Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

29 julho 2024

Glossário jurídico - Q

Para um maior e melhor conhecimento das terminologias usadas no domínio jurídico, o presente glossário alfabético foi projectado para apresentar as definições dos principais termos usados no campo do Direito

Qualificação do crime

Configuração atribuída ao crime para que se lhe aplique pena maior ou mais agravada.

Queixa

Exposição do facto criminoso feita pelo próprio ofendido, ou por quem tiver legitimidade para representá-lo; Petição inicial nos crimes particulares ou públicos, em que a lei admite a acção privada.

Queixa-crime 

Exposição do facto criminoso, feita pela parte ofendida ou pelo seu representante legal, para iniciar processo contra o autor ou autores do crime. A queixa-crime pode ser apresentada por qualquer cidadão — é um procedimento penal de carácter privado, que corresponde à denúncia na acção penal pública.

Querela 

Discussão; pequena questão; acusação criminal apresentada em juízo contra alguém.

Quesito 

Questão desenvolvida para instruir a causa jurídica relativamente a aspectos técnicos.

Questão de Direito

Demanda, relativa à reivindicação que alguém faz de um direito suposto, ou de interesses das partes, baseados nos argumentos que expõem, fundamentados legalmente.

Questão de facto

A que se reporta à matéria de facto que resulta do apuramento de ocorrências da vida real, mas também os que têm a ver com a vida psíquica e sensorial do indivíduo.

Quórum

Quantidade necessária de pessoas, podendo ser o número mínimo ou máximo de membros presentes ou formalmente representados, para deliberação numa assembleia ou para tornar válidas as decisões tomadas.

25 julho 2024

Glossário jurídico - I


Para um maior e melhor conhecimento das terminologias usadas no domínio jurídico, o presente glossário alfabético foi projectado para apresentar as definições dos principais termos usados no campo do Direito

Ignorância da lei

A ignorância ou má interpretação da lei não justifica o seu incumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.

Ilegal

Que é contrário à lei e à ordem pública. Ilegítimo. Ilícito

Ilícito

Qualidade negativa de determinado acto, declaração ou situação ilegal. A sua constatação depende sempre da operação prévia de interpretação ou aplicação das normas legais (com origem na lei ou em outras fontes de direito).

Imóvel

Por oposição a bem móvel, qualquer coisa que não possa ser deslocada ou que seja legalmente classificado como tal. Os exemplos mais clássicos são os prédios rústicos (i.e., terrenos delimitados), os prédios urbanos (i.e., edifícios incorporados no solo), quaisquer elementos que se encontrem ligados ao prédio de modo permanente, e ainda quaisquer árvores e frutos que estejam ligados ao solo.

Imparcialidade

Princípio de não favorecimento de nenhuma das partes, assegurando às partes envolvidas igualdade de tratamento. A imparcialidade envolve uma exigência de isenção entre quem decide e o objecto ou o destinatário da decisão. De acordo com este princípio, o decisor deve ter em consideração todos os interesses relevantes para a decisão, excluindo todos aqueles que se revelarem inapropriados à situação concreta.

Impenhorabilidade

Relação de bens que não podem ser tomados do devedor como garantia para abater da dívida dele com o credor.

Impetrar

Requerer o estabelecimento de qualquer medida judicial, que venha assegurar o exercício de um direito ou a execução de um acto.

Imprescritível

Qualidade ou indicação de tudo o que não é susceptível de prescrição ou do que não está sujeito a ela.

Improcedente

Não conforme ao Direito. Que não se ampara na lei ou na prova produzida em juízo. Que não procede, sem fundamento. Cf. Direito

Improbidade

Qualidade do homem que não procede bem, por não ser honesto.

Improbidade administrativa

Acto praticado por agente público, contrário às normas da lei. São exemplo, os actos que configuram enriquecimento ilícito ou prática de qualquer acção ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições.

Impugnar

Contestar, combater argumentos ou um acto, no âmbito de um processo, apresentando as razões

Imputabilidade

É considerado imputável quem pode ser responsabilizado por um facto punível, por se considerar ter as faculdades mentais e a liberdade necessárias para avaliar o acto quando o praticou.

Imunidade

Regalias e privilégios outorgados a alguém, para que se isente de certas imposições legais, não sendo obrigado a fazer ou a cumprir certos encargos ou obrigações. É atribuída a certas pessoas em face de funções públicas exercidas (parlamentares, diplomatas). A imunidade coloca as pessoas sob proteção especial.

Impedimento

Impeachment em inglês. Processo político-criminal para apurar a responsabilidade dos governantes ou de presidentes da República, cuja pena é a destituição do cargo.

Inamovibilidade

Prerrogativa constitucional assegurada aos juízes e magistrados do Ministério Público, salvo por promoção, remoção a pedido, ou decisão do tribunal competente, perante o interesse público.

Incapacidade

Falta de qualidades ou ausência de requisitos indispensáveis para o exercício ou gozo de direitos.

Incapacidade civil

Falta de aptidão, da parte de pessoas, para o exercício ou gozo de seus direitos. A incapacidade pode ser absoluta ou relativa.

Incidente processual

Em regra, o incidente deve ser resolvido antes da decisão da questão principal em causa objecto do litígio.

