Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

7/23/2021

Comunicação instalação carregador



Nome do condómino
Residência

                                                            À administração do condomínio
                                                            sito em

Assunto: Comunicação da instalação de posto de carregamento para veículo eléctrico em lugar de parqueamento

Exc. Senhor,

Venho pelo presente, solicitar a sua melhor atenção para o assunto que pretendo expor à sua especial atenção.

Na minha qualidade de proprietário da fracção (...) do edifício (...) sito em (...), e de acordo com o disposto no art. 29º do DL 90/2014, de 11 de Junho, sou de informar a administração do condomínio da minha intenção em instalar um posto de carregamento para veículo eléctrico no lugar de parqueamento associado à minha fracção autónoma.

Para efeitos de contabilização do respectivo consumo proponho a instalação de um dispositivo de contagem de energia eléctrica para permitir aferir o valor despendido mensalmente com o carregamento.

Cumpre-me ressalvar que a competente instalação será realizada por entidade habilitada para o efeito, de acordo com as regras técnicas e legislação em vigor, garantindo a efectiva segurança e protecção de pessoas e bens quer durante a instalação quer em funcionamento.

Em anexo junto documentação relevante, disponibilizando-me para lhe facultar qualquer esclarecimento complementar. 

Aos (...) dias do mês de (...) de (...),

E com os melhores cumprimentos,

(Assinatura)

Pontos carregamento carros eléctricos


Os proprietários de veículos eléctricos que pretendam instalar um posto de carregamento num edifício existente deverão informar a administração de condomínio da sua intenção, de acordo com o DL 90/2014, que altera o DL 39/2010.

Artigo 28º
Pontos de carregamento em novas operações urbanísticas


1 — As operações urbanísticas de construção de edifícios em regime de propriedade horizontal ou de outros imóveis que disponham de locais de estacionamento de veículos, devem incluir uma infraestrutura eléctrica adequada para o carregamento de veículos eléctricos, conceito que não inclui pontos de carregamento ou tomadas, que cumpra os requisitos e regras técnicas a aprovar.

2 — Para os edifícios ou outros imóveis abrangidos pelo disposto no número anterior deve ser assegurada uma potência adequada para o carregamento de veículos eléctricos, não podendo essa potência ser inferior ao valor a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das autarquias locais, da energia, das infraestruturas, dos transportes e da habitação.

3 — Quando os edifícios ou outros imóveis abrangidos pelo nº 1 forem destinados a fins habitacionais a infraestrutura de carregamento de veículos eléctricos pode não ser totalmente executada antes da sua entrada em exploração, mas deve estar preparada para permitir a instalação de um posto de carregamento normal ou de uma tomada em cada lugar do parque de estacionamento.

4 — As normas técnicas para as instalações de carregamento de veículos eléctricos previstas nos números anteriores são definidas pela portaria referida no n.º 2.

5 — Aplica-se à instalação, disponibilização, exploração e manutenção dos pontos de carregamento previstos no presente artigo o disposto no artigo 26º ou no artigo 27º, consoante aplicável.

Artigo 29º
Pontos de carregamento em edifícios existentes


1 — Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é admitida a instalação, por qualquer condómino, arrendatário ou ocupante legal, a expensas do próprio, de pontos de carregamento de baterias de veículos eléctricos ou de tomadas eléctricas que cumpram os requisitos técnicos definidos pela DGEG para o efeito de carregamento de baterias de veículos eléctricos, destinados a uso exclusivo ou partilhado, nos locais de estacionamento de veículos dos edifícios já existentes, de acordo com os termos definidos por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das autarquias locais, da energia, das obras públicas, dos transportes e da habitação.

2 — No caso de a instalação de ponto de carregamento ou de tomada eléctrica prevista no número anterior ser efectuada ou passar em local que integre uma parte comum do edifício, esteja ou não afecta ao uso exclusivo do respectivo condómino, a instalação carece sempre de comunicação escrita prévia dirigida à administração do condomínio e, quando aplicável, ao proprietário, com uma antecedência de, pelo menos, 30 dias sobre a data pretendida para a instalação.

3 — No caso referido no número anterior, a administração do condomínio e, quando aplicável, o proprietário só podem opor-se à instalação do ponto de carregamento ou tomada eléctrica nos seguintes casos:

a) Quando, após comunicação da intenção de instalação por parte de um condómino, arrendatário ou ocupante legal, procederem, no prazo de 90 dias, à instalação de um ponto de carregamento de baterias de veículos eléctricos para uso partilhado que permita assegurar os mesmos serviços, a mesma tecnologia e as necessidades de todos os seus potenciais utilizadores;

b) Quando o edifício já disponha de um ponto de carregamento de baterias de veículos eléctricos ou tomada eléctrica para uso partilhado que permita assegurar os mesmos serviços e a mesma tecnologia;

c) Quando a instalação do ponto de carregamento ou tomada eléctrica coloque em risco efectivo a segurança de pessoas ou bens ou prejudique a linha arquitectónica do edifício.

4 — As decisões a que se referem as alíneas b) e c) do número anterior são adoptadas no prazo máximo de 60 dias após a comunicação da intenção de instalação referida no nº 2 e, no caso da administração do condomínio, carecem de aprovação por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

5 — As decisões a que se refere o nº 3 são comunicadas, por escrito, ao condómino, arrendatário ou ocupante legal em causa no prazo de 15 dias após a sua adopção, devendo ser fundamentadas quando sejam negativas

.6 — O regime de propriedade e operação dos pontos de carregamento ou tomadas eléctricas previstos no presente artigo é o do local de instalação dessa infraestrutura, com excepção dos casos de pontos de carregamento de acesso privativo para uso exclusivo instalados em partes comuns do edifício, em que a operação cabe aos respectivos utilizadores.

7 — Aplica-se à instalação, disponibilização, exploração e manutenção dos pontos de carregamento previstos no presente artigo o disposto no artigo 26º ou no artigo 27º, consoante aplicável.

Modificar o TCPH

O nº 1 do art. 1418º do CC estabelece que é o título constitutivo da propriedade horizontal que especifica as partes do edifício que correspondem às várias fracções, por forma a que estas fiquem devidamente individualizadas e no qual é fixado o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem, do valor total do prédio. 

Além das especificações constantes no número anterior, o seu nº 2 elenca outras que dele podem constar, como a menção do fim a que se destina cada fracção ou parte comum (al. a)), o regulamento do condomínio, que distingue do especificado no art. 1429º-A por poder disciplinar também o uso, fruição e conservação das fracções autónomas (al. b)), e a previsão da obrigatoriedade da celebração de compromisso arbitral para a resolução de litigios (al. c) e art. 1434º).

O nº 3 deste preceito ressalva que a falta da especificação exigida pelo nº 1 e a não coincidência entre o fim referido na al. a) do nº 2 e o que foi fixado no projecto aprovado pela CM determinam a nulidade do TCPH, aplicando-se consequentemente o fixado no nº 1 do art. 1416º do CC.

O Título Constitutivo da Propriedade Horizontal, pode ser modificado:

a) pelo Administrador, em representação do Condomínio, outorgando a escritura ou elaborando e subscrevendo o documento particular em causa, havendo o acordo de todos os condóminos (cfr. art. 1419º, nº 1 e 2 do CC), porém este acordo pode ser nulo se não se observar o disposto no art. 1415º do CC, podendo a nulidade ser requerida nos termos do nº 2 do art. 1416º;

b) pelo condómino que procedeu à junção, numa só, de duas ou mais fracções autónomas (não carecendo para o efeito de autorização dos condóminos), desde que situadas no mesmo edifício, e desde que sejam todas contíguas, sendo esta dispensada quando se trate de fracções correspondentes a arrecadações e garagens (cfr. art. 1422º-A, nº 1 e 2 do CC).

Para se proceder à modificação do TCPH, são necessários os seguintes documentos: 

  • A certidão com o teor da descrição predial e das inscrições em vigor, passada pela Conservatória do Registo Predial com uma antecedência não superior a 6 meses ou, quanto a prédios situados em concelho onde tenha vigorado o registo obrigatório, a respectiva caderneta predial, actualizada; 
  • A caderneta predial actualizada ou a certidão do teor da inscrição matricial passada com antecedência não superior a um ano (A DGCI disponibilizou a possibilidade de obtenção via Internet da caderneta predial de prédios urbanos inscritos nas matrizes prediais, no seu site www.e-financas.gov.pt);  
  • No caso de prédio omisso, o duplicado da participação para a inscrição na matriz, que tenha aposto o recibo da repartição de finanças, com antecedência não superior a um ano, ou outro documento dela emanado, autenticado com o respectivo selo branco;  
  • O documento camarário comprovativo de que a alteração está de acordo com os correspondentes requisitos legais, ou, caso a modificação exija obras de adaptação, projecto devidamente aprovado;  
  • Caso intervenha o administrador em representação do condomínio, a acta da qual conste o respectivo acordo de todos os condóminos (*);  
  • Em caso de divisão de fracções autónomas não autorizada no título constitutivo, a acta com autorização da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição; 
  • As fracções autónomas já existentes que ainda tenham crédito à habitação terão de solicitar autorização prévia do seu banco para a alteração da propriedade horizontal, uma vez que, com a transformação poderão ser alteradas todas as permilagens do prédio; 
  • Será ainda necessário proceder ao preenchimento e entrega de Modelo 1 do IMI com as alterações que as fracções do prédio vão sofrer; 

De salientar que o valor da escritura será proporcional ao número global de fracções, ao qual acrescerá o valor dos registos na conservatória competente, não podendo com isso saber-se quais são em rigor os valores envolvidos.

