Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

02 julho 2024

Deliberações unânimes e assembleias universais


O art. 54º nº1, do Código das Sociedades Comerciais (CSC) consagra as figuras das deliberações unânimes por escrito e das assembleias totalitárias ou universais, permitindo, respectivamente, que a vontade social se manifeste fora do conclave ou em assembleia não regularmente convocada, ou sobre assunto não previamente tabelado.

Este art. 54º CSC, sob a epígrafe «Deliberações unânimes e assembleias universais», regula dois tipos de situações: A primeira é a possibilidade de, em qualquer sociedade, os sócios poderem «tomar deliberações unânimes por escrito». Trata-se de uma forma de deliberação em que se prescinde da reunião (vulgo, “assembleia geral”) dos sócios e do método colegial. Precisamente porque este método ou forma afasta o método ou forma tradicional (reunião da assembleia geral) a lei exige que todos os sócios concordem com as propostas de deliberação. A segunda situação regulada é a das assembleias gerais universais, também chamadas “totalitárias”.

Essas assembleias gerais caracterizam-se por serem reuniões em que não foram observadas as formalidades legais relativas à sua convocação, mas em que, estando presentes todos os sócios ou representados todos os sócios e todos manifestando a vontade de que a reunião se constitua como assembleia geral para deliberar sobre determinado ou determinados assuntos, tal é legalmente admissível.

Bem se compreende que quer a deliberação unânime por escrito quer a assembleia universal só sejam viáveis em sociedades com um reduzido número de sócios. Diferente é a deliberação por voto escrito, prevista no art. 247º nºs 1 e 2, também do CSC, só admissível nas sociedades por quotas ou em nome colectivo.

Contudo, no que aqui nos aproveita, sempre se pode dizer que, no âmbito da propriedade horizontal, o voto por escrito, dentro ou fora do conclave, e que "in casu", irreleva, não é admissível, porquanto, inexistindo dialéctica, não há troca de opiniões, de argumentos e de novas informações.

No que concerne à assembleia universal, esta pressupõe a presença de todos os condóminos - pessoalmente ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - e de estar ínsito o propósito de deliberar sobre assuntos de interesse para o condomínio e existir acordo unânime no sentido de se deliberar sobre determinado(s) assunto(s).

Nesta factualidade, importa desde logo salientar que a deliberação final da assembleia totalitária não exige a unanimidade, sendo aprovada nos termos gerais (maiorias simples ou qualificadas quando a matéria em discussão assim o exija).

Trata-se pois, este, de um procedimento concludente e inequívoco da vontade de os condóminos se reunirem sem a necessidade de se observarem os exigidos requisitos havidos fixados no art. 1432º do CC, e de deliberar, pelo que, nenhum terá legitimidade para colocar em crise o que se decidir em plenário, argumentando, no caso, que enferma a assembleia de anulabilidade por vício por a assembleia não ter sido regularmente convocada, ou, sendo-o, com discussão de assuntos não incluídos previamente na ordem de trabalhos.

A assembleia totalitária ou universal justifica-se por, face à presença do universo dos condóminos, estar garantida uma plena participação para se lograr a obtenção de deliberações válidas, independentemente de, a montante, não existir uma convocatória formalmente regular ou de o assunto não estar previamente inscrito na respectiva ordem de trabalhos.

Aduz-se daqui, obviamente que, havendo a assembleia convocada nos termos fixados na lei, e contanto estejam presentes e/ou representados por mandatários, todos os condóminos que reúnam a totalidade do capital investido no prédio, nada obsta a que, havendo o acordo de todos, se incluam novas matérias na ordem de trabalhos e sobre as mesmas se delibere.

Vale isto por dizer que, são requisitos de regularidade da assembleia universal a presença de todos os condóminos - por si, ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - o estar ínsito o propósito de deliberarem sobre assuntos com interesse para o condomínio e o acordo unânime de se deliberar sobre essas determinadas temáticas.

Porém, já não será de exigir a unanimidade na tomada de deliberações subsequentes, as quais que serão aprovadas nos termos gerais - cfr. neste sentido douta opinião do Dr. Pedro Maia "Deliberações dos sócios" in "Estudos de direito das sociedades", 5ª ed., 2002, 175, e Cons. Pinto Furtado, "Deliberações dos Sócios".


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