Incidente de uniformização de jurisprudência

Instituto que visa uniformizar a interpretação do direito no âmbito dos tribunais.

Incompetência

Falta de competência; falta de autoridade ou dos conhecimentos necessários para o julgamento de alguma coisa.

Inconstitucionalidade

Contrariedade da lei ou de acto normativo estabelecido na Constituição. Essa incompatibilidade pode ser formal (quando não foram observadas as regras necessárias ao processo de elaboração e edição legislativa) ou material (quando diz respeito ao próprio conteúdo da lei ou do acto normativo, se este está conforme os princípios e normas constitucionais).

Incumprimento

Deixar de cumprir. Inexecução de um contrato ou inobservância de suas cláusulas e condições; inadimplência.

Indeferimento tácito

É a recusa, por parte da Administração, da pretensão de um particular, operada automaticamente pela falta de resposta, dentro do prazo legal, a um pedido deste.

Indemnização

Compensação devida a alguém de maneira a anular ou reduzir um dano, geralmente, de natureza moral ou material. Reparação do prejuízo de uma pessoa, em razão da inexecução ou da deficiente execução de uma obrigação ou da violação de um direito absoluto.

Independência funcional

Os magistrados, no exercício das suas funções, têm inteira autonomia em relação ao processo, não dependendo de ordens dos seus superiores hierárquicos.

Indignidade

A indignidade é a exclusão do sucessor devido ao facto do mesmo ter praticado um acto reprovável contra o autor da herança, sendo punido com a perda do direito hereditário. A indignidade é uma sanção civil que acarreta na perda do direito sucessório.

Indiciar

Proceder a imputação criminal contra alguém.

Indício

Circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o facto, leva à conclusão da existência de outra ou outras circunstâncias; é a chamada prova circunstancial.

Indulto

Perdão ou absolvição de um erro, ou uma pena que foi aplicada a alguém. Fim do cumprimento de uma condenação. No Direito Penal, o indulto é um benefício que extingue a pena privativa de liberdade. O indulto é concedido por um decreto do Presidente da República.

Para receber o indulto devem ser preenchidos alguns requisitos como: já estar preso há um tempo proporcional à pena, ter cumprido pelo menos dois quintos da pena em regime fechado ou semi-aberto, além de bom comportamento.

Também podem existir outros requisitos que facilitam a concessão do benefício como ser portador de algumas doenças ou deficiências, ou ter filhos menores de quatorze anos (para as mulheres)

Ineficácia

Um acto é ineficaz sempre que não produza todos ou parte dos efeitos que a categoria a que pertence está apta a produzir. A ineficácia verifica-se sempre que os efeitos próprios do acto não se verifiquem no todo ou em parte.

Inepto

A inépsia é particularidade da acusação, queixa ou denúncia que não atenda às exigências determinadas pela lei e, por isso, é rejeitada pelo juiz.

Infligir

Aplicar pena ou castigo.

Informação jurídica

Uma das modalidades do acesso ao direito. Entende-se que o Estado de direito deve criar meios para o cidadão tomar conhecimento efectivo dos seus direitos, dos seus deveres, do conteúdo das leis, das decisões das autoridades que lhe podem interessar, da estrutura e da organização do Estado e de todas as instituições públicas e internacionais. Inclui-se aqui a preocupação de utilização de uma linguagem acessível ao cidadão comum.

Infraconstitucional

Toda regra que não conste do texto constitucional é inferior a ela, pois a Constituição é a lei suprema de um país, exercendo supremacia hierárquica sobre todas as outras leis.

Importunação sexual

Crime atribuído a quem importunar outra pessoa, praticando perante ela actos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual.

Imputação

Atribuir a alguém a culpa ou responsabilidade de qualquer acto.

Inimputabilidade

Condição (prevista no Código Penal) que exclui a ilicitude e a culpa.

Injunção

Medida que possibilita ao credor de uma dívida a obtenção de um título executivo, de modo célere e simplificado, sem necessidade de intentar uma ação declarativa num tribunal.

Inimputável

Aquele que, por falta de capacidade, não pode ser responsabilizado pelos seus atos.

Inquérito

Em processo penal, é a fase dirigida pelo Ministério Público (MP) que compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas em ordem à decisão sobre a acusação. O Ministério Público no inquérito em processo penal é coadjuvado pelos órgãos de polícia criminal.

Inquirição

Interrogatório judicial. Audição pelo juiz dos depoimentos que possam ser úteis ao processo.

Irrevogabilidade

O que não se pode revogar ou anular.

Insolvência

Situação em que uma empresa se encontra quando não consegue cumprir as suas obrigações vencidas, ou seja as obrigações cujo cumprimento é devido naquele momento. A situação de insolvência tem de ser declarada por decisão de um tribunal.

Insuficiência económica

Encontra-se em situação de insuficiência económica aquele que não tem condições objectivas para suportar pontualmente os custos de um processo. por esse motivo, beneficia de apoio judiciário nas modalidades de pagamento faseado e de atribuição de agente de execução.

Instância

Grau de hierarquia do poder judiciário. A primeira instância é onde em geral começam as ações. A segunda instância, onde são julgados recursos. A terceira instância integra os tribunais superiores que julgam recursos contra decisões dos tribunais de segunda instância.