(*) Em bom rigor, o título constitutivo pode ser modificado sem que haja o acordo formal de todos os condóminos. Pretendendo-se alterar o TCPH, da convocatória para a assembleia deve constar obrigatoriamente essa indicação (cfr. art. 1432º, nº 2 do CC), procedendo-se subsequentemente à aprovação da deliberação que carece da unanimidade nos termos dos nº 5, 6, 7 e 8 do art. 1432º do CC.

Permilagem



O que é e como se calcula o valor relativo havido fixado para cada fracção autónoma, expresso em percentagem ou permilagem, do valor total de um prédio?

Primeiramente importa ressalvar que a fixação destes valores é efectuada livremente pelo construtor ou instituidor da propriedade horizontal e podem reportar-se aos mais diversos critérios, nomeadamente, “custo/m2, qualidade da construção, área das fracções, afectação ou fim, preço de venda, rendimento, localização, exposição ao sol, a vista panorâmica” (in Abílio Neto “Manual da Propriedade Horizontal”, 4ª edição – reformulada, março 2015, Ediforum), entre outros, não se encontrando assim aqueles vinculados à observância de quaisquer regras nesta definição. 

O único factor imperativo existente, é o de que, o valor total do prédio tem de corresponder sempre ao somatório do valor relativo atribuído a cada uma das suas fracções autónomas. que o compõem. 

Abílio Neto, em anotação ao art. 1418º do CC (“Código Civil Anotado”, 19ª edição reelaborada, janeiro 2016, Ediforum) refere que, sendo o título constitutivo de propriedade horizontal modificável por escritura pública, podem os seus termos ser modificados por acordo de todos os condóminos, sendo este também o entendimento do TRP no seu Ac. de 06/04/2017 quando dispõe que “I - A modificação do valor relativo de várias fracções em relação ao valor total do prédio, expresso em permilagem, por consubstanciar alteração do título constitutivo da propriedade horizontal só se pode efectuar com o acordo de todos os condóminos através de escritura pública ou documento particular autenticado. II – Por conseguinte, não é legalmente admissível que essa modificação se concretize através de decisão judicial, nem sequer mediante o recurso a uma acção de suprimento do consentimento”. 

Sendo a permilagem definida em função do "valor" calculado para cada fracção, esta dará origem à proporção da comparticipação de cada fracção para as despesas de manutenção e/ou conservação dos elementos e áreas comuns prédio, para o pagamento dos serviços de interesse comum, pagamento do seguro de grupo, a distribuição das receitas pelos condóminos, bem como ao número de votos atribuídos em assembleia. Verificando-se a destruição ou demolição integral do prédio, será com base nesta proporcionalidade que será distribuído o valor residual do mesmo.

Muito embora o critério de fixação da permilagem seja livre, em bom rigor, não deve obedecer exclusivamente ao metros quadrados de cada fracção autónoma. Assim, se uma fracção possuir 100 m2 de área habitacional e uma outra exactamente igual e com a mesma área, possuir também um terraço de uso exclusivo com outros 100 m2, seria injusto que a distribuição do valor de cada fracção se tivesse efectuada numa razão directa do número de metros quadrados afectos a cada uma.

Nesta conformidade, a fracção com a fruição exclusiva do terraço, tem certamente um valor substancialmente superior, pela função "privativa" e panorâmica daquele, mas não valerá o dobro da fracção sem terraço, pelo que, não será justo que lhe seja imputado o dobro da permilagem. O mais correcto é que o cálculo do valor das distintas fracções autónomas, sem prejuízo de outros factores que importem considerar, seja efectuado em função das áreas afectas a cada uma, no entanto, cuidando-se que na fórmula de cálculo se atribua um determinado quociente de redução de valor para as áreas complementares, designadamente, varandas, terraços, garagens, arrumos, etc..

Sendo a importância destas áreas complementares mais ou menos relativa, este quociente pode e deve contudo variar, por metro quadrado, entre 1/3 e 1/4 do valor atribuído a cada metro quadrado da área habitacional das fracções autónomas.

7/22/2021

Praticar actos isolados



Por vezes o condomínio tem que recorrer a alguém, um condómino ou um terceiro para que preste um determinado serviço, devidamente remunerado, ou efectue uma qualquer venda comercial. Como emitir factura?

O que é o acto isolado?
 
O acto isolado, também chamado de acto único, destina-se a todos os que, não tendo uma actividade aberta nas Finanças, ou seja, todos os que, não sendo trabalhadores independentes, têm necessidade de emitir um recibo ou factura por um serviço ou venda feito de forma pontual ou esporádica. O acto isolado evita, assim, a abertura de actividade nas Finanças por um trabalho que surgiu de forma inesperada e que, de acordo com o art. 3º do CIRS não se prevê repetir de forma regular.

Em que consiste e quando se aplica?

De acordo com a informação veiculada pela Finanças, deve ser emitido um acto isolado quando se obtém um rendimento por uma actividade que não é previsível ou reiterada. Neste contexto, há três tipos de documentos que podem ser emitidos, nomeadamente:
  • Factura: com a identificação fiscal das partes intervenientes, a descrição da operação e respectivo valor;
  • Recibo: emitido aquando do pagamento da operação e como prova da quitação da factura previamente emitida;
  • Factura-recibo: emitida quando a data da operação e do seu pagamento coincidem.
Quais as suas vantagens?

Uma das principais vantagens de emitir um acto isolado é não ter de abrir actividade nas Finanças como trabalhador independente, nem inscrever-se na Segurança Social. Além disso, de acordo com o art. 30º do CIRS, os sujeitos passivos que emitam actos isolados ficam dispensados de contabilidade organizada, no que respeita a esses actos. Já à determinação do rendimento tributável dos actos isolados aplicam-se os coeficientes do regime simplificado, quando o rendimento anual ilíquido do sujeito é inferior ou igual a 200 000 €. Caso esse rendimento seja superior, então aplicam-se as mesmas regras dirigidas aos sujeitos passivos com contabilidade organizada, como explicado no citado preceito.
 
Quais as suas obrigações?

O nº 3 do art. 31º do CIVA estabelece que o acto isolado não pode exceder o limite previsto nas al. e) e f) do nº 1 do art. 29º do CIVA, ou seja 25 000 €. Caso ultrapasse este valor, deverá declarar o de início de actividade não sendo portanto considerado acto isolado. Porém, hão excepções, que estão previstas no art. 9º do CIVA, como a dispensa de cobrança de IVA que se aplica, por exemplo, à prestação de serviços por profissionais como médicos, odontologistas, parteiros e enfermeiros.

Acresce que, se o acto isolado ultrapassar os 12 500 €, também é necessário fazer retenção na fonte em sede de IRS, sendo que a taxa de retenção pode variar entre os 11,5% e os 25%, conforme se explica na página do portal das finanças. Os rendimentos de um acto isolado, que se configurem como de natureza comercial ou profissional, estão sujeitos a tributação em sede de IRS, através da entrega do anexo B da declaração modelo 3 de IRS. Depois do rendimento tributável ser apurado, é somado aos rendimentos de outras categorias (se existirem) e, finalmente, é tributado à taxa normal de IRS, aplicável à totalidade dos rendimentos.

Como pagar?

O acto isolado deve ser emitido no Portal das Finanças quando se presta um serviço esporádico e sem continuidade, não sendo necessário declarar o início de actividade nas Finanças.

Qual o prazo e pagamento do IVA do acto isolado?

Após a prestação do acto isolado, a auto-liquidação do IVA deve ser feita até ao final do mês seguinte ao da conclusão do serviço, podendo ser liquidado numa tesouraria das finanças ou através da guia modelo P2 a partir do Portal das Finanças:
  • Faça login com NIF e senha de acesso;
  • Aceda a Serviços > Pagar > Documentos de Pagamento – IVA;
  • Clique em Guia de Pagamento P2 > Continuar;
  • Escolha Submeter Novo Documento;
  • Preencha o valor do IVA;
  • Obtenha a guia de pagamento e pague no multibanco ou através do homebanking.
Seguidamente deve guardar-se o comprovativo de pagamento juntamente com o modelo de pagamento P2 e a factura recibo do acto isolado. Se o valor do acto único ultrapassar os 10 000 euros anuais, também é obrigatório fazer retenção na fonte de 25%.

Quais as excepções ao pagamento de IVA do acto isolado?

Regra geral, praticar um acto isolado implica o pagamento de IVA à taxa de 23%. Existem, no entanto, excepções previstas no art. 9º do CIVA. Profissionais de determinadas áreas, como médicos, parteiros, enfermeiros, protésicos, actores, músicos, desportistas e outros profissionais, estão isentos de pagamento de IVA quando emitem um acto isolado.

Muito embora não nos aproveite, podemos elencar outros serviços e actividades também:
  • Serviços médicos e sanitários realizados por clínicas e hospitais;
  • Serviços ligados à segurança e assistência sociais;
  • Serviços em creches, jardins-de-infância, centros de actividade de tempos livres e outros estabelecimentos para crianças e jovens;
  • Serviços em lares de idosos, centros de dia e centros de convívio para idosos;
  • Serviços de alojamento (hotéis e parques de campismo);
  • Serviços funerários e de cremação;
  • Serviço público de remoção de lixos;
  • Arrendamento de bens imóveis;
  • Aluguer de cofres-fortes;
  • Transporte de doentes ou feridos em ambulâncias;
  • Actividades de empresas públicas de rádio e televisão;
  • Transmissões de órgãos, sangue e leite humanos;
  • Visitas a bibliotecas, arquivos, museus, castelos, palácios e outros monumentos;
  • Outros serviços e actividades.
Como preencher a declaração de IRS?

