Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

4/25/2021

Minuta contrato administração de condomínio

Actualmente é cada vez mais recorrente o recurso à contratação de empresas de administração de condomínio (actividade profissional que ainda não é regulamentada pela lei), sendo que para o efeito, os condóminos não cuidam de redigir um competente contrato escrito, aplicando-se apenas as comuns regras do mandato.

No entanto, atendendo à importância jurídica deste documento, é de todo aconselhável a formalização de um contrato escrito entre as partes, pelo que se apresenta infra uma minuta, que enquanto bosquejo de um futuro acordo, poderá servir de base à elaboração de um contrato formal.

A presente proposta de contrato de administração de condomínios pode ser copiada e modificada, no seu todo ou em algumas das partes. O que releva é que os interessados devem entrar em acordo naquilo que lhes aproveita. Depois de ser analisada, discutida e aprovada, a minuta em sede plenária, é finalizada e passa a configurar como o contrato final que oficializará o negócio.

Acresce salientar que, ainda que a presente minuta seja apenas um esboço do documento final, os condóminos podem e devem - para que o mesmo seja feito da maneira mais eficaz -  negociar preliminarmente todos os pontos necessários e importantes para o acordo, pelo que devem esclarecer dúvidas, discutir as condições e os termos. Com tudo bem definido, melhor será o contrato, evitando-se assim eventuais imprecisões, lacunas, erros na redação e demais problemas que possam postergar a finalização do contrato – ou até gerar prejuízos no futuro.

Minuta contrato
 de
Administração de condomínio

 

Entre:

1. O condomínio do Edifício ... , sito na rua …, nº …, freguesia de …, com o NIPC n.º ... , representado pelo condómino mandatado pelo assembleia, …, proprietário da fracção autónoma correspondente ao …, e identificada com a letra …, doravante designada por Contratante,

E,

2. …, com sede na rua …, nº …, em …, registada no IRN nº …, e na CRC nº …, com o NIF nº …, representada pelo seu gerente …, doravante designada por Contratada.

Considerando que conforme deliberação da Assembleia de condomínio, com data de … foi decidido contratar os serviços do 2º Contratante, tudo melhor conforme acta dessa Assembleia que se anexa ao presente, bem como a lista com os nomes, moradas, número de contribuinte e identificação das fracções dos condóminos e que dele é parte integrante;

É celebrado o presente, que se reconduz num contrato para a administração do condomínio, o qual subordinado pelas cláusulas infra e no que se houver omisso, se aplica, na falta de regulamentação específica, o regime do mandato, como decorre do art. 1156º e ss. do CC e demais legislação aplicável.

Cláusula Primeira - Finalidade

1.1

Pelo presente contrato, o Contratante entrega a gestão do condomínio supracitado à Contratada, a qual a aceita a partir da presente data.

1.2

O presente contrato tem por finalidade regular os direitos e deveres estabelecidos entre ambas as partes.

1.3

O local de exercício das funções administrativas é no condomínio ou qualquer outro local pertencente à Contratada, sem prejuízo das deslocações inerentes à actividade desenvolvida.

Cláusula Segunda – Contactos

2.1

Para qualquer questão relativa aos serviços da Contratada, a mesma obriga-se a afixar no local de estilo sito na entrada do condomínio:

2.1.1

a sua identificação profissional;

2.1.2

a sede do escritório;

2.1.3

os horários de expediente nos dias úteis;

2.1.4

os contactos telefónicos no horário de atendimento;

2.1.5

um contacto telefónico para urgências fora do horário de atendimento e aos fins de semana e dias feriados;

2.1.6

o endereço de correio electrónico.

Cláusula Terceira - Início do contrato

3.1

O presente contrato entra em vigor logo que assinado pelos representantes do Condomínio.

3.2

O Contratante procederá à entrega de um dossier com toda a documentação inerente ao condomínio.

3.2.1

Será entregue também uma chave da porta de entrada do edifício e de outras partes comuns (caixa de correio da administração, sala de condomínio, vitrinas, etc).

Cláusula Quarta – Duração

4.1

O presente contrato é celebrado pelo prazo efectivo de 1 ano a contar da data da sua assinatura, sendo renovável automaticamente, salvo vontade contrária do Contratante, mediante deliberação tomada em sede plenária realizada aquando da assembleia anual.

Cláusula Quinta – Princípios de gestão

5.1

O presente contrato de administração é celebrado para regular a actividade da Contratada consubstanciada na gestão do condomínio do Contratante, a qual exige-se que, decorrente do desenvolvimento da mesma mediante critérios empresariais diligentes, sãos e prudentes, seja prestada privilegiando a eficiência e eficácia, e contribuindo para optimizar os ganhos de qualidade e racionalidade.

5.2

No exercício da sua actividade, a Contratada, obriga-se a cumprir todas as obrigações emergentes da lei, do presente contrato de que é parte, e a observar e respeitar, escrupulosamente, na integra e pontualmente os termos e condições previstos no regulamento do condomínio.

5.3

A Contratada não pode ceder a respectiva posição contratual no presente contrato de administração de condomínio sem para tanto, obter prévia autorização da assembleia de condóminos.

Cláusula Sexta - Âmbito da actividade

6.1

Sem prejuízo das funções elencadas no art. 1436º do CC, e outras que lhe sejam por imposição legal aplicáveis, cabe ainda à Contratada, exercer as funções atribuídas pela assembleia e em observância do que consta do regulamento do condomínio.

6.2

No domínio das prestações a que a Contratada está vinculada, a qual traduzida numa obrigação de meios no âmbito administrativo:

6.2.1

Consistindo no cumprimento dos seus poderes-deveres, obriga-se a observar e cumprir os princípios de gestão, exercendo a respetiva actividade com diligência e de acordo com elevados padrões de qualidade, garantindo a sua acessibilidade e a eficiência económica no que se refere à sua gestão e às soluções adoptadas nas suas actividades, denotando total transparência e imparcialidade enquanto no cumprimento das suas funções ou das deliberações da assembleia e prestando todos os esclarecimentos e todas as informações que julgue necessárias ou lhe sejam solicitadas.

6.2.2

Consistindo no dever de gestão, a Contratada obriga-se a estabelecer um sistema de logística coordenado e adequado ao desenvolvimento dos seus exercícios, tendo especialmente em vista o exaustivo registo das actividades executadas e a adopção de mecanismos que permitam aos condóminos monitorizar e fiscalizar a todo o tempo o cumprimento dos seus deveres.

6.2.3

Consistindo no dever de contratar serviços de interesse comum, a Contratada obriga-se a reger-se pelos princípios da transparência, assegurando a adopção de mecanismos para a celebração de contratos, transparentes, imparciais e sem interesses, directos ou indirectos e organizando a respectiva contabilidade de modo a permitir a identificação de quaisquer fluxos financeiros.

6.2.4

Consistindo no dever de confidencialidade, a contratada obriga-se a, durante a vigência do presente contrato e após a sua cessação, manter confidencialidade sobre todos os dossiers, documentos, dados e informações obtidos em virtude do exercício das suas funções, e que se refiram ao Contratante, nomeadamente sobre a sua organização, actividades ou dos condóminos, e qualquer outro dado de natureza comercial, não podendo, designadamente, extrair cópias, divulgá-los ou comunicá-los a terceiros, abrangendo igualmente a reprodução da informação em qualquer suporte informático, ou outro meio de registo de dados.

6.2.5

Consistindo na rescisão contratual a Contratada obriga-se a entregar todos os documentos contabilísticos e administrativos que lhe foram confiados, em perfeito estado de conservação e com a escrituração que se fizer necessária, com referência aos serviços, objecto do presente contrato, em dia e em ordem.