Instrução

Em processo penal a Instrução é uma fase processual facultativa, que visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

Interdição

Acto judicial pelo qual se declara a incapacidade de determinada pessoa, maior de idade, de praticar certos actos da vida civil.

Interesses colectivos ou difusos

Interesses comuns de pessoas não ligadas por vínculos jurídicos, ou seja, questões que interessam a todos, de forma indeterminada.

Interpretação

Acto relativo à operação que um jurista realiza para retirar o sentido que determinada regra jurídica deve ter para resolver uma situação em concreto, dela extraindo uma solução normativa para a regulação desse caso que é sempre classificado (qualificado) em face dos factos que o constituem.

Interpelação judicial

Instrumento judicial pelo qual uma pessoa dirige petição ao juiz, para pedir esclarecimentos acerca da conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal.

Interrogatório

Acto processual no qual a autoridade judicial obtém as declarações do arguido sobre os factos que lhe são imputados. Tem várias finalidades, com o intuito de alcançar a descoberta da verdade e garantir a defesa do arguido.

Intimação

Comunicação a alguém da existência de um acto processual para que faça ou deixe de fazer alguma coisa.

Instrução

Fase processual facultativa em que o juiz, ouvidas as partes, fixa os pontos sobre os quais incidirá a prova.

Invalidade

Valor jurídico negativo que afeta o acto administrativo devido à sua inaptidão para a produção de efeitos jurídicos que devia produzir. A invalidade pode assumir diversas formas, denominadas de desvalores jurídicos que se traduzem em regimes diversos. Os dois desvalores típicos dos actos da administração são a nulidade e a anulabilidade.

Inventário

Descrição e avaliação de bens, tendo em vista a partilha dos bens, nomeadamente nos casos de óbito, e de separação ou de divórcio.

Inversão do ónus da prova

A regra em Direito é que quem alega um determinado facto tem a obrigação de prová-lo. É o que conceptualmente se designa de ónus de prova. Cabe ao autor de uma demanda judicial a responsabilidade de comprovar a mínima verossimilhança dos fatos por ele narrados. A inversão do ónus de prova exige a verificação dos seguintes pressupostos: que a prova de determinada factualidade, por acção da parte contrária se tenha tornado impossível de fazer; e que tal comportamento, da mesma parte contrária, lhe seja imputável a título culposo.

24 julho 2024

Livro de reclamações


O livro de Reclamações, enquanto instrumento de cidadania, está regulamentado através do DL n º156/2005, de 15 de Setembro com as alterações subsequentes e está disponível nos formatos electrónico – através da correspondente plataforma tecnológica – e físico.

O condómino (enquanto consumidor pelo serviço prestado) tem à sua disposição o livro de reclamações físico no estabelecimento do operador (escritório da empresa de administração de condomínios) e o electrónico em www.livroreclamacoes.pt, onde poderá submeter a reclamação contra a empresa reclamada, ficando este obrigado a responder ao consumidor no prazo máximo de 15 dias úteis, sendo a reclamação também objecto de tratamento pela respectiva entidade reguladora ou fiscalizadora competente.

Quando o condómino apresenta uma reclamação através do Livro de Reclamações Electrónico, o administrador - enquanto operador económico - está obrigado a enviar-lhe uma resposta para o e-mail indicado no prazo de 15 dias úteis, que é recebida pela entidade reguladora/fiscalizadora da actividade desse operador económico, conforme a legislação havida em vigor.

Nesta conformidade, após a feitura da reclamação, o condómino deve aguardar pela resposta à mesma, contudo, caso decorram os referidos 15 dias úteis sem que o condómino tenha obtido uma competente resposta, pode e deve denunciar a situação à entidade reguladora/fiscalizadora do sector em questão, que actualmente, é o Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Construção (IMPIC). Esta entidade tem o poder de fiscalização quanto ao cumprimento das regras relativas à existência e disponibilização ao público do Livro de Reclamações nestas empresas.

No entanto, se o condómino obteve uma resposta dentro dos referidos 15 dias úteis, mas a mesma não foi de todo ao encontro da sua melhor expectativa, se assim o entender, pode e deve recorrer à resolução alternativa de conflitos.

A generalidade das reclamações feitas contra as empresas de administração de condomínio, via de regra, estão relacionadas com questões contratuais entre o condomínio e o administrador, nomeadamente no que concerne ao incumprimento do prazo para as marcações das assembleias de condóminos, a falta ou a deficiente prestação de contas e /ou da respectiva documentação comprovativa de suporte ou a não resolução atempada de problemas relacionados com as partes comuns do prédio.

Caso o condómino pretenda apresentar a sua reclamação relativa à actuação de uma empresa de administração de condomínio pode, ainda, recorrer ao Livro de Reclamações Electrónico. 

