Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

7/14/2023

DL 40 333 de 14/10/1955 - Legislação

A propriedade horizontal, que é hoje uma realidade insubstituível, foi entre nós instituída e regulamentada pelo Decreto-Lei nº 40 333 de 14 de Outubro de 1955, o qual na sua essência passou a integrar o Código Civil através do DL nº 47 344 de 25 de Novembro de 1966.

Atento o interesse histórico deste regime jurídico, replica-se infra o competente diploma.

Decreto-Lei 40 333
14 de Outubro de 1955


Artigo 1º As fracções de que se compõe um edifício, susceptíveis de constituírem unidades independentes para os fins de habitação, de actividade cultural, de actividade económica ou semelhantes, podem pertencer a proprietários diversos, em regime de propriedade horizontal, nos termos do presente decreto-lei.

Artigo 2º O regime da propriedade horizontal pode ser constituído:
1º Por negócio jurídico, incluindo a partilha extrajudicial;
2º Por decisão proferida em acção de divisão de coisa comum ou por efeito de partilha judicial;
3º Por destinação do prédio, prevista no respectivo projecto, à venda de fracções autónomas, a pronto pagamento ou em prestações, designadamente em regime de casas económicas, nos termos do Decreto-Lei nº 23 052, de 23 de Setembro de 1933, e mais legislação aplicável, ou de casas de renda económica, em conformidade com a Lei nº 2 007, de 7 de Maio de 1945, e mais legislação em vigor.
§ único. Considera-se, para os efeitos legais, título constitutivo da propriedade horizontal, segundo as hipóteses:
1º O negócio jurídico a que se refere o nº 1 do corpo deste artigo;
2º A decisão que decretar ou homologar a divisão, nos casos do nº 2;
3º As decisões administrativas que aprovar o projecto do prédio, na hipótese mencionada no nº 3.

Artigo 3º O título constitutivo deve:
1º Especificar as partes do prédio componentes de cada uma das fracções autónomas, por forma a que estas fiquem devidamente individualizadas.
2º Fixar o valor relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem do valor total do prédio.
§1º Nos casos dos nº 2º e 3º do § único do artigo 2º as decisões aí referidas devem individualizar o mapa de partilha, o projecto ou outros documentos de que constem os elementos acima exigidos, os quais se considerarão parte integrante do título constitutivo.
§2º Se o título constitutivo não satisfazer ao disposto neste artigo, será completado por acordo dos interessados, expresso em documento autêntico, ou por arbitramento judicial, atendendo-se, quanto ao valor, àquele que o prédio tinha ao tempo da construção.

Artigo 4º Só podem ser objecto de propriedade horizontal as fracções autónomas que constituam unidades aptas para os fins mencionados no artigo 1º e que sejam suficientemente distintas e isoladas entre si.
§1. Se o prédio for construído propositadamente para ser vendido em fracçõe, nos termos do artigo 2º, será este requisito considerado na aprovação do respectivo projecto; nos outros casos será verificado por vistoria da câmara municipal do concelho respectivo ou por vistoria judicial, conforme a propriedade horizontal for constituída, respectivamente, por negócio jurídico, ou por decisão judicial.
§2. Se, porém, esta forma de domínio for titulada por testamento, a prova do mencionado requisito só será exigível para o registo definitivo da constituição.

Artigo 5º O título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado por acordo de todos os interessados celebrado por escritura pública e, se algum deles for incapaz ou ausente, mediante autorização judicial, nos termos dos artigos 1488º e 1489º do Código de Processo Civil.
§ único. Não pode, todavia, modificar-se a composição das fracções autónomas sem que a observância do artigo antecedente se mostre garantido por vistoria municipal, ou no caso de a modificação exigir obras, pela aprovação do respectivo projecto.

Artigo 6º A constituição da propriedade horizontal e a modificação do títrulo constitutivo devem ser inscritas no registo predial para produzirem efeitos em relação a terceiros.
§ único. Os notários não poderão, todavia, lavrar escritura pública, pela qual se transmitam direitos ou contraiam encargos sobre fracções autónomas de edifícios em regime de propriedade horizontal, sem que se mostre registado o respectivo título constitutivo.