6.3

No domínio das prestações a que a Contratada está vinculada, a qual traduzida numa obrigação de meios no âmbito financeiro e contabilístico:

6.3.1

Consistindo na prestação de contas, exige-se-lhe que elabore um balanço da gestão e contas do exercício semestral, a apresentar em assembleia até ao dia 15 de Julho do ano em curso, e um relatório de gestão e contas do exercício anual, a apresentar em assembleia até ao dia 15 de Janeiro seguinte, ambos em modelo simplificado, de fácil leitura e interpretação.

6.3.2

Consistindo na orçamentação, exige-se-lhe que elabore uma proposta previsional do total das despesas comuns, em modelo simplificado, de fácil leitura e interpretação, que aborde todas as rúbricas, incluindo despesas extraordinárias, e com um valor o mais aproximado possível da realidade para evitar situações de défice.

6.3.3

Consistindo no pagamento das despesas comuns, exige-se-lhe que cumpra com pontualidade e boa-fé na concretização todos os pagamentos havidos devidos pelo condomínio, responsabilizando-se pelas multas, juros e eventualmente indemnizações pelos danos que deu origem pela sua omissão.

6.4

No domínio das prestações a que a Contratada está vinculada, a qual traduzida numa obrigação de meios no âmbito da conservação:

6.4.1

Consistindo na realização dos actos conservatórios dos bens comuns, obriga-se a evitar a deterioração ou destruição das coisas, salvaguardando o condomínio de moléstias, perigos ou prejuízos causados pelos condóminos ou terceiros, tomando para tanto as medidas cautelares adequadas, ou propondo acções para obter o ressarcimento dos danos causados às partes comuns.

6.4.2

Consistindo na gestão dos serviços de interesse comum, obriga-se a realizar visitas semanais, em quantidade indeterminada, mas as suficientes para atender às necessidades, nomeadamente no acompanhamento do trabalho dos prestadores de serviços e realizando uma vistoria dos serviços prestados.

6.4.3

Consistindo na gestão das intervenções inerentes à manutenção, obriga-se a recorrer a profissionais qualificados ou empresas idóneas, tecnicamente competentes e certificadas, com pessoal devidamente legalizado e a coberto do competente seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais, com um orçamento que reúna a melhor relação preço-qualidade e mediante a apresentação em assembleia de uma minuta que compreenda as cláusulas a incluir no contrato a celebrar no âmbito do procedimento pré-contratual para a realização da empreitada, onde aquele se obriga a cumprir o contrato em conformidade com a proposta, o projeto, o caderno de encargos, o plano de trabalhos e a legislação aplicável em vigor, dos quais declarará ter integral conhecimento e perfeito entendimento, que depois de rubricados se dão para todos os efeitos, como reproduzidos e integrados e ainda de acordo com as instruções que lhe venham a ser dadas pelo Contratante ou pela fiscalização, pela qual será responsável a Contratada.

6.5

No âmbito das prestações a que a Contratada está vinculada, a qual traduzida numa obrigação de meios no âmbito coercivo:

6.5.1

Consistindo na cobrança das receitas, exige-se-lhe que desenvolva diligentemente toda a actividade adequada à obtenção da devida cobrança dessas receitas, ainda que – se necessário – mediante o recurso a acções judiciais, para as quais tem legitimidade, não carecendo da prévia autorização ou convocação da assembleia de condóminos.

Cláusula Sétima – Dever de colaboração recíproca e informação

7.1

As partes estão vinculadas pelo dever de colaboração mútua, designadamente no tocante à prestação recíproca de informações necessárias à boa execução do contrato, sem prejuízo dos deveres de informação previstos na lei.

Cláusula Oitava – Honorários

8.1

Pela prestação dos serviços referidos na cláusula primeira, o Contratante pagará à Contratada a importância anual de … euros, iva incluído, em duodécimos de … euros.

8.2

Os honorários serão liquidados no último dia do mês a que dizem respeito, por dedução do respectivo montante nas disponibilidades do condomínio.

8.3

A Contratada passará recibo dos honorários, o qual será arquivado na pasta do condomínio.

8.4

A prestação de quaisquer outros serviços administrativos não contemplados na cláusula primeira terão obrigatoriamente de ser pontual e especificamente acordados, por escrito, pelas partes, caso em que serão debitados por acréscimos aos valores ajustados no presente contrato.

Cláusula Nona – Despesas

9.1

Aos honorários referidos acresce o custo do material de expediente utilizado na execução dos serviços contratados, nomeadamente papel, pastas de arquivo, impressos, envelopes, fotocópias e registos nos ctt, os quais serão expressamente discriminados e objeto de fatura, desde que previamente comunicados ao segundo outorgante

Cláusula Décima – Seguro responsabilidade Civil

10.1

A Contratada deverá facultar competente prova de que possui o respectivo seguro de responsabilidade civil, para a garantia dos danos causados a terceiros, resultantes do exercício da sua actividade.

Cláusula Décima-primeira - Contratação de serviços

11.1

No que tange à contratação dos serviços de interesse comum requeridos pelo condomínio, quando os mesmos não estejam já estabelecidos, e por motivos de transparência e imparcialidade, deverão ser contratadas empresas sem qualquer vínculo com a Contratada.

Cláusula Décima-segunda – Autonomia

12.1

A Contratada deverá informar se é detentora ou está vinculada, por qualquer meio, directa ou indirectamente, com alguma entidade comercial, empresarial ou industrial, obrigando-se a identificar as mesmas.

12.2

Se no decurso do presente contrato se constituir detentora ou estabelecer vínculos, por qualquer meio, directa ou indirectamente, com alguma entidade comercial, empresarial ou industrial, obriga-se a informar o Contratante.

Cláusula Décima-terceira – Livro de reclamações

13.1

A Contratada deverá facultar a consulta do respectivo livro de reclamações na sede da respectiva firma, sempre que a mesma lhe seja solicitada por qualquer condómino, sem que para tanto lhe seja obrigado a prestar qualquer justificação para o interesse.

Cláusula Décima-quarta – Denúncia do contrato

14.1

Qualquer das partes goza da faculdade de resolver unilateralmente o contrato, sem carecer de apresentar justificação, desde que feita a comunicação com um pré-aviso de 30 e 60 dias, para o Contratante e para a Contratada, respectivamente.

14.2

O incumprimento das obrigações decorrentes do presente contrato, confere ao Contratante o direito à resolução ido contrato, por justa causa, cessando imediatamente todos os direitos deles emergentes.

14.2.1

A denúncia do contrato, com fundamento em justa causa será comunicada por carta registada com aviso de recepção, para a morada constante no presente contrato, ou para outra que, tenha sido indicada previamente em sua substituição.

14.2.2

A Contratada obriga-se a apresentar o relatório de gestão e contas no prazo de 15 dias, contados da data da recepção da comunicação referida no número anterior.

Cláusula Décima-quinta – Devolução de documentos

15.1

Em caso de rescisão ou não renovação do contrato, o administrador obriga-se a entregar a quem prestou serviços, ou a quem a assembleia a indicar por escrito, os livros e os documentos que tenha em seu poder, no prazo máximo de 8 dias.

15.2

Aquando da entrega, deverá ser emitido e assinado documento ou auto de receção, no qual se discriminem os livros e documentos entregues.

15.3

Após o cumprimento desta disposição, o administrador cessante fica desobrigado de prestar qualquer informação respeitante aos livros e documentos devolvidos, salvo se lhe for novamente facultada a sua consulta.