Para preencher uma reclamação no Livro de Reclamações Electrónico, o condómino deve:
  • Reunir toda a documentação necessária, nomeadamente os dados de identificação da empresa de administração sobre a qual pretende reclamar;
  • Aceder à plataforma do Livro de Reclamações Electrónico e seleccionar a opção "Fazer reclamação";
  • Preencher todos os campos do formulário que são apresentados e relatar de forma clara os factos que motivaram a reclamação;
  • Indicar o seu endereço de e-mail para receber as notificações relacionadas com a reclamação na sua caixa de correio electrónico;
  • Finalmente, clicar em "Submeter".
Atente que o Livro de Reclamações Electrónico não é um mecanismo de resolução de conflitos de consumo. No caso de se sentir lesado, pode recorrer aos Centros de Arbitragem de Conflitos de Consumo e Centros de Informação Autárquicos ao Consumidor (CIAC). 

Para obter mais informações acerca destas entidades, pesquise no nosso blogue.

Os estabelecimentos / escritórios das empresas de administração de condomínios têm de ter um Livro de Reclamações?

Sim, de acordo com o previsto no nº 2 do art. 1º do DL 156/2005, de 15 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo DL 371/2007, de 6 de Novembro, passou a ser obrigatória a existência de um Livro de Reclamações, para todos os prestadores de serviços ou fornecedores de bens, desde que exista um estabelecimento físico, fixo ou permanente que tenha um contacto directo com o público.

Em que situações não é o Livro de Reclamações obrigatório?

Não é necessário ter o Livro de Reclamações, se estivermos perante estaleiros, tal como definidos no DL 155/95, de 1 de Julho, como os locais temporários ou móveis onde se efectuam trabalhos de construção de edifícios e de engenharia civil, designadamente:
  • Escavação;
  • Terraplanagem;
  • Construção de edifícios;
  • Ampliação de edifícios;
  • Alteração de edifícios;
  • Reparação, restauro e conservação de edifícios;
  • Montagem e desmontagem de elementos pré-fabricados;
  • Montagem e desmontagem de andaimes, gruas e outros aparelhos elevatórios;
  • Demolição;
  • Trabalhos especializados no domínio da água (irrigação, drenagem, adução, redes e tratamento de esgotos);
  • Canalizações (instalações de gás, água e equipamento sanitário);
  • Instalações de aquecimento e de ventilação (instalação de aquecimento central, ar condicionado e ventilação);
  • Isolamento térmico, acústico, antivibrações e impermeabilização;
  • Instalações elétricas, de antenas, para-raios e telefones;
  • Outros trabalhos que possam ter de efectuar-se em obras de construção de edifícios e de engenharia civil;
  • bem como os locais onde se desenvolvem actividades de apoio directo àqueles trabalhos.
Quantos Livros de Reclamações pode ter uma empresa de administração de condomínios?

Uma empresa de administração de condomínios pode ter tantos Livros de Reclamações, quantos os locais (sede, sucursais, filiais) onde exerça a sua actividade comercial (para todos os efeitos, aplica-se esta equiparação) , através de serviços de atendimento ao público.

A publicitação no sítio da Internet com instrumentos que permitam os consumidores reclamarem dispensa a existência do Livro de Reclamações?

Não. Esta prerrogativa é facultativa, não dispensando a existência do Livro de Reclamações.

Os Livros de Reclamações têm algum modelo próprio?

Sim, os livros de reclamações têm de se conformar com os modelos estabelecidos na Portaria nº 1288/2005, de 15 de Dezembro.

O não envio do original destacado do Livro de Reclamações, contendo a reclamação, tem algumas consequências?

Sim. A omissão deste procedimento, constitui contra-ordenação punível com coima de € 250,00 a € 3 500,00 e de € 3 550,00 a € 30 000,00, consoante o infractor seja pessoa singular ou colectiva.

Existe uma obrigação da empresa também facultar uma cópia da reclamação ao condómino?

Sim, existe a obrigação de entregar o duplicado da reclamação ao condómino.


22 julho 2024

Prescrição 5 e 20 anos


A obrigação do condómino de pagar as despesas normais atinentes à manutenção e conservação do imóvel, despesas essas necessárias para a conservação e fruição das partes comuns do condomínio, reconduzíveis a quotizações ordinárias (aqui se incluindo as atinentes a contribuições para o Fundo Comum de Reserva), resultantes da aprovação do orçamento anual de receitas/despesas do condomínio, repartidas pelos condóminos, porque se renovam anualmente enquanto durar o condomínio, prescreverão em 5 anos, nos termos do art. 310º, al. g) do CC e o prazo da prescrição começará a correr da data em que a prestação pode ser exigida — cfr. nº 1 do art. 306º do CC.

Assim, conforme se concluiu no Acórdão do TRP de 06-04-2017 (Pº 6756/16.1T8PRT-A.P1, rel. VIEIRA E CUNHA): “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais, nos termos do art.º 1424º CCiv, e, por isso, renovam-se anualmente, enquanto durar o condomínio – art.ºs 1424º e 1431º, prescrevendo no prazo de cinco anos – al. g) do art.º 310º CCiv.”.

Mas o embargado entende que as obrigações atinentes às quotas extraordinárias, por não se tratar de uma obrigação periodicamente renovável - mas sim, de uma despesa eventual/extraordinária - apenas poderá prescrever nos termos gerais, em 20 anos (cfr. art. 21º da contestação) – cfr. art. 309º do CC.

Será assim?