Artigo 7º A cada edifício sob regime de propriedade horizontal corresponderá, no registo predial, uma só descrição, na qual deverá constar a especificação pormenorizada das suas diversas fracções autónomas, individualizando-se cada uma delas por uma letra maiúscula e pela menção ou do andar em que se situa ou de qualquer outra circunstância que sirva para a distinguir das demais.
§ único. Das quotas de referência aos actos de inscrição deverá sempre constar a fracção a que esses actos respeitam.

Artigo 8º As inscrições de constituição da propriedade horizontal, e bem assim das convenções posteriores, serão feitas por extracto dos respectivos títulos e nelas será mencionado o valor atribuído a cada uma das fracções autónomas.

Artigo 9º Na matriz predial cada edifício em regime de propriedade horizontal terá uma só descrição.
§1º Na descrição genérica do edifício deve mencionar-se o facto de ele se encontrar em regime de propriedade horizontal.
§2º Cada uma das fracções autónomas será descrita pormenorizadamente e individualizada por uma letra maiúscula igual à que lhe estiver atribuída no registo predial.

Artigo 10º Cada um dos proprietários tem direito de propriedade sobre a fracção autónoma correspondente e, acessoriamente, o direito de compropriedade na parte comum do prédio.
§ único. O complexo destes direitos é incindível, salvo disposição da lei em contrário, e está sujeito, para todos os efeitos, ao regime da propriedade de coisas móveis.

Artigo 11º O proprietário da fracção autónoma pode usar e dispor desta livremente, nos termos gerais de direito.
§ único. No caso de alienação das fracções, os demais proprietários não gozam de qualquer preferência fundada na compropriedade sobre as partes comuns do prédio.

Artigo 12º No exercício do seu direito devem os proprietários suportar as limitações necessárias ao bem de todos, em virtude das relações de vizinhança, da compropriedade nas coisas comuns e da circunstância de as fracções pertencerem ao mesmo edifício.
§ único. Em especial, é vedado aos condóminos:
1º Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparações adequadas, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos à moral ou aos bons costumes;
c) Dar-lhe uso contrário ao fim que foi destinada a fracção, salvo a autorização de todos os condóminos ou o competente suprimento judicial quando injustamente negada.

Artigo 13º São comuns as seguintes partes integrantes e pertenças do prédio:
1º O terreno, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as restantes partes estruturais do prédio;
2º O telhado, assim como os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do último pavimento;
3º As entradas, as escadas e os corredores de passagem comum;
4º As instalações gerais de água, electricidade, aquecimento e semelhantes.
§ 1º Presumem-se ainda comuns:
1º Os pátios e jardins comuns;
2º Os ascensores;
3º As dependências destinadas ao uso e habitação do porteiro;
4º As garagens;
5º Em geral, as coisas que não forem afectadas ao uso exclusivo de qualquer dos condóminos.
§ 2º As coisas referidas no corpo deste artigo, enquanto durar a propriedade horizontal, são indivisíveis e não podem separar-se das fracções autónomas, salvo para serem substituídas por outras de igual função, com a aprovação do respectivo projecto pela câmara municipal, as mencionadas no §1º podem dividir-se e alienar-se nos termos gerais da compropriedade.

Artigo 14º Os proprietários podem usar os bens comuns, em conformidade com o respectivo fim, e sem inibirem os consortes do exercício de igual direito.

Artigo 15º O direito dos proprietários aos bens comuns será, na falta de título em contrário, representado por uma quota igual à percentagem ou permilagem prevista no nº 2 do art. 3º.

Artigo 16º Salvo disposição em contrário, os proprietários contribuirão para as despesas relativas aos bens comuns e aos serviços de interesse comum na proporção da quota referida no artigo anterior.
§ 1º - As despesas relativas aos diversos lanços da escada ficarão porém, apenas a cargo dos proprietários que deles normalmente se servem.
§ 2º - Nas despesas dos ascensores só comparticiparão os proprietários cujas fracções autónomas por eles possam ser servidas.

Artigo 17º As obras que constituam inovações dependem da aprovação, em assembleia dos condóminos que representem dois terços do valor total do edifício.
§ único. Não são permitidas inovações nos bens comuns que possam prejudicar a utilização, por parte de alguns condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns.

