"Nos termos da al. g) estão sujeitos a um prazo de prescrição de 5 anos, entre outros, os créditos relativos a “prestações periodicamente renováveis”. Interessa pois determinar o que se deve entender por prestações periodicamente renováveis para efeitos desta norma.Em função da influência do tempo sobre o seu objecto, é costume distinguir, usando a terminologia de Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, p. 85 e ss., entre as prestações instantâneas, as prestações duradouras e as prestações fraccionadas ou repartidas.As prestações instantâneas são aquelas cujo objecto é realizado num único momento, ou seja, o comportamento exigível do devedor esgota-se num só momento (quae único actu perficiuntur). Ao invés, nas prestações duradouras a prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória uma influência decisiva na conformação global da prestação, ou seja, não só o devedor é chamado a efectuar diversos actos para satisfação do direito de crédito do credor, como a extensão desses actos depende decisivamente do factor tempo.Dentro das obrigações duradouras distinguem-se ainda as prestações de execução continuada, que são aquelas cujo cumprimento é feito continuamente ao longo do tempo, e as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo que são aquelas que se renovam no fim de períodos temporais consecutivos, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos.Existem ainda prestações fraccionadas ou repartidas que são aquelas cujo cumprimento se protela no tempo mas em que o facto tempo não tem influência sobre o objecto da prestação mas apenas sobre o modo da sua execução, isto é, o objecto da prestação foi fixado previamente e permanece inalterado ainda que, por acordo das partes, o seu cumprimento deva ser feito ao longo de tempo, em momentos separados dividido em fracções ou parcelas.Quando a al. g) do art. 310º do CC se refere a prestações periodicamente renováveis está pois a reportar-se às prestações emergentes de obrigações duradouras que se classificam como prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, como é o caso da prestação de pagamento da renda a cargo do arrendatário ou da prestação de pagamento do consumidor de água ou electricidade a cargo do adquirente no contrato de fornecimento desse bens.As prestações relativas ao pagamento das despesas comuns do condomínio que incumbem ao condómino são prestações periodicamente renováveis?Numa primeira aproximação, a resposta tende a ser afirmativa. Com efeito, essas despesas são normalmente relativas a encargos com a limpeza e a segurança do prédio, o seguro, a aquisição de água e electricidade para as necessidades e zonas comuns, os contratos de manutenção dos serviços comuns como os elevadores e os equipamentos energéticos. Tais despesas têm como causa bens e serviços utilizados ou produzidos quotidianamente, de forma paulatina mas constante, pelo que não apenas o respectivo custo está associado ao decurso do tempo e dele depende essencialmente, como a obrigação de as suportar se renova no fim de períodos temporais consecutivos, em regra a anuidade, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos (ainda que o regulamento do condomínio possa estabelecer que o pagamento pelo condómino seja feito, por exemplo, em duas prestações semestrais). Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os Acs. TRL de 22.4.2010, rel. Márcia Portela (p.º 5892/04.1YXLSB.L1-6), de 21.6.2011, rel. Amélia Ribeiro (pº 7855/07.6BOER-A.L1-7), da TRC de 14.11.06, rel. Artur Dias (p.º 3948/04.0TBAVR.C1), e da TRP de 27.05.2014, rel. Vieira Cura (pº 4393/11.6TBVLG-A.P1).Pode suceder que o condomínio delibere a prática de um acto isolado gerador de uma despesa singular, designadamente com uma obra extraordinária de conservação ou reparação. Nessa situação, ainda que a despesa seja objecto de inclusão no orçamento e de repartição pelos condóminos na proporção das respectivas quotas a acrescer às despesas correntes e normais, parece questionável que a obrigação de pagamento dessa despesa singular possa ser classificada como prestação periodicamente renovável. Daí que tal como se entendeu no Acórdão desta Relação de 14.09.2015, relatado por Carlos Gil (proc. n.º 388/11.8TJPRT-A.P1) e com o que se concorda em absoluto, “as despesas de conservação, ainda que impostas legalmente com uma periodicidade mínima, não são necessariamente periódicas pois que, se podem ser fixadas a forfait, para serem cobradas anualmente, na veste das denominadas quotizações de condomínio, podem ter carácter pontual determinado em função do concreto custo das obras em causa e do momento em que se decide efectuar certa obra.Como é sabido, a amplitude das obras de conservação necessárias em cada imóvel varia de acordo com uma multiplicidade de factores…. Daí que, por vezes, as contribuições do condomínio anualmente fixadas e o respectivo fundo comum de reserva não sejam suficientes para custear as obras de conservação necessárias em certo momento. (…) quando as obras de conservação têm carácter pontual e são adrede custeadas pelos condóminos e não a forfait, não é o tempo, o seu decurso que determina o custo de tais obras, mas sim as diversas vicissitudes relevantes para a sua concreta valorização…”.Resulta assim justificado que as prestações para pagamento das despesas comuns do condomínio podem ou não ser prestações periodicamente renováveis. Se o forem, em princípio estão sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos. Caso contrário, o prazo de prescrição da dívida é o prazo ordinário de vinte anos.Tendo a execução sido instaurada e estando incluídas na quantia exequenda dividas que se venceram mais de cinco anos antes (cfr. art. 323º, nº 2, do CC), aquela distinção carecia de ser concretizada. Porém, pelas razões que se explicam de seguida, isso não se mostra necessário para decidir a excepção.Vejamos porquê.Sob a epígrafe “direitos reconhecidos em sentença ou título executivo”, o art. 311º do CC, que sucede aos preceitos que fixam os prazos de prescrição ordinária (309.º) e de cinco anos (310.º), estatui o seguinte no seu nº 1:“O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição (…)”.