Neste ponto, subscrevemos as considerações expendidas a respeito desta temática no Acórdão do TRP de 04-02-2016 (Pº 2648/13.4TBLLE-A.P1, rel. ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA) do seguinte teor:

"Nos termos da al. g) estão sujeitos a um prazo de prescrição de 5 anos, entre outros, os créditos relativos a “prestações periodicamente renováveis”. Interessa pois determinar o que se deve entender por prestações periodicamente renováveis para efeitos desta norma.

Em função da influência do tempo sobre o seu objecto, é costume distinguir, usando a terminologia de Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, p. 85 e ss., entre as prestações instantâneas, as prestações duradouras e as prestações fraccionadas ou repartidas.

As prestações instantâneas são aquelas cujo objecto é realizado num único momento, ou seja, o comportamento exigível do devedor esgota-se num só momento (quae único actu perficiuntur). Ao invés, nas prestações duradouras a prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória uma influência decisiva na conformação global da prestação, ou seja, não só o devedor é chamado a efectuar diversos actos para satisfação do direito de crédito do credor, como a extensão desses actos depende decisivamente do factor tempo.

Dentro das obrigações duradouras distinguem-se ainda as prestações de execução continuada, que são aquelas cujo cumprimento é feito continuamente ao longo do tempo, e as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo que são aquelas que se renovam no fim de períodos temporais consecutivos, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos.

Existem ainda prestações fraccionadas ou repartidas que são aquelas cujo cumprimento se protela no tempo mas em que o facto tempo não tem influência sobre o objecto da prestação mas apenas sobre o modo da sua execução, isto é, o objecto da prestação foi fixado previamente e permanece inalterado ainda que, por acordo das partes, o seu cumprimento deva ser feito ao longo de tempo, em momentos separados dividido em fracções ou parcelas.

Quando a al. g) do art. 310º do CC se refere a prestações periodicamente renováveis está pois a reportar-se às prestações emergentes de obrigações duradouras que se classificam como prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, como é o caso da prestação de pagamento da renda a cargo do arrendatário ou da prestação de pagamento do consumidor de água ou electricidade a cargo do adquirente no contrato de fornecimento desse bens.

As prestações relativas ao pagamento das despesas comuns do condomínio que incumbem ao condómino são prestações periodicamente renováveis?

Numa primeira aproximação, a resposta tende a ser afirmativa. Com efeito, essas despesas são normalmente relativas a encargos com a limpeza e a segurança do prédio, o seguro, a aquisição de água e electricidade para as necessidades e zonas comuns, os contratos de manutenção dos serviços comuns como os elevadores e os equipamentos energéticos. Tais despesas têm como causa bens e serviços utilizados ou produzidos quotidianamente, de forma paulatina mas constante, pelo que não apenas o respectivo custo está associado ao decurso do tempo e dele depende essencialmente, como a obrigação de as suportar se renova no fim de períodos temporais consecutivos, em regra a anuidade, sendo então aí cumpridas através de uma prestação instantânea correspondente a um desses períodos (ainda que o regulamento do condomínio possa estabelecer que o pagamento pelo condómino seja feito, por exemplo, em duas prestações semestrais). Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os Acs. TRL de 22.4.2010, rel. Márcia Portela (p.º 5892/04.1YXLSB.L1-6), de 21.6.2011, rel. Amélia Ribeiro (pº 7855/07.6BOER-A.L1-7), da TRC de 14.11.06, rel. Artur Dias (p.º 3948/04.0TBAVR.C1), e da TRP de 27.05.2014, rel. Vieira Cura (pº 4393/11.6TBVLG-A.P1).

Pode suceder que o condomínio delibere a prática de um acto isolado gerador de uma despesa singular, designadamente com uma obra extraordinária de conservação ou reparação. Nessa situação, ainda que a despesa seja objecto de inclusão no orçamento e de repartição pelos condóminos na proporção das respectivas quotas a acrescer às despesas correntes e normais, parece questionável que a obrigação de pagamento dessa despesa singular possa ser classificada como prestação periodicamente renovável. Daí que tal como se entendeu no Acórdão desta Relação de 14.09.2015, relatado por Carlos Gil (proc. n.º 388/11.8TJPRT-A.P1) e com o que se concorda em absoluto, “as despesas de conservação, ainda que impostas legalmente com uma periodicidade mínima, não são necessariamente periódicas pois que, se podem ser fixadas a forfait, para serem cobradas anualmente, na veste das denominadas quotizações de condomínio, podem ter carácter pontual determinado em função do concreto custo das obras em causa e do momento em que se decide efectuar certa obra.

Como é sabido, a amplitude das obras de conservação necessárias em cada imóvel varia de acordo com uma multiplicidade de factores…. Daí que, por vezes, as contribuições do condomínio anualmente fixadas e o respectivo fundo comum de reserva não sejam suficientes para custear as obras de conservação necessárias em certo momento. (…) quando as obras de conservação têm carácter pontual e são adrede custeadas pelos condóminos e não a forfait, não é o tempo, o seu decurso que determina o custo de tais obras, mas sim as diversas vicissitudes relevantes para a sua concreta valorização…”.

Resulta assim justificado que as prestações para pagamento das despesas comuns do condomínio podem ou não ser prestações periodicamente renováveis. Se o forem, em princípio estão sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos. Caso contrário, o prazo de prescrição da dívida é o prazo ordinário de vinte anos.

