Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

5/05/2021

As maiorias qualificadas

A lei exige, para se poder considerar ter sido votada e aprovada uma decisão, que nesse sentido tenha sido votada pela maioria dos condóminos presentes à reunião, sendo que a maioria exigível é definida como sendo mais de metade dos votos, ao invés da metade dos votos mais um.

A maioria diz-se simples ou absoluta, se corresponde a mais de metade dos votos e qualificada se a lei fizer corresponder a um número superior à maioria simples. A maioria simples, tem-se disciplinada no art. 1432º, nº 3 do CC: "As deliberações são tomadas, salvo disposição especial, por maioria dos votos representativos do capital investido". As maioria qualificadas resultam pois, como ressalva este preceito, de disposições especiais.

Deve entender-se que as razões que levaram o legislador a estabelecer um regime especial para as deliberações por unanimidade se impõe também no caso das deliberações por maioria qualificada, que assim, e integrando-se a lacuna, devem apenas considerar-se válidas se votadas pela maioria dos votos representativos do capital e se posteriormente forem confirmadas pelos condóminos ausentes na medida necessária a que se perfaça a maioria qualificada.

Importa ainda sublinhar que apesar do art. 1432º nº 4 do CC estabelecer um regime próprio para as deliberações tomadas em assembleia de condomínio realizada em segunda convocatória, tal regime deve entender-se restrito às deliberações previstas no nº 3 do mesmo preceito, devendo-se entender que as razões que levaram o legislador a estabelecer um regime especial para as deliberações por unanimidade se impõe também no caso das deliberações por maioria qualificada, que assim, e integrando-se a lacuna, devem apenas considerar-se válidas se votadas pela maioria dos votos representativos do capital e se posteriormente forem confirmadas pelos condóminos ausentes na medida necessária a que se perfaça a maioria qualificada.


Deliberações que requerem unanimidade

  • A alteração do título constitutivo da propriedade horizontal (Art. 1419º do CC).
  • A alteração da forma de comparticipação para as despesas diversa da fixada no nº 1 do art. 1424º do CC.
  • A aprovação ou alteração do regulamento do condomínio, disciplinando o uso, fruição e conservação, quer das partes comuns, quer das fracções autónomas. (Art. 1418º, nº 2, al. a) do CC).
  • As inovações sobre as partes comuns que introduzam modificação nas características do prédio, como tal especificadas no TCPH (Ac. STJ de 22/2/2017, Processo n.º 2064/10.0TVLSB.L1.S1).
  • A alteração do início e termo do exercício administrativo (Aragão Seia, in Propriedade Horizontal, Almedina, 2002, p. 164).
  • Os actos de disposição ou afectação das partes comuns (Mota Pinto, in Direitos Reais, coligidas por Álvaro Moreira e Carlos Fraga, Livraria Almedina, Coimbra, 1976, p. 286).
  • Aprovação da clausula de representação, pela qual se determina que a representação só pode ser exercida por determinadas pessoas (Sandra Passinhas, in A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal, Almedina, 2000, p. 237).
  • Limitar o número de procurações que um condómino pode representar em assembleia.
  • A reconstrução do prédio em caso de destruição superior a ¾ do seu valor.
  • A instalação de uma antena de uma operadora de telecomunicações (Ac. STJ de 19/3/2009, processo nº 07B3607)
  • Arrendar ou vender espaços comuns (idem).
  • Qualquer alteração que um condómino pretenda introduzir nas partes comuns para benefício da sua fracção (terá de obter a aprovação das entidades legais e alterar o título constitutivo. (Aragão Seia, in Propriedade Horizontal, Almedina, 2001, p. 97 e ss., 131, 135-136).
Deliberações que requerem a maioria do capital investido

  • Pedido de encerramento de um estabelecimento de Alojamento Local à CM fundamentada na prática reiterada e comprovada de actos que perturbem a normal utilização do prédio, e bem assim, em actos que causem incómodos e afectem o descanso dos condóminos (Lei nº 62/2018 de 22 de Agosto com entrada em vigor em 22 Outubro de 2018).
Deliberações que requerem maioria sem oposição

  • A proibição de quaisquer actos ou actividades, quer nas partes comuns, quer nas fracções autónomas, que não constem do TCPH.
  • A imposição aos condóminos da proibição de terem animais dentro das suas fracções autónomas, atendendo aos distúrbios que possam provocar, segundo as normas de vizinhança.
  • A divisão de uma fracção autónoma em duas ou mais fracções, excepto se o TCPH o permitir (Art. 1422º-A, nº 3 do CC).
  • A alteração da forma de comparticipação para as despesas, diversa da fixada no nº 1 do art. 1424º do CC (apenas aplicável às despesas de fruição e pagamento de serviços de interesse comum). Aprovado pela Lei nº 8/2022 de 10/1/ de 2022. Entra em vigor a partir de 10/4/2022.
 
Deliberações que requerem 2/3 sem oposição

  • A alteração da forma de comparticipação para as despesas diversa da fixada no nº 1 do art. 1424º do CC (apenas se aplica às despesas de fruição e pagamento de serviços de interesse comum). Revogado pela Lei nº 8/2022 de 10/1/ de 2022. Vide: Deliberações que requerem a maioria sem oposição
Deliberações que requerem 2/3 e maioria dos condóminos

  • As inovações nas partes comuns (no entanto, as inovações não podem, em qualquer circunstância, prejudicar a utilização das partes comuns ou individuais). De salientar que as inovações visadas pelo art. 1425º, nº 1, devem ser excluídas aquelas que importem modificação do TCPH, na medida em que, com este alcance, caem no âmbito da norma imperativa do art. 1419º, nº 1 do CC.

Deliberações que requerem 2/3 dos votos

  • As obras que modifiquem ou prejudiquem a linha arquitectónica ou a estética do prédio (que podem carecer ainda de comunicação ou licenciamento administrativo) (Art. 1422º, nº 3 do CC).
  • A alteração do uso das fracções quanto o título constitutivo seja omisso sobre o fim das mesmas (Art. 1422º, nº 4 do CC).
  • Substituir a instalação de comunicação (v.g. intercomunicadores) de audio para vídeo. 
  • Modificar a porta de entrada ou o portão. 
  • A instalação de quaisquer estruturas de lazer (parque infantil no logradouro, churrasqueira comum, piscina, etc.).
  • A instalação de um posto de carregamento para veículos eléctricos.

 

Deliberações que requerem dupla maioria (condómino e votos)


  • A instalação de elevadores e gás canalizado, havendo pelo menos 8 fracções (Art. 1425º, nº 2 do CC).
  • A reconstrução do edifício, se a destruição atingir uma parte menor (Art. 1428º, nº 2 do CC).
  • A aplicação de coimas ás infracções das normas do regulamento que não estejam especialmente previstas e sancionadas no Regulamento, ou das ordens que, em seu cumprimento, emanem do administrador.

Notas: 
 
1)  A aprovação ou proibição da instalação de hostels num condomínio carece apenas de uma maioria simples (Lei nº 62/2018 de 22 de Agosto com entrada em vigor em 22 Outubro de 2018).

2) 2/3 dos votos representa 67 ou 667 votos, conforme se delibere em % (percentagem) ou ‰ (permilagem), respectivamente.
 
3) A maioria dos condóminos, é a metade mais um de todos os condóminos.

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