Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

3/23/2022

Carregamento veículos eléctricos

Se um condómino adquirir um automóvel electrificado, seja um híbrido plug-in com motores de combustão e eléctrico ou um veículo totalmente eléctrico, necessitará de o recarregar regularmente. Se no regime de propriedade vertical tem-se este desiderato pacífico, o mesmo pode não ocorrer no regime de propriedade horizontal, principalmente se se tratar de edifícios.

Assim, carregar a bateria do carro num edifício pode revelar-se, nalguns casos, numa solução particularmente dispendiosa, quando não mesmo impossível, por causa da capacidade energética do prédio, normalmente tendo potência suficiente para alimentar a iluminação das partes comuns e os elevadores, muitas vezes assente num sistema eléctrico que não aguentará mais carga.

O condómino que pretenda instalar um ponto de carregamento na garagem do prédio pode fazê-lo, bastando para tanto seguir as regras preceituadas no DL nº 90/2014 de 11/6, o qual procede à terceira alteração ao DL nº 39/2010, de 26/4, que estabelece o regime jurídico da mobilidade eléctrica, aplicável à organização, acesso e exercício das actividades relativas à mobilidade eléctrica, bem como as regras destinadas à criação de uma rede piloto de mobilidade eléctrica.

Artigo 29.º
Pontos de carregamento em edifícios existentes

1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é admitida a instalação, por qualquer condómino, arrendatário ou ocupante legal, a expensas do próprio, de pontos de carregamento de baterias de veículos eléctricos ou de tomadas eléctricas que cumpram os requisitos técnicos definidos pela DGEG para o efeito de carregamento de baterias de veículos eléctricos, destinados a uso exclusivo ou partilhado, nos locais de estacionamento de veículos dos edifícios já existentes, de acordo com os termos definidos por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das autarquias locais, da energia, das obras públicas, dos transportes e da habitação.

2 - No caso de a instalação de ponto de carregamento ou de tomada eléctrica prevista no número anterior ser efectuada ou passar em local que integre uma parte comum do edifício, esteja ou não afecta ao uso exclusivo do respectivo condómino, a instalação carece sempre de comunicação escrita prévia dirigida à administração do condomínio e, quando aplicável, ao proprietário, com uma antecedência de, pelo menos, 30 dias sobre a data pretendida para a instalação.

3 - No caso referido no número anterior, a administração do condomínio e, quando aplicável, o proprietário só podem opor-se à instalação do ponto de carregamento ou tomada eléctrica nos seguintes casos:

a) Quando, após comunicação da intenção de instalação por parte de um condómino, arrendatário ou ocupante legal, procederem, no prazo de 90 dias, à instalação de um ponto de carregamento de baterias de veículos eléctricos para uso partilhado que permita assegurar os mesmos serviços, a mesma tecnologia e as necessidades de todos os seus potenciais utilizadores;

b) Quando o edifício já disponha de um ponto de carregamento de baterias de veículos eléctricos ou tomada eléctrica para uso partilhado que permita assegurar os mesmos serviços e a mesma tecnologia;

c) Quando a instalação do ponto de carregamento ou tomada eléctrica coloque em risco efectivo a segurança de pessoas ou bens ou prejudique a linha arquitectónica do edifício.

4 - As decisões a que se referem as alíneas b) e c) do número anterior são adoptadas no prazo máximo de 60 dias após a comunicação da intenção de instalação referida no n.º 2 e, no caso da administração do condomínio, carecem de aprovação por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

5 - As decisões a que se refere o n.º 3 são comunicadas, por escrito, ao condómino, arrendatário ou ocupante legal em causa no prazo de 15 dias após a sua adopção, devendo ser fundamentadas quando sejam negativas.

6 - O regime de propriedade e operação dos pontos de carregamento ou tomadas eléctricas previstos no presente artigo é o do local de instalação dessa infraestrutura, com excepção dos casos de pontos de carregamento de acesso privativo para uso exclusivo instalados em partes comuns do edifício, em que a operação cabe aos respectivos utilizadores.