Tendo a execução sido instaurada e estando incluídas na quantia exequenda dividas que se venceram mais de cinco anos antes (cfr. art. 323º, nº 2, do CC), aquela distinção carecia de ser concretizada. Porém, pelas razões que se explicam de seguida, isso não se mostra necessário para decidir a excepção.

Vejamos porquê.

Sob a epígrafe “direitos reconhecidos em sentença ou título executivo”, o art. 311º do CC, que sucede aos preceitos que fixam os prazos de prescrição ordinária (309.º) e de cinco anos (310.º), estatui o seguinte no seu nº 1:“O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.

Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição (…)”.

E, em conformidade, concluiu-se no referido aresto de 04-02-2016 que: “Em regra, as prestações do condómino para pagamento das despesas comuns do condomínio serão prestações periodicamente renováveis, sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos, mas isso não será assim quando se tratar de uma despesa singular gerada por um acto isolado, designadamente uma obra extraordinária de conservação ou reparação do edifício. Se após a constituição da dívida sujeita a prazo de prescrição de cinco anos, esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição.”

De igual modo, no Acórdão do TRP de 17-06-2021 (Pº 627/14.3TBVNG-B.P1, rel. JUDITE PIRES) concluiu-se que: “É de vinte anos o prazo prescricional quanto ao direito de crédito [fundado numa acta de assembleia de condóminos] que esteja a ser exercido por via de acção executiva”.

Revertendo estas considerações para o caso, verifica-se que o direito de crédito está a ser exercido por via de acção executiva, o que sucede em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 6º do DL nº 268/94, de 25 de Outubro: “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo”.

Ora, considerando a sua natureza de prestações periodicamente renováveis, pode concluir-se que a obrigação do condómino de pagar as despesas normais atinentes à manutenção e conservação do imóvel, despesas essas necessárias para a conservação e fruição das partes comuns do condomínio, reconduzíveis a quotizações ordinárias (aqui se incluindo as atinentes a contribuições para o Fundo Comum de Reserva), resultantes da aprovação do orçamento anual de receitas/despesas do condomínio, repartidas pelos condóminos, porque se renovam anualmente enquanto durar o condomínio, prescrevem no prazo de 5 anos, nos termos da al. g) do art. 310º do CC.

Sob a epígrafe “direitos reconhecidos em sentença ou título executivo”, o art. 311º do CC, que sucede aos preceitos que fixam os prazos de prescrição ordinária (309.º) e de cinco anos (310.º), estatui o seguinte no seu nº 1:“O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.

Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição (…).

Em regra, as prestações do condómino para pagamento das despesas comuns do condomínio serão prestações periodicamente renováveis, sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos, mas isso não será assim quando se tratar de uma despesa singular gerada por um acto isolado, designadamente uma obra extraordinária de conservação ou reparação do edifício. Se após a constituição da dívida sujeita a prazo de prescrição de cinco anos, esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição.

20 julho 2024

ACTRL 11/07/24: logradouro – parte comum – usucapião


Tribunal: TRL
Processo: 4810/20.4T8LSB.L1-2
Relatora: Higina Castelo
Data: 11-07-2024

Descritores:

Direito de uso
Parte comum
Logradouro

Sumário:

«I.–A invocação, por via de exceção, da aquisição por usucapião do direito de propriedade sobre uma parte originariamente comum de dado prédio apenas poderia ser bem-sucedida se: i. já se encontrasse previamente julgada a aquisição por usucapião; ou, ii. se verificassem in casu não apenas os pressupostos substantivos da usucapião, mas também os processuais determinados pela natureza de parte comum do direito que se pretendia ter adquirido.

II.–Ainda que se possa adquirir por usucapião o direito de propriedade de uma parte originariamente comum, um direito de uso exclusivo de parte comum não é usucapível, por a tanto se opor o disposto no artigo 1293.º, al. b), do CC.

III.–Exerce, sem qualquer abuso, o seu direito de uso exclusivo de parte de um logradouro (parte comum do prédio constituído em propriedade horizontal, afeta ao uso exclusivo da sua fração autónoma) quem, após décadas de permissão gratuita do uso dessa parte por terceiro, retira essa permissão; se assim é quando a permissão integra um contrato de comodato – artigo 1137.º, n.º 2 do CC –, assim será, por maioria de razão, quando existiu mera inércia perante o uso indevido por outrem.»

