Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

7/15/2021

Deliberar sobre assuntos estranhos à OT


O nº2 do art. 1432º do Código Civil – ao impor certos requisitos do aviso convocatório da assembleia de condóminos – visa garantir-lhes o direito à informação das matérias objecto da convocatória a fim de assegurar uma participação esclarecida na discussão e votação.

Segundo o Ac. do TRC datado de 4/10/2005, "O art. 174º do Código Civil dispõe, no seu nº 2, que são anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia. Esta norma é omissa sobre a especificação do conteúdo da ordem de trabalhos a mencionar na convocatória da assembleia de associados, devendo tal lacuna ser integrada por aplicação analógica, nos termos do art. 10º, nº 1 e 2, do Código Civil, do disposto no nº 8 do artº 377. do Código das Sociedades Comerciais, segundo o qual «o aviso convocatório (das assembleias gerais) deve mencionar claramente o assunto sobre o qual a deliberação é tomada»”.

Também no Ac. deste Tribunal, proferido no processo n.º 3125/17.0T8VIS.C1, de 20 de Fevereiro de 2019, decidiu que é anulável a deliberação tomada sobre assunto não constante da ordem de trabalhos, sem a presença de todos os condóminos ou, estando todos presentes, se estes não concordaram com a sujeição do assunto a deliberação.

Diz a lei que o direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação. Acontece que, tendo a mesma pedido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, manda a lei que a acção se considere proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono. Ora, tendo esse pedido sido formulado numa determinada data, é essa a data a considerar como sendo aquela em que foi instaurada a acção e não a data em que a mesma entrou em juízo. De onde resulta que, na data em que foi instaurada a acção ainda não tinha decorrido o referido prazo de caducidade.

Apreciando a validade das deliberações tomadas, o TRC entendeu que tendo a sessão da assembleia de condóminos sido suspensa para continuar noutra data, não havia lugar a uma nova convocatória dirigida aos condóminos ausentes. A sessão suspensa para continuar noutro dia é fraccionada em duas partes, mas mantém-se o mesmo ato e a lei só exige a convocatória para o dia em que se inicia a sessão.

Porém, a assembleia não pode depois deliberar sobre assuntos que não constavam da ordem de trabalhos indicada na convocatória. Essa falta de indicação do assunto na convocatória acarreta a anulabilidade das deliberações tomadas, a não ser que, estando todos presentes, os condóminos manifestem a vontade de reunir-se para deliberar sobre determinado assunto. Como tal, se for tomada uma deliberação sobre assunto não constante da ordem de trabalhos sem que estejam presentes todos os condóminos ou, estando todos presentes, sem que tenham concordado com a sujeição do assunto a deliberação, a mesma será inválida.

Destas competentes decisões retira-se que o art. 174º dispõe, no seu nº 2, que são anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia, salvo se todos os associados comparecerem à reunião e todos concordarem com o aditamento. No entanto, esta norma é omissa sobre a especificação do conteúdo da ordem de trabalhos a mencionar na convocatória da assembleia de associados, devendo tal lacuna ser integrada por aplicação analógica, nos termos do art. 10º, nº 1 e 2, do Código Civil, do disposto no nº 8 do art. 377º do Código das Sociedades Comerciais: “o aviso convocatório (das assembleias gerais) deve mencionar claramente o assunto sobre o qual a deliberação é tomada”.

E isto é assim para que os interessados saibam, de antemão, o que vai ser discutido na assembleia geral e possam, assim, preparar atempadamente a sua intervenção e tomada de posição quanto à defesa dos seus direitos, sem serem confrontados no decurso da assembleia com a discussão de assuntos que não estavam agendados para essa ocasião. Estas razões procedem igualmente quanto à convocatória das assembleias gerais das pessoas colectivas constituídas sob forma de associações (cfr., neste sentido, o Ac. do STJ de 09/11/2000).

Ainda segundo este Acórdão, a anulabilidade prevista no art. 174º, nº 1, vale igualmente para a deliberação tomada sobre matéria ou assunto que na convocatória não estava claramente mencionado, de modo a não suscitar dúvidas. Convém, ainda, ter em consideração o que diz o Prof. Menezes Cordeiro (Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, T-III, pág. 608/609) a esse propósito: “A fixação da ordem do dia é da maior importância: apenas conhecendo-a poderão os associados ajuizar da necessidade ou da conveniência de comparecer na assembleia “.

Quanto à ordem do dia, observar-se-à ainda o seguinte:
-os diversos pontos devem estar suficientemente explícitos; por exemplo, não basta uma referência genérica, tipo “outros assuntos”, para legitimar tudo o que, na reunião, se queira incluir;
-devem considerar-se abrangidos todos os assuntos que sejam consequência natural e lógica da discussão de outro assunto indicado na convocatória.

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