Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

12/15/2023

Forma da procuração - V


Em bom rigor, a solução ideal seria a de fazer depender a forma da procuração da finalidade das formalidades exigidas para o negócio principal: nos casos em que esta finalidade consiste apenas em obter prova segura acerca do acto (formalidades ad probationem(42)), a outorga de poderes de representação não careceria da forma prescrita para aquele negócio.(43)

No entanto, a fixação do sentido e alcance da finalidade de cada exigência legal de forma depende da actividade interpretativa, pelo que aquela solução conduziria a incertezas várias.

Nas palavras do legislador: “Em rigor a solução deveria ser a de olhar às finalidades do formalismo requerido para o negócio representativo para decidir da aplicabilidade ou inaplicabilidade de tal formalismo ao negócio de concessão de poderes. Para fugir, contudo, às graves dificuldades e incertezas a que isso daria lugar pareceu-nos melhor estabelecer (…) o princípio geral de que a procuração está sujeita à forma exigida para o negócio a que diz respeito (…), admitindo embora que se estabeleçam, maxime em legislação especial, restrições a este princípio.”(44)

Ora, como as mais das vezes a forma legal é estabelecida ad substantiam(45), a regra vertida no artigo 262.°, n.° 2, do CC parece-nos de grande razoabilidade, a melhor possível.(46)

b) Excepções à equiparação formal entre a procuração e o negócio jurídico representativo: em especial, do artigo 116.° do Código do Notariado

Conforme resulta expressamente da primeira parte do ar-tigo 262.°, n.° 2, do CC (“Salvo disposição legal em contrário”), o princípio da equiparação formal entre o acto concessor de poderes representativos e o negócio que o procurador deva realizar comporta excepções(47).

No presente trabalho, importa-nos analisar a excepção constante do disposto no artigo 116.° do Código do Notariado(48), preceito que estipula:

“1 — As procurações que exijam intervenção notarial podem ser lavradas por instrumento público, por documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento presencial da letra e assinatura ou por documento autenticado.
2 — As procurações conferidas também no interesse do procurador ou de terceiro devem ser lavradas por instrumento público cujo original é arquivado no cartório notarial.
3 – Os substabelecimentos revestem a forma exigida para as procurações.”(49)(50)

Vale por dizer: a procuração pode ser verbal ou escrita, consoante os negócios a concluir sejam consensuais ou requeiram forma escrita; quando para estes se exija escritura pública, aquela pode assumir a forma de instrumento público, documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento presencial da letra e assinatura ou por documento autenticado.

Na síntese de Antunes Varela e Pires de Lima, “O n.° 2 [o artigo 262.°, n.° 2, do CC] contém uma regra que, em face dos princípios expressos no artigo 127.° do Código do Notariado [actual artigo 116.° do CN], será seguramente de aplicação pouco frequente quanto a actos em que deva haver intervenção notarial. É, no entanto, uma regra geral de aplicação certa nos casos em que se exija para o acto apenas a forma escrita. Quando assim seja, a procuração deve igualmente ser passada por escrito. Em relação a actos para os quais se não exija sequer a forma escrita valerá a procuração verbal.”(51) (parêntesis e itálico nossos)

Notas:

(42) Nos casos em que a forma da declaração é exigida “apenas para prova da declaração” (cfr. artigo 364.°, n.° 2, do CC), a sua falta não gera a nulidade do acto, mas apenas a dificuldade de prova do acto, a qual é suprível por confissão expressa. No caso de formalidades ad substantiam, atendendo aos relevantes motivos de interesse público subjacentes, a sua inobservância acarretará a nulidade do acto (cfr. artigo 220.° do CC). Sobre a distinção doutrinária entre formalidades ad substantiam e formalidades simplesmente ad probationem, vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., págs. 433 e 434, José de Oliveira Ascensão, Direito Civil – Teoria Geral, volume II – Acções e Factos Jurídicos, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2003, pág. 69, e Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 545.

(43) Parece ser esta a solução de outros direitos, conforme ensina Vaz Serra: “No direito austríaco, é pela finalidade da disposição de forma que se decide se esta é exigida também para o negócio da outorga de poderes (…), e semelhantemente no direito francês (…), no qual a ratificação pode ser expressa ou tácita, salvo tratando-se de acto solene.” Vide Vaz Serra, “Anotação ao Acórdão…”, cit., pág. 184. Mais recentemente, em relação ao direito gaulês, Maria Helena Brito confirma: “tem-se defendido que, quando a lei exige uma forma solene (por exemplo, intervenção notarial) para o acto que o mandatário deve celebrar em nome do mandante, à mesma forma deve estar sujeito o contrato de mandato, sempre que a exigência legal se destine a proteger uma das partes, pois, a não ser assim, poderia ser iludido o objectivo da lei.” Vide Maria Helena Brito, Ob. cit., pág. 213.

(44) Vide Rui de Alarcão, “Breve Motivação do Anteprojecto sobre o Negócio Jurídico na Parte Relativa ao Erro, Dolo, Coacção, Representação, Condição e Objecto Negocial”, in Boletim do Ministério da Justiça, n.° 138, 1964, pág. 106.

(45) Neste sentido, Carvalho Fernandes: “ A formulação do art. 220.° do C. Civ. sugere que a forma legal é em regra estabelecida ad substantiam.” Vide Luís A. Carvalho Fernandes, Ob. cit., pág. 235. Na mesma linha, Pais de Vasconcelos afirma: “ Em regra as exigências legais de forma são ad substantiam. Esta conclusão retira-se do artigo 220.° do Código Civil que comina, em princípio, com nulidade o desrespeito pela forma exigida por lei.” Vide Pedro Pais de Vasconcelos, Ob. cit., pág. 545. Da análise do artigo 364.° do CC, Mota Pinto extrai idêntica conclusão: “Donde se infere que quaisquer documentos (autênticos ou particulares) serão formalidades «ad probationem», nos casos excepcionais em que resultar claramente da lei que a finalidade tida em vista ao ser formulada certa exigência de forma foi apenas a de obter prova segura acerca do acto e não qualquer das outras finalidades possíveis do formalismo negocial (obrigar as partes a reflexão sobre as consequências do acto, assegurar a reconhecibilidade do acto por terceiros ou o seu controlo no interesse da comunidade, etc.).” (negrito nosso) Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 434.

(46) Era este o entendimento de Vaz Serra: “ Como, (…) a forma é exigida pela lei normalmente para assegurar a ponderação dos declarantes, a regra será que procuração e a ratificação estão sujeitas à forma prescrita para o negócio a celebrar ou celebrado pelo representante, com as restrições, no nosso direito, resultantes dos artigos 1327.° a 1329.° do Código Civil e do artigo127.° do Código do Notariado.” Vide Vaz Serra, “Anotação…”, cit., pág. 184.

(47) Cfr., por exemplo, artigos 97.°, § 2.°, do Código Comercial, 43.°, n.o 2, do Código do Registo Civil e 39.° do Código do Registo Predial. Sobre este preceito, vide Isabel Pereira Mendes, Código do Registo Predial – Anotado e Comentado com Formulário, 13.ª edição, Almedina, Coimbra, 2003, págs. 215 – 217.

(48) Adiante, abreviadamente identificado por CN.

