Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

2/17/2023

(Con)vivência vs barulho da vizinhança - VI


Ruídos no âmbito dos licenciamentos 
 
Chegados aqui, existem inúmeros concelhos caracterizados pela coabitação de múltiplas actividades antropogénicas em áreas de residência que são susceptíveis de gerar conflitos ao nível do ruído.
 
É no âmbito das competência de fiscalização conferidas pelo Regulamento Geral do Ruído, já citado, que os municípios têm na sua esfera a gestão da fase instrutória das reclamações relativas a actividades ruidosas (ex: medições acústicas para despiste da violação dos limites legais sonoros, como elemento probatório em sede de reposição da legalidade).
 
Recorde-se que as competências em matéria legislativa no tema que nos ocupa abarcam diversos domínio de intervenção, nomeadamente local, regional e central, correlacionando-se com o planeamento territorial, o licenciamento e medidas ou procedimentos de fiscalização e controlo destas. Na prática, é ainda no âmbito das responsabilidades de cada Município o licenciamento das actividades ruidosas temporárias, a título meramente exemplificativo, trabalhos ou obras urgentes, competições desportivas, corrida de automóveis, casamentos, aniversários, música ao vivo, treinos de aeronaves, campos de tiro, tendas de circo, mediante a Licença Especial de Ruído(ou “LER”), que têm gerado inúmeras queixas por parte das/dos cidadã/ãos.
 
Parece-nos assim importante que se chama à colação da necessidade imperiosa de criar e fomentar critérios harmoniosos para a emissão e implementação da LER (21), com a colaboração das autoridades policiais e polícia municipal (no âmbito das suas atribuições e competências). 
 
Torna-se assim cada vez mais prioritário que o decisor sobre a aplicação (boa) das regras impostas e das condicionantes em cada caso concreto tenham ainda como objectivo, a prevenção de procedimentos mais céleres e eficazes no futurona atribuição de LER.
 
A (não) decisão de licenciar e as condições da imposição do exercício devem ter na sua balança a equação entre as obrigações de fiscalização num prato, e noutro, alguns aspectos que são contraditórios (ex: promoção de qualidade de vida das populações)que, à luz do regime actual, não são isentos de divergente doutrina (22).
 
De reter, que no âmbito de qualquer procedimento de emissão de LER, no quadro das actividades previstas na lei, cada município deverá, desde logo: (i) analisar a fundamentação para o pedido de excepção e as suas implicações; (ii) avaliar e validar as medidas de prevenção e de redução do ruído propostas e (iii) fixar as condições do exercício da actividade, considerando, a localização, a data, duração e medidas de minimização. 
 
Não é apenas o Provedor de Justiça que vai alertando que este tipo de licenças especiais de ruído se devem abster de estipular condições individuais, sob pena de invalidade, é a própria lei, a doutrina, e a jurisprudência, sempre que, em causa, estejam formas de renúncia ao exercício de uma competência que é a da aplicação de norma geral e abstracta por meio de ato administrativo (23).
 
Alerta-se para o facto de as medidas de minimização puderem assumir um papel de enorme relevância na compatibilização entre o exercício da actividade com a colisão de eventuais direitos de não exposição ao ruído que “perturbe” a população residente numa determinada zona da sua residência, cabendo aos municípios o bom rastreio e a concretização dos maus elementares princípios gerais a que estão adstritos. A transparência dos procedimentos deve estar disponível nos sítios electrónicos quer dos Municípios, Juntas de Freguesia, autoridades policiais e CCDR ́s, bem como nos locais de realização das actividades que vejam a sua autorização emitida.

Notas

(21) Foi inclusive criado um grupo de trabalho (GTLER) que envolveu elementos da APA e das CCDR, entre outros, com o escopo de criar as Boas Práticas em cada território no âmbito do processo da emissão destas licenças especiais em prol da qualidade de vida dos seus munícipes. 
 
(22) A proibição do exercício de actividades ruidosas temporárias na proximidade de edifícios de habitação aos sábados, domingos e feriados e nos dias úteis entre as 20 e as 8 horas, na proximidade de escolas durante o seu horário de funcionamento, e na proximidade de hospitais ou estabelecimentos similares pode ser excepcionada mediante emissão de LER, ao abrigo do artigo 15º do RGR, pelo respectivo município - https://www.ccdr-alg.pt/site/sites/ccdr-alg.pt/files/Ambiente/Ruido/guia_ler_jul_2017_.pdf(pág. 11).
 
(23) Relatório do Provedor de Justiça. “Boas Práticas no Controlo Municipal de Ruído” 2013

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