Artigo 18º As obras inovadoras serão pagas pelos proprietários nos termos do artigo 16º. Os proprietários dissidentes só poderão, no entanto, ser compelidos a concorrer para as respectivas despesas se a sua recusa for judicialmente havida como infundada.
§1º O proprietário cuja recusa se tiver como fundada poderá comparticipar a todo o tempo nas inovações, mediante o pagamento da quota correspondente nas despesas de execução e manutenção da obra efectuada, contanto que essa comparticipação não cause um prejuízo infundado aos outros proprietários.
§2º As inovações aprovadas podem ser imediatamente executadas, desde que um ou alguns dos condóminos suportem os respectivos encargos.

Artigo 19º As reparações indispensáveis e urgentes nos bens comuns podem ser levadas a efeito, na falta ou impedimentos do administrador, mediante a iniciativa de qualquer proprietário, para serem pagas a final por todos, na proporção devida.

Artigo 20º No caso de destruição de todo o edifício, ou de uma parte que represente, pelo menos, três quartos do seu valor, qualquer dos condóminos poderá exigir a venda do terreno e dos materiais pela forma que a assembleia vier a designar.

Artigo 21º No caso de destruição de uma parte menor poderá a assembleia deliberar por dupla maioria do número dos condóminos e do capital investido no edifício, a reconstrução deste.
§1º Os proprietários que não quiserem comparticipar nas despesas da reconstrução poderão ser obrigados a ceder os seus direitos a outros condóminos, segundo o valor entre eles acordado ou fixado por avaliação.
§2º O proprietário alienante poderá escolher o condómino ou condóminos a quem a cedência deverá ser feita.

Artigo 22º É obrigatória a realização do seguro do edifício contra o risco de incêndio.
§ único. Qualquer dos condóminos pode compelir os restantes à efectivação e manutenção do seguro quando o administrador não tenha providenciado oportunamente para esse efeito.

Artigo 23º A acta da sessão que tiver deliberado quaisquer despesas constituirá título executivo, nos termos do artigo 46º do Código de Processo Civil, contra o proprietário que deixar de entregar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, à qual acrescerão os juros legais de mora.

Artigo 24º O crédito por encargos previstos neste decreto-lei beneficia de privilégio mobiliário especial, nos termos do nº 4 do artigo 882º do Código Civil, e de privilégio imobiliário, nos termos do nº 2 do art. 887º do mesmo código.

Artigo 25º Os direitos e obrigações de cada proprietário nos bens comuns são inseparáveis da propriedade singular, a qual não poderá em caso algum ser transmitida ou onerada independentemente daqueles direitos e obrigações.

Artigo 26º Nenhum proprietário poderá renunciar os seus direitos aos bens comuns com o fim de se escusar aos encargos correspondentes.

Artigo 27º A administração dos bens comuns compete à assembleia dos condóminos e a um administrador por ela eleito.
§1º Os organismos e empresas legalmente autorizados a construir prédios para venda de fracções autónomas a prestações, em regime de propriedade resolúvel, poderão, nos contratos celebrados com os adquirentes, reservar para si a administração dos bens comuns enquanto todo o edifício não for objecto de propriedade absoluta.
§2º No caso previsto no parágrafo anterior não haverá administrador designado pela assembleia, mas sem a anuência desta não poderão fazer-se quaisquer inovações nos bens comuns nem modificar-se os serviços de interesse comum previstos nos contratos de venda ou em outros actos por estes pressupostos, salvo o suprimento judicial, quando o desacordo da assembleia for injustificável.
§3º Na hipótese dos dois parágrafos anteriores a assembleia deve pronunciar-se, nos termos do artigo seguinte, sobre o orçamento e as contas da administração, se esta não for remunerada por quantia fixa ou calculada directa e exclusivamente pelos contratos de venda das fracções autónomas.

Artigo 28º Cada proprietário terá, dentro da assembleia, tantos votos quantas as unidades inteiras que se contiverem na percentagem ou permilagem a que se refere o nº 2 do art. 3º.