Texto integral: vide aqui

ACTRL 19/12/23: Responsabilidade administrador


Tribunal: TRL
Processo: 163/20.9T8CSC.L1-7
Relator: Carlos Oliveira
Data: 19-12-2023

Descritores:

CONDOMÍNIO
ADMINISTRADOR
OBRIGAÇÃO DE INFORMAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
PRESCRIÇÃO
PRAZO

Sumário:

1. A responsabilidade civil do administrador do condomínio pelo incumprimento dos deveres legais estabelecidos no Art.º 1436.º do C.C., no quadro do exercício das suas funções, trata-se de responsabilidade obrigacional, por a obrigação de indemnização decorrer do não cumprimento de obrigações específicas de que são credores os condóminos, no quadro da organização estabelecida por lei para a propriedade horizontal (cfr. Art.º 798.º e ss. do C.C.).
2. O prazo prescricional aplicável à responsabilidade civil do administrador de condomínio por violação dos deveres estabelecidos no Art.º 1436.º do C.C. é o prazo ordinário de 20 anos (cfr. Art.º 309.º do C.C.).
3. O administrador do condomínio tem a obrigação de prestar contas, o que compreende a obrigação de prestar todas as informações e esclarecimentos devidos sobre as despesas que realizou no exercício das suas funções, assistindo correspondentemente aos condomínos o direito a essa informação (cfr. Art.ºs 573.º e 1436.º al. j) – correspondente à al. l) do n.º 1 do mesmo preceito, na redação dada pela Lei n.º 8/2022 de 10/1) – ambos do C.C.).
4. Para a procedência da ação destinada a obter o reconhecimento do direito à informação basta verificar-se que o credor tem esse direito e o devedor não cumpriu, ou recusa-se a cumprir, a correspondente obrigação.
5. A obrigação de informações pelo administrador de condomínio não se circunscreve à obrigação de apresentação de contas em assembleia geral de condóminos, nos termos do Art.º 1431.º n.º 1 do C.C., podendo, a todo o tempo, ser solicitado ao administrador que preste esclarecimentos e informações sobre os atos ou despesas que realiza.

Texto integral: vide aqui

15 julho 2024

Quarta parte do rendimento colectável


A fixação de penalidades por atraso no cumprimento da obrigação de pagamento de quotas de condomínio, ou de outras obrigações dos condóminos, vem prevista no nº 1 do art. 1434º do CC. Estas “penalidades”, têm duas funções ou objetivos: (a) pressionar os condóminos ao cumprimento e, também, (b) estabelecer a compensação (indemnização) a que o condomínio tem direito em caso de mora ou incumprimento.

Tratando-se, de uma efetiva cláusula penal moratória, a sua fixação está também sujeita ao disposto nos art. 811º e 812º do CC. Em conformidade com estes normativos, pode a cláusula penal ser reduzida equitativamente quando o seu valor se revelar manifestamente excessivo (nº 2 do art. 812º).

O nº 2 do art. 1434º do citado código, norma de natureza imperativa, fixa um limite máximo às penalidades aplicáveis em cada ano. Esse limite corresponde “à quarte parte do rendimento coletável anual da fração do infractor”.

Como se sabe, o rendimento coletável correspondia a um conceito de natureza fiscal, no âmbito do Código da Contribuição Predial, e que desapareceu do ordenamento jurídico com a aprovação do Código da Contribuição Autárquica (através do DL 422-C/88, de 30.11), dando lugar, para efeitos de tributação de imóveis, à figura do “valor patrimonial”. Contudo, são realidades distintas não podendo esta, sem mais, substituir aquela. 

Na verdade, o rendimento coletável anual correspondia à utilidade económica que os prédios proporcionavam ou eram suscetíveis de proporcionar aos seus proprietários – quer em caso de recebimento de rendas, quer em caso de fruição pelo próprio -, considerando o período de um ano, e que, enquanto receita, constituía a base de cálculo do imposto ou coleta a pagar. 

O “valor patrimonial” corresponde ao efetivo valor do prédio apurado segundo parâmetros legais e constitui a referência para aplicação de uma taxa variável (entre 0,5 e 0,8) cujo produto corresponde ao imposto a pagar. Estes parâmetros de avaliação contêm-se, atualmente, no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), aprovado pelo DL nº 287/2003, de 12-11, cujo art. 31º revogou expressamente o Código da Contribuição Autárquica (e as normas, ainda vigentes à data, do Código da Contribuição Predial).

Não obstante a dissemelhança dos conceitos, a doutrina e a jurisprudência têm convergido no sentido de que, pese embora a referência a “rendimento coletável”, não existe revogação tácita daquele art. 1434º “ou necessidade do mesmo ser interpretado ou integrada qualquer lacuna, fazendo antes apelo ao regime transitório previsto no art. 6º do DL .º 442-C/88, de 30 de Novembro, que aprovou o Código da Contribuição Autárquica” (veja-se Ac. do TRL, do Relator Tomé Gomes, Proc.984/10.OXVLSB.l1-7, proferido em 13.11.2012, publicado em www.dgsi.pt).

Segundo o nº 1 do art. 6º do DL 422-C/88, de 30 Novembro, que, como se disse, era uma disposição destinada a salvaguardar a transição de regimes:

1 - O valor tributável dos prédios urbanos, enquanto não for determinado de acordo com as regras do Código das Avaliações, será o que resultar da capitalização do rendimento colectável, actualizado com referência a 31 de Dezembro de 1988, através da aplicação do factor 15.
2 - O rendimento colectável dos prédidos urbanos não arrendados, reportado a 31 de Dezembro de 1988, é desde já objecto de uma actualização provisória de 4% ao ano, cumulativa, com o limite máximo de 100%, desde a última avaliação ou actualização, não se considerando para o efeito a que resultou da aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 69.º da Lei n.º 2/88, de 28 de Janeiro.

