Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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7/09/2023

O art. 1429º do Código Civil


Redacção actual

Redacção dada pelo DL 267/94 de 25 de Outubro, Art. 1º - Alteração CC

Artigo 1429.º
Seguro obrigatório

1. É obrigatório o seguro contra o risco de incêndio do edifício, quer quanto às fracções autónomas, quer relativamente às partes comuns.
2. O seguro deve ser celebrado pelos condóminos; o administrador deve, no entanto, efectuá-lo quando os condóminos o não hajam feito dentro do prazo e pelo valor que, para o efeito, tenha sido fixado em assembleia; nesse caso, ficará com o direito de reaver deles o respectivo prémio.

Anteprojecto

Art. 131º

1ª Revisão Ministerial

Art. 1417º

1. É obrigatório o seguro do edifício contra o risco de  incêndio.
2. Qualquer dos condóminos pode compelir os restantes à efectivação e manutenção do seguro quando o administrador o não tenha feito.

Projecto

Art. 1429º

Tem a redacção do texto original do Código, salvo ligeira alteração da sua parte final, onde se lia "a parte do prémio que lhe couber".

Direito anterior

Art. 22º DL 40 333

É obrigatória a realização do seguro do edifício contra o risco de  incêndio.
§  único. Qualquer dos condóminos pode compelir os restantes à efectivação e manutenção do seguro quando o administrador não tenha providenciado oportunamente para esse efeito.

5/27/2022

O seguro contra o risco de incêndio

É obrigatório o seguro contra o risco de incêndio, quer quanto às fracções autónomas, quer relativamente às partes comuns. O seguro deve ser celebrado pelos condóminos, mas se não o for feito, dentro do prazo e pelo valor que tenha sido fixado em assembleia, deve ter-se o mesmo, obrigatoriamente efectuado pelo administrador do condomínio.

Nesta factualidade, importa desde logo realçar que, nos termos do art. 1436º do CC, deve ser o administrador a propor à assembleia o montante do capital seguro. O administrador, enquanto órgão administrativo do condomínio, pode celebrar este seguro sobre as fracções autónomas, em nome da tutela mediata da segurança, quer das outras fracções autónomas, quer das partes comuns do edifício. A repartição das despesas com o seguro segue o regime geral do art. 1424º do CC.

Para evitar a negligência dos condóminos, o legislador permite, rectius, impõe, esta ingerência na fracção autónoma, ficando o administrador com o direito de reaver dos condóminos o respectivo prémio. Este poder-dever do administrador justifica-se pela existência de um interesse comum do condomínio, mas que não é igual ao conjunto do interesse de todos os condóminos, distinguindo-se dele.

Se os condóminos não fizerem o seguro, ou celebrando-o por um valor inferior àquele que tiver sido fixado em assembleia, a realização deste pelo administrador é um poder-dever, isto é, um poder funcional e não um poder-opção. O legislador não visa proteger um interesse disponível ao encarregar um órgão administrativo do condomínio de se substituir aos condóminos, em caso de inércia da parte destes. O administrador tutela aqui o interesse colectivo. 

Rui Vieira Miller, A propriedade horizontal no código civil, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 243, considera que o art. 1429º do CC é uma norma que não é de interesse e ordem pública, pois foi ditada pelo exclusivo interesse privado dos condóminos que, assim, a podem afastar. O que o legislador pretendeu foi, "em virtude da importância de que tal garantia para todos se reveste e da conveniência em cobrir o maior risco de incêndio derivado da contiguidade de cada fracção, tornar a realização do seguro por iniciativa de qualquer condómino ou, na sua falta, do administrador, independentemente do consentimento expresso ou tácito dos interesses que, por força da lei, ficam vinculados a esse acto".

Sandra Passinhas, A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal, Almedina, Coimbra, 2000, pág. 164, não concorda "plenamente, com esta ideia. Esta norma foi ditada pelo interesse privado e exclusivo dos condóminos, não individualmente considerados, mas sim como interesse do grupo. Se assim o entendêssemos, o interesse colectivo seria de considerar disponível pelos condóminos, o que não acontece (precisamente porque é algo diverso da mera soma dos interesses individuais).  O que vale ainda mais para o administrador. O administrador é, apenas, um órgão de tutela deste interesse, e não seu titular. Muito menos pode, por isso, dispor dele".

No entanto,, o Ac. do TRL, de 6/5/2003, decidiu que:

1. A interpretação extensiva só é possível quando o intérprete conclua pela certeza de que o legislador se exprimiu restritivamente, dizendo menos do que pretendia.
2. Só é obrigatório o seguro da totalidade do prédio contra o risco de incêndio, não podendo qualquer dos condóminos eximir-se à sua efectivação ou escusar-se ao pagamento dos respectivos encargos.
3. Mas o seguro contra qualquer outro risco de destruição ou danificação do edifício é facultativo, podendo o mesmo incidir sobre a totalidade do prédio, mediante deliberação dos condóminos, nos termos do art. 1432º, nº 3, do CC, e podendo qualquer condómino efectuá-lo, embora restrito à sua fracção autónoma.

Atento o que ficou dito, o único seguro obrigatório é o de risco de incêndio (sendo todas as demais coberturas, facultativa) e é apenas este que o administrador deverá celebrar quando os condóminos o não hajam feito dentro do prazo e valor que para o efeito tenha sido fixado pela assembleia (cfr. art. 1429º, nº 2 do CC). Se o administrador celebrar, em nome dos condóminos faltosos, um seguro multi-riscos habitação ou multi-riscos condomínio, em detrimento do seguro obrigatório (risco de incêndio), só poderá exigir e reaver deles a parte do respectivo prémio correspondente apenas e só ao risco obrigatório
 
À luz destes ensinamentos, o administrador deve cuidar de proceder à competente elaboração de um protocolo com a listagem de todos os condóminos, a identificação das respectivas seguradoras, a indicação do montante do capital seguro, a validade do mesmo e o prazo limite a que se obrigam a comunicar a feitura da renovação, sob pena de, se considerarem em incumprimento, assistindo então ao administrador de proceder à sua feitura.

De salientar que, se posteriormente o condómino provar que, não obstante o atraso na entrega do comprovativo, possui o competente seguro, o administrador procederá ao cancelamento, assistindo-lhe o direito ao respectivo estorno, no entanto, porque este não corresponderá ao prémio total havido pago, o condómino será responsável por quitar a diferença entre o montante pago e o do reembolso.