Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

1/21/2022

Dação em cumprimento

A dação em cumprimento é um negócio jurídico do tipo de contratos bilaterais e onerosos utilizado pelo devedor para cumprir, total ou parcialmente perante o credor, as dívidas ou responsabilidades a que está obrigado. Muito utilizada pelos particulares como forma de extinguirem as suas dívidas. Normalmente os bens dados em cumprimento dessa dívida são bens imóveis, pelo que a escritura envolve o pagamento de IMT e Imposto de Selo.

A dação em cumprimento vem referida no art. 837° CC que refere que “a prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento. Daqui resulta que esta causa de extinção das obrigações tem dois pressupostos:

- a realização de uma prestação diferente da que for devida;

- o acordo do credor relativo à exoneração do devedor com essa prestação.

Enquanto no cumprimento o devedor realiza a prestação devida, produzindo assim a extinção da obrigação, na dação em cumprimento realiza um aliud em relação ao que está vinculado, ainda que com o fim de extinguir essa mesma obrigação. Tem sido, porém, questionado se o art. 837° do CC limita a dação em cumprimento às prestações de coisa e, dentro delas, à entrega de uma coisa de natureza diferente (por exemplo: a entrega um barco em lugar do carro prometido), ou se pode igualmente abranger qualquer tipo de prestação diferente da que for devida (por exemplo: a entrega de uma quantia de dinheiro em substituição do barco devido). Certo é que deste preceito não resulta qualquer tipo de limitação (cfr. também os art. 877° nº 3 e 1409° do CC que justificam esse facto).

É elemento essencial da dação em cumprimento que a prestação seja definitivamente realizada, não parecendo ser suficiente a mera celebração do acordo transmissivo do direito. Efectivamente, apesar de o art. 408° nº 1 do CC determinar que a transmissão do direito se dá com a mera celebração do contrato33, parece resultar do art. 837° do CC que a dação em cumprimento só se verifica com a efectiva realização da prestação (cfr. Leitão, Direito das obrigações, volume II, pág. 177).

A dação em cumprimento determina em primeiro lugar a extinção da obrigação que aquela visou satisfazer, com a consequente exoneração do devedor (cfr. art. 837° do CC). Sendo a obrigação solidária, a dação em cumprimento realizada por um dos devedores produz igualmente a extinção da obrigação dos outros devedores (cfr. art. 523° do CC), assim como a realização a um dos credores solidários produz igualmente a extinção da obrigação do devedor perante os outros credores (cfr. art. 532° do CC e relativamente à garantia contra vícios da coisa ou do direito transmitido os art. 837°; 892 e ss., 905° e ss., 913° e ss. e 587° CC. Em alternativa à garantia pelos vícios da coisa ou do direito transmitido nos termos da compra e venda, o credor pode optar pela prestação primitiva e pela repa-ração dos danos sofridos).

A dação pro solvendo ou dação em função do cumprimento, prevista no art. 840° CC, consiste na execução de uma prestação diversa da devida para que o credor proceda à realização do valor dela e obtenha a satisfação do seu crédito por virtude dessa realização por isso na dação pro solvendo o crédito subsiste até o credor venha a realizar o valor dele (por exemplo, através de uma venda do bem entregue ou da cobrança do credito cedido). 

Enquanto na dação em cumprimento se verifica uma causa distinta de extinção das obrigações, na dação pro solvendo há apenas um meio de facilitar o cumprimento das obrigações. Se a dação tem por objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma dívida presume-se igualmente feita pro solvendo (cfr. art. 840° nº 2 CC). Em consequência desta disposição será igualmente qualificada como dação pro solvendo a entrega de um cheque para o pagamento de uma dívida.

A escritura da dação em cumprimento

De sublinhar que, a escritura de dação em cumprimento pressupõe sempre o acordo das partes quanto ao valor a atribuir ao bem entregue para pagamento da dívida. Assim, os bens normalmente dados em cumprimento podem incluir imóveis, prédios rústicos ou urbanos, quotas ou acções de sociedades, veículos automóveis e obras de arte. No entanto podem ser dados quaisquer outros bens, desde que as partes sobre isso cheguem a acordo.

Assim, se o valor do bem for inferior ao valor da dívida, esta fica parcialmente extinta e o devedor poderá entregar ao credor a diferença em dinheiro ou através de outros bens que possua para extinção total da dívida.

Nesta factualidade, na dação em função do cumprimento, o crédito só se extingue quando for satisfeito e na medida respectiva. No mais, e no âmbito das escrituras de dação em cumprimento o Cartório procede à emissão das guias de IMT e de Imposto de Selo quando devidas, obtém toda a documentação necessária relativa aos bens a dar em cumprimento, realiza a escritura e procede ao registo dos bens a favor do novo titular, sejam quotas, veículos automóveis ou prédios.

Pelo acima exposto, os proprietários que tenham adquirido uma fracção autónoma mediante um crédito hipotecário, podem desobrigar-se do ónus da dívida, através deste instrumento. Pese embora os bancos não sejam forçados a aceitar (regra geral, não existe um acordo entre a avaliação que ambas as partes fazem ao imóvel), já existe uma acção julgada nos nossos tribunais onde a entidade financeira viu-se na obrigação de aceitar a entrega da casa pelo devedor, no entanto, este caso não faz necessariamente, jurisprudência.

Esta deverá ser contudo, a solução de último recurso, após esgotada uma possível renegociação do crédito, consolidação de créditos ou a alienação.

Quanto ao valor do imóvel, se a avaliação for inferior ao valor da dívida, o cliente poderá ter que formalizar a contratação de um crédito pessoal para pagar o valor remanescente. Pelo contrário, se a avaliação se tiver superior ao valor de mercado do imóvel, o banco é obrigado a devolver ao cliente a diferença. Importa não olvidar que, ao valor em dívida, acrescem todas as demais despesas relativas aos custo do processo.

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