7 - Aplica-se à instalação, disponibilização, exploração e manutenção dos pontos de carregamento previstos no presente artigo o disposto no artigo 26.º ou no artigo 27.º, consoante aplicável.

Edifícios anteriores a 2010

Com a introdução do DL nº 39/2010, de 26 de Abril, as instalações eléctricas nos edifícios passaram a ser obrigatoriamente montadas de forma prever este tipo de situações. Nas construções anteriores, caso algum condómino pretenda instalar um ponto de carregamento na garagem do prédio poderá optar por uma wallbox, a qual permitirá carregar a viatura de uma forma mais rápida. Esta permite ainda que o condómino tenha acesso a informação detalhada relativamente a quanto gastou, podendo posteriormente acertar contas com a administração do condomínio.

De salientar que, as wallbox são unidades de carregamento montadas na parede, as quais são alimentadas por corrente alternada, em modo monofásico ou trifásico, aumentam a velocidade com que a energia é fornecida à viatura. Importa ressalvar que a instalação das wallbox nas partes comuns do edifício, devem respeitar os requisitos técnicos, estabelecidos pela Direcção Geral de Energia e Geologia (DGEG).

Caso seja o condomínio que pretenda avançar com a instalação de unidades de carregamento de veículos eléctricos, compete ao administrador do condomínio solicitar uma vistoria a realizar por um técnico especializado, com a finalidade de se verificar se o sistema eléctrico da garagem permite esse desiderato. Se não permitir, o passo seguinte será o de se avançar para um projecto com vista à montagem de uma nova instalação eléctrica que permita carregar as viaturas eléctricas na garagem.

Outro pormenor prende-se com a questão da rede eléctrica, porquanto na localização do edifício pode não haver energia suficiente para alimentar várias garagens com carregadores de eléctricos (o ideal é que o edifício se situe nas imediações de um posto de transformação, que transforma energia de alta e média tensão em baixa tensão).

A título meramente ilustrativo, se considerarmos um edifício com 30 fracções autónomas, que careça de uma potência de 7 kw, a energia total necessária será de 200 kw, à qual haverá que acrescentar a energia consumida pelos elevadores e iluminação geral. Acresce que será ainda necessário fazerem-se as obras para a instalação da nova rede de energia da garagem, nomeadamente com a instalação de cabos para os pontos de carregamento, a adaptação dos quadros de coluna, e bem assim, a instalação de novos contadores.

Posto isto, cada condómino teria que despender, no total, cerca de 5 mil euros.
 
Consumo de energia

Quando os postos de carregamento são colocados nas partes comuns, a lei é omissa quanto à imputação dos custos de electricidade. E tese, dimana do art. 1424º nº 3 do CC que as partes comuns (e por extensão, as coisas comuns) do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem. No entanto, se existir apenas um contador, serão de aplicar as regras do uso das coisas comuns. Assim o art. 1406º, nº 1 do CC que preceitua que, "Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito".

No entanto, o mais avisado (e correcto) é optar-se a uma de duas hipóteses: (i) um contador próprio a solicitar à empresa distribuidora de rede eléctrica ou (ii) a separação de consumos na conta de electricidade do condomínio (também a solicitar à referida empresa distribuidora). Neste concreto, importa sublinhar que a instalação só pode ser recusada em condições muito especiais, sobretudo se estiverem relacionadas com a segurança do edifício, como decorre do citado diploma legal.

No mais, quanto à responsabilidade pela legalidade da instalação, compete desde logo ao administrador do condomínio verificar se existe alguma irregularidade procedimental, devendo comunicá-la prontamente à empresa fornecedora de energia, solicitando a sua desinstalação e corte de fornecimento ou contactar o site www.e-redes.pt e efectuar a competente denúncia. Cumpre ainda ressalvar que, se a instalação irregular foi autorizada pelo administrador do condomínio, qualquer condómino pode recorrer para a assembleia nos termos do art. 1438º do CC..

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