Viver em condomínio
22 julho 2024
Prescrição 5 e 20 anos
26 fevereiro 2022
Reverter a imputação das comparticipações
Para aprovação de imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra - ficarem as despesas de fruição e serviços comuns a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição -, é exigível que a deliberação seja aprovada por uma maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, sem qualquer oposição (cfr. nº 2 do art. 1424º do CC).
No entanto, após a alteração da forma de imputação das comparticipações, isto é, deixando-se de pagar na forma proporcional ao valor das respectivas fracções (percentagem ou permilagem), passando a fazer-se em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, caso no futuro se pretenda regressar ao regime regra de imputação das comparticipações condominiais de forma proporcional ao valor das respectivas fracções, isto é, deixando-se de pagar em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição para se regressar à forma proporcional ao valor das respectivas fracções, não é exigível a maioria qualificada de 2/3 sem oposição para reverter a alteração ao regime regra ao pagamento de despesas de condomínio, pois é incomparável a situação de a lei exigir tal maioria qualificada para a imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra (em função da permilagem, de acordo com o art. 1424º, nº 2 do CC), e exigi-la para o regresso ao regime regra.
Assim é, mesmo que a assembleia pretenda, neste âmbito, alterar anterior deliberação aprovada por maioria qualificada, pois as deliberações da assembleia de condóminos não “determinam um vínculo contratual permanente, e são sempre susceptíveis de revogação e de modificação, ainda que tomadas por unanimidade. A decisão da assembleia em sede de gestão é sempre contingente e transitória, e não pode precludir novas e diversas deliberações que possam surgir no decurso da vida do condomínio” (cfr. Sandra Passinhas, em “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, Almedina, 2ª ed., p. 246 a 247)”, isto é, não era aqui exigida a maioria qualificada, sendo incomparável a situação de a lei exigir uma maioria qualificada para a imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra (em função da permilagem, de acordo com o art. 1424º nº 2 do CC), e exigi-la para o regresso ao regime regra –, como, as deliberações das assembleias de condóminos que sejam contrárias à lei ou a regulamentos são anuláveis, nos termos do art. 1433º, nº 1 do CC, e não nulas, sem prejuízo de situações excepcionais, onde não se incluem as suscitadas nos embargos como pretende a recorrente, poderem implicar a nulidade ou até a inexistência – como vem sendo maioritariamente sustentado na doutrina e jurisprudência.
A boa fé comporta dois sentidos principais: no primeiro, é essencialmente um estado ou situação de espírito que se traduz no convencimento da licitude de certo comportamento ou na ignorância da sua ilicitude; no segundo, apresenta-se como princípio de actuação, significando que as pessoas devem ter um comportamento honesto, correcto e leal, nomeadamente no exercício de direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa dos outros. Os bons costumes constituem o conjunto de regras de convivência que, num dado ambiente e em certo momento, as pessoas honestas e correctas aceitam comummente. O fim social e económico do direito é a função instrumental própria do direito, a justificação da respectiva atribuição pela lei ao seu titular.