Cláusula Décima-sexta – Aditamentos

16.1

O presente contrato expressa integralmente o estabelecido entre as partes, representando outrossim as suas vontades, prevalecendo, consequentemente, sobre toda e qualquer declaração, negociação ou outros contratos, constantes ou não de documentos escritos.

16.2

Salvo aquelas que venham a ser necessárias para cumprir com obrigações legais, as alterações ou adicionais ao contrato só serão válidos se revestirem a forma de documento escrito assinado por ambas as partes.

Cláusula Décima-sétima – Direitos

17.1

Salvo se de outro modo expressamente previsto resultar, o não exercício, total ou parcial, dos direitos e faculdades emergentes do presente contrato, por qualquer das partes, não significará a renúncia a tais direitos, pelo que manter-se-ão os mesmos válidos e eficazes, não obstante, o seu não exercício.

Cláusula Décima-oitava – Litígios

18.1

Para qualquer questão emergente da interpretação, execução e integração do presente contrato, serão resolvidos por comum acordo entre o Contratante e a Contratada.

18.1.1

Caso não seja possível o acordo, as partes deverão submeter a sua resolução à mediação de uma entidade terceira escolhida por acordo, para a competente arbitragem.

18.1.2

Na necessidade de resolução por via judicial fica desde já estipulada a exclusiva competência do foro da Comarca de … com renúncia expressa a qualquer outro.

18.2

Em caso de litígio e de eventual recurso à via judicial, no sentido de resolver qualquer questão decorrente de incumprimento contratual, obrigará a parte vencida a pagar à parte vencedora as custas, encargos e despesas do processo judicial, incluindo as despesas e honorários de advogado e agente de execução que a parte vencedora tenha de incorrer e despender com o litígio.


Cláusula Décima-nona – Regulamento

19.1

O presente contrato inclui uma cópia do regulamento, em suporte físico ou informático, a qual dele faz parte integrante.


E assim, cientes do conteúdo do presente contrato, por se acharem justos e contratados, após a sua leitura e concordância com o seu teor, assinam livremente e de boa-fé o presente instrumento, feito em duplicado, de igual teor e forma, ficando um exemplar em poder de cada um dos Contratantes, e na presença das testemunhas abaixo assinadas, obrigando-se por si e seus sucessores a qualquer título, a cumprir os termos e condições aqui estipulados, prescindindo ainda estes expressamente do reconhecimento notarial das respetivas assinaturas.

…, … de … de 22020

O Contratante: (assinatura e carimbo)

A Contratada: (assinatura e carimbo)

As testemunhas:

Violação art. 1424º, nº 3 e 4 - 1ª parte

O disposto no nº 1 do art. 1424º do CC – relativo às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum – apenas pode ser afastado por disposição em contrário. Porém tratando-se de despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum, o nº 2 permite o afastamento da regra da proporcionalidade por disposição do regulamento de condomínio aprovada pela maioria explicitada na norma e com um dos dois conteúdos nela estabelecidos.

As normas dos nº 3 e 4 do art. 1424º do CC – que dispõem sobre a repartição das despesas relativas a partes comuns que servem exclusivamente alguns condóminos ou a ascensores que apenas servem determinadas fracções – constituem disposições especiais que afastam a regra geral da proporcionalidade estabelecida pelo nº 1 e não podem ser afastadas por deliberação da assembleia de condóminos. Assim, as deliberações das assembleias de condóminos que imponham uma repartição diferente da determinada pelos nº 3 e 4 do art. 1424º para as despesas neles previstas são deliberações com conteúdo negocial contrário à lei e, como tal, nulas, por via do disposto no art. 280º do CC.

Importa neste contreto sublinhar que a sanção da anulabilidade prevista no art. 1433º do CC aplica-se às deliberações que violem normas legais imperativas que não digam respeito ao conteúdo negocial ou normas do regulamento de condomínio.

Atente-se à natureza das normas do art. 1424º, nº 3 e 4, do CC
 
O art. 1424º do CC tem, presentemente e desde a Lei 32/2012, de 14 de Agosto, o seguinte teor:
«Encargos de conservação e fruição
1- Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.
2- Porém, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação.
3- As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
4- Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.
5- Nas despesas relativas às rampas de acesso e às plataformas elevatórias, quando colocadas nos termos do n.º 3 do artigo seguinte, só participam os condóminos que tiverem procedido à referida colocação.»

A primitiva redação apresentava-se como segue:
«Encargos de conservação e fruição
1.- Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.
2.- Porém, as despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
3.- Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.»

Em 1994, o artigo foi alterado pelo DL 267/94, de 25 de outubro, passando a ter o seguinte conteúdo:
«Encargos de conservação e fruição
1.- Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.
2.- Porém, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação.
3.- As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.
4.- Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.»

A grande alteração de 1994 foi o acrescento da norma que recebeu o nº 2, passando os anteriores nº 2 e 3 a nº 3 e 4. As regras dos actuais nº 3 e 4 vêm, portanto, da redação primitiva, correspondendo aos nº 2 e 3 dela, tendo-se apenas, na regra relativa aos lanços de escadas, suprimido a conjunção «porém». A alteração de 2012 limitou-se a acrescentar o nº 5, relativo a despesas com rampas de acesso e plataformas elevatórias, colocadas por condómino que tenha no seu agregado familiar pessoa com mobilidade condicionada.

O nº 1 do art. 1424º confere-nos a regra geral em matéria de despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns: proporcionalidade, com referência ao valor das frações. As escadas são, entre outras, partes comuns, e os ascensores também assim se presumem (cfr. art. 1421º, nº 1, al. c), e nº 2, al. b), do CC). No entanto, no que respeita ao pagamento das despesas inerentes, os nº 3 e 4 do art. 1424º excepcionam a regra do nº 1. 

Se as escadas servirem apenas um grupo de condóminos, continuam a ser partes comuns a todos os condóminos, mas as despesas relativas a lanços que sirvam exclusivamente alguns condóminos ficam a cargo dos que deles se servem (cfr. 1424º, nº 3) - «não se trata de um serviço efetivo, de um gozo subjetivo da parte dos condóminos, mas sim de uma possibilidade objetiva de utilização» (Sandra Passinhas, A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal, 2.ª ed., Coimbra, Almedina, 2002, p. 38 e nota 59, no mesmo sentido M. Henrique Mesquita, «A propriedade horizontal no Código Civil português», Revista de Direito e de Estudos Sociais, XXIII, 1976, p. 130, nota 117). Os ascensores presumem-se comuns, embora nas despesas só participem os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas (1424º, nº 4) – Sandra Passinhas, cit., p. 40.

Na vigência da primitiva versão do art. 1424º (anterior ao DL 267/94), houve quem se pronunciasse no sentido de as normas do art. 1424º do CC terem natureza supletiva, devendo permitir-se que o título constitutivo da propriedade horizontal ou deliberação de todos os interessados mediante escritura pública afastassem as regras ditadas pelo artigo.
Assim, Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado, III, 2.ª ed., de 1987, em anotação ao artigo em causa, p. 431, escreveram: «O princípio geral aplicável à repartição das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum é o do recurso à estipulação das partes. Valerá para o efeito o critério que tiver sido estabelecido pelos interessados, no título constitutivo ou em estipulação adequada. Na falta de disposição negocial, vigora como primeira regra supletiva o critério da proporcionalidade (…).

