Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

10/09/2023

Suspensão das deliberações - Prazos


4.2.2.3 Suspensão das deliberações - Prazos
 
Relativamente ao prazo, os condóminos dispõem de 10 dias para instaurar tal procedimento (380º, nº 1 ex vi 383º, nº 1, CPC), tratando-se igualmente de um prazo de caducidade que não pode ser conhecido oficiosamente por em causa estarem direitos disponíveis dos condóminos. 
 
O prazo conta-se desde a data da assembleia ou desde a data em que o requerente teve conhecimento dessa deliberação, se não tiver sido regularmente convocado para a assembleia (nº 3 do art. 380º, CPC)(218). Surge, porém, uma questão semelhante à que foi discutida acerca da cação de anulação, atinente à contagem deste prazo no caso de o requerente não ter comparecido à assembleia e só ter tomado conhecimento da deliberação depois de decorridos os 10 dias. “Neste caso, é necessário apreciar, desde logo, se o requerente foi devidamente convocado e, em caso afirmativo, se há causa justificativa do conhecimento tardio, nomeadamente justo impedimento ou falta de acesso à ata imputável (...) (ao administrador), violando o seu dever de informação dos (...) (condóminos)”(219). Não tendo sido devidamente convocado, a própria lei – ao contrário do que acontece no preceito civilístico – responde à questão.

Ainda sobre o prazo, questiona-se se o prazo para propor a acção principal se suspende com a instauração da providência. Neste aspecto, tendemos a seguir os ensinamentos de Lebre de Freitas (220) e de Lobo Xavier (221), no sentido de o prazo não se suspender com a propositura do procedimento cautelar, “ambos correndo paralelamente”.
 
Com efeito, as duas vias judiciais têm finalidades distintas, na medida em que o pedido de suspensão de deliberação não é uma mera antecipação da decisão da açcão principal, antes visando evitar os danos resultantes da deliberação; por seu turno,o pedido principal visa apenas aferir a sua (i)legalidade (222).
 
Acresce que, no caso das deliberações anuláveis, não se deverão confundir os prazos de caducidade previstos no nº 4 do art. 1433º e no art. 380º, nº 1, CPC, tratando-se de prazos autónomos e independentes. De resto, não existe nenhum motivo razoável que justifique que o legislador quisesse que o prazo de propositura da acção anulatória fosse mais amplo quando se requeresse a suspensão, até porque, como temos vindo a repetir, uma das grandes preocupações no âmbito das deliberações das assembleias é que estas adquiram estabilidade no mais curto espaço de tempo e “tal desiderato não se compadece com o aguardar o decretamento da providência que (...) em virtude de vicissitudes várias pode demorar vários meses”(223)

Importa ainda ter em mente que, não sendo instaurada antes, e havendo decisão que decrete a suspensão da deliberação, o seu requerente passa a dispor de 30 dias desde a data em que a decisão lhe seja comunicada para propor a acção principal, sob pena de a providência caducar (art. 373º, n.º 1, a).

Em síntese, o condómino legitimado – para efeitos de simplificação, consideraremos que foi regularmente convocado – dispõe de 10 dias a contar da data da deliberação para requerer a sua suspensão e, tratando-se de deliberação anulável, de 60 dias a contar da mesma data para instaurar a respectiva acção de impugnação. Porém, caso a suspensão seja decretada – e independentemente do vício que enferme a deliberação em crise -, esta caducará se o condómino não propuser a acção principal no prazo de 30 dias a contar da data em que a decisão lhe seja comunicada

Notas

218. Rejeitamos aqui a posição defendida por Sandra Passinhas (op. cit., pp. 260 e 261), quando refere que o pedido de suspensão deve ser feito no prazo de 10 dias a contar da data da deliberação ou, “se o requerente esteve ausente da reunião, da data em que ele teve conhecimento da deliberação (sob pena de o procedimento cautelar se tornar mais exigente que a cação principal)”. Entende a autora que só depois de ter conhecimento da deliberação é que o condómino está em condições de fazer valer os seus direitos, daí que o prazo previsto para presentes e ausentes seja distinto. Na sua opinião, o art.1433º/2, ao dispor que o prazo de 10 dias para os condóminos ausentes exigirem a convocação de assembleia extraordinária só conta a partir da comunicação da deliberação, vem reforçar tal entendimento. Parece-nos existir aqui uma confusão entre as disposições substantivas e adjectivas, deturpando-se aquilo que vem estabelecido no CPC para a providência cautelar de suspensão das deliberações.
219. Neste sentido, José António De França Pitão e Gustavo França Pitão, Código de Processo Civil Anotado, Tomo I – Artigos 1º a 702º, Quid Juris, Lisboa, 2016, em anotação ao nº 1 do art. 380º, p. 446. No mesmo sentido, ac. TRE de 27/09/2012.

220. Lebre de Freitas / A. Montalvão Machado / Rui Pinto, op. cit., p. 97.
221. Lobo Xavier, Anulação...,p. 95.
222. Ac. STJ de 13/05/2004.
223. Ac. TRE de 28/06/2018, que destacamos pelas várias referências jurisprudenciais que sustentam o mesmo entendimento.
 

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