Artigo 29º A assembleia reunirá uma vez por ano, na primeira quinzena do mês de Janeiro, mediante convocação do administrador, para discussão e aprovação das contas respeitantes ao último ano e, bem assim, para a aprovação do orçamento das despesas a efectuar durante o ano.
§1º A assembleia poderá reunir sempre que seja necessário, mediante convocação do administrador ou dos condóminos que representem, pelo menos, 25 por cento do valor total do edifício.
§2º A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade de celebração de compromissos arbitrais para a resolução de litígios dos proprietários entre si, ou deles com o administrador, e fixar penas pecuniárias para a inobservância deste decreto-lei ou das decisões da assembleia ou do administrador, contanto que o montante dessas penas não exceda um quarto do rendimento colectável anual da fracção do infractor.

Artigo 30º A assembleia terá as suas sessões no lugar designado pelo administrador ou pelos proprietários referido no §1º do artigo anterior e será convocada por meio de circular enviada com cindo dias de antecedência, aos condóminos, mediante correspondência registada, com aviso de recepção.

Artigo 31º A assembleia, sem prejuízo do disposto no artigo 17º, delibera por maioria dos votos representativos de todo o capital investido.
§ único. Se não comparecer o número de proprietários suficiente para se obter o necessário vencimento, será convocada nova sessão, dentro dos dez dias imediatos, podendo então a assembleia deliberar por maioria dos votos dos proprietários presentes, desde que estes representem, pelo menos, um terço do valor do edifício.

Artigo 32º As deliberações da assembleia contrárias à lei ou ao regulamento aprovado pelos interessados poderão ser anuladas a requerimento de qualquer dos condóminos.
§1º A acção será proposta dentro do prazo de vinte dias, a contar da deliberação, quanto aos que a não aprovaram, ou da comunicação da deliberação, quanto aos condóminos ausentes à sessão.
§2º Pode ser requerida a suspensão das deliberações da assembleia, nos termos dos artigos 403º e 404º do Código de Processo Civil.
§3º A representação judiciária dos outros condóminos competirá ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.

Artigo 33º O administrador será nomeado e exonerado por deliberação da assembleia dos proprietários.
§1º Se a assembleia o não fizer, poderá a nomeação ser feita pelo tribunal da situação do prédio, a requerimento de qualquer dos condóminos.
§2º O tribunal poderá também destituir o nomeado, a requerimento de qualquer condómino, quando se mostre que ele praticou graves irregularidades ou agiu com manifesta negligência no exercício das suas funções.
§3º O cargo de administrador pode ser remunerado, dura pelo prazo renovável de dois anos e será desempenhado por um dos proprietários ou por terceiro.

Artigo 34º São atribuições do administrador:
1º Convocar a assembleia dos proprietários, nos termos do artigo 29º;
2º Elaborar o orçamento das receitas e despesas relativas a cada ano;
3º Efectuar e manter o seguro do edifício contra os riscos de incêndio, sob pena de se tornar responsável pelos prejuízos resultantes da sua falta;
4º Cobrar as receitas e efectuar as despesas comuns;
5º Propor acção executiva contra os proprietários que deixarem de entregar, dentro do prazo estabelecido, a sua quota-parte nas despesas aprovadas;
6º Realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns;
7º Regular o uso das coisas comuns e a prestação dos serviços de interesse comum;
9º Executar as deliberações da assembleia.

Artigo 35º O administrador pode agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiro, no exercício das atribuições conferidas no artigo anterior ou quando devidamente autorizado pela assembleia.
§1º Pode igualmente ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício.
§2º Exceptuam-se as acções relativas a questões de propriedade ou de posse dos bens comuns, salvo a atribuição de poderes especiais ao administrador pela assembleia dos proprietários.
§3º Compete também ao administrador representar o conjunto dos proprietários perante as autoridades administrativas.

Artigo 36º O administrador terá os seguintes livros:
De receitas e despesas;
De actas;
De inventário dos bens de propriedade comum.

Artigo 37º Dos actos do administrador cabe recurso para a assembleia, que neste caso poderá ser convocada pelo proprietário impugnante.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Se pretender colocar questões, use o formulário de contacto.