O acto isolado enquadra-se nos rendimentos da categoria B e deve ser declarado no Modelo 3. Estão dispensados de apresentar a declaração Modelo 3 e o respectivo anexo B os contribuintes que realizem actos isolados cujos rendimentos sejam inferiores a quatro vezes o valor do IAS (1 755,24 euros em 2020), e não aufiram outros rendimentos, ou apenas recebam rendimentos tributados pelas taxas liberatórias previstas no art. 58º do CIRS.

Eis os quadros que deve preencher no anexo B da declaração Modelo 3:
  • Quadro 1: Seleccionar a opção “acto isolado”;
  • Quadro 3: Indicar o código de actividade a que respeita o acto isolado;
  • Quadro 4A: Declarar o valor dos rendimentos (sem o IVA);
  • Quadro 6: Indicar o valor da retenção na fonte de IRS, se se aplicar;
  • Quadro 13 (campo N): Declarar novamente o valor dos rendimentos.

Execução de constribuições devidas


O artigo 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº 268/94, de 25/10, com referência ao artigo 703º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil, estatui que a acta que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

A expressão presente no texto do artigo 6º, nº 1, do DL 268/94, de 25/10, «contribuições devidas ao condomínio» abrange quer as “contribuições em dívida ao condomínio” (contribuições já apuradas), quer as contribuições futuras, desde que se verifiquem os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade que condicionam a admissibilidade da acção executiva, devendo estas características da obrigação exequenda constar da deliberação tomada na assembleia geral de condóminos e serem vertidas na correspondente acta.

É outrossim uniformemente entendido que se enquadram neste âmbito as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício, na acepção do artigo 1421º, os serviços de interesse comum referidos no artigo 1424º, os prémios de seguro obrigatório contra o risco de incêndio previstos no artigo 1429º e as despesas com a reconstrução do edifício (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08/07/2007, in www.dgsi.pt).

Em abstracto, é também entendimento maioritário que a acta da assembleia de condóminos pode abranger a cobrança coerciva das contribuições mensais de condómino devidas pelo executado (artigos 1436º, als. d), e) e h), do Código Civil), bem como a penalização prevista para o devedor relapso relacionada com o não pagamento tempestivo das contribuições devidas ao condomínio prevista pelos artigos 1434º, nº 1 (in fine), e nº 2, 810º e 811º do mesmo diploma, desde que este agravamento esteja previsto no regulamento do condomínio. Pois, doutro modo, impunha-se a solução de obrigar o condomínio a instaurar uma acção declarativa com o fim de obter a condenação do condómino relapso no pagamento dessa penalidade, quando o objectivo legislativo é a simplificação e a agilização dos mecanismos tendentes a garantir o cumprimento das obrigações relativas às despesas comuns e outras de natureza afim na propriedade horizontal.

No sentido amplo de que se deve incluir as penas pecuniárias fixadas nos termos do artigo 1434º do Código Civil podem ser consultados os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 05/06/2001, do Tribunal da Relação do Porto de 03/03/2008, do Tribunal da Relação de Lisboa de 08/07/2007, 17/02/2009 e 22/06/2010, in www.dgsi.pt, porém, em sentido contrário numa acepção restritiva encontram-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 14/12/2010, 21/03/2013 e 08/01/2013, in www.dgsi.pt. Sandra Cristina Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª edição, 2002, pág. 319, advoga que, «embora, rigorosamente, a pena pecuniária não seja uma “contribuição devida ao condomínio”, esta é a solução mais conforme à vontade do legislador. Não faria sentido que a acta da reunião da assembleia tivesse deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio servisse de título executivo contra o condómino relapso, e a mesma acta não servisse de título executivo para as penas pecuniárias, aplicadas normalmente para punir os condóminos inadimplentes».

A prestação será exigível quando está vencida e ela só se vence quando o devedor é interpelado judicial ou extrajudicialmente, para cumprir a obrigação em certo prazo ou fixando-se o seu termo. Se o vencimento da prestação não resultar directamente do título executivo, o exequente deve com o requerimento executivo juntar documento que comprove o vencimento da obrigação, não podendo o administrador limitar-se a juntar aos autos cópias da acta de assembleia de condóminos, bem como a quota-parte nas despesas necessárias à conservação e fruição nas partes comuns de que é condómino o executado e da aplicação de uma pena pecuniária.


Conteúdo acta executiva

 

A acta que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte (cfr. art. 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº 268/94, de 25/10, com referência ao art. 703º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil). 

A expressão presente no texto do art. 6º, nº 1, do DL 268/94, de 25/10, «contribuições devidas ao condomínio» abrange quer as “contribuições em dívida ao condomínio” (contribuições já apuradas), quer as contribuições futuras, desde que se verifiquem os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade que condicionam a admissibilidade da acção executiva, devendo estas características da obrigação exequenda constar da deliberação tomada na assembleia geral de condóminos e serem vertidas na correspondente acta (neste sentido, ver acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 26/04/2007, 12/06/2008 e 17/02/2011, in www.dgsi.pt).

A acta deve reunir os requisitos substanciais exigidos na lei e pressupostos pelo art. 6º, nº 1, do DL 264/94, na medida em que pela mesma se mostra que a assembleia aprovou as contribuições e outras despesas já em dívida ao condomínio por parte do executado, que se mostravam devidamente discriminadas quanto aos respectivos quantitativos, natureza das mesmas e períodos a que respeitam.

Rui Pinto afirma que «deve considerar-se que o título executivo é um documento, i. é., a forma de representação de um facto jurídico, o documento pelo qual o requerente de realização coactiva da prestação demonstra a aquisição de um direito a uma prestação, nos requisitos legalmente prescritos» (Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, pág. 142-143).

Mas, por outro lado, o título executivo é também condição suficiente da acção executiva, uma vez que a sua apresentação faz presumir as características e os sujeitos da relação obrigacional, correspondendo à necessidade reclamada pelo processo executivo de se encontrar assegurada, com apreciável grau de probabilidade, a existência e o conteúdo da obrigação. Assim, a análise do título deve demonstrar, sem necessidade de outras indagações, tanto o fim como os limites da acção executiva».

O título executivo cumpre ainda, no processo executivo, uma função de legitimação: ele determina as pessoas com legitimidade processual para a acção executiva e, salvo oposição do executado, ou vício de conhecimento oficioso, é suficiente para iniciar e efectivar a execução. Também através dele, pode-se aferir se a deliberação tomada na reunião de condóminos necessitava de ser notificada ao titular da fracção se este estivesse estado ausente dessa reunião em ordem a perfectibilizar a correspondente acta, enquanto título executivo. E, a ocorrer essa omissão, importa assim apurar quais são as consequências da falta da notificação e se a mesma se traduz na inexigibilidade da dívida exequenda.

Na leitura de Aragão Seia «a acta da reunião de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar no prazo estabelecido sua quota-parte (nº 1 do art. 6º do DL nº 268/94, de 25/10), ainda que o condómino não tenha estado presente nessa assembleia; a força executiva da acta não tem a ver com a assunção pessoal da obrigação consubstanciada na assinatura dela, mas sim com a eficácia imediata da vontade colectiva, definida através da deliberação nos termos gerais, exarada em acta».

Pires de Lima e Antunes Varela entendem que uma vez aprovadas e exaradas em acta, as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para todos os condóminos, mesmo para os que não tenham participado na reunião ou que, participando, se abstiveram de votar ou votaram contra, e ainda, para aqueles que ingressem no condomínio após a sua aprovação. 

Assim, após se reconhecer que a obrigação é certa, determinada e líquida, tem-se a mesma exigível. Atente que a prestação é exigível quando está vencida e ela só se vence quando o devedor é interpelado judicial ou extrajudicialmente, para cumprir a obrigação em certo prazo ou fixando-se o seu termo. Se o vencimento da prestação não resultar directamente do título executivo, o exequente deve com o requerimento executivo juntar documento que comprove o vencimento da obrigação.

7/21/2021

Prazo pagamento quotas


Quanto ao tempo do cumprimento, duas questões podem ser colocadas: (i) Quando é que a obrigação pode ser cumprida? Ou seja, quando é que o devedor pode cumprir e o credor tem de aceitar, sob pena de entrar em mora? (ii) 2. Quando é que a obrigação tem de ser cumprida? Ou seja, quando é que o credor por exigir que o devedor cumpra sob pena de este entrar em mora?

A lei trata ambas as situações nos arts. 777º e ss. do CC. Nas obrigações puras, o cumprimento pode ser realizado ou exigido a todo o tempo (cfr. nº 1 do art.777º CC), correspondendo à regra geral supletiva (se nada for dito em contrário ou resultar da natureza da obrigação, ela é pura e segue o regime do citado normativo, logo, o devedor só entra em mora depois de interpelado pelo credor – cfr. nº 1 art. 805º CC). Nas obrigações a prazo, ou seja, já constituídas, a exigibililidade do cumprimento ou possibilidade de realização são diferidas para momento posterior, porque a lei ou as partes fixaram prazo (obrigações de prazo certo – onde o devedor constitui-se em mora com o decurso do prazo - cfr. al. a) nº 2 art. 805º CC), pela natureza da prestação ou as circunstâncias que a determinaram ou os usos o impõem (na falta de acordo, o prazo é fixado pelo tribunal – cfr. nº 2 art.777º e 1456º e 1457º do CPC).