15 fevereiro 2022
Excepção de não cumprimento
Assim, num contrato bilateral, em que não haja prazos diferentes para a realização das prestações, é atribuída a qualquer das partes a faculdade de recusar realizar a sua prestação enquanto a contraparte não efectuar a que lhe compete ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
A excepção de não cumprimento do contrato não nega o direito ao cumprimento da prestação nem afasta o dever de a cumprir, consagrando-se apenas o efeito dilatório de um dos contraentes realizar a sua prestação em momento posterior, isto é, quando receber a contra-prestação a que tem direito.
Mesmo estando o cumprimento das obrigações sujeito a prazos diferentes, a excepção de não cumprimento do contrato poderá ser sempre invocada pelo contraente cuja prestação deva ser efectuada depois da do outro, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que deva cumprir primeiro.
Neste sentido, decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães, através do Acórdão proferido em 3711/2016 que:
Não actua em abuso de direito (art. 334º do C.C.) o condómino que recusa o pagamento de prestações de condomínio no valor global de € 7.350,06, reportadas ao período de 2010 a 2015, inclusive, enquanto o condomínio não efectuar obras de impermeabilização da cobertura do edifício, por forma a fazer cessar as infiltrações, humidades e escorrências que, desde 2009, impedem a utilização conveniente das três fracções que possui no último piso - superior - do mesmo."
"I - As despesas condominiais, apesar de constituírem obrigações propter rem, que decorrem do estatuto de um direito real , consubstanciam em última análise e no plano dogmático “verdadeiras obrigações”, razão porque, desde que reunidos os necessários pressupostos, nada obsta a que os condóminos possam invocar quanto ao seu pagamento a exceptio non adimpleti contractus.
II – Para que lícito seja ao condómino devedor invocar a exceptio non adimpleti contractus para suspender o pagamento de prestações/contribuições condominiais vencidas, necessário é que entre estas últimas e as prestações das quais se arroga credor em relação ao condomínio, exista uma relação de sinalagma funcional, ou seja, estejam ambas ligadas por um nexo de correspectividade e interdependência."
18 janeiro 2022
A excepção de não cumprimento
No entanto porém, existem excepções à regra, isto é, existem algumas (poucas) situações nas quais, os condóminos podem furtar-se à obrigação do cumprimento, sem com isso, incorrerem em incumprimento e nas sanções previstas para o mesmo, como por exemplo, no caso replicado infra, do Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 3/11/2016, que ensina:
"A excepção de não cumprimento do contrato (cfr. art. 428º do CC) é aplicável, não apenas aos contratos bilaterais, mas as todos os casos em que, por força da lei, se crie entre as partes uma situação análoga, o que nomeadamente sucederá perante obrigações proper rem, como a obrigação do condómino participar nas despesas de conservação e fruição das partes comuns do edifício (uma vez que o sinalagma que é fundamento do funcionamento da exceptio tem mais relação com o aspecto funcional do que com o aspecto genético das obrigações em causa).
Nesta conformidade, não actua em abuso de direito (cfr. art. 334º do CC), por exemplo, um condómino que se recuse o pagamento de prestações de condomínio (v.g. quotas mensais) reportadas a um determinado período de meses ou anos, enquanto o condomínio, não efectuar obras de impermeabilização da cobertura do edifício, por forma a fazer cessar as infiltrações, humidades e escorrências que, desde esse mesmo período de incumprimento, impedem a utilização conveniente da sua fracção autónoma".
Nesta conformidade, lê-se, a propósito, no art. 428º, nº 1 do CC que, «se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo», logo, o funcionamento da exceptio non adimpleti contractus a que se refere este artigo pressupõe a existência de um contrato com prestações correspectivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra (o que se verifica nos chamados contratos bilaterais ou sinalagmáticos).
Por outras palavras, mercê da sua própria natureza, esta excepção é aplicável apenas aos contratos bilaterais com obrigações reciprocamente interligadas por um sinalagma genético-funcional, já que só aí o contraente fiel pode sustar o cumprimento da sua prestação como meio idóneo de coagir a contraparte a cumprir também a sua prestação sinalagmática. Mas pressupõe igualmente que não estejam fixados prazos diferentes para as prestações, já que, devendo uma delas ser cumprida antes da outra, a exceptio não teria razão de ser.
