Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

5/01/2021

Quotas prescrevem em 5 anos

O art. 310º, do CC, elenca várias situações que prescrevem no prazo de 5 anos (cfr. al. a) a f)), sendo que na al. g), refere expressamente que também prescrevem no mesmo prazo “…Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis…”. Ora, como referido na doutrina, a razão de ser da fixação deste prazo curto, tem por finalidade evitar que o credor, retardando a exigência dos créditos periodicamente renováveis, os deixe acumular ao ponto de tornar excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor.

Acresce ressalvar que nesse mesmo sentido, vai a jurisprudência, como é o caso do Ac. do STJ, de 02.05.2002, onde, a propósito de uma situação de prescrição a curto prazo, se decidiu que “…O prazo da prescrição, começa a contar-se da exigibilidade de cada prestação. Tal prescrição, interrompe-se, todavia, pela citação ou qualquer acto que exprima a intenção de se exercer o direito. A razão de ser de um prazo curto de prescrição das prestações periodicamente renováveis é evitar que o credor as deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor…”.

Ora, salvo o devido respeito, e no seguimento do entendimento que se tem como a melhor doutrina e jurisprudência, afigura-se ser esta, justamente, a situação atinente às quotas de condomínio ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos que são consideradas prestações periodicamente renováveis.

Na verdade, não parece curial qualquer tese no sentido de que as prestações em dívida constituem prestações instantâneas fraccionadas, porquanto estas ocorrem quando, existindo uma única prestação, instantânea por natureza, esta é realizada por partes, ou seja, executada por diversas parcelas, em consequência de convenção das partes, sendo que o objecto global da prestação é, neste caso e ao invés do que sucede na prestação duradoura, desde o início fixado, mas a execução é escalonada no tempo, realizando-se por diversas fracções ou prestações. É o que acontece, por exemplo, na venda a prestações, relativamente à prestação de preço.

Pelo contrário, quando, em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam – posto que decorrentes de uma só relação obrigacional – diversas prestações (isto é, prestações repetidas) a satisfazer regularmente ou sem regularidade exacta, teremos as chamadas prestações reiteradas, repetidas, contrato sucessivo ou periódicas. Por outras palavras, no domínio das chamadas prestações duradouras, isto é, aquelas que não se esgotam num só momento, antes se distendendo no tempo, uma prestação diz-se periódica quando, protelando-se no tempo, tem de ser realizada em momentos sucessivos, com espaçamento em regra regular.

Entende-se ser este o caso das ditas despesas condominiais, ou melhor dizendo, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum…”, como é referido no art. 1424º, nº 1, do CC, que integram, assim, a situação prevista na já referida al. g) do art. 310º, do CC, estando, pois, sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos.

Como ensina Aragão Seia “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do art. 1424º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio – art. 1424º e 1431º. Assim sendo, prescrevem no prazo de 5 anos - al. g) do art. 310° - e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida (cfr. nº 1 do art. 306º do CC.

E é também este o entendimento dominante, senão unânime, da nossa jurisprudência, podendo-se citar, entre outros, o Ac. do STJ de 14.12.2000, onde se sustentou que “…Quando as prestações de um condómino respeitam a despesas do condomínio atinentes a serviços de segurança, vigilância, limpeza, água e electricidade e seguro do prédio, o prazo de prescrição das mesmas é de cinco anos…”.

Do Ac. da Relação de Coimbra, de 14.11.2006 colhe-se também: “…O novo condómino, ao adquirir a respectiva fracção, não fica automaticamente sujeito à obrigação de pagar as eventuais despesas de condomínio ou de conservação do imóvel em dívida, apenas respondendo pelas obrigações que se vençam após a sua investidura na qualidade de condómino – obrigações «ob rem» ou «propter rem de dare», não ambulatórias. A obrigação do condómino de pagar as despesas de condomínio e de conservação do imóvel já vencidas está sujeita ao regime da prescrição previsto no art. 310º, al. g), do CC – 5 anos…”.

No mesmo sentido, também se pronunciaram o Ac. do TRL, de 16.03.2010, e o Ac. da Relação de Lisboa, de 22.04.2010: “…As prestações relativas às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio prescrevem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 310º, al. g) CC…”. Neste último aresto, aliás, chama-se justamente a atenção para o facto de que “…o estabelecimento deste prazo curto de prescrição tem por finalidade evitar a acumulação de dívidas, impedindo que estas atinjam montantes elevados e acarretem a ruína do devedor (cfr. Vaz Serra, «Prescrição extintiva e caducidade», BMJ, 106.º, pgs. 107 e 121)…”.

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