(49) A norma transcrita em texto corresponde ao artigo 127.° do anterior CN, que dispunha:
“1. As procurações e substabelecimentos que exijam intervenção notarial devem ser lavrados:
a) Por instrumento público;
b) Por documento escrito e assinado pelo mandante, com reconhecimento presencial da letra e assinatura;
c) Por documento escrito por pessoa diversa do mandante e assinado por este, com reconhecimento presencial da assinatura.
2. O mandato judicial, quando não inclua poderes para confissão, desistência ou transacção, pode também ser conferido por documento escrito e assinado pelo constituinte, com reconhecimento da letra e assinatura, ou mediante a assinatura da parte aposta conjuntamente com a do procurador, no respectivo articulado, com reconhecimento presencial da assinatura.
3. O mandato com poderes de livre e geral administração civil ou gerência comercial, para contrair obrigações cambiárias, para fins que impliquem confissão, desistência ou transacção em pleitos judiciais ou a representação em actos que têm de realizar-se por modo autêntico ou para cuja prova é exigido documento autêntico, não pode ser conferido sob a forma prevista na alínea c) do n.° 1.”

(50) Dada a expressa remissão para o artigo 116.° do CN, o artigo 118.° deste diploma constitui igualmente uma excepção à regra geral prevista no artigo 262.°, n.° 2, do CC, ao estabelecer:
“1 – É permitida a representação por meio de procurações e de substabelecimentos que, obedecendo a alguma das formas prescritas no artigo 116.°, sejam transmitidas por via telegráfica ou por telecópia, nos termos legais.
2 – As procurações ou substabelecimentos devem estar devidamente selados.”

(51) Vide Pires de Lima e Antunes Varela (com a colaboração de M. Henrique Mesquita), Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, pág. 244.


Forma da procuração - IV



Por outro lado, como afirma Maria Helena Brito, “O acto de atribuição de poderes é também funcional e estruturalmente independente em relação ao negócio jurídico representativo”(36), isto é, há autonomia do poder de representação face ao negócio jurídico celebrado pelo representante e terceiro. Símbolo desta autonomia é o regime vertido no artigo 259.° do CC:

“1. À excepção dos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do representado, é na pessoa do representante que deve verificar-se, para efeitos de nulidade ou anulabilidade da declaração, a falta ou vício da vontade, bem como o conhecimento ou ignorância dos factos que podem influir nos efeitos do negócio.
2. Ao representado de má fé não aproveita a boa fé do representante.” (itálico nosso)

Em matéria de forma, porém, a regra do CC, ao impor para a procuração a solenidade exigida ao negócio a realizar pelo procurador (cfr. artigo 262.°), constitui excepção à independência do negócio jurídico atributivo do poder de representação relativamente ao negócio principal.

II - Procuração: da sua forma

a) Regra: igualdade de forma entre a procuração e o negócio jurídico representativo

Tendo em conta a independência da procuração relativamente ao negócio representativo, seria de esperar que, no domínio da forma, a regra para aquela fosse a não exigência da solenidade requerida para este. É esta, aliás, a solução vigente nos ordenamentos jurídicos suíço e germânico (37).

No CC português, a opção, porém, foi diversa, consagrando-se, como regra geral, a sujeição da procuração à forma exigida para o negócio principal(38)(39). Dispõe o artigo 262.°, n.° 2:

“Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar.”

Na base desta previsão legislativa, parece ter estado o pensamento de Vaz Serra: “Mas, se a procuração não é parte do negócio a realizar pelo representante, não estando por isso, como tal, sujeita às formalidades prescritas para este, pode a razão dessas formalidades compreender o acto pelo qual o interessado atribui poderes de representação a terceiro. (…) Se, por exemplo, com a exigência de formalidades, se pretende assegurar a ponderação do interessado, evitando que levianamente realize o negócio em questão, essa finalidade abrange a procuração, que é o único acto em que se manifesta a vontade do interessado.”(40)

Noutros termos: a ratio subjacente à exigência de forma legal para a conclusão de certos negócios jurídicos (v.g. artigos 875.° e 947, n.° 1, do CC e artigo 80.° do Código do Notariado) obriga à adopção de formalismo idêntico pela procuração atributiva de poderes representativos para a celebração destes negócios. De outro modo, as razões de garantia de ponderação das partes, de publicidade e de segurança jurídica que estão na base da necessidade da observância das solenidades para alguns negócios representativos (ditos formais)(41) não seriam salvaguardadas.

Notas:

(36) Vide Maria Helena Brito, Ob. cit., pág. 124.

(37) Existem, contudo, algumas excepções, legais e jurisprudenciais, ao princípio geral da independência da procuração relativamente ao negócio representativo no domínio da forma, consagrado nos direitos alemão e helvético. Assim, a título de exemplo, “ a jurisprudência do Bundesgericht esclarece que, no caso de o negócio representativo estar sujeito a forma autêntica, a «vontade de representar» do representante deve ser declarada sob a mesma forma.” e a doutrina suíça “informa que o princípio da independência da procuração relativamente ao negócio representativo é em parte contrariado pelos responsáveis pelo registo predial, ao exigirem procuração escrita relativamente aos actos de transferência de propriedade, e que numerosos cantões subordinam a validade dos actos à autenticação da assinatura do autor.” Vide Maria Helena Brito, Ob. cit., pág. 107.

(38) Em Itália, a simetria formal entre negócio – base e procuração foi também acolhida no CC (artigo 1392.°). Para a indicação da doutrina italiana mais relevante sobre esta questão, vide Pedro de Albuquerque, Ob. cit., pág. 1037.

(39) Nos termos do artigo 268.°, n.° 2, primeira parte, do CC, também “ a ratificação está sujeita à forma exigida para a procuração”.

(40) Vide Vaz Serra, “ Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 24-05-1960 (Vaz Pereira)”, in Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 94, 1961-1962, pág. 184.

(41) Segundo Menezes Cordeiro, as razões de solenidade, de reflexão e de prova, tradicionalmente apontadas como estando na base da forma negocial legalmente exigida “assumem (…) tão-só, uma consistência de tipo histórico: elas [as justificações de determinadas exigências de forma] terão levado o legislador ou, mais latamente, o Direito, a prescrevê-las.” (parêntesis nosso) Vide Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, cit., pág. 569.

Forma da procuração - III



c) Representação voluntária: a procuração

Na representação voluntária(17), os poderes do representante procedem da vontade do representado, exteriorizada numa declaração negocial designada por procuração (cfr. artigo 261.° do CC).

Quanto aos poderes outorgados, a procuração pode ser geral, se abrange os actos de natureza patrimonial(18), ditos de administração ordinária(19), ou especial, quando ao representante é permitida a prática dos actos especificamente previstos bem como dos actos necessários à sua execução.(20)

Para a procuração ser eficaz não é necessária a aceitação, pelo que o beneficiário tem de renunciar a ela no caso de não querer ser procurador (cfr. artigo 265.°, n.° 1, do CC), isto é, estamos perante um negócio jurídico unilateral(21).