Contudo, «a fórmula legal “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimentos das prestações” não é inteiramente rigorosa, pois o que a excepção supõe é que um dos contraentes não esteja obrigado, pela lei ou pelo contrato, a cumprir a sua obrigação antes do outro: se não estiver, pode ele, sendo-lhe exigida a prestação, recusá-la, enquanto não for efectuada a contraprestação ou lhe não for oferecido o cumprimento simultâneo desta. Por conseguinte, a excepção pode ser oposta ainda que haja vencimentos diferentes, dado poder sê-lo pelo contraente cuja prestação deva ser feita depois da do outro contraente, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro» (cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 105, pag. 283, e ano 108, pag. 155).
Vem-se, ainda, precisando que, sendo os contratos bilaterais o âmbito natural da excepção de não cumprimento, a mesma poder-se-á ainda aplicar a outras situações em que se esteja perante obrigações que se justifiquem reciprocamente, não necessariamente por um sinalagma genético (em que a correspectividade se refere ao momento constitutivo, não podendo uma obrigação surgir sem a outra), mas sim por um sinalagma funcional (em que a correspectividade se refere a obrigações já constituídas, significando que elas se vão desenvolver solidariamente).
Será precisamente esse o caso das obrigações reais ou propter rem, isto é, das obrigações a que o respectivo titular está vinculado, não por via de um contrato, mas por ser titular de um determinado direito real, que não deixam por isso de consubstanciar verdadeiras relações obrigacionais (cfr. Rui Pinto Duarte, Curso de Direitos Reais, pag. 21).
Com efeito, «o entendimento de que as obrigações “propter rem” fazem parte do conteúdo do “ius in re” não significa que, por esse motivo, elas devam ser qualificadas como relações de natureza real, ou de natureza mista, ou como figuras de fronteira entre os “iura in re” e as obrigações. Estruturalmente, é de verdadeiras obrigações que se trata, ou seja, de vínculos jurídicos por virtude dos quais uma pessoa, na qualidade de titular de um direito real, fica adstrita a realizar uma prestação em benefício de outra» (cfr. M. Henrique Mesquita, Obrigações Reais e Ónus Reais, pag. 102 e 103).
Logo, apesar da letra do art. 428º do CC e da sua inserção na disciplina dos contratos, poder inculcar o contrário, definindo o art. 397º do mesmo diploma a obrigação sem fazer qualquer menção à sua origem, admite-se que a excepção de não cumprimento seja aplicável às obrigações propter rem, uma vez que o sinalagma que é fundamento do funcionamento da exceptio tem mais relação com o aspecto funcional do que com o aspecto genético das obrigações em causa, isto é, mais com a reciprocidade das obrigações do que com a sua origem (cfr. Ac. da RL, de 08.05.2008, Pedro Lima Gonçalves, Processo nº 1824/2008-8. No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406, Almeida Costa, RLJ, ano 119, p. 143, e Menezes Cordeiro, Da Boa Fé no Direito Civil, Vol. II, p. 847. Na jurisprudência, e em sede da obrigação do condómino concorrer para os encargos de conservação e fruição de partes comuns de um edifício, verdadeira obrigação propter rem, Ac. da RP, de 01.04.1993, CJ, Ano 1993, Tomo II, p. 201, e Ac. da RL, de 09.05.1996, CJ, Ano 1996, Tomo III, p. 87).
Desta forma, pode «dizer-se, de um modo geral, que a “exceptio” tem ainda aplicação nos casos em que, por força da própria lei, embora contra a vontade das partes, se cria entre elas uma situação análoga à proveniente de um contrato bilateral» (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 1979, pag. 271, nota 3). Dir-se-á assim, agora com maior rigor, que a excepção peremptória de não cumprimento do contrato é uma excepção de direito material, que se destina a permitir que o contraente fiel não cumpra enquanto o contraente faltoso não cumprir também. Não legítima, por isso, o incumprimento definitivo do contrato pelo contraente fiel, mas apenas o cumprimento dilatório do contraente fiel como forma de coagir o contraente faltoso a cumprir também aquilo que tem que cumprir. Pressupõe, por isso, que o cumprimento das obrigações interconexionadas ou seja simultâneo, ou que a obrigação do excipiente deva ser cumprida em último lugar já que então - à data do respectivo adimplemento - ele sabe se a contraparte cumpriu, ou não a prestação, a que está vinculada (cfr. Ac. do STJ, de 18.02.2003, Azevedo Ramos, CJ AcSTJ, Ano 2003, Tomo I, p. 103-106; e Ac. do STJ, de 18.11.2004, Borges Soeiro, in www.dgsi.pt).
