Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

9/07/2023

Aprovação pelos Condóminos Ausentes


2.2.2.1 Aprovação pelos condóminos ausentes

Existe um sistema de aprovação por parte dos condóminos que não estiveram presentes na reunião, previsto nos nº 5 a 8, do art. 1432º do CC, que permite atenuar os efeitos que a exigência de unanimidade provoca na vida do condomínio, nomeadamente ao nível da paralisação da sua evolução e de eventuais injustiças e ineficiências económicas.
 
Assim, além de ser necessário que a assembleia seja convocada com especificação dos assuntos que carecem de aprovação por unanimidade (cfr. nº 2), os condóminos presentes têm de representar, pelo menos, 2/3 do capital investido e aprovar unanimemente a deliberação (cfr. nº 5). A título de hipótese, num condomínio constituído por dez condóminos, detendo todos eles a mesma percentagem de votos (10%), uma deliberação que careça de unanimidade só poderá ser aprovada se comparecerem, pelo menos, sete condóminos (representativos de 70% do capital investido, superior aos 66% que correspondem a 2/3 de 100%) e todos eles votarem favoravelmente.(28) Caso compareçam, por hipótese, nove condóminos e apenas oito votem favoravelmente, a deliberação não pode ser aprovada, uma vez que todos os presentes têm de votar favoravelmente no momento, não lhes sendo admitida aprovação posterior.(29)

Preenchidos os pressupostos do nº 5, a deliberação, apesar de válida, carece da aprovação posterior pelos condóminos ausentes, só assim adquirindo eficácia.
 
Após a recepção da carta, o condómino ausente terá 90 dias para dar o seu expresso assentimento ou discordância, devendo comunicar por escrito à assembleia (cfr. nº 7). Caso nada diga nesse prazo, o seu silêncio vale como assentimento (cfr. nº 8).
 
Com efeito, estatui o nº 6 do art. 1432º do CC que, após a assembleia, a deliberação deverá ser comunicada a todos os condóminos ausentes (30) no prazo de 30 dias, por carta registada com aviso de recpeção (31) devendo esta ser remetida para o domicílio do condómino (nº 9).
 
Sendo preterida a formalidade da comunicação(seja do efectivo envio, seja do envio para domicílio correto), a deliberação estará inquinada por um vício (32) que se considerará sanado se o condómino ausente vier, mesmo assim,manifestar a aprovação da mesma, por escrito (nº 7) ou se, decorrido o prazo para propositura da respectiva acção de impugnação“ com fundamento na não exigibilidade da obrigação por ausência de notificação da deliberação”, o condómino nada faça. (33)

Caso a carta registada seja devolvida por deficiência na indicação da residência por causa não imputável ao destinatário, o administrador terá de expedir nova carta para a morada correcta. Se, por outro lado, a carta foi dirigida com rigor, não sendo conhecido outro domicílio ao condómino, como se trata de um acto jurídico, o administrador deverá fazer publicar um anúncio em jornal da sua residência (cfr. art. 225º ex vi art. 295º), considerando-se, dessa forma, feita a comunicação.(34)
 
A contagem dos prazos previstos no art. 1432º do CC, deverá ser feita à luz da lei substantiva, a observar em relações jurídicas de direito privado, pelo que lhes são aplicáveis as regras do art. 279º ex vi art. 296º, ambos do CC.

Notas

26. Idem, ibidem e Rui Vieira Miller, op. cit., p. 270.
 
27. A favor: Abílio Neto, ibidem, e ac. STJ de 19/03/2009, recorrendo às regras da compropriedade (arts. 1024º, nº 2 e 1420º, nº 1). Contra: Ac. TRP de 06/03/2007, negando o recurso à analogia.
 
28. Veja-se, ainda a título de exemplo, o ac. TRE de 03/11/2016): “No caso, encontravam-se presentes condóminos representando 837,87/mil do edifício, os quais votaram todos a favor da alteração das permilagens, pelo que foi respeitada a norma supracitada. Logo, a deliberação não é inválida, por ter sido aprovada por unanimidade dos condóminos presentes.”
 
29. Como ensina Sandra Passinhas, op.cit., p. 621, o único momento em se que pode verificar uma verdadeira fusão de vontades dos condóminos é o momento da votação.

30I. ncluindo comproprietários, cônjuges e herdeiros, quando a fracção pertença a mais que um titular, bem como todos os que têm de ser convocados e, por conseguinte, direito a participar na assembleia, designadamente: proprietário, usufrutuário, titular de direito de uso ou habitação, locatário nos contratos de leasing para habitação, depositário judicial e fiduciário.Neste sentido, vide Abílio Neto, op. cit., pp. 678 e ss., João Vasconcelos Raposo, op. cit., pp. 30 e ss. e Sandra Passinhas, op. cit., pp. 208 e ss.
 
31. Forma que o legislador exige para garantir que o condómino ausente tem conhecimento efectivo do teor da deliberação (ac. TRC de 06/12/2016).
 
32. Neste sentido, João Vasconcelos Raposo, op. cit., p. 49 e ac. TRP de 09/10/2018: “A comunicação imposta no art. 1432º, nº 6 do CC exerce uma função adjectiva(...) não contendendo com a validade intrínseca das deliberações aprovadas na assembleia a que se refere”, mas tão-só com a sua eficácia. Contra: ac. TRE de 28/06/2017.
 
33. Cfr. ac. TRP de 04/12/2017, entendimento do qual partilhamos, já que o contrário (no sentido de a inexistência de comunicação corresponder à inexequibilidade da deliberação) redundaria numa situação de inexigibilidade de cumprimento de obrigações a determinados condóminos, por tempo indefinido, em situações não previstas pelo legislador. Com efeito, diz-nos o art. 2º do D.L.n.º 268/94, de 25 de Outubro,que depois de aprovadas e exaradas em acta, as deliberações vinculam todos os condóminos, inclusive aqueles que não tenham estado presentes na reunião. Além disso, o art. 6º daquele diploma não exige que a acta, para que seja exequível, tenha de ser comunicada aos condóminos ausentes. Estamos, portanto,perante situações de deliberações que sem prejuízo de não serem comunicadas aos condóminos ausentes,recolheram, em assembleia,o número de votos suficientes para serem aprovadas validamente, pelo que se tornarão eficazes relativamente àqueles condóminos logo que se mostre ultrapassado o prazo de impugnação.
 
34- A este propósito, Rui Vieira Miller, op.cit., p. 277.

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