A segunda regra supletiva, aplicável às partes comuns do prédio que apenas sirvam um ou alguns dos condóminos, é a que restringe a repartição dos respetivos encargos aos utentes dessas partes. Este segundo critério (da redução dos condóminos obrigados) é completado pelo primeiro, quanto à forma como se dividem os encargos entre condóminos onerados» - as ênfases em título constitutivo e estipulação adequada são nossas.

Henrique Mesquita previa a possibilidade de uma repartição de despesas diferente da prevista no art. 1424º resultar do título constitutivo (não de uma qualquer deliberação em assembleia): «Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações. A obrigação de contribuir para estas despesas é uma típica obrigação propter rem – uma obrigação decorrente não de uma relação creditória autónoma, mas antes do próprio estatuto do condomínio. (…) «Mesmo quando as obrigações que impendem sobre os condóminos resultem do título constitutivo (e não diretamente da lei), a sua força vinculativa decorre da eficácia real do estatuto do condomínio e não de um ato de aceitação por parte daqueles» (M. Henrique Mesquita, «A propriedade horizontal no Código Civil português», Revista de Direito e de Estudos Sociais, XXIII, 1976, pp. 129-130 e nota 119).

Na jurisprudência encontrava-se idêntico sentido, como se alcança, exemplificativamente, do sumário do Ac. do STJ de 02/04/1975, BMJ 246, p. 157: «I – No silêncio do título, é nula a deliberação dos condóminos que estabeleça a possibilidade de alteração da comparticipação das despesas por decisão da assembleia geral; a modificação do regime fixado no art. 1424.º do Cód. Civil só é possível por acordo de todos os interessados e mediante escritura pública» - ênfases nossas.

Ao encontro do entendimento espelhado na doutrina e na decisão acabadas de referir, o DL 267/94 introduziu no art. 1424º uma norma permitindo que as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum possam, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação. 

Esta norma do nº 2 introduzida em 1994 veio permitir de forma expressa que os condóminos conformem de modo diferente do estabelecido no nº 1 a sua participação no pagamento de despesas relativas a serviços de interesse comum. Este nº 2 passou a possibilitar o afastamento da regra do nº 1 no que respeita ao pagamento daquelas despesas, desde que tal afastamento seja feito por disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio. Ainda assim, a disciplina do regulamento apenas poderá ter uma de duas soluções: ou as despesas ficam a cargo dos condóminos em partes iguais ou ficam a cargo dos condóminos na proporção da respetiva fruição. Acresce ainda um requisito: que as despesas fiquem devidamente especificadas e que sejam justificados os critérios que determinam a sua imputação.

Com a alteração de 1994, a lei passou a admitir que a regra da proporcionalidade fosse afastada – ainda que apenas em relação ao pagamento de serviços de interesse comum (não quanto às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns que o nº 1 também prevê) –, não apenas por disposição (legal) em contrário, mas também mediante disposição do regulamento nos termos apertados previstos no novo nº 2 do mesmo art. 1424º.

«Disposição», como tantos outros termos, é uma palavra polissémica, mesmo considerando o estrito léxico jurídico. No Código Civil, encontramo-la essencialmente com dois significados que simplisticamente se podem reconduzir a «alienação» e «preceito», como passamos a justificar. Por um lado, encontramos a palavra associada aos poderes de usar e de prescindir da coisa por parte de quem tem o domínio sobre ela, nomeadamente com o significado de alienação ou oneração de bens ou direitos, como no âmbito dos art. 28º, nº 2, 39º, nº 4, 109º, 127º, 153º, nº 1, 197º, nº 1, 226º, nº 2, 274º, nº 1, 622º, nº 1, 764º, nº 1 e 819º. Trata-se nestes casos de exercer sobre bens e direitos atos que vão além da mera administração, designadamente dando-lhes destino que implica a mudança de titularidade. Não é este o significado que procuramos.

Por outro lado, encontramos «disposição» como preceito e, neste sentido, quase sempre como preceito ou norma legal. É de disposição legal que se trata, e de forma expressa – com a menção «legal» imediatamente a seguir a «disposição» – nos art. 4º, al. a), 14,º nº 1, 67º, 171º, nº 2, 262º, nº 2, 294º, 331º, nº 2, 375º, nº 3, 393º, nº 1, 483º, nº 1, 606º, etc. É também de disposição legal que se trata em casos como os dos art. 285º («as disposições dos artigos subsequentes»), 509º, nº 3 («nos termos desta disposição»), 773º, nº 2 («disposição do número anterior»). Por vezes refere-se «disposição especial», claramente com o sentido de norma especial, por confronto com a regra geral (art. 239º, 296º, 433º).

Ainda com o sentido de preceito, regra, por definição, disciplina abstratamente estatuída para situações futuras que se preveem de forma genérica, encontramos a palavra disposição por referência à estatutária ou regulamentar de pessoas coletivas (em geral, associações, fundações – nos art. 163º, nº 1, 171º, nº 2, 180º, 188º, nº 5), e afins (no caso do regulamento do condomínio – nos art. 1424º, nº 2, 1432º, nº 3, e 1435º, nº 4). 

O condomínio, enquanto entidade a que o direito reconhece uma parcela de personalidade, sem lhe atribuir personalidade jurídica, pertence ao conjunto das quase-pessoas colectivas, que a doutrina trata com designações várias – «pessoas rudimentares» (Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Parte Geral, Tomo III, Coimbra, Almedina, 2004, p. 521), «figura afim da pessoa coletiva» (Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, I, ..., Universidade Católica Editora, 2001, p. 536), «ente não personalizado» (Oliveira Ascensão, Teoria Geral do Direito Civil, I, ..., ULFD, 1984/85, p. 274).

A expressão «salvo disposição em contrário» surge, claramente com o significado de «salvo norma legal em contrário», nos seguintes art. do CC: no art. 123º, «salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos»; no art. 298º, nº 3, «os direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, enfiteuse, superfície e servidão não prescrevem, mas podem extinguir-se pelo não uso nos caos especialmente previstos na lei, sendo aplicáveis nesses casos, na falta de disposição em contrário, as regras da caducidade»; no art. 570º, nº 2, «se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar»; no art. 750º, «salvo disposição em contrário, no caso de conflito entre o privilégio mobiliário especial e um direito de terceiro, prevalece o que mais cedo se houver adquirido»; no art. 1287º, «a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação»; no art. 1588º, «o casamento católico rege‐se, quando aos efeitos civis, pelas normas comuns deste código, salvo disposição em contrário».

Os significados de «disposição» que encontramos no Código são alguns daqueles que encontramos nos dicionários gerais. Não encontramos nestes nem no Código «disposição» como parte do conteúdo de um acordo contratual. Quando o Código se refere a tal, fala em «cláusula» ou em «estipulação». Em abono da nossa conclusão, repare-se:

i) quando o CC ressalva acordo das partes, a expressão utilizada é «salvo estipulação em contrário», como, entre outros, sucede nos art. 274º, nº 1, 420º, 448º, nº 1, 550º, 852º, nº 1, 862º, 882º, nº 2, 921º, nº 3, 1046º, 1073º, nº 2, 1074º, nº 1 e 5, 1096º, 1138º, nº 2, 1183º; 

ii) o Código distingue claramente «disposição» e «estipulação» no sentido que expusemos, como sucede nos art. 393º, nº 1 («por disposição da lei ou estipulação das partes»), 772º, nº 1 («Na falta de estipulação ou disposição especial da lei») ou 777º, nº 1 («Na falta de estipulação ou disposição especial da lei»). 