Logo, «a exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral. Por isso ela vigora, não só quando a outra parte não efectua a sua prestação por que não quer, mas também quando ela a não realiza ou a não oferece porque não pode» (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406).
Compreende-se, assim, que se afirme que «a excepção do contrato não cumprido não pressupõe a culpa do devedor da contraprestação no seu atraso. A inexecução por parte deste pode ser-lhe imputável ou não, isto é, tanto pode ele constituir-se em mora como não. Ainda que o incumprimento não lhe seja imputável, antes obedeça a circunstâncias fortuitas, independentes da vontade, a excepção é invocável pelo outro contraente» (cfr. João José Abrantes, A excepção de não cumprimento do contrato no Direito Civil, p. 88).
Também no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso é comummente aceite pela doutrina o recurso à exeptio non rite adimpleti contractus: a mesma «vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227º e 762º, nº 2», ambos do C.C. (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4ª Edição, p. 406).
Com efeito, a doutrina e a jurisprudência têm realçado que, no aferir da legitimidade da invocação da excepção de não cumprimento do contrato, importa ponderar: a regra da boa fé; e a verificação da proporcionalidade (ou do equilíbrio) entre as prestações. É que, por um lado, «seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo»; e, por outro, «na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quando se torne necessário para garantir o seu direito» (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, «Anotação ao Ac, do STJ, de 11 de Novembro de 1984», RLJ, ano 119, 1986/1987, p. 144).
Assente, e face à sua invocação, o contraente a quem é oposta a excepção do não cumprimento tem de provar que cumpriu a sua prestação para obviar aos respectivos efeitos substantivos (cfr. Ac. do STJ, de 24.06.1999, Noronha do Nascimento, CJ AcSTJ, Ano 1999, Tomo II, p. 163, com bold apócrifo). Deverá por isso, para obstar ao seu válido exercício, oferecer o cumprimento simultâneo, em termos completos e rigorosos.
Por fim, a excepção de não cumprimento do contrato tem de ser invocada pela parte que se pretende valer da mesma, de forma expressa ou tácita, não podendo ser conhecida oficiosamente pelo juiz (cfr. Calvão da Silva, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, p. 334). A sua invocação tácita terá de resultar de factos alegados pelo excipiente que inequivocamente a exprimam (cfr. Ac. da RC, de 08.06.93, Francisco Lourenço, CJ, Ano 1993, p. 55; e Ac. da RG, de 09.04.2003, Arnaldo Silva, CJ, Ano 2003, Tomo II, p. 281).
15 janeiro 2022
O cumprimento das obrigações
- o princípio da pontualidade;
- o princípio da integralidade; e
- o princípio da concretização e da boa fé.
A doutrina portuguesa (e também a jurisprudência) distinguem entre dois momentos distintos: o momento em que o devedor pode cumprir a obrigação, forçando o credor a receber a prestação, sob pena de o credor entrar em mora, e o momento em que o credor pode exigir do devedor a realização da prestação, sob pena de o devedor entrar em mora.
A prova do cumprimento compete em princípio ao devedor, uma vez que o cumprimento constitui um facto extintivo do direito do credor que deve ser demonstrado pela parte contra quem o crédito é invocado (cfr. art. 342° nº 2 do CC).
21 julho 2021
Prazo pagamento quotas
Pagamento das quotas
16 abril 2021
Alteração pagamento quotas
Para aprovação de imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra - ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição -, é exigível que a deliberação ocorra por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, sem oposição (cfr. nº 2 do art. 1424º do CC).
Não é exigível a maioria qualificada de dois terços sem oposição para reverter uma alteração ao regime regra ao pagamento de despesas de condomínio, pois é incomparável a situação de a lei exigir tal maioria qualificada para a imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra (em função da permilagem, de acordo com o art. 1424º, nº 2 do CC), e exigi-la para o regresso ao regime regra.
As deliberações das assembleias de condóminos que sejam contrárias à lei ou a regulamentos são anuláveis, nos termos do art. 1433º, nº 1 do CC, e não nulas, sem prejuízo de situações excepcionais, onde não se incluem as suscitadas nos embargos, poderem implicar a nulidade ou até a inexistência.
O abuso de direito apenas é susceptível de se verificar quando o seu “titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”, nos termos do art. 334º do CC.