Trata-se de um negócio jurídico unilateral receptício(22)(23), cujo destinatário, de acordo com a melhor doutrina(24), é o terceiro com quem o representante contrata em nome do representado, e não o representante(25) ou o público(26). Deste modo, no plano da interpretação negocial (cfr. artigo 236.° do CC(27)), impera o entendimento de Ferrer Correia: “ nós ponderamos que os principais interessados (no caso da procuração) são aqui o constituinte e o terceiro; consideramos, depois, que o constituinte, querendo contratar com o terceiro por intermédio do procurador, não pode deixar de querer comunicar-lhe a autorização representativa de que o último está munido: e logo concluímos ser o terceiro quem mormente carece das atenções que, na teoria geral da interpretação, se dispensam ao destinatário da declaração de vontade, á contraparte – e quem principalmente as merece.”(28)

A classificação da procuração como negócio jurídico unilateral tornou-se clara a partir da afirmação da autonomia entre o poder de representação e a relação fundamental de ligação entre representado e representante.

Na verdade, durante muito tempo, doutrina e jurisprudência não distinguiam procuração de mandato, considerando o poder de representação mero efeito deste contrato(29). Actualmente, porém, é pacífica a cisão conceptual entre o acto jurídico de que emerge o poder representativo e os negócios que estão na base da relação entre representante e representado(30).

Dito de outro modo, a procuração é um negócio abstracto(31), cujo efeito é a outorga de poder representativo ao procurador, não cumprindo qualquer função económica ou social típica, isto é, a procuração pode ter causas várias(32).

No entanto, a procuração apresenta alguns traços de causalidade, podendo notar-se várias manifestações de influência da relação de base sobre o poder de representação. Podemos mesmo falar de uma “relativização do carácter abstracto da procuração”.(33)

Exemplificativamente, a possibilidade de o procurador poder fazer-se substituir por outrem se tal resultar da relação jurídica que determina a procuração (cfr. artigo 264.°, n.° 1 do CC) e a cessação do negócio – base implicar a cessação desta, salvo se outra for a vontade do representado (cfr. artigo 265.°, n.° 1, do CC)(34), constituem limitações importantes à autonomia do poder de representação(35).

Notas:

(17) A representação voluntária distingue-se da representação legal, resultando aqui os poderes representativos da lei, e da representação orgânica ou constitucional. Segundo Manuel de Andrade, a representação das pessoas colectivas obriga à autonomização desta categoria, “que aliás não será verdadeira representação mas organicidade”. Vide Manuel de Andrade, Ob. cit., págs. 288 e 289.

(18) Excluem-se, assim, os actos meramente pessoais (v.g., testamento — cfr. artigo 2182.° do CC). Como afirma Carvalho Fernandes, “são meramente pessoais, hoc sensu, aqueles actos em relação aos quais a lei exclua exercício representativo, ou que, pela sua natureza devem seguir regime análogo. Está aqui em causa, em geral, uma particular ligação com o seu autor, pela índole dos interesses envolvidos, que exigem uma avaliação pessoal, não se compadecendo com a interferência de terceiros. O exemplo de escola é o direito de testar, sendo o testamento um acto pessoal hoc sensu.” Vide Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II – Fontes, Conteúdo e Garantia da Relação Jurídica, 3.ª edição, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2001, pág. 212.
Quanto ao casamento, um dos nubentes pode ser substituído por procurador, devendo a procuração conter poderes especiais para o acto, a designação do outro nubente e a indicação da modalidade do casamento (cfr. artigos 1616, alínea a), e 1620.° do CC).

(19) Nas palavras de Manuel de Andrade, actos de administração ordinária ou “Actos de mera administração serão pois os que correspondem a uma gestão patrimonial limitada e prudente em que não são permitidas certas operações – arrojadas e ao mesmo tempo perigosas – que podem ser de alta vantagem, mas que podem ocasionar graves prejuízos para o património administrado. Ao mero administrador são proibidos os grandes voos, as manobras audaciosas, que podem trazer lucros excepcionais, mas também podem levar a perdas catastróficas.” Vide Manuel de Andrade, Ob. cit., pág. 62.

(20) No CC, esta distinção é feita em relação ao mandato, dispondo o artigo 1159.°:
“1. O mandato geral só compreende os actos de administração ordinária.
2. O mandato especial abrange, além dos actos nele referidos, todos os demais necessários à sua execução.”
Seguindo Menezes Cordeiro, consideramos “esta distinção aplicável à procuração, na base dum argumento histórico, dum argumento sistemático e dum argumento lógico a fortiori. Historicamente, (…) o facto de toda esta matéria se ter vindo a desenvolver a partir do mandato. O argumento sistemático aponta a unidade natural que deve acompanhar o mandato com representação: o mandatário irá receber os poderes necessários para executar cada ponto do mandato. Finalmente, o argumento lógico explica que não faz sentido ter uma lei mais exigente para um mero serviço – o mandato – do que para os poderes de representação, que podem bulir com razões profundas de interesse público e privado”. Vide Menezes Cordeiro, “ A Representação no Código Civil…”, cit., pág. 405.

(21) Mota Pinto afirma expressamente: “Nos negócios unilaterais há uma só declaração de vontade ou várias declarações mas paralelas, formando um só grupo. Se olharmos os autores das declarações, constataremos haver um só lado, uma só parte. É o caso do testamento, da renúncia à prescrição, da procuração.” (negrito nosso) Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 385.

(22) Nas palavras de Manuel de Andrade, “Quanto às variantes que podem assumir os negócios unilaterais, (…) só queremos destacar a mais importante de todas e a mais corrente, que os agrupa em receptícios e não receptícios. Nos receptícios (ou com declaração de vontade receptícia), a declaração tem de ser dirigida e levada ao conhecimento de pessoa determinada, não valendo sem isso. É o caso da denúncia de um contrato (de arrendamento, de prestação de serviços), da revogação ou renúncia a uma procuração, etc. Nos não receptícios (com declaração de vontade não receptícia), a declaração vale logo que é emitida, sem necessidade de comunicação a pessoa determinada (embora possa ser preciso o concurso de algum outro facto ou circunstância). Estes negócios são, de longe, mais raros do que os outros. O exemplo mais típico é o testamento; mas costumam-se citar outros, como o negócio de fundação.” (negrito nosso) Vide Manuel de Andrade, Ob. cit., pág. 42.
Tradicionalmente, na Faculdade de Direito de Lisboa, fala-se em declarações negociais recipiendas e não recipiendas, por se considerar esta terminologia “ mais consentânea com o étimo das expressões”. Vide Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, I, Parte Geral, Tomo I, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 548.

(23) Em sentido contrário, Carvalho Fernandes afirma: “Enquanto negócio, por procuração identifica-se um negócio jurídico unilateral não recipiendo. Esta última qualidade não exclui, porém, no plano prático, a necessidade de materialmente o documento em que se consubstancia esse acto ter de chegar ao poder do procurador. Sem ele, este não está em condições de agir sempre que a procuração seja um negócio formal e, portanto, se torne necessário exibir o correspondente documento para fazer a sua prova.” Vide Luís A. Carvalho Fernandes, Ob. cit., pág. 213.

(24) Neste sentido, vide Ferrer Correia, “ A procuração na teoria da representação voluntária”, in Estudos Jurídicos, II – Direito civil e comercial. Direito criminal, 2.ª edição, (reimpressão), Coimbra, 1995, págs. 30-32 e Paulo Mota Pinto, Ob. cit., págs. 607 e 608.

