Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

3/31/2022

Vícios na convocação

As eventuais irregularidades do procedimento de convocação - e, em particular, as atinentes à observação do prazo e à iniciativa da convocação - não podem dar lugar senão a deliberações contrárias à lei e, como tal, sujeitas a anulação.

Nas deliberações resultantes de assembleias irregularmente convocadas há uma violação lateral da lei, através do processo formativo da assembleia. Serão, por isso, de acordo com o regime - regra, deliberações meramente anuláveis.

O desrespeito dos limites impostos pela lei importa a anulabilidade da decisão adoptada, com a consequência de que, não sendo esta tempestivamente impugnada, o vício de que é afectada considera-se sanado.

É inválida a deliberação da assembleia tomada sem contraditório, ao menos formal, de todos os interessados, pois não se pode dizer que haja deliberação se não está constituída a massa deliberante, isto é, até que cada um esteja em posição de participar na formação da vontade comum (com o seu voto, as suas sugestões ou observações) ou, ainda, que esteja em posição de eventualmente exercer os seus direitos como dissidente ou como ausente.

A falta de convocação de um condómino afecta a própria validade da deliberação, sem que se possa aduzir que o voto do condómino não convocado não tem influência no resultado da votação.

Segundo Lobo Xavier, Anulação de deliberação social e deliberações conexas, Atlântida Editora, Coimbra, 1975, pág. 52, "quando a pessoa legitimada para concorrer ao colégio foi disso impedida, este facto determina sempre a invalidade das deliberações aí tomadas - e tal invalidade revestirá a forma de anulabilidade. (...) Isto muito embora os votos que àquela coubessem fossem insuficientes para, somados aos da minoria, igualar o número daqueles que fizeram vencimento". 

A posição deste autor justifica-se desde logo porque não pode garantir-se que a deliberação teria sido aprovada tal como o foi se porventura se tivessem respeitado os preceitos legais e estatutários, admitindo-se o sujeito excluído. "Pois, no pensamento da lei, a assembleia geral não é apenas destinada à votação, mas também à formação do convencimento dos votantes, através do mútuo esclarecimento proveniente da discussão que eventualmente precede a emissão dos votos.

Assim, com a irregularidade cometida perde-se a possível influência de um membro do colégio deliberativo na determinação dos restantes. Não pode raciocinar-se como se o sentido dos votos destes fosse seguramente o mesmo, ainda que, o excluído tivesse intervindo na assembleia. Também neste sentido, Gino Terzago, Diritti i doveri, pág. 28.

Obviamente que a participação dos condóminos na reunião sana a irregularidade ou a falta de convocação. Não basta a mera presença na assembleia; o condómino pode dirigir-se ao local da reunião numa tentativa de adiar a assembleia, pois apesar de ter tomado conhecimento da sua realização, não beneficiou do prazo mínimo concedido por lei e que, no caso concreto, seria indispensável, por exemplo, para aconselhamento jurídico ou tão só para ponderar sobre uma correcta tomada de decisão. 

É necessário que os condóminos manifestem a vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado assunto. 

Para as pessoas colectivas em geral (cfr. art. 174º, nº 3, ex vi art. 157º do CC), a comparência de todos os interessados sanciona quaisquer irregularidades da convocação, desde que nenhum deles se oponha à realização da assembleia. Nos termos do art. 54º do CSC, os sócios, podem reunir-se em assembleia geral, sem observância das formalidades prévias, desde que todos estejam presentes e todos manifestem a vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinados assuntos (a assembleia totalitária ou universal).

Pinto Furtado, Deliberações dos sócios, Almedina, Coimbra, 1993, pág. 187 e ss., define a assembleia universal como "a assembleia geral não convocada, ou convocada irregularmente, a cuja reunião tenham comparecido todos os sócios e todos tenham então aprovado a sua constituição e a susceptibilidade de passarem a deliberar sobre um assunto determinado". Não é por directa equiparação da lei, a considerar cumprida, com a presença de todos, a função a que se destina a convocação, que se forma uma assembleia universal, mas porque nesse sentido veio a manifestar-se a vontade de todos.

O ónus de provar em juízo que todos os condóminos foram tempestivamente convocados para a assembleia incumbe à entidade convocante, não se podendo encarregar o condómino da prova negativa da inobservância de tal obrigação legal.

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