiver maior participação no capital social, ou, em igualdade de circunstâncias, pelo sócio mais velho, salvo se existir disposição diversa no contrato de sociedade, vide o nº 4 do art. 248º do CSC. É óbvio que no caso das sociedades unipessoais quem preside é o sócio único, como não poderia deixar de ser) e, se os houver, dos secretários;

c) Os nomes dos sócios presentes ou representados e o valor nominal das partes sociais, quotas ou ações de cada um, salvo nos casos em que a lei mande organizar lista de presenças, que deve ser anexada à acta;

d) A ordem do dia constante da convocatória, salvo quando esta seja anexada à acta;

e) Referência aos documentos e relatórios submetidos à assembleia;

f) O teor das deliberações tomadas;

g) Os resultados das votações;

h) O sentido das declarações dos sócios, se estes o requererem.

O número 3 estipula “Quando a acta deva ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e algum deles não o faça, podendo fazê-lo (repare-se que não pode deixar de ser tido em atenção, neste caso, o disposto no art. 521º (Recusa ilícita de lavrar acta), do CSC, que dispõe que aquele que, tendo o dever de redigir ou assinar acta de AG, sem justificação o não fizer, ou agir de modo que outrem igualmente obrigado o não possa fazer, será punido, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal, com multa até 120 dias), deve a sociedade notificá-lo judicialmente para que, em prazo não inferior a 8 dias, a assine; decorrido esse prazo, a ata tem a força probatória referida no nº 1, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na AG sem prejuízo do direito dos que a não assinaram de invocarem em juízo a falsidade da acta”.

O nº 4 refere que “Quando as deliberações dos sócios constem de escritura pública, de instrumento fora das notas ou de documento particular avulso, deve a gerência, o conselho de administração ou o conselho de administração executivo inscrever no respetivo livro a menção da sua existência”.

O nº 5 estabelece “Sempre que as actas sejam registadas em folhas soltas, deve a gerência ou a administração, o presidente da mesa da assembleia geral e o secretário, quando os houver, tomar as precauções e as medidas necessárias para impedir a sua falsificação”.

O nº 6 dispõe “As actas são lavradas por notário, em instrumento avulso, quando, no início da reunião, a assembleia assim o delibere ou ainda quando algum sócio o requeira em escrito dirigido à gerência, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo da sociedade e entregue na sede social com 5 dias úteis de antecedência em relação à data da assembleia geral, suportando o sócio requerente as despesas notariais”.

O nº 7 refere que “As actas apenas constantes de documentos particulares avulsos constituem princípio de prova, embora estejam assinadas por todos os sócios que participaram na assembleia”.

Finalmente, o nº 8, estabelece que “Nenhum sócio tem o dever de assinar as actas que não estejam consignadas no respetivo livro ou nas folhas soltas, devidamente numeradas e rubricadas”.

Vejamos, também, o que dispõe, nesta matéria, o Código do Procedimento Administrativo (CPA), nomeadamente nos seus art. 34º e 35º:

Assim, o art. 34º (Acta da reunião), estabelece no seu nº 1: “De cada reunião é lavrada acta, que contém um resumo de tudo o que nela tenha ocorrido e seja relevante para o conhecimento e a apreciação da legalidade das deliberações tomadas, designadamente a data e o local da reunião, a ordem do dia, os membros presentes, os assuntos apreciados, as deliberações tomadas, a forma e o resultado das respetivas votações e as decisões do presidente”.

Por sua vez, os nºs 2, 3, 4 e 5 dispõem, respetivamente, “As actas são lavradas pelo secretário e submetidas à aprovação dos membros no final da respetiva reunião ou no início da reunião seguinte, sendo assinadas, após a aprovação, pelo presidente e pelo secretário”, “Não participam na aprovação da acta os membros que não tenham estado presentes na reunião a que ela respeita”, “Nos casos em que o órgão assim o delibere, a acta é aprovada, logo na reunião a que diga respeito, em minuta sintética, devendo ser depois transcrita com maior concretização e novamente submetida a aprovação”, “O conjunto das actas é autuado e paginado de modo a facilitar a sucessiva inclusão das novas actas e a impedir o seu extravio” e “As deliberações dos órgãos colegiais só se tornam eficazes depois de aprovadas as respetivas actas ou depois de assinadas as minutas e a eficácia das deliberações constantes da minuta cessa se a acta da mesma reunião não as reproduzir”.

Atentemos, agora, aos seguintes comentários a este art. 34º do CPA, respigados da obra «Código do Procedimento Administrativo – Anotado – Comentado – Jurisprudência» – 2ª edição – Atualizada e Aumentada – 1992 – Livraria Almedina – da autoria de José Manuel Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho. Note-se que este Código foi alvo de profundas alterações, levadas a efeito pelo DL nº 4/2015, de 7/1, e republicado em anexo a este mesmo decreto-lei, mas, dado que o art. 34º não sofreu qualquer alteração, os comentários por nós acima referidos têm toda a atualidade.

A pág. 111, desta obra, a nota 3 refere que “A acta representa o registo formal da formação da vontade do órgão descrevendo tudo o que se passou na reunião”. A pág. 112, a nota 13 refere que “A acta, lavrada pelo secretário ou por quem o substitui, deve ser aprovada no final da reunião ou na reunião seguinte, sendo, de seguida, assinada pelo presidente e pelo secretário. Por vezes, a importância da deliberação não se compadece com formalismos que tendam para a morosidade. Por isso, desde que seja deliberado pela maioria dos membros presentes, a acta ou o texto da deliberação podem ser aprovados nessa mesma reunião sob a forma de minuta, numa primeira redação da acta”.

Na mesma pág., a nota 14 refere que “As deliberações tomadas só são eficazes e, portanto, só estão aptas a produzirem efeitos jurídicos uma vez aprovadas as actas ou assinadas as minutas. Enquanto isso não acontecer, o acto de deliberação pode até ser válido, mas não será eficaz, nem suscetível de execução”.

E, na pág. 113, a nota 18, relativa a jurisprudência, refere que “Se a acta da reunião não satisfazer os requisitos legais, é como se não exista, e as declarações nelas contidas consideram-se inexistentes por carência absoluta de forma, nos termos do art. 363º, nº 5, do Código Administrativo. (Ac. do STA de 19/5/50, CA, 367 e Ac. STA de 1/3/46, II Série de 21/5/46”.

Após a leitura destas anotações, que pensamos serem úteis para a assimilação da importância da existência das atas, retomamos o CPA, para transcrever o seu art. 35º (Registo na acta do voto de vencido), o qual estipula no nº 1 que “Os membros do órgão colegial podem fazer constar da acta o seu voto de vencido, enunciando as razões que o justifiquem”. Por sua vez, o nº 2, estabelece: “Aqueles que ficarem vencidos na deliberação tomada e fizerem registo da respetiva declaração de voto na acta ficam isentos da responsabilidade que daquela eventualmente resulte”. Finalmente, o nº 3, dispõe: “Quando se trate de pareceres a dar a outros órgãos administrativos, as deliberações são sempre acompanhadas das declarações de voto apresentadas”.