Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

20 junho 2024

Responsabilidade pelas custas



Estabelece o nº 1 do art. 1424º do CC que, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações”.

A jurisprudência dominante tem qualificado as contribuições dos condóminos nos termos da citada disposição legal como prestações periódicas, visto que o seu montante depende da aprovação, pela assembleia geral de condóminos, a qual, reúne pelo menos uma vez por ano – vide art. 1431º, nº 1, do CC.

E, efetivamente, em regra, as contribuições dos condóminos para a satisfação das despesas comuns têm efectivamente uma natureza que se pode considerar tanto regular, como periódica.

Aliás, como salienta Aragão Seia (Propriedade Horizontal; 2.ª ed., Almedina, 2022, pag. 131, nota 9), “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do artigo 1424.º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio – artigos 1424.º e 1431.º".

Enquanto condóminos, estão estes obrigados a comparticipar para as despesas tidas por necessárias à conservação e fruição das partes comuns do prédio e bem assim, ao pagamento de serviços de interesse comum (cfr. art. 1424 CC).

Cumpre contudo perguntar: E as despesas de contencioso e com honorários de um solicitador ou advogado motivadas pela instauração de ações contra um condómino que não procedeu, por exemplo, ao pagamento das comparticipações para o condomínio, constituem despesas a realizar pelo condomínio?

Como regra, a responsabilidade pelo pagamento das custas assenta no princípio da causalidade e, subsidiariamente, no princípio da vantagem ou do proveito processual: um processo não deve causar prejuízos à parte que tem razão, sendo por isso as custas pagas pela parte vencida, e na medida em que o for; ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito da demanda.

Ora, de facto, estamos face a despesas que operam evidentemente no interesse comum, pela importância que tais comparticipações assumem para suportar os encargos com as partes comuns do prédio. Nessa medida, podem e devem as despesas de contencioso e honorários de solicitador ou advogado, considerarem-se despesas que se inserem no âmbito do pagamento de serviços de interesse comum.

No entanto, podem os condóminos, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, assumir tal encargo (cfr. art. 559º/1 a) CC), ou, pode a assembleia de condóminos deliberar um diferente critério de pagamento de tal serviço, sem que tal deliberação contenda com o estabelecido no regulamento ou com o regime legal da propriedade horizontal.

Como se começou por referir o art. 1424º/1 CC estabelece uma norma supletiva quanto à forma de repartição das despesas. A assembleia de condóminos pode deliberar noutro sentido e atribuir ao condómino o pagamento das despesas de contencioso e honorários com solicitador ou advogado, quando aquele dá causa à acção destinada, por exemplo, a cobrar as prestações para o condomínio. 

Uma tal deliberação, representa uma norma que se enquadra na esfera de poderes conferidos à assembleia de condóminos por estar ainda em causa uma deliberação sobre pagamento de despesas efectuadas no interesse comum.

Conclui-se, assim, que a deliberação que prevê a constituição de mandatário para promover acções judiciais no sentido de obter, por exemplo, a cobrança das comparticipações em divida ao condomínio e faz repercutir as despesas com contencioso e honorários a solicitador ou advogado sobre o respetivo condómino faltoso, insere-se nos actos de gestão da assembleia pois são as comparticipações que permitem suportar os encargos e fruição das partes comuns do prédio. 

Se a promoção de tais acções decorre do interesse comum e constitui uma das funções do administrador do condomínio (cfr. art. 1436º/e) CC), já as despesas inerentes não o são e por isso, justifica-se que tais encargos sejam suportados por quem deu causa às mesmas, como se haja decidido em deliberação.

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