Segundo alguns jurisconsultos, podemos também recorrer ao nº 1 do artº 763º que ensina (a negrito o normativo, entre parênteses meus sublinhados):

"A prestação (leia-se, quota do condomínio) deve ser realizada integralmente (paga numa única prestação) e não por partes (em prestações mensais)".

"excepto se" (porém, este mesmo preceito, estabelece excepções à sua própria regra) :

1) "outro for o regime convencionado" (em bom rigor, a letra da lei refere-se a outro regime legal, no entanto, nada obsta a que, em sede de assembleia, mediante uma competente deliberação, se decida em sentido diverso ao da exigida integralidade).

2) "ou imposto por lei" (como é consabido, a lei nada impõe ou dispõe no regime da PH sobre esta matéria, logo valeria a regra antes desta excepção - a da integralidade - porém, somos de recorrer, por analogia (e por força do artº 10º CC), ao nº 2 do artº 1041º do CC.

3) "ou pelos usos" (ainda que haja relutância em recorrer-se ao preceituado no RAU, temos esta ressalva que nos permite socorrer-nos, pacificamente, dos usos de outros regimes).

Destarte, a comparticipação para as despesas de fruição e conservação das partes comuns, pode ter-se concretizada em duodécimos, havendo-se a satisfação a realizada segundo este exemplo retirado do regime do arrendamento e do qual podemos aproveitar, com a devida analogia:

A renda de casa vence-se no 1.º dia útil do mês imediatamente anterior a que diga respeito.

Portanto, só se o 1.º dia do mês calhar a um feriado, sábado ou domingo, é que se avança até ao 1.º dia útil (segunda a sexta-feira).

O locatário faz cessar a mora se proceder ao pagamento da renda no prazo de oito dias (de calendário) a contar do seu começo.

Sendo o 1.º dia útil uma segunda-feira, 8 dias a contar do início da mora, dá dia 9 como limite.

Se o dia 1 calhar a um domingo, o 1.º dia útil será a segunda-feira seguinte, dia 2. Adicionando 8 dias significa que o último dia para pagamento da renda é dia 10.

Se o dia 1 for a um sábado, o primeiro dia útil é dia 3, segunda-feira. Somando-lhe 8 dias de calendário, dá dia 11 como último dia para pagamento da renda.

Coincidindo o dia 1 com uma sexta-feira e for feriado, significa que o 1.º dia útil é segunda-feira, dia 4. Neste caso, o último dia para pagamento da renda, sem entrar em mora definitiva, é o dia 12.

Mas se o último dia em que se pode fazer cessar a mora calhar a um feriado, sábado ou domingo, avança-se para o 1.º dia útil seguinte como data limite para pagamento da renda.

Pagamento das quotas


Dimana da letra da lei que o devedor (condómino) cumpre a obrigação quando realiza a prestação (quota) a que está vinculado (cfr. art. 762º CC), sendo que o regime do cumprimento das obrigações obedece principalmente a três princípios gerais que têm referência na lei: o princípio da pontualidade, da integralidade e da boa fé.

O princípio da pontualidade encontra-se consagrado no art. 406° nº 1 do CC, e refere-se aos contratos, mas vale para todas as obrigações, ressalva o cumprimento ponto por ponto, a proibição de alteração unilateral da prestação devida e onde o devedor não pode invocar situação precária em que o cumprimento o deixará. Ou seja, estipula que o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.

O princípio da integralidade encontra-se expresso no art. 763° nº 1 do CC, corolário da regra da pontualidade, estabelece que a prestação debitória deve ser integralmente cumprida e não por partes; logo, o credor não pode ser obrigado a aceitar o cumprimento parcial. Significa que o devedor deve realizar a prestação de uma só vez, ainda que se trate de prestação divisível. Se o devedor oferecer apenas uma parte da prestação, o credor pode recusar o seu recebimento sem incorrer em mora.

Resta o princípio da boa fé na concretização, o qual encontra-se referido no art. 762° nº 2 do CC, consubstancia-se como regra de conduta (boa fé objectiva), que vincula devedor e credor e permite encontrar regras objectivas para resolver dúvidas relacionadas com deveres de prestação (secundários) e deveres acessórios de conduta. Desta norma resulta que para se considerar verificado o cumprimento da obrigação não basta a realização da prestação devida em termos formais, sendo antes necessário o respeito dos ditames da boa fé, quer por parte de quem executa, quer por parte de quem exige a obrigação.

O princípio da concretização (cfr. nº 1 artº 762º CC), pelo qual, a vinculação do devedor deve ser concretizada numa conduta real e efectiva, transpondo a vinculação do plano deontológico, para o plano ontológico: passa-se do dever ser ao ser. Como? Pelos pressupostos do cumprimento , disciplina da forma de realização (tempo, lugar) e determinação dos efeitos concretos.

7/20/2021

Obras nos terraços

Acórdão: TRP
Data: 11-10-2018

Sumário

I- Os terraços de cobertura constituem parte comum do prédio de que fazem parte mesmo quando afcetos ao uso exclusivo de uma fracção.
II - em virtude daquela dúplice função, de terraço e de cobertura, que é desempenhada pelo mesmo, impõe-se distinguir entre.
- obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto tal, que serão da responsabilidade do proprietário da fracção autónoma que tem o uso exclusivo do referido terraço - no º 3 do artº 1424º do C.Civil.
- as obras destinadas a reparar as deficiências estruturais dos terraços ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a função dos terraços enquanto cobertura as quais serão da responsabilidade do condomínio.
III – Só não será assim quando neste último caso esteja comprovado que se devem a uso anormal por parte do proprietário da fracção autónoma.

Fundamentação:

O art. 1424º do CC é claro ao dispor, como regra suplectiva, que, salvo disposição em contrário, as despesas coma conservação e fruição das partes comuns do edifício são da responsabilidade dos condóminos na proporção do valor das suas fracções. Trata-se da de uma típica obrigação propter rem, decorrente da titularidade de um direito sobre a coisa. Como salientam P. de Lima e A. Varela [1] nesta parte o Código não seguiu a opção do critério da utilidade seguido no regime do C Civil italiano, por nem sempre ser fácil destrinçar a quem aproveita a utilidade relativa da coisa.
 
Já os nºs 3 e 4 do mesmo art. 1424º do CC consagram um critério suplectivo diferente relativamente às despesas com os diversos lanços de escadas ou às partes comuns que sirvam exclusivamente algum dos condóminos – nº 3 – ou às despesas com os ascensores – nº 4, assente no critério da utilidade que essas partes comuns representam para os condóminos a quem tais partes comuns aproveitam. Nestes casos as despesas ficam a cargo dos condóminos que são servidos por aquelas partes comuns, ou que por elas possam ser servidas (no caso dos ascensores), relevando assim a utilidade que determinados condóminos podem objectivamente extrair daquelas partes comuns, e não o uso que efectivamente façam delas, subsistindo a responsabilidades pelas despesas em relação a essas partes comuns mesmo em relação aqueles condóminos que , podendo fazê-lo, as não usam.
 
O actual nº 3 do art. 1424º do C Civil, correspondente ao nº 2 do mesmo preceito na redacção original do Código, refere-se, além dos lanços de escadas, às despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos, dispõe que ficam a cargo dos que delas se servem.
 
Ora é hoje incontroverso, face ao disposto na alínea b) do nº 1 do art. 1421º do CC, na redacção introduzida pelo DL 267/94, De 25-10, que s terraços de cobertura, mesmo quando de uso exclusivo de um dos condóminos, são partes imperativamente comuns do prédio, atenta a função capital de cobertura ou protecção do imóvel que desempenham no interesse de todos os condóminos. De resto já assim era entendido à luz da mesma norma na redacção anterior aquela alteração legislativa (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, 2ªedição, págs. 422).
 
No entanto em virtude daquela dúplice função, de terraço e de cobertura, a situação dos terraços de cobertura é algo diversa das situações previstas no nº 3 do artº 1424º do CC. É que, se enquanto terraço, são efectivamente de uso exclusivo de um dos condóminos, enquanto cobertura servem de forma capital a totalidade dos condóminos.
 
Assim que não pode, de forma simplista, ter como aplicável aos terraços de cobertura o disposto no nº 3 do art. 1424º do CC para fazer recair sobre o condómino que deles tem o direito de uso exclusivo, toda a responsabilidade pela conservação e reparação dos mesmos.
Haverá sim de fazer-se uma interpretação que, atendendo à referida especificidade, conjugue o disposto no nº 1 do art. 1424º com o disposto no nº 3 do mesmo preceito.
 
E essa interpretação não pode ser outra que não aquela que tem vindo a ser adoptada maioritária, senão mesmo uniformemente, pelos tribunais , no sentido de distinguir entre obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto tal, e as obras destinadas a reparar as deficiências estruturais dos terraços ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a função dos terraços enquanto cobertura. E se enquanto às primeiras a responsabilidade pela sua realização e despesas associadas deve ser imputada aos condóminos que tem do terraço o uso exclusivo, atento o disposto no nº 3 do art. 1424º do CC, em relação às segundas a sua responsabilidade recai sobre todos os condóminos na proporção do valor da sua fracção, nos termos previsto no nº 1 do art. 1424º do CC.
 
Fazer recair a responsabilidade pelas despesas de conservação e fruição apenas sobre o proprietário da fracção que detém o uso exclusivo do terraço de cobertura traduzir-se-ia em clamorosa injustiça já que, se enquanto terraço ele é de facto de uso exclusivo de um dos condóminos, enquanto cobertura ele é de uso comum e aproveita a todos os condóminos. E por isso mesmo ele é parte comum do prédio.