(25) Segundo Januário Gomes, o destinatário natural da procuração é o representante, o qual não pode prevalecer-se dos poderes conferidos enquanto não receber a procuração ou tiver conhecimento desses poderes. No entanto este autor reconhece: “embora a relação de representação respeite apenas ao representado e ao representante, é perante terceiros que a mesma está mediatamente destinada a operar”. Vide Manuel Januário da Costa Gomes, Em tema de revogação do mandato civil, Coimbra, 1989, pág. 237.

(26) Para uma resenha da principal doutrina germânica e da jurisprudência helvética defensoras desta posição, vide Maria Helena Brito, Ob. cit., págs. 120 e 121.

(27) O artigo 236.° do CC estabelece:
“1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.”
Neste preceito, encontra-se consagrada a doutrina da impressão do destinatário, de cariz objectivista, embora com a limitação subjectivista (“salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”), decorrente dos ensinamentos de Larenz e, entre nós, de Ferrer Correia. Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., págs. 443-445.

(28) Vide Ferrer Correia, Ob. cit., pág. 14.

(29) Sobre a evolução doutrinária em Portugal até à plena autonomização das figuras do mandato, da representação e da procuração, vide Pedro Leitão Pais de Vasconcelos, Ob. cit., págs. 35 a 42.

(30) Normalmente, o mandato é o negócio jurídico base, embora a relação subjacente à procuração possa emergir de outros negócios (v.g, contratos de trabalho e de agência).

(31) Seguindo a lição de Mota Pinto, “Os negócios em que estas (as causas) não relevam, por poderem preencher uma multiplicidade de funções e os efeitos do negócio serem separados da sua causa, designam-se como negócios abstractos – por exemplo, negócios cambiários, como o saque de um cheque ou o aceite de uma letra (…). Na generalidade dos negócios jurídicos, contudo, o direito não isola o seu conteúdo da respectiva causa – são negócios causais.” Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 399.
Como refere Pedro Pais de Vasconcelos, “ Os negócios abstractos ocorrem normalmente em situações nas quais a tutela da confiança no tráfego jurídico se impõe à autonomia privada. Esta situação verifica-se no caso da procuração. Se a procuração fosse um negócio causal, poucas seriam as pessoas que aceitariam celebrar negócios com um procurador, pois correriam o risco de o dominus vir mais tarde invocar a relação subjacente para impugnar parte ou a totalidade do negócio. A eficiência prática, a segurança e a utilidade da procuração, enquanto instrumento jurídico que permite a multiplicação e aceleração do tráfego jurídico através da legitimação de terceiros para agirem em representação de outrem, exige a abstracção.” Vide Pedro Leitão Pais de Vasconcelos, Ob. cit., pág. 62.

(32) Ferrer Correia afirma a “ natureza abstracta da procuração, para significar que ela não recebe em si o título que todavia materialmente o explica e justifica – o negócio jurídico fundamental. A procuração constrói-se como se, para além dela, não estivesse o mandato, a locatio operarum, a sociedade. Está. Mas procedemos como se não estivesse, fazemos abstracção desse outro negócio jurídico”. Vide Ferrer Correia, Ob. cit., págs. 27 e 28.

(33) Vide Paulo Mota Pinto, Ob. cit., pág. 600.

(34) A procuração pode também cessar por renúncia do procurador (cfr. artigo 265.°, n.° 1, do CC) e por revogação, livre, do representado, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação. Será, porém, irrevogável a procuração conferida no interesse comum do dominus e do procurador ou de terceiro, salvo acordo do interessado ou verificação de justa causa (cfr. artigo 265.°, n.os 2 e 3, do CC).

(35) Para mais exemplos de limites à abstracção da procuração, vide Maria Helena Brito, Ob. cit., págs. 123 e 124, e Pedro Leitão Pais de Vasconcelos, Ob. cit., págs. 62 e 63.


12/13/2023

Forma da procuração - II


Existem, porém, outras hipóteses de eficácia do negócio em relação ao representado quando haja actuação sem poder de representação. De facto, a actuação do representante depois da modificação ou cessação duma procuração pode exigir a tutela da confiança de terceiros que com ele mantenham relações jurídicas. Dispõe, por isso, o art. 266° do CC:

“1—As modificações e a revogação da procuração devem ser levadas ao conhecimento de terceiros por meios idóneos, sob pena de lhes não serem oponíveis senão quando se mostre que delas tinham conhecimento no momento da conclusão do negócio.
2—As restantes causas extintivas da procuração não podem ser opostas a terceiro que sem culpa as tenha ignorado.”

Por outro lado, no caso de abuso de representação(11), quando a contraparte não conheça nem deva conhecer a falta de poderes do representante, o negócio produz efeitos relativamente ao representado (cfr. art. 268° e 269° (12) do CC).

Pelo contrário, nas situações em que a falta de poderes do representante resulta da falta de uma procuração, porque este nunca teve legitimação representativa, não é aplicável o artigo 266.° do CC, acima transcrito, nem parece justificar-se a protecção de terceiro mediante a eficácia do negócio na esfera jurídica do representado.

Na verdade, cabe ao terceiro exigir ao representante a justificação dos seus poderes (cfr. art. 260° do CC(13)), pelo que, fora dos casos excepcionais configuradores de um abuso do direito, não parece haver razões convincentes para a tutela daquele(14).

Em matéria de representação aparente, não se pode, contudo, olvidar o disposto no art. 23°, n° 1, do DL n° 178/86, de 3 de Julho, diploma regulador do contrato de agência(15):

“1—O negócio celebrado por um agente sem poderes de representação é eficaz perante o principal se tiverem existido razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justifiquem a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do agente, desde que o principal tenha igualmente contribuído para fundar a confiança do terceiro.”

De acordo com este preceito, a existência de circunstâncias objectivas que fundem uma aparência de representação, aliada à condição subjectiva da actuação do representado, justificam a tutela da confiança da contraparte e a eficácia do negócio perante o representado-principal.

Embora não nos pareça que o dispositivo em análise consagre um princípio geral de relevância da aparência, concordamos com Maria Helena Brito, segundo a qual “a situação objectiva geradora de confiança imputável ao pretenso representado – a aparência de poder de representação do pretenso representante – pode surgir no âmbito de outras relações contratuais, como no contrato de trabalho e, em geral, sempre que se confie a execução de determinadas tarefas a outrem.” Afirma, por isso, a autora: “Somos assim conduzidos à conclusão de que a aplicação do regime estabelecido pelo art. 23° do DL n° 178/86 se justifica especialmente no âmbito dos contratos de cooperação ou até, de modo mais rigoroso, no âmbito dos contratos de cooperação auxiliar, de que o contrato de agência constitui, nesta matéria, o paradigma, por razões que se prendem com o momento em que foi legislativamente regulado.”(16)

Notas:

(11) Segundo Menezes Cordeiro, o abuso de representação “traduz a situação na qual os poderes efectivamente existentes sejam superados pelo acto praticado. Ele é equiparado à representação sem poderes da qual é, no fundo, apenas uma modalidade. (…) Em termos mais gerais, o abuso de representação vem a ser o exercício dos inerentes poderes em oposição com a relação subjacente.” Vide Menezes Cordeiro, “A Representação no Código Civil…”, cit., págs. 418 e 419.

(12) Estipula o art. 269° do CC: “O disposto no artigo anterior é aplicável ao caso de o representante ter abusado dos seus poderes, se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso.”