Exercício análogo ao que acabámos de fazer nas últimas páginas encontra-se em Rui Pinto Duarte, anotação ao art. 1424, in Código Civil Anotado, II, Artigos 1251.º a 2334.º, Ana Prata (coord.), Almedina, 2017, pp. 258-9, com conclusão no sentido de a «disposição» referida no nº 1 do art. 1424º ser disposição legal ou disposição do título constitutivo, incluindo do regulamento constante do título constitutivo: «A conjugação do nº 1 do art. 1424º com o n.º 2 do mesmo artigo e com o art. 1418º, .s 1 e 2, leva-nos a pensar que, no caso em apreço, a expressão “salvo disposição em contrário” abrange tanto disposições legais como disposições do título constitutivo, incluindo do regulamento do condomínio que aquele título contenha. Não julgamos que se deva entender que a expressão abrange também disposições de regulamentos de condomínio não constantes do título constitutivo (resultantes de deliberação dos condóminos ou de ato do administrador) ou de (outras) deliberações dos condóminos».

As normas dos nº 1, 3, 4 e 5 do art. 1424º do CC são normas jurídicas precetivas, que contêm preceitos, regras de proceder, formas de agir nas circunstâncias que elas próprias preveem (sobre as classificações das regras, v. sobretudo José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e teoria geral, 3.ª ed., ..., Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 433-55). 

As normas precetivas têm, por defeito, carácter imperativo. E assim sucede com estas, pois o nº 1 apenas permite o seu afastamento por disposição em contrário, sendo os nº 3, 4 e 5 as tais disposições que excecionam a regra do nº 1. O nº 2, que se inicia com a adversativa «porém», dando assim indicação de que também vai excecionar a regra do nº 1, autoriza que, dentro de certos limites de quórum e requisitos de conteúdo, parte das despesas a que o nº 1 se reporta, tenham diferente disciplina.

O elemento literal das normas do art. 1424º dá-nos a indicação clara, por tudo quanto fomos dizendo, que as regras dos nº 3 e 4 (que são as relevantes no nosso caso) não podem ser afastadas por decisão de condóminos. Também avançámos com razões históricas que nos permitem perceber o nº 2; a simples existência deste enfatiza que qualquer afastamento das demais regras do art. 1424º, que não por via de disposição legal, apenas pode acontecer nos estritos parâmetros definidos pelo nº 2.

Há razões fortes para que assim seja, entrando agora noutros elementos da interpretação das normas, nomeadamente no lógico e no teleológico. Na PH estão em permanente tensão interesses individuais de cada condómino e interesses comuns a todos ou a grupos de condóminos. Idealmente, cada condómino está interessado na melhor (já de si discutível) preservação das partes comuns, mas tanto não significa que todos partilhem a mesma ideia sobre a melhor forma se atingir essa preservação e, nomeadamente, que todos concordem com a medida em que cada um deve contribuir para as despesas referentes a partes comuns. 

É sobretudo a respeito destas que se defrontam interesses financeiros individuais e interesses coletivos de pagamento das despesas necessárias ao bom estado das partes comuns. Não podia o legislador deixar (como não deixou) nas mãos da maioria dos condóminos a atribuição das despesas a cada um, sob pena de os condóminos minoritários serem esmagados por interesses estritamente económicos da maioria. O que teria nefastas consequências sociais, quer ao nível de cada núcleo habitacional (conflitos entre condóminos, com inerentes perdas na qualidade de vida dos mesmos), quer ao nível social mais alargado, com necessários reflexos na litigiosidade, na conservação do património construído, e na atração e valorização dos imóveis em propriedade horizontal.

No campo estritamente contratual, graças ao princípio de ampla liberdade, positivado no art. 405º do CC, as regras que disciplinam os tipos são, em geral, supletivas, ou seja, aplicam-se quando as partes nada estipulem em contrário e haja necessidade de regular aspetos que não previram (para a distinção entre normas imperativas e supletivas, v., além de Oliveira Ascensão, cit., pp. 441-6, Jorge Morais Carvalho, Os limites à liberdade contratual, Almedina, 2016, pp. 174-9).

As deliberações das assembleias de condóminos estão num nível regulatório diferente dos contratos na medida em que podem ser tomadas sem intervenção de todos os interessados e, especialmente quando digam respeito ao regulamento do condomínio, mesmo que tomadas por todos os condóminos, podem afectar terceiros, futuros condóminos, que sobre elas não puderam pronunciar-se. Como tal, a lei não pode deixar ao acaso, nas mãos de parte dos condóminos existentes em dado momento, uma regulação que afectará outros, inclusivamente pessoas que só em momento futuro farão parte do condomínio.

Aqui chegados, concluímos que a norma do nº 1 do art. 1424º (proporcionalidade do valor das frações no pagamento das despesas) apenas pode ser afastada nos termos do nº 2 e é excecionada pelas regras dos nº 3 e 4. Uma repartição de despesas diferente da prevista no art. 1424º, nº 1, só é possível mediante disposição do regulamento do condomínio, aprovado sem oposição por maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio. Não basta uma mera deliberação da assembleia (assim também, Sandra Passinhas, cit., p. 284).

As regras dos nº 3 e 4 do art. 1424º excecionam a regra da proporcionalidade para certas despesas, acautelando interesses de condóminos que, quando minoritários, poderiam doutro modo ver-se na contingência de ter de suportar despesas para as quais nada contribuem e das quais não podem sequer tirar proveito. São, pois, normas imperativas cujo afastamento não é possível, nem sequer dentro apertados requisitos estabelecidos pelo nº 2 (que, no caso sub judice, de todo o modo não se verificam).

A norma do nº 2 do art. 1424º possibilita o afastamento da regra da proporcionalidade, por disposição do regulamento do condomínio aprovada nos moldes já referidos, no que respeita a algumas despesas englobadas no nº 1, mais concretamente às «despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum». Pela sua inserção sistemática e pelo seu conteúdo, a norma do nº 2 não possibilita o afastamento da disciplina dos nº 3 e 4, que não respeitam ao pagamento de serviços de interesse comum, mas de serviços de interesse exclusivo de parte dos condóminos.

Ainda que tivéssemos outro entendimento – ou seja, ainda que entendêssemos que as regras dos nº 3 e 4 podiam ser afastadas nos termos do nº 2 –, no caso dos autos o resultado seria o mesmo, uma vez que as deliberações plasmadas nas actas dadas à execução não respeitam os requisitos do nº 2, nomeadamente: não foram tomadas por maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio, não resultaram em disposição do regulamento do condomínio, não determinam a contribuição paritária nem na proporção da fruição.

Nem se compreenderia, repetimos, que as normas sobre repartição de despesas relativas a partes comuns dos prédios em PH pudessem estar na disponibilidade dos condóminos (além do estritamente regulado no nº 2 do art. 1424º), pois o condomínio corresponde a um conjunto de interesses individuais potencialmente conflituantes, alguns minoritários, que ficariam constantemente prejudicados pela imposição de repartições de despesas favoráveis às maiorias, conduzindo a situações de necessário conflito, com repercussões importantes no bem-estar social, além de prováveis consequências ao nível da própria conservação do património construído que a todos interessa.

Aqui chegados importa averiguar qual é a sanção prevista para a violação das regras dos nº 3 e 4 do art. 1424º do CC.

4/24/2021

Valor probatório das actas

A acta constitui um requisito de eficácia dos actos da assembleia dos condóminos, que são praticados oralmente, sendo o único meio de prova das decisões tomadas na reunião da assembleia dos condóminos.