Terá assim de concluir-se que, no caso dos autos, estando em causa deficiências relativas à impermeabilização do seu terraço que cobre parcialmente a fracção dos Autores, a responsabilidade pela sua reparação recai, na ausência de deliberação em contrário, sobre todos os condóminos na proporção das respectivas fracções.
 
Só assim não seria se estivesse provado ter havido por parte da 2ª ré, ora recorrente, qualquer actuação que tivesse dado origem à apurada falha de impermeabilização do terraço em causa. E essa prova não está feita, como decorre dos factos apurados.

Refere-se ainda na sentença recorrida que ainda que assim não se entendesse, sempre haveria de concluir-se de igual forma em virtude de ter ficado demonstrado que os condóminos do prédio sito no n.º … da D… concordaram que cada um deles cuidaria de zelar pela manutenção e conservação do terraço que lhes está adstrito, garantindo as reparações necessárias para evitar danos ou prejuízos aos demais condóminos.
 
Não é assim.
 
Desde logo porque o estatuto da propriedade horizontal é fixado com base nas disposições legais aplicáveis, no título constitutivo da propriedade horizontal, no regulamento do condomínio, e nas deliberações da assembleia de condóminos. Não bastará por isso um qualquer acordo entre condóminos para conformar o estatuto do condomínio neste ou naquele aspecto.
 
E mesmo quando tomada em assembleia de condóminos a deliberação sobre a repartição das despesas relativas a serviços de interesse comum em termos diversos dos que resultam dos critérios suplectivos constantes dos nº 1 e 3 do art. 1424º do CC, só será válida se for aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio. Nada disso resulta do que ficou a constar como provado nos autos
 
E assim sendo resta concluir que vigora o critério suplectivamente imposto pelas disposições conjugadas dos nº 1 e 3 do art. 1424º do CC, sendo que, no que concerne às despesas com a reparação da impermeabilização do terraço, uma vez que o que está em causa é a sua utilidade enquanto cobertura do prédio, a repartição haverá de fazer-se nos termos do citado nº 1 do art. 1424º do CC.
 
O facto de os demais condóminos terem vindo a manter e a conservar os terraços de que têm o uso exclusivo, tendo alguns deles inclusive realizado obras de impermeabilização nos seus espaços de terraço, a expensas suas, é a este respeito e pelas apontadas razões, irrelevante. 

Terraços em socalcos vs varandas

 

O terraço é uma cobertura plana de um edifício; a varanda (que a lei considera como coisa diferente daquele; cfr. art. 1360º, nº 2 do CC) é algo semelhante mas murada, com balaústres (que sustentam um peitoril) ou balcão e não é por estar por cima de outra fracção que é um terraço de cobertura; a ser assim, também a sala seria, na mesma, um terraço.

A função de uma ou outra coisa é diferente. O terraço serve apenas de cobertura de um andar inferior para proteger a casa aí existente, tal como o telhado serve a mesma função (aliás, não deixa de ser explícita a equiparação que o preceito legal aqui em discussão faz de telhado e terraço). Já a varanda é uma extensão da casa, um prolongamento da sala (geralmente) onde o dono pode colher luz solar e ar fresco, gozar a vista e fazer a sua vida social. Tendo em mente um prédio típico (como uma torre), com varanda por cima de varanda, será que cada uma delas, face à nova redacção do artº 1421º, nº 1, al. b) do CC, é um terraço a que se aplica a qualificação de coisa comum? Será que o solo de cada varanda é cobertura da fracção inferior? E se a varanda estiver fechada? Cremos que ninguém chegou a tal conclusão e, no entanto, estas varandas também estão sujeitas à chuvas, poeiras, folhas, etc. como qualquer outra cobertura.

No sentido aqui defendido pode ver-se o ac. do STJ, de 8 de Abril de 1997, e o da Relação de Guimarães, de 14 de Dezembro de 2006. Neste escreve-se que o terraço, na forma de varandas construídas em socalcos, não serve de cobertura ou protecção do imóvel visto na sua globalidade. Em sentido contrário pode apontar-se o ac. da Relação de Coimbra, de 23 de Setembro de 2008, onde se afirma que o legislador quis «nesta actual versão [que] passassem a estar abrangidos os chamados terraços de cobertura intermédios, isto é, os terraços que apesar de servirem de cobertura a alguma ou algumas fracções, se situavam ao mesmo nível doutra ou doutras fracções, podendo servir de pátio ou varandas a estas». Mas isto, salvo o devido respeito, é esquecer que varanda e terraço de cobertura são coisas diferentes e têm funções diferentes.

Na matéria de facto descreve-se o local em questão como varanda e sempre como varanda. As próprias partes assim a ela se referem tal como é isso que consta da descrição do Registo Predial (uma divisão assoalhada, cozinha, instalação sanitária e varanda). Concluímos daqui que a varanda dos autos não se integra na previsão do art. 1421º, nº 1, al. b), do CC. E não se presume comum porque ela está afectada ao uso exclusivo de um condómino (cfr. art. 1421º, nº 2, al. e) do CC).

Sendo assim, a conclusão que se tira é que uma varanda integra-se na fracção e a ele pertence. Logo, as despesas com a sua impermeabilização são por conta do respectivo proprietário. E nada de estranho existe nisto. O proprietário é responsável pela boa condição do apartamento e tem a obrigação de evitar que a sua má condição provoque danos aos demais vizinhos. É exactamente a mesma obrigação que o proprietário tem de evitar derrames de águas da sua casa de banho ou cozinha — e ninguém duvida que elas se integram na fracção e não pertencem às partes comuns do edifício..

Analisemos.

A problemática daqui incide sobre a dicotomia que é efectuada no Aresto, entre varanda e terraço, problemática essa que transcende a mera análise semântica, porquanto a funcionalidade material do espaço que aqui releva, se sobreporá à terminologia utilizada.

Dispõe o art. 1421º, nº 1, alínea b), do CC, que «1. São comuns as seguintes partes do edifício: b) O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção.», acrescentando o seu nº 3 que «O título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns.».

Daqui deflui que os terraços de cobertura são parte, imperativamente comum, quando a sua função é exercida no interesse de toda a construção, quando tiverem função análoga à do telhado, quando, por assim dizer, o substituam, porquanto como resulta da materialidade assente, o edifício está construído em socalcos e não tem telhado: todas as fracções são cobertura das fracções inferiores.

Deste modo, sendo todas as fracções cobertura das fracções inferiores, a varanda ou terraço de um apartamento será também cobertura do apartamento que constitui o andar imediatamente inferior, tratando-se deste modo de uma parte forçosa ou necessariamente comum por integrar a estrutura do edifício, sendo um elemento vital da sua construção, cfr Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III, 2ª Edição, 420.

Estamos, assim, em sede de terraços intermédios, abrangidos pela previsão legal inserta no apontado art. 1421º, nº 1, alínea c) do CC, tratando-se assim de uma parte comum de edifício constituído em propriedade horizontal, o que deita por terra a conclusão a que se chegou no Acórdão de que «O terraço de cobertura é a cobertura do edifício onde estão implantadas as fracções autónomas e não cobertura de cada fracção.».

O Acórdão atenta a configuração particular de um edifício que foi construído, como dissemos supra, em socalcos e, assim sendo, não podemos falar nesse terraço de cobertura global da propriedade onde se situam as fracções, mas antes em várias coberturas constituídas por estas mesmas fracções com os terraços ou varandas que delas fazem parte integrante, veja-se aliás a descrição predial uma divisão assoalhada, cozinha, instalação sanitária e varanda, sendo inócua esta designação face à construção onde se inserem as fracções, ex adverso do considerado pelo segundo grau que fez incidir a sua decisão numa dualidade aparentemente contrária quando conclui que o terraço serve apenas de cobertura de um andar inferior para proteger a casa aí existente, tal como o telhado serve a mesma função (aliás, não deixa de ser explícita a equiparação que o preceito legal aqui em discussão faz de telhado e terraço). Já a varanda é uma extensão da casa, um prolongamento da sala (geralmente) onde o dono pode colher luz solar e ar fresco, gozar a vista e fazer a sua vida social, quando no caso sub judice se apurou que todas as fracções são cobertura das fracções inferiores, de onde a tal varanda que ali se desconsiderou, sendo a mesma uma extensão da casa, incorpora a própria estrutura do prédio, independentemente de ser utilizada exclusivamente pelo respectivo condómino, cfr neste sentido Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2ª Edição, 74 «[O] telhado é a cobertura de um edifício, isto é, o dispositivo que permite protege-lo (…) Os terraços de cobertura são coberturas horizontais (…) A sua sustentação é um pouco diferente da das coberturas ordinárias dado que a sua constituição e finalidade também é diferente (…) Os terraços de cobertura, que tanto se podem situar ao nível do primeiro andar por servirem de cobertura, por exemplo, a uma garagem ou a um estabelecimento, como ao nível de qualquer outro ou até do último piso, cobrindo parte do edifício, mesmo quando estejam afectados ao uso exclusivo de um condómino, são parte comum».

Para o efeito é-nos indiferente a terminologia utilizada, de varanda ou terraço não só porque frequentemente ambos os vocábulos são usados como sinónimos, como também pela circunstância de na espécie a específica e particular construção do prédio impor que cada uma das fracções – no seu todo – são cobertura das fracções imediatamente inferiores, ou dito de outro modo, são o telhado umas das outras., de onde o tal prolongamento da fracção consubstanciada na varanda ou terraço, constituir, nos termos do normativo inserto no art. 1421º, nº 1, alínea b) do CC, uma parte comum e visto o problema nesta perspectiva, única possível, atenta a configuração material da propriedade, não se poderá manter a tese sufragada no Aresto impugnado, cfr inter alia os Ac STJ de 15 de Maio de 2012 (Relator Hélder Roque) e de 9 de Junho de 2016 (Relator Orlando Afonso), in www.dgsi.pt.