(13) O art. 260° do CC reza o seguinte:
“1—Se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos.
2—Se os poderes de representação constarem de documento, pode o terceiro exigir uma cópia dele assinada pelo representante.”

(14) Neste ponto, seguimos a posição de Menezes Cordeiro, o qual não admite, perante os dados do Direito português, a “procuração tolerada” nem a “procuração aparente”. Vide Menezes Cordeiro, “A Representação no Código Civil…”, cit., págs. 414-416. Também Heinrich Ewald Hörster considera estas figuras de difícil aceitação no direito português “devido ao disposto no art. 457.° CCiv.” Vide Heinrich Ewald Hörster, Ob. cit., pág. 484.
Mota Pinto, por seu lado, afirma poder justificar-se a protecção do terceiro na “procuração por tolerância”, embora lhe ofereça mais dificuldades a vinculação do representado nas hipóteses de mera “procuração por aparência”. Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 551.

(15) Sobre o art. 23° do DL n° 178/86, vide António Pinto Monteiro, Contrato de Agência-anotação, 5.ª edição, Coimbra, 2004, págs. 109-110 e Paulo Mota Pinto, “Aparência de poderes de representação e tutela de terceiros. Reflexão a propósito do artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 178/86, de 3 de Julho”, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, volume LXIX, 1993, pág. 587 e seguintes.

(16) Vide Maria Helena Brito, Ob. cit., págs. 138-139.

Forma da procuração - I



PROCURAÇÃO

(art. 116º do Código do Notariado e art. 38º do DL nº 76-A/2006, de 29 de Março)(*)

Pelo Mestre João Nuno Calvão da Silva(**)

I - Representação: breves notas

a) Pressupostos

Regulada nos art. 258° a 269° do CC(1)(2), a representação caracteriza-se pela actuação de alguém (representante) em nome de outrem (representado)(3), não se limitando aquele a exprimir a vontade deste.

Decisiva é, por um lado, a existência da contemplatio domini, assim se distinguindo a representação do contrato de mandato, através do qual alguém (mandatário) fica vinculado a praticar um ou mais actos jurídicos por conta de outrem (mandante)(4).

Não é também pressuposto da figura em análise a actuação do representante no interesse do representado(5), porquanto o nosso ordenamento jurídico parece admitir a concessão de poderes representativos no interesse exclusivo do representante e/ou de terceiro(6).

Por outro lado, o representante não se limita a comunicar a mensagem que alguém lhe transmite, possuindo, em maior ou menor grau, uma margem de decisão própria quanto aos actos a praticar. Por isso, o representante distingue-se do núncio(7).

b) Efeitos e representação sem poderes(8)

No ordenamento jurídico-civilístico português, o instituto da representação é definido em função dos seus efeitos. Dispõe o art. 258° do CC: “O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.”

Da disposição transcrita resulta a característica fundamental da representação: a produção de efeitos na esfera jurídica de uma pessoa distinta da que manifesta a vontade negocial(9).

Assim, é essencial a existência de legitimação representativa, só podendo o representante actuar em nome do representado, vinculando-o às consequências jurídicas do acto praticado, se dispuser de poderes para tal. Não existindo o necessário poder de representação, apenas a ratificação do representado torna o negócio eficaz na sua esfera jurídica(10). Neste sentido, estabelece o art. 268°, n° 1, do CC: “O negócio que uma pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de outrem é ineficaz em relação a este, se não for por ele ratificado.”

Notas:

(*) Para a elaboração deste trabalho foi fundamental o contributo do Mestre João Maia Rodrigues, notário e jurista de grande qualidade. A ele temos de agradecer o alerta para a importância prática do problema e sugestões que em muito valorizaram o nosso estudo.

(**) Assitente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

(1) Segundo Heinrich Ewald Hörster, a sistematização adoptada pelo nosso Código Civil “pode ser considerada como não sendo inteiramente feliz”, defendendo aquele Professor que “o lugar mais indicado para a própria subsecção (…) seria a seguir à perfeição da declaração negocial.” Vide Heinrich Ewald Hörster, A Parte Geral do Código Civil Português – Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª reimpressão da edição de 1992, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 478.

(2) Adiante identificado por CC.

(3) Dispõe o art. 258° do CC: “O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.” (negrito nosso)

(4) Nos termos do art. 1157° do CC, “Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra.” (negrito nosso) Nem sempre foi clara a distinção entre mandato e representação: o CC de 1867, na linha do Code Civil, identificava-os e a doutrina nacional da época não discernia claramente a diferença entre estas figuras (v.g, Guilherme Moreira, Paulo Merêa, Cunha Gonçalves, entre outros). A distinção parece ter surgido nítida apenas com Manuel de Andrade, Galvão Telles, Magalhães Collaço e, sobretudo, com Ferrer Correia. Vide Maria Helena Brito, A Representação nos contratos internacionais – Um contributo para o estudo do princípio da coerência do direito internacional privado, Almedina, Coimbra, 1999, págs. 87 e 88, e Menezes Cordeiro, “A Representação no Código Civil: sistema e perspectivas de reforma”, in Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Volume II – A Parte Geral do Código e a Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 2006, págs. 393 a 396.
Actualmente, na doutrina nacional, parece consensual a não coincidência entre os conceitos analisados, podendo haver mandato sem representação (v.g, o contrato de mandato sem representação, regulado nos termos dos artigos 1180.° e seguintes do CC, e o contrato de comissão, regulamentado pelos art. 266° e segs do Código Comercial) e representação sem mandato (v.g, a representação legal e a procuração que coexista com um contrato de trabalho ou de agência, por exemplo). Vide, por todos, Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição (por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto), Coimbra Editora, 2005, págs. 541 e 542. Sobre o mandato sem representação, vide Fernando Pessoa Jorge, O Mandato Sem Representação, reimpressão, Almedina, Coimbra, 2001.
Na jurisprudência, a questão também é pacífica, considerando-se que a procuração e o mandato podem coexistir ou andar dissociados. Exemplificativamente, cfr. Acórdãos do STJ de 10-03-98 e de 22-02-96, in www.dgsi.pt.

(5) Na representação legal, porém, o interesse do incapaz – representado é elemento essencial, na medida em que os poderes do representante constituem poderes-deveres ou “ofícios”, a terem de ser exercidos e do modo previsto pelo ordenamento jurídico. Para a noção de “direito funcional”, vide Rabindranath Capelo de Sousa, Teoria Geral do Direito Civil, volume I, Coimbra, 2003, pág. 185.

(6) No CC prevê-se expressamente a procuração “também no interesse do procurador ou de terceiro”, a qual “não pode ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa” (art. 265°, n° 3, do CC), ao contrário da procuração no interesse exclusivo do representado, livremente revogável por este (art. 265°, n° 2, do CC).
Em termos paralelos, em relação ao contrato de mandato, estabelece o art. 1170° do CC:
“1—O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
2—Se, porém, o mandato tiver sido conferido, também, no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.” (itálico nosso) Sobre a admissibilidade das procurações no interesse exclusivo do procurador, de terceiro, ou de ambos, com uma interessante resenha das principais posições doutrinárias e jurisprudenciais, bem como uma análise do Direito Comparado sobre a questão, vide Pedro Leitão Pais de Vasconcelos, A Procuração Irrevogável, Almedina, Coimbra, 2002, em especial págs. 6 a 20. Mais recentemente, Pedro de Albuquerque pronunciou-se inequivocamente pela inadmissibilidade das procurações in rem propriam: “Também não nos parece poderem subsistir dúvidas quanto à circunstância de, em nosso entender, não ser admissível a existência de procurações ou poderes de representação concedidos no exclusivo interesse do representante ou de terceiro.” Vide Pedro de Albuquerque, A Representação voluntária em Direito Civil (Ensaio de Reconstrução Dogmática), Almedina, Coimbra, 2004, pág. 983.