A força executiva das actas do condomínio estende-se a todos os condóminos, mesmo que não tenham estado presentes na assembleia, e quer tenham votado ou não favoravelmente a deliberação aprovada, e quer tenham assinado ou não a acta, uma vez que a força executiva da acta não tem a ver com a assunção pessoal da obrigação consubstanciada na assinatura dela, mas sim com a eficácia imediata da vontade coletiva definida através da deliberação nos termos legais, exarada na acta.

A acta de uma assembleia de condominos não deixa de ser válida, e constituir título executivo, mesmo que não contenha todas as assinaturas a que alude o art. 1º, nº 1, do DL nº 268/94 de 25/10. As deliberações da assembleia dos condóminos, devidamente lavradas ou consignadas em acta, são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções autónomas (cfr. art. 1º nº 2 do DL nº 268/1994, de 25/10).

O nº 1 do art. 1º do mesmo diploma estatui que “são obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado”. Ora, não sendo a acta assinada por todos os condóminos que participaram na assembleia, coloca-se a questão de saber se a mesma pode valer como acta, designadamente para efeitos do disposto no art. 6º do citado diploma legal. A resposta deverá ser afirmativa.

Dir-se-á, em primeiro lugar, que a lei não sanciona expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia. Designadamente, não comina com a inexistência, ineficácia ou nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas.
E afigura-se não ser aqui aplicável a disciplina que rege as sociedades comerciais, pois está-se perante um instituto (propriedade horizontal) com regime específico do direito civil. 

De qualquer modo, o CSC não deixa de considerar o documento como acta, nem, sem mais, lhe retira a sua força probatória, quando aquela, devendo ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia, alguns deles o não façam, podendo fazê-lo (cfr. art. 63º, nº 3). De acordo com esse preceito, a exigência da assinatura por todos os sócios vem a converter-se, ao fim e ao cabo, “na exigência menor, juridicamente relevante, de assinatura apenas pela maioria dos sócios presentes”.

Por outro lado, é de salientar que, “uma vez aprovadas e exaradas em acta, as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para todos os condóminos, mesmo para os que não tenham participado na reunião (...)”[P. de Lima e A. Varela, CC anotado, III, 2ª ed., 446; Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 173; Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 257]. Ou seja, a acta a que se refere o DL nº 268/94 é também vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia, como resulta do disposto no nº 2 do art. 1º deste diploma. Ponto é que as deliberações sejam devidamente comunicadas aos condóminos ausentes, como, de resto, o impõe o nº 6 do art. 1432º do CC.

Ora, não se compreenderia tal regime relativamente aos condóminos ausentes e não se considerar a acta válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta. O entendimento seguido conduziria a que – porque ninguém pode ser materialmente obrigado a assinar um acta - qualquer condómino poderia obstar continuamente à validade das decisões da assembleia. Bastaria, para tanto, e como escreve o ilustre conselheiro Aragão Seia [Ob. e loc. Cit], que um condómino se recusasse a assinar a acta. O que seria inaceitável.

Para este autor, o condómino que se recuse a assinar a acta deve, em última instância, ser notificado “como se de ausente se tratasse”, podendo, nesse caso, “vir a impugnar as deliberações, verificados os necessários pressupostos, ou arguir a falsidade da acta em tribunal”. E, segundo o Ac. do TRP de 26.10.98, proc. nº 9850708, in www.dgsi.pt, “a acta da assembleia de condóminos constitui título executivo, nos termos do art. 6º do D.L. nº 268/94, mesmo que o condómino devedor não tenha estado presente na assembleia ou se tenha recusado a assinar a acta”.

Ora, não se vê qualquer razão para a acta não tenha igual força e natureza quando os condóminos, por qualquer outro motivo, não tenham assinado a acta. Se “a acta da assembleia de condóminos onde está fixada a obrigação de pagamento para as despesas comuns do prédio constitui título executivo, ainda que o condómino não tenha estado presente nessa assembleia” [Ac. da TRC, de 29.6.99, CJ, 1999, III, 43], por maioria de razão tal acta valerá como tal e constituirá título executivo no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, não assinaram a acta, por se haverem recusado a tal ou por outro motivo. É que “a força executiva da acta não tem a ver com a assunção pessoal da obrigação consubstanciada na assinatura dela, mas sim com a eficácia imediata da vontade colectiva, definida através da deliberação nos termos legais, exarada em acta” (Aragão Seia [Ob. cit., p. 198] e citado Ac. da RC, de 29.6.99).

Assim sendo, dever-se-á concluir, como neste último acórdão, que a acta a que se refere o art. 6º, nº 1 do DL 268/94 constitui título executivo contra o proprietário que deixa de pagar, tenha participado ou não na assembleia de condóminos e tenha ou não assinado a acta. Também segundo o Ac. da TRP, de 19.3.2001, in www.dgsi.pt (processo nº 0051128) “a acta da assembleia de condóminos (...) que deliberou a realização de obras em partes comuns, por certa quantia global, sem especificação do valor a pagar por cada condómino, embora não esteja por eles assinada, é título executivo”.

Para constituir título executivo, a acta da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, não dependendo, pois, a respectiva força executiva, da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes), nem de, nela, ser explicitado aquele valor. Conclui-se portanto, que a acta não deixa de ser válida, e constituir título executivo, mesmo que não contenha todas as assinaturas a que alude o art. 1º, nº 1, do DL nº 268/94.

Uma vez aprovadas e exaradas em acta, as deliberações da assembleia de condóminos representam a vontade colegial e são vinculativas para todos os condóminos (e terceiros titulares de direitos sobre as fracções) – mesmo para os que não tenham participado na reunião ou que, participando, se abstiveram de votar ou votaram contra –, e ainda para aqueles que ingressem no condomínio após a sua aprovação.

Se o texto da mesma contiver erros, imprecisões, ou matérias estranhas à reunião ou deliberações, pode o condómino ilidi-la nos termos da lei.

O Juiz Conselheiro Aragão Seia (Propriedade horizontal, Almedina, 2ª edição, páginas 172 a 175) defende que a acta “é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular – art. 376º. (…) A recusa de um condómino em assinar a acta não pode decretar a invalidade da deliberação. Se assim fosse, encontrado estava um meio de qualquer condómino obstar continuamente à validade das decisões da assembleia. Recusando-se um condómino a assinar deve ser isso consignado na acta, sendo assinada pelos demais que hajam participado na assembleia. 

É, aliás, o que acontece quando um condómino sai no decurso desta, antes de lavrada e assinada a acta. Se se recusa a assinar, depois de elaborada a acta e assinada pelos demais, deve-se lavrar um “em tempo”, assinado por todos os outros condóminos que participaram na assembleia. Se já não for possível colher a assinatura de todos os que assinaram a acta deve ser notificado como se de ausente se tratasse. Poderá, assim, vir a impugnar as deliberações, verificados os necessários pressupostos, ou a arguir a falsidade da acta em tribunal”.

A jurisprudência conhecida tem, quase unanimemente, defendido que a acta da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem e a falta de assinatura de condóminos que nela participaram é uma mera irregularidade que, não sendo oportunamente reclamada, não afecta a deliberação tomada nem a exequibilidade do título. Apela-se para o preâmbulo do Dec.-Lei nº 268/94, onde se diz que o mesmo teve como objectivo “procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”. 

Defende-se que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no art. 334º do CC, porque a ela deu causa ou não quis remediar. Lembra-se que nos termos do disposto no art. 1413º do CC as deliberações contrárias ou não à lei ou regulamentos anteriormente aprovados tornam-se definitivas se não for requerida a anulação por qualquer condómino que as não tenha aprovado nos prazos e pelo modo aí referidos. 