O art. 1420º, nº 1 do CC dispõe que «Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício.», de onde resulta para cada um dos condóminos a obrigação de participar, na proporção do valor da sua fracção, nas despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, de harmonia com o preceituado no art. 1424º, nº 1 do mesmo diploma, apenas estando excepcionadas dessa comparticipação as despesas referidas no seu nº 3, isto é as “relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem”, situação esta que transcende a configurada nos autos, «[O] que caracteriza a propriedade horizontal e constitui razão de ser do respectivo regime é o facto de as fracções independentes fazerem parte de um edifício de estrutura unitária – o que, necessariamente, há-de criar especiais relações de interdependência entre os condóminos, quer pelo que respeita às partes comuns do edifício, quer mesmo pelo que respeita às fracções autónomas», apud Henrique Mesquita, A propriedade horizontal no Código Civil português, in RES, Ano XXIII, Nºs 1-2-3-4, 84.

Em face da materialidade apurada, as varandas/terraços são partes comuns.

Terraços comuns


Dispõe o art. 1421º, nº 1, alínea b), do CC, que «1. São comuns as seguintes partes do edifício: b) O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção.», acrescentando o seu nº 3 que «O título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns.».

No entanto, esta matéria não é tão pacífica quanto possa aparentar, porquanto, desde logo, no Direito anterior (DL 40333) o nº 2 do art. 1421º estatuia que eram comuns, "O telhado, assim como os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do último pavimento", portanto, em causa estavam apenas os terraços sitos no ultimo pavimento, em substituição do telhado. Com a aprovação do DL 267/94, esta norma passou para a al. b) do nº1 com a redacção supra, que por não devidamente especificada, deixou ao critério dos juízes determinar se um terraço intermédio era ou não imperativamente comum. Vide mais informação aqui: https://apropriedadehorizontal.blogspot.com/2021/07/o-art-1421-do-codigo-civil.html

Não obstante esta dualidade, o STJ fixou jurisprudência quanto à comunhão de todos os terraços. Contudo, importa salientar que os terraços de cobertura são parte, imperativamente comum, quando a sua função é exercida no interesse de toda a construção, quando tiverem função análoga à do telhado, quando, por assim dizer, o substituam (neste sentido Ac. STJ de 6/11/2018).

Assim, se um edifício está construído em socalcos e não tem telhado, onde todas as fracções são cobertura das fracções inferiores, os terraços/varandas dos apartamentos, serão também cobertura dos apartamentos que constituem os andares imediatamente inferiores, tratando-se deste modo de partes forçosa ou necessariamente comuns por integrarem a estrutura do edifício, sendo elementos vitais da sua construção.

Em sentido diverso ocorre, se um edifício está construído com um ou vários terraços intermédios, ainda que com a função de cobertura, mas de galeria(s) (leia-se, passeios abrigados) ou de determinadas áreas do logradouro do prédio, os quais, por não se terem edificados no interesse de toda a construção e não se substituindo ao telhado, não são comuns.

7/17/2021

Modificação do TCPH


Só por acordo de todos os condóminos, dado em escritura pública ou por documento particular autenticado, com observância do disposto no art. 1415º do CC é que pode ser modificado o Título Constitutivo da Propriedade Horizontal (TCPH). É o que se retira do art. 1419º do CC.Este art. 1419º foi alterado pelo art. 4º do DL 116/2008 (publicado no Diário da República nº 128/2008, Série I de 2008-07-04, em vigor a partir de 2008-07-21), sendo a sua actual redacção a seguinte:

1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 1422.º-A e do disposto em lei especial, o título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado por escritura pública ou por documento particular autenticado, havendo acordo de todos os condóminos.
2 - O administrador, em representação do condomínio, pode outorgar a escritura ou elaborar e subscrever o documento particular a que se refere o número anterior, desde que o acordo conste de acta assinada por todos os condóminos.
3 - A inobservância do disposto no artigo 1415.º importa a nulidade do acordo; esta nulidade pode ser declarada a requerimento das pessoas e entidades designadas no n.º 2 do artigo 1416.º

O art. 1422º-A do CC, a cujo nº 3 se refere o art. 1419º no seu nº 1, tem o teor seguinte:

1 - Não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas.
2 - Para efeitos do disposto do número anterior, a contiguidade das fracções é dispensada quando se trate de fracções correspondentes a arrecadações e garagens.
3 - Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.
4 - Sem prejuízo do disposto em lei especial, nos casos previstos nos números anteriores, cabe aos condóminos que juntaram ou cindiram as fracções o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública ou de documento particular autenticado, introduzir a correspondente alteração no título constitutivo.
5 - A escritura pública ou o documento particular a que se refere o número anterior devem ser comunicados ao administrador no prazo de 10 dias.

A inobservância do art. 1415º do CC importa na nulidade do acordo, a qual, pode ser declarada a requerimento de qualquer condómino ou do Ministério Público, este sobre participação da entidade pública a quem incumbiu a aprovação ou a fiscalização das construções (cfr. art. 1419º, nº 3, que remete para o art. 1416º, nº 2 do CC).

Neste sentido, Pires de Lima & Antunes Varela (Código Civil Anotado, III, pág. 359) diz que "A nulidade do acordo, no caso do art. 1419º, terá como consequência o retorno à constituição inicial da propriedade horizontal, e só no caso de este retorno não ser possível, se sujeitará o pedido ao regime de compropriedade, nos termos do art. 1416º, nº 1."

Sob a epígrafe modificação de propriedade horizontal, dispõe o art. 60º do actual Código do Notariado, aprovado pelo DL 207/95 de 14 de Agosto:

1 - Os instrumentos de modificação do título constitutivo da propriedade horizontal que importem alteração da composição ou do destino das respectivas fracções só podem ser lavrados se for junto documento camarário comprovativo de que a alteração está de acordo com os correspondentes requisitos legais.
2 - No caso de a modificação exigir obras de adaptação, a exibição do projecto devidamente aprovado dispensa o documento a que se refere o número anterior.


7/16/2021

Deliberações inexistentes

O legislador substantivo não reconhece a figura das "deliberações inexistentes", não havendo, assim, qualquer regime processual que lhes seja especificamente aplicável, pelo que ou estamos perante deliberações sociais — que, por esse facto podem ser objecto da providência cautelar especificada de suspensão das deliberações sociais, desde que verificados todos os respectivos requisitos, incluindo o do "dano apreciável" - ou não estamos perante deliberações sociais (por nem sequer na aparência poderem ser imputadas à sociedade, o que não é o caso concreto) e, nesse caso, não poderão ser objecto da providência requerida, mas apenas de procedimento cautelar comum, desde que verificados todos os respectivos pressupostos;

Em síntese, diremos que, em regra, para aqueles que aceitam a figura da inexistência jurídica das deliberações sociais, como Raúl Ventura (Sociedades por quotas, II, Almedina, Coimbra, 1996, p. 247), uma deliberação será inexistente se falta absolutamente algum dos seus elementos essenciais específicos. 

Paulo Olavo e Cunha (Impugnação de Deliberações Sociais, Almedina, 2015, p. 180 e ss.), na tentativa de identificar os elementos específicos para que haja uma deliberação social, ainda que inválida, identificou 4 elementos, a saber: (i) existência de uma realidade que seja imputável aos sócios sobre a qual se possam pronunciar; (ii) emissão de votos os sócios de modo a formar um deliberação; (iii) os votos têm de ser expressos numa quantidade mínima; (iv) a deliberação tem de observar um processo estabelecido ou permitido pela lei ou regulado contratualmente.

Coutinho de Abreu (Curso de Direito Comercial, Vol. II, 6.ª ed., Almedina, 2019, p. 457) também enuncia dois tipos de hipóteses onde pode haver cabimento para as deliberações inexistentes: (a) não correspondência dos factos (invocados como deliberativo-sociais) a qualquer forma de deliberação dos sócios; (b) não correspondência dos factos à forma de deliberação invocada.

Alberto Pimenta, «Suspensão e anulação de deliberações sociais», cit., p. 445, nota 173, defendia que «o pedido de suspensão das deliberações só pode ser formulado como acto preparatório da acção de impugnação prevista no art. 146° do Cód. Com.»). A favor da possibilidade de suspensão de deliberações nulas, cfr. o Ac. STJ de 20/03/1962, BMJ, 115°, p. 541 (que admite também a suspensão de deliberações inexistentes) e o Ac. STJ de 21/12/1976, BMJ, 262°, p. 168.

Para Raúl Ventura, uma deliberação será inexistente se falta absolutamente algum dos seus elementos essenciais específicos. No Ac. STJ de 4/12/96, sustentou-se que a deliberação inexistente é o acto a que falte o mínimo dos requisitos essenciais para que possa ter a eficácia jurídica própria de uma deliberação ou que não seja adequado, nem sequer na sua aparência material, a vincular a sociedade. Mas no referido aresto entendeu-se que não se pode recorrer ao procedimento de suspensão de deliberações sociais relativamente a deliberações inexistentes porque aquele procedimento pressupõe uma efectiva deliberação. Para reagir cautelarmente contra uma deliberação inexistente, seria ainda assim possível recorrer a uma providência cautelar não especificada.