(7) Pelo facto de o representante emitir uma declaração negocial própria, o artigo 259.°, n.° 1, do CC determina ser “na pessoa do representante que deve verificar-se, para efeitos de nulidade ou anulabilidade da declaração, a falta ou vício da vontade, bem como o conhecimento ou ignorância dos factos que podem influir nos efeitos do negócio”.
Por outro lado, se “o procurador não necessita de ter mais do que a capacidade de entender e querer exigida pela natureza do negócio que haja de efectuar” (art. 263° do CC), pois a exigência da capacidade de exercício deste seria excessiva atenta a falta de interesse próprio na conclusão dos negócios, “ao núncio, bastará a capacidade natural para transmitir a declaração de vontade”. Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 543.
Para uma análise das diferenças entre núncio e representante, vide Raúl Guichard, “Sobre a distinção entre núncio e representante”, in Scientia Iuridica, XLIV, n.os 256-258, 1995, pág. 317 e seguintes.

(8) A hipótese prevista no art. 261° do CC parece configurar um caso de representação sem poderes, porquanto o auto-contrato é anulável se o representado não tiver especificadamente consentido na celebração do negócio. Por outro lado, ao proibir-se o negócio consigo mesmo, visa-se evitar o risco de conflito de interesses entre o representante e o representado, pelo que o contrato será válido quando, por sua natureza, excluir esse risco.

(9) Dada a essencialidade desta nota, parte da doutrina considera-a requisito de existência da representação. Vide Menezes Cordeiro, “A Representação no Código Civil…”, cit., pág. 397, e Raúl Guichard, “Notas sobre a falta e limites do poder de representação”, in Revista de Direito e Estudos Sociais, XXXVII, Lisboa, 1995, pág. 5. No sentido de que o poder representativo constitui um mero pressuposto de eficácia da representação, posição, em nosso entendimento, mais rigorosa, vide Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, volume II, (7.ª reimpressão), Almedina, Coimbra, 1992, págs. 302-303 e Carlos Alberto da Mota Pinto, Ob. cit., pág. 548.

(10) Naturalmente, pensamos aqui na representação voluntária, fundada na vontade do representado, e não na representação legal, a qual promana da lei e visa suprir incapacidades de exercício de certos indivíduos (v.g., menores, interditos), os quais, não podendo agir pessoal e autonomamente, não podem nomear um representante voluntário nem, obviamente, legitimar a posteriori os actos praticados sem poderes pelos seus representantes legais, isto é, em violação de limites imperativos da lei à sua actuação (v.g., art. 1889° e 1893°,1937° a 1940° do CC). Não olvidamos, porém, a possibilidade de confirmação de negócios anuláveis concluídos por incapazes de agir pelos próprios, cessadas as causas das respectivas incapacidades. Para uma distinção entre os regimes da ratificação e da confirmação de negócio anuláveis, vide Rui de Alarcão, A confirmação dos negócios anuláveis, Coimbra, 1971, pág. 118 e seguintes.

12/06/2023

Limitações a que os condóminos estão sujeitos

 A regra geral, formulada no art. 1420º do CC, é a de que cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence.

Em princípio, portanto, ele goza essa fracção como qualquer outro proprietário singular pode fruir a coisa de que é dono.

Segundo o art. 1305º do CC, "o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem", contudo, sendo este um direito pleno, não é absoluto, porquanto, tem de ser exercido "dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas".

O direito de propriedade não é pois, como se disse, absoluto, porquanto está este limitado pela função social ou económica que desempenha.

No caso da PH, a sua peculiar fisionomia requer especial atenção à interdependência dos condóminos no uso e fruição do prédio, com relevo para a comodidade e tranquilidade destes e para a sua segurança e a do próprio edifício,

Daí que, para além das restrições que de um modo geral a lei assinala ao direito de todo o proprietário, se torne indispensável a imposição de outras que atendam àquelas circunstâncias, sem que isso leve a desvirtuar o domínio pleno do condómino, pois se trata apenas de manifestação do princípio consignado naquele art. 1305º.

É precisamente a essas restrições que este artigo se refere.

Em lugar de formulação genérica e de certo modo vaga que fora dada no art. 12º do DL 40 333, o nº 1 deste art. 1422º veio dispor, de forma objectiva, que os condóminos sofrem as limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários das coisas imóveis, consoante esteja em causa o exercício do seu direito sobre a fracção autónoma ou sobre as partes comuns.

O facto de o preceito não se ter referido, como fazia a lei anterior, ao bem de todos a dever nortear o exercício do direito dos condóminos não quis significar desatenção a essa circunstância, pois é ela uma das que se devem ter em conta por exigência da regra geral do art. 334º, que taxa de ilegítimo o exercício de um direito"quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".

A estas circunstâncias devem, pois, os condóminos atender sempre e como regra geral ao exercerem o seu direito quer como proprietários singulares, quer como comproprietários.

 De um modo especial, e naquela primeira qualidade, devem observar as regras dos seguintes preceitos:

Artigo 1346.º
(Emissão de fumo, produção de ruídos e factos semelhantes)

O proprietário de um imóvel pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores, cheiros, calor ou ruídos, bem como à produção de trepidações e a outros quaisquer factos semelhantes, provenientes de prédio vizinho, sempre que tais factos importem um prejuízo substancial para o uso do imóvel ou não resultem da utilização normal do prédio de que emanam.

Nota: A expressão "prédio vizinho", pode e deve ler-se, no âmbito do regime da PH, como "fracção vizinha", seja ela contígua ou situada no mesmo edifício.

Artigo 1347.º
(Instalações prejudiciais)

1. O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei.
2. Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua inutilização só é admitida a partir do momento em que o prejuízo se torne efectivo.
3. É devida, em qualquer dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.

Nota: A expressão "no seu prédio", pode e deve ler-se, no âmbito do regime da PH, como "no interior da sua fracção", englobando esta a área habitacional, garagem, arrecadações. etc..

Artigo 1348.º
(Escavações)

1. O proprietário tem a faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer escavações, desde que não prive os prédios vizinhos do apoio necessário para evitar desmoronamentos ou deslocações de terra.
2. Logo que venham a padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos serão indemnizados pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as precauções julgadas necessárias.

Nota: Embora não se antevejam situações frequentes entre os condóminos que devam ser reguladas por este preceito, certo é que elas se poderão verificar, sobretudo em prédios onde os condóminos tenham a fruição exclusiva de um logradouro de certa extensão.

Artigo 1349.º
(Passagem forçada momentânea)

1. Se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos.
2. É igualmente permitido o acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de coisas suas que acidentalmente nele se encontrem; o proprietário pode impedir o acesso, entregando a coisa ao seu dono.
3. Em qualquer dos casos previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido.