Tornando-se definitivas, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções – nº 2 do art. 1º do DL nº 268/94. Realça-se que a lei não sancionou expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia. Designadamente, não comina com a inexistência, ineficácia ou nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas. 

Mais se diz que não se compreenderia que a acta seja vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia (uma vez que lhes sejam comunicadas) e não se considerar a mesma válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta (cfr., v.g., Ac. do TRL, de 02.3.2004, processo 10468/2003-1; do TRP, 18.4.2006, processo 0621451, 18.12.2003, processo 0336205 – também in Col. Jur., ano XXVIII, tomo V, pág. 217 -, 06.3.2003, processo 0330883).

Se a acta da reunião contiver palavras emendadas, truncadas ou escritas sobre rasuras ou entrelinhas, com a devida ressalva manterá a sua força probatória. (cfr. art. 371º, nº 2, do CC). Se a acta da reunião contiver notas marginais, palavras entrelinhadas, rasuras, emendas ou outros vícios externos, com a devida ressalva, manter-se-á a sua força probatória. (cfr. art. 376º, nº 3, do CC).

A AG como órgão colegial

A propósito da pandemia, o website consultoriodocondominio, publicou a 29 de Janeiro de 2021, o artigo de opinião « Assembleias de condomínio vs Covid-19», onde se diz que, e passa-se a citar:

«Pedimos cuidado para a interpretação do Artigo 5º, número 1 da Lei 1º-A/2020, de 19 de março, com a redação mais recente pela Lei n.º 1-A/2021, de 13 de janeiro, que refere:

“A participação por meios telemáticos, designadamente vídeo ou teleconferência de membros de órgãos colegiais de entidades públicas ou privadas nas respetivas reuniões, não obsta ao regular funcionamento do órgão, designadamente no que respeita a quórum e a deliberações, devendo, contudo, ficar registado na respetiva ata a forma de participação.”

Portanto, não devemos confundir uma assembleia de uma associação, partido político, acionistas de uma empresa, entre outras, pois estas sim, são uma assembleia de um órgão colegial, como o próprio artigo informa, com regras e estatutos próprios de funcionamento.

A assembleia de condóminos não é exemplo de um órgão colegial.»

A assembleia de condóminos não é um órgão colegial?

Da Dra. Sandra Passinhas, Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, " As funções do administrador têm um carácter marcadamente executivo e prático, que não se coaduna com o funcionamento colegial da assembleia de condóminos; os poderes que o administrador tem de regulação da coisa comum exigem-lhe uma actividade autónoma e sustentada. (...) Só tal organização, que se revela, por exemplo, na deliberação colegial e no princípio maioritário, na existência de órgãos administrativos e de um regulamento condominial, determina a síntese da pluralidade dos interesses, transformando o interesse comum dos condóminos em interesse colectivo do condomínio, sem todavia excluir que esses interesses possam continuar a ser referidos ainda ao condómino na sua qualidade de membro do grupo."

Do Ac. do TRE de 22/10/1998: "É o administrador quem, no caso, tem legitimidade para agir em juízo, na sua qualidade legal de órgão executivo da assembleia de condóminos que é um órgão colegial constituído por todos os condóminos."

Do Ac. do TRP de 26/1/2006: "É à assembleia, órgão colegial composto por todos os condóminos, que compete decidir sobre os problemas do condomínio que se refiram às partes comuns, encontrando soluções para os resolver, delegando no administrador a sua execução e controlando o modo como este dela se desempenha. [Aragão Seia, “Propriedade Horizontal”, pág. 153]".

Do Ac. do STJ de 18/1/2007: "A administração das partes comuns do edifício, que pertencem em compropriedade aos condóminos, é assegurada pela assembleia de condóminos - n.º 1 do art. 1430.º CC, órgão colegial constituído por todos os condóminos, com carácter deliberativo, que tem poderes de controle, de aprovação e decisão sobre todos os actos de administração."

Do Ac. do TRC de 6/11/2012: "De acordo com o ensinamentos de Mota Pinto, in Direitos Reais, 1970/71, pag. 284, «a assembleia de condóminos é um órgão colegial constituído por todos os condóminos, com carácter deliberativo, que tem poderes de controle, de aprovação e decisão final sobre todos os actos de administração."

Do Ac. do TRL de 14/7/2014: "a administração das partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal, que pertencem em compropriedade aos condóminos (cfr. art. 1420, nº 1), é assegurada pela assembleia de condóminos, órgão colegial constituído por todos os condóminos, com caracter deliberativo, que tem poderes de controle, de aprovação e de decisão sobre todos os actos de administração. "

Do Ac. do TRC de 24/11/2016: "O condomínio, enquanto órgão colegial, está obrigado/vinculado às deliberações aprovadas em assembleia, pelo que quem tem interesse direto em contradizer no pleito, é o condomínio, e não cada condómino de per se."





4/23/2021

Assembleias online

O que é uma Assembleia online (virtual)?

Uma Assembleia online ou virtual é uma reunião de condóminos realizada no ambiente digital (rede de internet) através do uso de diversos meios telemáticos (aplicativos) disponibilizados gratuitamente por várias empresas, a qual, pode ser uma interessante alternativa às assembleias presenciais porquanto pode promover uma maior participação dos condóminos que assim não tem que sair do conforto do lar para se deslocarem ao local de realização da reunião plenária.

As assembleias virtuais vieram para ficar?

A era digital com os seus constantes avanços tecnológicos estão continuamente a modificar a forma como interagimos uns com os outros e com o mundo em geral, pelo que, os condomínios, para o seu regular funcionamento administrativo, podem e devem acompanhar esta evolução, podendo também as assembleia adaptar-se a esta nova realidade.

Quais são as vantagens?

As vantagens e benefícios atinentes à realização de assembleias virtuais têm-se muito superiores às eventuais desvantagens (a maior desvantagem será porventura o facto de alguns condóminos poderem não dominar esta nova tecnologia). Mas a maior vantagem será indubitavelmente a objectividade, porquanto, os condóminos terão que se focar nos pontos em discussão, tendo que fazer propostas, debater e votar de forma mais organizada, evitando-se outrossim, conversas laterais ou comentários descontextualizados.

Acresce sublinhar que esta metodologia promove uma maior participação dos condóminos, sendo que, nos países onde se tem consolidada esta prática, é referida a existência de uma notável convivência durante a realização da reunião plenária.

As assembleias de condomínio virtuais são legais?

Com a reforma operada pelo DL 76-A/2006 passou a existir a possibilidade de se realizarem Assembleias Gerais virtuais (leia-se, por meios telemáticos), nomeadamente através de videoconferência, a qual foi consagrada no art. 377º, nº 6, al. b) do CSC, podendo, assim, realizarem-se Assembleias Gerais através destes meios, desde que os estatutos da sociedade não o proíbam. No entanto, apesar deste artigo apenas dizer respeito às Sociedades Anónimas, por força do art. 248º, nº 1 do mesmo diploma, estende-se às Sociedades por Quotas.

No passado havia quem defendesse que a realização de assembleias de condomínio virtuais era uma prática não conforme à letra lei e portanto, passíveis de impugnação nos termos do art. 1433º do CC. De facto, o regime da propriedade horizontal tinha-se omisso nesta matéria, no entanto, mediante disposição contida no regulamento, aprovada em reunião plenária, por unanimidade, podiam os condóminos reunir-se nestes termos.