Todavia, a grande dificuldade encontra-se na concretização das situações que possam enformar o conceito «inexistência jurídica».

Como nota Vasco Lobo Xavier (Regime das deliberações sociais no Projecto de Código das Sociedades, in: Temas de direito comercial/Ciclo de Conferências no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, Almedina, 1986, p. 15 e ss.), a maior parte dos exemplos colhidos na doutrina estrangeira como exemplos de deliberações inexistentes, tem hoje diferente tratamento entre nós, face ao regime consagrado no CSC, sendo enquadradas como deliberações nulas (a falta de convocação de assembleia, é sanável se que todos os sócios estiverem presentes ou representados) ou como deliberações anuláveis (a falta de quórum constitutivo conduzirá em princípio à anulabilidade da deliberação que se considere tomada, o mesmo valendo para a falta de quórum deliberativo se for revelado exteriormente algo que possa considerar-se uma deliberação positiva).

Este autor também tratou o tema em Anulação de deliberação social e deliberações conexas, cit., p. 196, nota 94, referindo-se a outros casos em que a doutrina e a jurisprudência se dividiram quanto à caracterização do vício da deliberação. Deliberação inexistente seria desde logo aquela em que não-sócios deliberam sobre assuntos da sociedade. Outros casos seriam mais duvidosos, mas a maior parte daqueles que a doutrina estrangeira tratava como exemplos de deliberações inexistentes tem hoje diferente tratamento entre nós, face ao regime consagrado no CSC. 

Assim: 
a) a falta de convocação de assembleia conduz à nulidade das deliberações tomadas na assembleia, a não ser que todos os sócios tenham estado presentes ou representados; 
b) a falta de quórum constitutivo conduzirá em princípio à anulabilidade da deliberação que se considere tomada, o mesmo valendo para a falta de quórum deliberativo se se revela exteriormente algo que possa considerar-se uma deliberação positiva (se nem sequer se revela exteriormente algo que se possa configurar como deliberação positiva, então a deliberação positiva não existe: cfr. Vasco Lobo Xavier, «Regime das deliberações sociais no Projecto de Código das Sociedades», Temas de direito comercial, Almedina, Coimbra, 1986, p. 16); 
c) quanto à falta de acta, o n.° 1 do art. 63.° do CSC parece revelar que não acarreta inexistência.

Também alguns arestos têm considerado que pode haver deliberações inexistentes juridicamente, secundando a doutrina que acolhe a inexistência como uma invalidade aposta a certas deliberações sociais, ainda que não haja unanimidade nesse entendimento.

Assim, e nomeadamente, pronunciaram-se sobre a inexistência jurídica o Ac. STJ, de 04-12-1996 «III. Deliberação inexistente é aquela a que falte o mínimo dos requisitos essenciais ou a que, nem na aparência, é adequada a vincular a sociedade.» e o Ac. TRP de 19-05-2010 «O direito societário comina a inexistência jurídica e não somente uma invalidade para as deliberações ditas por tomadas em assembleia-geral universal de sócios que não ocorreu afinal com a presença de todos eles, nem contou com o assentimento de todos a que tal conclave se constituísse e deliberasse sobre os assuntos referidos na acta (art. 54° do CSC», mas, em sentido oposto, o Ac. RP, de 19/05/2010 «I. O Código das Sociedades Comerciais não reconhece a inexistência jurídica enquanto categoria autónoma e distinta da nulidade ou da ineficácia stricto sensu das deliberações de sociedades comerciais, não constituindo, assim, vício passível de consubstanciar fundamento típico da impugnação das mesmas.»

7/15/2021

Deliberar sobre assuntos estranhos à OT


O nº2 do art. 1432º do Código Civil – ao impor certos requisitos do aviso convocatório da assembleia de condóminos – visa garantir-lhes o direito à informação das matérias objecto da convocatória a fim de assegurar uma participação esclarecida na discussão e votação.

Segundo o Ac. do TRC datado de 4/10/2005, "O art. 174º do Código Civil dispõe, no seu nº 2, que são anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia. Esta norma é omissa sobre a especificação do conteúdo da ordem de trabalhos a mencionar na convocatória da assembleia de associados, devendo tal lacuna ser integrada por aplicação analógica, nos termos do art. 10º, nº 1 e 2, do Código Civil, do disposto no nº 8 do artº 377. do Código das Sociedades Comerciais, segundo o qual «o aviso convocatório (das assembleias gerais) deve mencionar claramente o assunto sobre o qual a deliberação é tomada»”.

Também no Ac. deste Tribunal, proferido no processo n.º 3125/17.0T8VIS.C1, de 20 de Fevereiro de 2019, decidiu que é anulável a deliberação tomada sobre assunto não constante da ordem de trabalhos, sem a presença de todos os condóminos ou, estando todos presentes, se estes não concordaram com a sujeição do assunto a deliberação.

Diz a lei que o direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação. Acontece que, tendo a mesma pedido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, manda a lei que a acção se considere proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono. Ora, tendo esse pedido sido formulado numa determinada data, é essa a data a considerar como sendo aquela em que foi instaurada a acção e não a data em que a mesma entrou em juízo. De onde resulta que, na data em que foi instaurada a acção ainda não tinha decorrido o referido prazo de caducidade.

Apreciando a validade das deliberações tomadas, o TRC entendeu que tendo a sessão da assembleia de condóminos sido suspensa para continuar noutra data, não havia lugar a uma nova convocatória dirigida aos condóminos ausentes. A sessão suspensa para continuar noutro dia é fraccionada em duas partes, mas mantém-se o mesmo ato e a lei só exige a convocatória para o dia em que se inicia a sessão.

Porém, a assembleia não pode depois deliberar sobre assuntos que não constavam da ordem de trabalhos indicada na convocatória. Essa falta de indicação do assunto na convocatória acarreta a anulabilidade das deliberações tomadas, a não ser que, estando todos presentes, os condóminos manifestem a vontade de reunir-se para deliberar sobre determinado assunto. Como tal, se for tomada uma deliberação sobre assunto não constante da ordem de trabalhos sem que estejam presentes todos os condóminos ou, estando todos presentes, sem que tenham concordado com a sujeição do assunto a deliberação, a mesma será inválida.

Destas competentes decisões retira-se que o art. 174º dispõe, no seu nº 2, que são anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia, salvo se todos os associados comparecerem à reunião e todos concordarem com o aditamento. No entanto, esta norma é omissa sobre a especificação do conteúdo da ordem de trabalhos a mencionar na convocatória da assembleia de associados, devendo tal lacuna ser integrada por aplicação analógica, nos termos do art. 10º, nº 1 e 2, do Código Civil, do disposto no nº 8 do art. 377º do Código das Sociedades Comerciais: “o aviso convocatório (das assembleias gerais) deve mencionar claramente o assunto sobre o qual a deliberação é tomada”.

E isto é assim para que os interessados saibam, de antemão, o que vai ser discutido na assembleia geral e possam, assim, preparar atempadamente a sua intervenção e tomada de posição quanto à defesa dos seus direitos, sem serem confrontados no decurso da assembleia com a discussão de assuntos que não estavam agendados para essa ocasião. Estas razões procedem igualmente quanto à convocatória das assembleias gerais das pessoas colectivas constituídas sob forma de associações (cfr., neste sentido, o Ac. do STJ de 09/11/2000).

Ainda segundo este Acórdão, a anulabilidade prevista no art. 174º, nº 1, vale igualmente para a deliberação tomada sobre matéria ou assunto que na convocatória não estava claramente mencionado, de modo a não suscitar dúvidas. Convém, ainda, ter em consideração o que diz o Prof. Menezes Cordeiro (Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, T-III, pág. 608/609) a esse propósito: “A fixação da ordem do dia é da maior importância: apenas conhecendo-a poderão os associados ajuizar da necessidade ou da conveniência de comparecer na assembleia “.

Quanto à ordem do dia, observar-se-à ainda o seguinte:
-os diversos pontos devem estar suficientemente explícitos; por exemplo, não basta uma referência genérica, tipo “outros assuntos”, para legitimar tudo o que, na reunião, se queira incluir;
-devem considerar-se abrangidos todos os assuntos que sejam consequência natural e lógica da discussão de outro assunto indicado na convocatória.

7/10/2021

Violação art. 1424º, nº 3 e 4 - 2ª parte


No seguimento a análise anterior, relativamente às deliberações das assembleias de condóminos que imponham uma repartição diferente da determinada pelos nº 3 e 4 do art. 1424º do CC para as despesas neles previstas, por se terem deliberações com conteúdo negocial contrário à lei são, como tal, nulas, por via do disposto no art. 280º do CC, porquanto, a sanção da anulabilidade prevista no art. 1433º do CC aplica-se apenas às deliberações que violem normas legais imperativas que não digam respeito ao conteúdo negocial ou normas do regulamento de condomínio.

Atentemos agora ao regime da invalidade.
 
Com alguma frequência encontramos informação no sentido de a violação de uma norma imperativa gerar necessariamente nulidade do negócio. É o que parece ser sugerido, por exemplo, pelo trecho de Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado, III, 2.ª ed., Coimbra Editora, 1987, p. 447, quando, em anotação ao art. 1433 do CC (que determina que as deliberações da assembleia contrárias à lei são anuláveis), escrevem: «no âmbito desta disposição não estão compreendidas, nem as deliberações que violam preceitos de natureza imperativa, nem as que tenham por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia de condóminos». Se assim fosse, as deliberações contrárias à lei a que o art. 1433 se reporta e que comina com a anulabilidade não seriam imperativas, seriam dispositivas e, nomeadamente, suplectivas. Mas não pode ser assim (também reparando na incongruência, Jorge Morais Carvalho, Os limites…, cit., p. 151, nota 442). Normas suplectivas são aquelas cujo conteúdo pode ser validamente afastado pelas partes, pelo que o negócio que as afasta é válido, logo, não anulável.
 