Artigo 1350.º
(Ruína de construção)

Se qualquer edifício ou outra obra oferecer perigo de ruir, no todo ou em parte, e do desmoronamento puderem resultar danos para o prédio vizinho, é lícito ao dono deste exigir da pessoa responsável pelos danos, nos termos do artigo 492.º, as providências necessárias para eliminar o perigo.

Artigo 1351.º
(Escoamento natural das águas)

1. Os prédios inferiores estão sujeitos a receber as águas que, naturalmente e sem obra do homem, decorrem dos prédios superiores, assim como a terra e entulhos que elas arrastam na sua corrente.
2. Nem o dono do prédio inferior pode fazer obras que estorvem o escoamento, nem o dono do prédio superior obras capazes de o agravar, sem prejuízo da possibilidade de constituição da servidão legal de escoamento, nos casos em que é admitida.

Nota: Embora não se antevejam situações frequentes entre os condóminos que devam ser reguladas por este preceito, certo é que elas se poderão verificar, sobretudo em prédios onde os condóminos tenham a fruição exclusiva de um logradouro de certa extensão.

Artigo 1352.º
(Obras defensivas das águas)

1. O dono do prédio onde existam obras defensivas para conter as águas, ou onde, pela variação do curso das águas, seja necessário construir novas obras, é obrigado a fazer os reparos precisos, ou a tolerar que os façam, sem prejuízo dele, os donos dos prédios que padeçam danos ou estejam expostos a danos iminentes.
2. O disposto no número anterior é aplicável, sempre que seja necessário despojar algum prédio de materiais cuja acumulação ou queda estorve o curso das águas com prejuízo ou risco de terceiro.
3. Todos os proprietários que participam do benefício das obras são obrigados a contribuir para as despesas delas, em proporção do seu interesse, sem prejuízo da responsabilidade que recaia sobre o autor dos danos.

Destas sortes, como comproprietários, os condóminos estão sujeitos à regra geral do nº 1 do art. 1406º do CC, em razão do que, na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer deles "é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito".

Legislação referente à SCIE


Geral SCIE (Segurança Contra Incêndio em Edifícios)


A Segurança contra incêndio em edifícios possui como princípios gerais a preservação da vida humana, do ambiente e do património cultural. Em Portugal continental cabe à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil assegurar o seu cumprimento, com excepção dos edifícios e recintos classificados na 1.ª categoria de risco cuja competência é dos municípios.


REGIME JURIDICO

REGULAMENTO TÉCNICO


CARGA DE INCÊNDIO MODIFICADA

COMISSÃO DE ACOMPANHAMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DO REGIME JURIDICO DE SCIE

CARTÕES DE IDENTIFICAÇÃO
  • Portaria n.º 54/2020 de 03 de Março​ - cartões de identificação profissional e de livre-trânsito das entidades credenciadas pela ANEPC para emissão de pareceres, realização de vistorias e de inspeções - Em vigor​
  • Portaria n.º 51/2020 de 27 de fevereiro​ - cartões de identificação profissional e de livre-trânsito para uso do pessoal da ANEPC que desempenhe funções de fiscalização e inspeção - Em vigor

12/04/2023

Glossário do Condomínio - H

Para um maior e melhor conhecimento das terminologias usadas no regime da propriedade horizontal, o presente glossário alfabético apresenta as definições dos principais termos usados no âmbito condominial.

Habitação

Residência, local onde se habita.
 
Hall
 
Espaço compreendido entre a porta da rua e a escada ou as portas que dão ingresso ao interior de uma casa ou edifício.
 
Hipoteca
 
Garantia do credor através da qual este passa a ter o poder de, mediante um acto de disposição, realizar, através do bem garantido, o seu crédito.

12/03/2023

Glossário jurídico - A


O presente glossário jurídico tem por desiderato, divulgar, em linguagem acessível ao comum dos condóminos, dos conceitos e expressões mais usados na prática do Direito, visando, pois, combater a iliteracia existente neste domínio.

Abandono da causa

Por incumprimento das diligências processuais e nos prazos da lei.

Absolvição

Decisão judicial que põe termo a uma acção, considerando que o réu não deve ser condenado, Em processo crime, decisão judicial que, depois de transitada em julgado, extingue o procedimento criminal contra o arguido pelos factos que lhe eram imputados na acusação, ou porque se provou a sua inocência, ou porque não foi produzida prova suficiente para fundamentar a condenação.

Abstenção

Renúncia do exercício de um direito ou de uma obrigação; Privar-se de praticar determinado acto ou de tomar determinada posição.

Acareação

Audição simultânea de pessoas que apresentaram depoimentos diferentes sobre a mesma matéria em tribunal.

Acção cível

Acto processual para fazer reconhecer um direito em tribunal.

Acção de despejo

Meio de os proprietários desocuparem os seus imóveis que estão sob contrato de locação.

Acção executiva

Meio processual através do qual se aplicam as medidas necessárias para impor um direito já reconhecido (por ex. a cobrança forçada de uma dívida).

Acção judicial

Processo em tribunal. É caracterizada por ter partes (duas ou mais), objecto (aquilo que se discute) e fases (diversas etapas na sua tramitação). Distingue-se conforme a sua natureza (civil, criminal ou administrativa) e complexidade (por exemplo, processo ordinário ou comum, sumário, especial). Também é habitual chamar-lhe causa ou instância.

Acesso ao direito e aos tribunais

Conjunto de meios pelos quais o cidadão pode conhecer e exercer os seus direitos. Inclui a informação jurídica de natureza geral, a consulta jurídica (entenda-se, referente a uma situação concreta. É realizada por advogado ou, em determinadas situações, por magistrado do Ministério Público ou por professor de direito), a nomeação de um advogado ou solicitador (pagando os seus serviços ou beneficiando de apoio judiciário), e, por último, a possibilidade de acesso aos tribunais a custo não proibitivo, eventualmente pagando com redução, ou mesmo não pagando, as custas e demais despesas.

Aclaração

Acto ou efeito de aclarar, esclarecimento.

Acórdão

Decisão de um conjunto de juízes (em regra, três. Poderão ser mais ou apenas dois, conforme os casos) numa determinada ação ou processo. Pode ocorrer em qualquer tipo de tribunal e em qualquer grau da hierarquia judicial. A expressão também existe em tribunais ou órgãos decisórios de outra natureza (por exemplo, tribunais arbitrais).

Acordar

Resolver de comum acordo uma determinada questão.

Acto ilícito

Acto contrário a um dever jurídico. Considera-se ilícito o acto violador de um direito absoluto de outrem ou de uma norma legal destinada a proteger interesses privados.

Acto próprio de Advogado

Considera-se acto próprio de advogado aquele exercido no âmbito da sua actividade profissional, no interesse de terceiros, bem como aquele que resulte do exercício do direito dos cidadãos a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade. Constituem actos próprios de advogados o exercício do mandato forense, a consulta jurídica, a elaboração de contratos e de negócios jurídicos, a negociação para a cobrança de créditos.

Acusação

Peça processual apresentada pelo Ministério Público, no âmbito da qual alguém é acusado de ter cometido crime(s) pelos quais deverá ser julgado.

Acusado

Pessoa relativamente à qual o Ministério Público deduziu acusação.