No mais, se dúvidas subsistissem, a Lei nº 1-A/2020, no seu art. 5º refere-se a “entidades públicas e privadas” dando a entender que o que se disse em relação às sociedades comerciais se aplica outrossim ao universo completo de pessoas coletivas, a não ser que os estatutos/regulamento destas proíbam a existência de assembleias gerais online. Mesmo que proibidos, e porque se vão buscar soluções para estas entidades privadas ao regime das sociedades comerciais supletivamente, pode permitir-se uma alteração ad hoc ao regulamento do condomínio, nos termos do art. 54º do CSC.

Como são feitas as convocatórias?

Nos termos do art. 1432º, nº 1 do CC, as assembleias são convocadas por meio de cartas registadas, enviadas com 10 dias de antecedência, sendo que a este meio se pode equiparar o envio do documento por meios telemáticos com assinatura electrónica qualificada, que assegure a sua efectiva recepção, nos termos do DL nº 290-D/99, que institui o regime jurídico dos documentos electrónicos e da assinatura digital. 

Isto significa que a convocatória poderá ser enviada por e-mail, desde que, (i) respeitando a antecedência fixada no nº 1 do art. 1432º do CC; (ii) informe que a assembleia geral de condóminos decorrerá através de videoconferência (indicando qual a plataforma, software ou aplicativo a usar e como efectuar o acesso); e (iii) seja assinada pela forma indicada e que contenha uma validação cronológica emitida por uma entidade certificadora (os CTT oferecem o serviço Marca do Dia Electrónica, por exemplo).

Como são enviados os documentos?

O art. 289º do CSC estabelece que, com pelo menos 15 dias de antecedência relativamente à data da assembleia, devem ser disponibilizados no site da sociedade – caso exista – os documentos e as informações preparatórios da Assembleia Geral ali mencionados, mas caso este não exista, poderá qualquer accionista requerer que estas informações lhe sejam enviadas no prazo de oito dias após a recepção do pedido, por correio electrónico. No entanto, o envio destas informações por correio electrónico não preclude a obrigação de se enviarem as informações em papel, se o sócio o solicitar.

No âmbito condominial pode-se aplicar, com as necessárias adaptações (não olvidar que na propriedade horizontal, a antecedência exigida é de apenas 10 dias) um idêntico regime, mediante disposição contida no regulamento, aprovada nos termos do art. 1432º, nº 3 do CC. Assim, conjuntamente com a convocatória, o administrador pode obrigar-se a enviar os documentos que lhe sejam exigidos e bem assim toda a informação preparatória da reunião.

Como decorre a assembleia virtual?

Nas assembleias virtuais propriamente ditas, não há qualquer reunião presencial dos condóminos, porquanto todos participam através de meios de comunicação remotos, porém, é possível que nem todos os condóminos tenham acesso a meios telemáticos para participarem nas reuniões, questão que terá de ser acautelada, através da realização de uma assembleia geral mista (reunião presencial para os condóminos que pretendam participar presencialmente por não terem acesso a sistemas de videoconferência, cumulada com a permissão de assistência e participação dos restantes condóminos através de sistema de videoconferência).

Caso os condomínios pretendam optar por este tipo de assembleia torna-se necessário que os meios escolhidos permitam assegurar: (i) a autenticidade e a segurança das comunicações; e (ii) o registo integral da reunião, do seu conteúdo e dos respectivos intervenientes. Neste contexto, a utilização de meios telemáticos e a preocupação em registar a forma de participação foi também reforçada pela Lei nº 1-A/2020 que no respectivo art. 5º refere que “a participação por meios telemáticos, designadamente vídeo ou teleconferência de membros de órgãos colegiais de entidades públicas ou privadas nas respectivas reuniões, não obsta ao regular funcionamento do órgão, designadamente no que respeita ao quórum e às deliberações, devendo, contudo, ficar registado na respectiva acta a forma de participação”. Importa também sublinhar que a realização destas reuniões não pode prejudicar “o regular funcionamento do órgão”, ou seja, a colegialidade da assembleia, pelo que se se verificar interrupção da transmissão por problemas técnicos ou hackers, isso pode determinar a invalidade das deliberações tomadas em plenário.

Destarte, sendo possível a reunião em assembleias gerais utilizando estes meios, colocam-se uma série de questões, pois a realização de reuniões por meios telemáticos tem riscos, e tem uma grande capacidade para litígios, nomeadamente a possibilidade de violação do direito à participação na assembleia de todos os condóminos em condições de participação, discussão e votação e a violação das regras de segurança, autenticidade, identificação dos representantes dos condóminos ou de terceiros titulares de direitos sobre as fracções e registo da reunião. Isto pode levar à consequente invalidade das deliberações tomadas.

No caso de quem assista por videoconferência, numa assembleia virtual ou numa assembleia mista, nos termos da lei, é necessário: (i) assegurar a possibilidade de cada condómino intervir plenamente na reunião, permitindo-se-lhe colocar questões, fazer propostas e votar; (ii) garantir a segurança da videoconferência e verificar a qualidade e a identidade dos participantes na assembleia; e (iii) assegurar a gravação, de modo a poder registar-se o conteúdo da reunião.

Neste caso, para se garantir a autenticidade das declarações e se verificar a identidade dos condóminos importa realizar-se uma verificação visual, que deve ficar registada para comprovar que aqueles condóminos estiveram presentes na reunião e nela participaram. Este expediente pode substituir a tradicional lista de presenças. Quanto ao registo do conteúdo da assembleia através da gravação integral da mesma, atendendo que pode interferir com a protecção de dados pessoais e com a invasão na vida privada dos condóminos, o registo pode ser feito apenas em formato áudio, a não ser quando o regulamento consinta o registo em formato vídeo.

Em relação aos condóminos que pretendam ser representados por via de mandato, estes deverão enviar por correio electrónico ou carta registada uma competente procuração ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral, assinada ou com assinatura digital, e este documento deve ser aceite pelo mesmo como representação válida. 
 
Finalmente, para que a reunião decorra com a maior normalidade possível e sem precalços ou confusões, é aconselhável que o Presidente da Mesa da Assembleia Geral elabore previamente um Regimento que tenha por objecto estabelecer as normas de organização e disciplinar o funcionamento da reunião plenária.
 
Como são feitas as votações?
 
Os votos terão necessariamente que ser efectuados de forma verbal e verificação visual, sendo assim emitidos em tempo real durante a realização da assembleia geral virtual, não sendo portanto admitidos votos por correspondência, através de meios electrónicos ou por deliberação por escrito. Para este efeito, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral, procederá à chamada ordenada dos condóminos através das letras correspondentes à ordem alfabética utilizada na descrição das fracções constante do registo predial. 
 
Como são lavradas as actas?
 
A redacção das actas das assembleias virtuais não carece de exigências especiais (sendo lavradas como as de qualquer reunião presencial - aliás, com o uso de actas avulsas, estas já se têm feitas em registo informático), excepto no que concerne à necessidade de se ressalvar a forma como foi realizada a reunião e como foram cumpridas as exigidas formalidades legais.

O nº 1 do art. 1º do DL 268/94 de 25/10 estabelece ques actas após lavradas e assinadas pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral e subsequentemente subscritas por todos os condóminos que tenham estado presentes na assembleia, devendo posteriormente serr enviadas cópias aos ausentes (cfr. art. 1432º nº 6 do CC), pelo que, este constrangimento pode ser ultrapassado, (i) enviando-se a acta, nos termos havidos fixados no citado preceito para todos os condómibos, sem excepção, ou enviando-se por correio electronico, para que os condóminos possam apor uma assinatura digital (continuando a exigir-se o envio para os ausentes).