As normas imperativas não geram necessariamente nulidade do ato praticado em violação delas. A prática negocial em desrespeito de uma norma imperativa pode ter diversos tipos de consequências, parte das quais não passam sequer pela invalidade do negócio (sanções penais ou contra-ordenacionais, resolução do contrato, inexistência, mera ineficácia) – a propósito, Jorge Morais Carvalho, Os limites…, cit., pp. 167-216. A sanção da nulidade está definitivamente excluída nos casos em que está prevista outra sanção do campo da eficácia do negócio (anulabilidade, mera ineficácia, invalidade atípica); havendo estatuição de uma sanção estranha ao domínio da eficácia do negócio – como, por ex., quando a infracção da norma imperativa constitui contra-ordenação –, teremos de ponderar a adequação da nulidade ao negócio (já assim o defendemos em Regime jurídico da actividade de mediação imobiliária anotado, Almedina, 2015, pp. 70-3 e em Contrato de mediação, Almedina, 2014, pp. 389-93).

Por facilidade de exposição, passamos a reproduzir o art. 1433º do CC, justamente epigrafado «impugnação das deliberações»:
«1.- As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.
2.- No prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.
3.- No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.
4.- O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação.
5.- Pode também ser requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei de processo.
6.- A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.»

Por via do transcrito artigo, a lei afasta a consequência da nulidade para deliberações da assembleia de condóminos que lhe sejam contrárias, consagrando a da anulabilidade. Mas será assim para todos os casos de deliberações contrárias à lei?
 
Usando palavras alheias que a propósito vêm, «antes de mais, há a notar que é opinião comum que, pese a letra da lei, certos tipos de ilegalidade geram a nulidade das deliberações – e não mera a anulabilidade. (…) O CC seguiu, em matéria de deliberações da assembleia de condóminos, como no tocante às deliberações das assembleias gerais das associações (art. 177º), a orientação de diplomas anteriores (designadamente do Código Comercial, no seu art. 146º) de só prever a anulação de deliberações, mas ao longo do tempo gerou-se consenso sobre que certas violações de normas imperativas (mormente a desconformidade do conteúdo das deliberações com tais normas) acarretam a nulidade das deliberações em causa» – Rui Pinto Duarte, anotação ao art. 1433º, in Código Civil Anotado, cit., p. 285. 
 
O Autor exemplifica com M. Henrique Mesquita, Direitos Reais, Sumários das Lições ao Curso de 1966-1967, Coimbra (policopiado), 1967, pp. 292 e ss., e «A Propriedade Horizontal no Código Civil Português», Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXIII, janeiro/dezembro 1976, pp. 140 a 142; e Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, III, 2.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pp. 447 e 448, e, ainda, com o Ac. do STJ de 8.2.2001 (CJ-STJ ano IX, tomo I, 2001, pp. 105 e ss., em especial p. 107). Podemos acrescentar ainda, também exemplificativamente, Sandra Passinhas, cit., pp. 251-3.
 
Concordamos: há deliberações da assembleia de condóminos contrárias à lei que são anuláveis, às quais se aplica o regime do art. 1433, e há deliberações contrárias à lei que são nulas, às quais se aplica o regime geral da nulidade.

Como aferir, então, se estamos perante norma cuja infracção gera nulidade, se perante norma cuja infracção gera mera anulabilidade nos termos do art. 1433?
 
A apreciação da questão envolve a interpretação dos art. 280º e 294º do CC. Nos termos do primeiro, o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável (nº 1), bem como o negócio contrário à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes (nº 2) são nulos. Nos termos do segundo, os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei. Como harmonizar os dois preceitos?
 
Segundo a doutrina comum, o art. 280º contempla o objecto negocial com os seus dois significados: objecto imediato – conteúdo, efeitos jurídicos do negócio, considerando as declarações das partes e o direito aplicável –, e objecto mediato – objecto stricto sensu, quid sobre que incidem os efeitos do negócio (assim Carlos Ferreira de Almeida, Contratos, II, Conteúdo, contratos de troca, Almedina, 2007, p. 14, Jorge Morais Carvalho, Os contratos de consumo: reflexão sobre a autonomia privada no direito do consumo, Almedina, 2012, pp. 44 e 60, Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil português, I, Parte geral, t. I, Introdução, doutrina geral, negócio jurídico, 3.ª ed., Almedina, 2005, p. 674, Carvalho Fernandes, Teoria geral do direito civil, II, Fontes, conteúdo e garantia da relação jurídica, 5.ª ed. ..., Universidade Católica Editora, 2010, p. 159, Mota Pinto, Teoria geral do direito civil, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2005, pp. 553-9, Pais de Vasconcelos, Teoria geral do direito civil, 6.ª ed. Almedina, 2010, pp. 581-2, Heinrich Hörster, A parte geral do Código Civil português, Coimbra, Almedina, 1992, pp. 522-3.). 
 
Embora a propósito da possibilidade física e da determinabilidade do objecto normalmente se expresse que é o objecto mediato que está em causa, no que respeita à possibilidade legal e à não contrariedade à lei já não é feita essa restrição (Mota Pinto, Teoria geral…, cit., pp. 554-7; Heinrich Hörster, A parte geral…, cit., pp. 522-3) – repare-se que estamos ainda no âmbito do nº 1, que alude expressamente ao objecto, alusão que não é feita no nº 2. No art. 280º estão, pois, previstas causas de invalidade do objecto do negócio, em qualquer dos seus sentidos.
 
O art. 294º tem um âmbito mais abrangente, cominando com a nulidade a violação de normas imperativas, mesmo quando estas normas não contêm essa directa cominação, desde que, nestes casos, não resulte da lei outra solução. 
 
A norma do art. 280º é (a par das normas dos art. 281º, 220º, e de outras espalhadas pela legislação do país) uma concretização da norma do art. 294º (neste sentido também Heinrich Hörster, A parte geral…, cit., p. 522). Jorge Morais Carvalho reserva o art. 280º para o objecto ou elementos internos do negócio e o 294º para os elementos exteriores (Os contratos de consumo, cit., pp. 50-6, 60-1, e Os limites…, cit., pp. 141-67). Na prática, assim sucede, porque o art. 280º rege especialmente sobre os negócios celebrados contra disposição imperativa respeitante a elementos internos do negócio. Em consequência, o art. 294º – apesar de não distinguir, nem pelo elemento literal nem pela sua inserção sistemática, o objecto das disposições legais a que se reporta –, fica com o seu âmbito comprimido pela norma do art. 280,º e outras (220º, 281º), que regem sobre situações particulares que, de outro modo, estariam nele previstas.
 
Assim, a resposta à nossa última questão é: se a norma violada pela deliberação da assembleia for uma daquelas cuja infracção a lei comina com a nulidade, como sucede se a infracção se reconduzir ao disposto no art. 280º, a consequência é a nulidade; se, pelo contrário, se trata de uma norma para a qual a lei não prevê expressamente a nulidade, caímos no âmbito do art. 294º, havendo então que atender a outras consequências que a lei preveja. Se a violação cair no âmbito residual do art. 294º, só gerará nulidade na falta de diferente solução da lei.
 
As normas dos nº 3 e 4 do art. 1424º do CC respeitam ao conteúdo negocial, ao seu objecto imediato, aos direitos e deveres dos condóminos no que respeita à sua participação nas despesas relativas a partes comuns.
 
Cremos, ainda assim, que nada impedia que a norma do art. 1433º, ou outra, cominasse com a anulabilidade deliberação da assembleia de condóminos que violasse, pelo seu conteúdo, disposição legal; mas teria de o dizer expressamente. Não o dizendo de forma expressa, cremos que uma deliberação que pelo seu objecto imediato ou conteúdo viola norma expressa é nula por via do disposto no art. 280º do CC.
 
A sanção da anulabilidade prevista no art. 1433º do CC aplica-se a deliberações contrárias a normas legais que não respeitem ao conteúdo negocial, nomeadamente normas relativas a elementos externos, ou a deliberações contrárias a normas do regulamento de condomínio.

Não se desconhecem decisões no sentido de as normas do art. 1424º serem suplectivas, pretendendo-se retirar essa suplectividade da locução «salvo disposição em contrário» e/ou de trechos doutrinários anteriores à versão de 1994 (que introduziu a norma do actual nº 2 que veio dar alguma abertura à intervenção dos condóminos na repartição de certas despesas, mas apenas quando resultante de regulamento deliberado em condições muito especiais e com específicos conteúdos que o mesmo nº 2 prevê). Também não se desconhecem decisões que aplicam às deliberações que impõem repartição de despesas contrária às normas do art. 1424º o regime de anulabilidade previsto no art. 1433º. Porquanto o que se expôs, entendemos que tal contrariedade gera nulidade. Diga-se a latere que, se as normas do art. 1424º fossem suplectivas, as deliberações da assembleia de conteúdo diverso dos nelas previstos, seriam válidas e não anuláveis; se as deliberações que contrariam a repartição de despesas estabelecida nessas normas fossem anuláveis nos termos do art. 1433º, então as normas seriam imperativas (como são, ainda que por outra via) e não suplectivas.