Adesão ao contrato

Aceitação do contrato pelo aderente

Adjudicação

Decisão final do procedimento de contratação pública, através da qual, a entidade adjudicante selecciona a melhor proposta apresentada pelos concorrentes, de acordo com o critério de adjudicação definido.

Admissibilidade

Análise dos pressupostos de constitucionalidade e juridicidade e de adequação financeira e orçamentária.

Admoestação

Censura dirigida a alguém pelo tribunal relativamente a determinada prática.

Adopção

Criação, por sentença judicial, de um vínculo jurídico semelhante ao que resulta da filiação natural, independentemente dos laços de sangue. Acto jurídico pelo qual se estabelece relação legal de filiação.

Advocacia

Actividade liberal exercida por advogados, mediante a qual representam os interesses das pessoas no tribunal ou fora do tribunal.

Advogado

Licenciado em Direito que exerce advocacia, estando obrigatoriamente inscrito na Ordem dos Advogados.

Advogado oficioso

Advogado designado pela autoridade judiciária (magistrado do Ministério Público ou juiz) para defender o arguido, se este não tiver constituído nenhum.

Admissibilidade

Análise dos pressupostos de constitucionalidade e juridicidade e de adequação financeira e orçamentária.

Agente de Execução

Um solicitador, advogado ou apenas licenciado em Direito que realiza todas as diligências do processo de execução (citações, notificações, penhoras, entre outras).

Agravantes

Circunstâncias legais, objectivas ou subjectivas, que influenciam na quantificação da pena, aumentando-a, face à particular culpabilidade do agente.

Alçada

Limite de competência de um juízo ou tribunal para julgar, conforme o valor da acção.

Alegações

Síntese dos argumentos de facto e de direito apresentados pelas partes que se confrontam em tribunal nas fases de julgamento ou de recurso, tanto oralmente como por escrito, defendendo o que consideram dever ser provado.

Alienação 

Transferência do domínio de um determinado bem ou a própria cessão desse, ou seja, a entrega de alguma coisa

Aluguer

Modalidade do contrato de locação, que respeita a coisa móvel. Assim, trata-se de um contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa móvel, mediante uma retribuição que se designa por aluguer.

Alteração substancial dos factos

Imputação ao arguido de um crime diferente daquele de que vinha acusado.

Alvará

Documento que uma autoridade judicial ou administrativa passa a favor de um interessado, seja de interesse público ou particular, certificando, autorizando ou aprovando certos actos ou direitos.

Amnistia

Perdão que é concedido aos culpados que tenham cometido delitos. Em termos penais, extingue a responsabilidade criminal, eliminando a incriminação de factos passados. Esta extinção é determinada pelo poder legislativo e tem dois efeitos: No caso de se verificar antes de uma sentença condenatória ter transitado em julgado, o procedimento criminal é extinto. Depois do trânsito em julgado da decisão condenatória, a execução da pena ou a medida de segurança cessam.

Analogia

Forma de resolver um problema jurídico através da aplicação de uma regra ou norma jurídica criada para uma situação com semelhanças. A aplicação de uma norma por analogia só pode ter lugar quando não exista uma norma directamente aplicável ao caso. Em situações que envolvam a incriminação das pessoas, não é permitido utilizar a analogia.

Ano judicial

O ano judicial corresponde ao ano civil.

Anulação

Decisão, geralmente de uma autoridade (por exemplo um juiz ou um superior hierárquico na administração pública), que desfaz os efeitos produzidos por outro acto, negócio ou contrato. A anulação tem sempre por base um determinado facto que a lei considera impedir consequências de outra forma normais (por exemplo, o acto ter sido praticado sem o consentimento de um dos interessados).

Aparte

Interrupção do orador para indagação, esclarecimento ou observação.

Aplicação

A expressão é geralmente utilizada no meio jurídico para significar o acto de concretizar o direito, isto é, de fazer incidir as regras jurídicas sobre uma determinada situação. Implica a realização de determinadas operações prévias, como a prova dos factos e a interpretação das regras jurídicas provenientes da lei ou de outras fontes.

Apoio judiciário

Uma vertente importante do acesso ao direito. Consiste no mecanismo mediante o qual o cidadão beneficia da nomeação de advogado ou solicitador (patrocínio oficioso) e/ou da redução ou mesmo isenção dos gastos (custas e outras despesas) inerentes ao processo. O pedido de apoio judiciário deve ser efectuado junto da Segurança Social.

Apostila

Certificação da autenticidade de actos públicos

Arbitragem

Meio alternativo aos tribunais para a resolução de litígios. Os processos são mediados por um árbitro designado por acordo entre as partes.

Aresto

O mesmo que acórdão

Arguido

No processo crime, é formalmente considerada como tal uma pessoa sobre a qual se considera poderem existir algumas provas de ter praticado um crime num processo criminal. A situação de arguido implica determinados direitos (por exemplo, o de não prestar declarações) e deveres.

Arquivamento do processo

Decisão de encerrar o processo.

Arrendamento

Modalidade do contrato de locação, que respeita a coisa imóvel.

Arresto

Apreensão judicial de bens imóveis ou móveis do devedor determinada numa decisão judicial.

Assistente 

Em Direito Penal, é uma condição para poder intervir directamente no andamento do processo, o que implica colaborar com o Ministério Público. O assistente tem o direito de intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que considere necessárias; deduzir acusação independente da do Ministério Público e, no caso de crimes particulares deduzir acusação mesmo que aquele a não deduza; interpor recurso das decisões que o afectem, mesmo que o Ministério Público o não tenha feito. O assistente tem ainda outros direitos, como participar na audiência, fazer alegações no final desta através do seu advogado, pronunciar-se sobre os meios de prova, arrolar testemunhas e questionar directamente essas testemunhas e as arroladas pelo arguido.

Atestar

Afirmar a veracidade de certo facto.

Atenuante

Circunstância que diminui a responsabilidade do arguido e, consequentemente, a pena.

Audiência

Sessão de julgamento em tribunal, presidida por um ou mais juízes, em que é julgado um processo.

Audiência prévia

A audiência prévia corresponde a uma diligência judicial, ocorrida na fase do saneamento do processo judicial, na qual participam o juiz e os mandatários das partes processuais.

Auto de notícia

Relato descritivo da forma e dos meios pelos quais chegou ao conhecimento da autoridade policial a ocorrência de um crime ou de uma contraordenação. É elaborado pela autoridade policial segundo um determinado modelo.

Autor

Agente de um delito ou contravenção; parte da relação processual que provoca a atividade judicial, iniciando a acção.

Autoridades

No sentido mais corrente refere-se a todos aqueles que se encontram investidos de poderes públicos, derivados do Estado ou das instituições internacionais (por exemplo, a União Europeia). Incluem os titulares dos órgãos de soberania (por exemplo, presidente da república, deputados, membros do Governo, juízes), membros dos órgãos administrativos do Estado e das autarquias locais, polícias, inspectores, fiscais, etc.

Autos

Conjunto das peças de um processo.

Averbação

Registo de determinada anotação diante de algum documento. Diz-se, por exemplo, da averbação de divórcio escrita na certidão de casamento, a partir do Livro de Registro de Casamento e de Imóveis.

Avocar

Chamar a si a responsabilidade.