Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

9/28/2023

Via judicial - Acção de anulação


4.2 Via judicial

4.2.1 Acção de anulação
 
Perante deliberações que padeçam de irregularidades, a acção de anulação consiste no procedimento mais comum, apresentando especialidades relativamente ao regime geral da anulabilidade de actos ou negócios jurídicos, previsto nos arts. 286º e ss do CC.(151)
 
Com efeito, o nº 4 do art. 1433º prevê um prazo mais curto, pelo que, caso se tenha lançado mão da faculdade de convocação de assembleia extraordinária - e pressupondo que se deliberou manter a deliberação primitiva tida por irregular -, o prazo é de 20 dias contados da deliberação que daí resulte. 
 
Não tendo sido convocada ou solicitada assembleia extraordinária, o prazo é de 60 dias sobre a data da deliberação, prazo este cuja contagem suscita alguma questões que tentaremos resolver infra.(152)
 
Relativamente à natureza destes prazos, apesar de ser certo que se tratam de prazos de caducidade de natureza substantiva,(153) sujeitos às regras dos arts. 328º e ss. do CC, há quem defenda (154) estarmos perante prazos que não podem ser conhecidos oficiosamente pelo tribunal, por se tratarem de direitos disponíveis dos condóminos (art. 303º ex vi 333º, nº 2), e quem entenda (155) que os mesmos prazos são de conhecimento oficioso (art. 333º, nº 1).
 
No nosso entendimento, estamos perante prazos de caducidade que têm de ser invocados perante o tribunal, só assim produzindo os devidos efeitos (de extinção do respectivo direito), isto porque o direito de impugnar uma determinada deliberação é um direito disponível e, por isso, o seu titular é livre de exercê-lo ou não, tal como a parte contrária é livre de opor ou não a extemporaneidade daquele exercício.
 
Deste modo, nunca o tribunal poderá conhecer da excepção de caducidade quando esta não seja invocada. 
 
Por fim, note-se que, por força da aplicação analógica do art. 179º, a anulação das deliberações não prejudica direito que terceiro de boa fé adquira em execução das deliberações anuladas.(156)

Notas

151. Não nos debruçaremos sobre as acções de mera declaração de nulidade, ineficácia e inexistência, por entendermos que tal não se justifica, atendendo não só a tudo o que foi dito supra sobre os respectivos vícios, como ao facto de estas seguirem – salvo quanto à legitimidade - o regime geral
152. “Limita(-se), assim, de forma relevante a possibilidade de se fazer valer o direito, em nome da estabilidade da relação jurídica, em casos em que se entende que cabe ao interessado avaliar rapidamente se pretende ou não a manutenção do contrato.” Jorge Carvalho Morais, op. cit., p. 201.
153. Vide acs. TRE de 12/07/2018 e do TRL de 20/03/2013, ensinando este último que: “Os prazos substantivos (...) respeitam ao período de tempo exigido para o exercício de direitos materiais e são-lhes «aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição» (art. 298º, nº 2, do CC), tendo o seu decurso, em princípio, sem prejuízo das regras respeitantes à necessidade da sua invocação em juízo, a consequência de extinção do respectivo direito.”
154. Abílio Neto, op. cit., p. 724, Rui Vieira Miller, op. cit., p. 283, Sandra Passinhas, op. cit., p. 259, e ac. TRP de 30/06/2014, ainda que este último sobre o prazo previsto no nº 1 do art. 380º, CPC.
155. João Vasconcelos Raposo, op. cit.., p. 68

156. Sandra Passinhas, op. cit., p. 260 e ac. TRL de 17/12/2015.

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