Acompanhando o citado Acórdão, temos que, partindo desta base, cabe ao tribunal “ ponderar, em cada caso concreto, se a sanção pecuniária fixada pela assembleia de condóminos ultrapassa o limite máximo que resulta do nº 2 do art. 1434º do CC, nomeadamente apelando ao valor tributável conhecido com referência ao ano mais próximo, sujeito ao factor 0,15 e, nos termos do nº 2 do art. 1434.º do CC, encontrar a quarta parte do mesmo, daí resultando o limite anual máximo da sanção, independentemente do número de infracções.”

A título ilustrativo, o documento evidencia que o valor patrimonial tributável da fracção foi de €93.572,13, em 2012. Admitindo-se que este valor foi fixado em 2010, sendo igual em 2011, anos em que ocorreram as faltas de pagamento de quotas de condomínio, cabe, então multiplicá-lo pelo fator 0,15. Obtém-se o montante de €14.035,82 e calcula-se a quarta parte deste valor, apurando-se um resultado de €3.508,95. Este é, à luz restrita do nº 2 do art. 1434º do CC, o valor máximo da penalidade exigível, em cada ano e independentemente do número de infrações por ele praticadas.

Havendo embora quem entenda que o limite a que alude o art. 1434º/2 do CC, deve ser calculado em função da colecta resultante da aplicação da taxa municipal ao valor patrimonial não cremos, com o devido respeito, que seja a melhor solução. Na verdade, estas taxas de imposto podem variar - segundo decisão da Assembleia Municipal - entre 0,5% e 0,8% (cfr. art. 112º do CIMI) – e esse facto, retira consistência, uniformidade e objectividade ao conceito o que, salvo melhor opinião, introduz desarmonia e desequilíbrio no sistema.

Mas será que a exigência de uma tal cláusula penal, apesar de se conter dentro dos limites legais do nº 2 do art. 1434º do CC, não é, à luz de juízos de equidade, manifestamente excessiva e não deve ser reduzida como preceitua o art. 812º do CC?

Prevê este normativo que a cláusula penal possa ser reduzida pelo tribunal de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente. O mesmo sucede nos casos em que a obrigação tenha sido parcialmente cumprida.

Há também convergência da doutrina e da jurisprudência no sentido de que cabe ao Demandado invocar, fundadamente, a desproporcionalidade da cláusula. Essa apreciação pode ocorrer por força do art. 26º da LJP.

Vejamos, então.

A obrigação cujo cumprimento aqui se exige tem natureza pecuniária. Nas obrigações pecuniárias, o devedor que não cumpra atempadamente incorre na obrigação de indemnizar o credor pelo dano que lhe causou. Essa indemnização corresponde aos juros de mora, à taxa legal, desde a data do incumprimento até integral pagamento (cfr. art. 804º a 806º do CC). A taxa de juros de mora legal corresponde a 4%.

Se no caso relatado tivesse sido aplicada a taxa de juros legal, a penalidade a cargo do Demandado, relativamente ao ano de 2010, em que as quotas não pagas perfaziam €220,64 e foram pagas antes do final de junho de 2013, rondaria os €22. Este montante é de tal forma irrisório que a sua mera aplicação como sanção pecuniária lhe retiraria toda a força dissuasora de abusos de falta de pagamento. Na verdade, como já se disse, a fixação de uma cláusula penal estabelecida para o atraso no pagamento tem uma dupla função coercitiva e indemnizatória.

Na PH, a cláusula penal tem o objectivo de punir os inadimplentes não só pela falta de entrega, em si, de receitas que pertencem ao condomínio mas, sobretudo, pelos prejuízos que a todos causa a falta de contribuição de alguns para a gestão e conservação das partes comuns do prédio, desde a limpeza dos espaços comuns até à realização de obras de conservação, por vezes, de caráter urgente. E a falta de cumprimento é, ainda, grave num condomínio, porquanto é geradora de mau estar nas relações entre os comproprietários, comprometendo, muitas vezes, o bom funcionamento das assembleias e a sã discussão de temas do interesse de todos. Neste enquadramento não se afigura adequado que a cláusula penal se limite aos juros moratórios à taxa legal; ela deve ser mais gravosa.

Uma cláusula penal que impõe o pagamento de €5 por cada mensalidade em atraso e por cada mês em que perdurar o atraso desde que este seja superior a 90 dias não se nos afigura, na perspectiva simples do montante fixado, exagerada. Todavia, quando o atraso corresponde a várias quotas e perdura por vários meses ela é suscetível de conduzir a valores exorbitantes, que ultrapassarão largamente o prejuízo efetivamente sofrido, pois não está sujeita a um limite máximo que interrompa a contagem da penalidade; antes se verifica que continuará a contar-se ad eterno, enquanto não ocorrer o pagamento. Por outro lado, esta penalidade é igual para todos os condóminos independentemente do valor das quotas a cargo de cada um, o que impede que cada um seja penalizado na proporção do prejuízo efetivamente causado com o atraso. Convenhamos que, embora do ponto de vista da conduta em si, tanto seja censurável a falta de pagamento de uma quota de €20 como uma de €40, já causará mais danos na gestão do prédio a falta de pagamento da segunda.

Voltando à situação concreta, apuramos que no caso do Demandado - a quem competia pagar em 2010 uma quota mensal de €27,58 e a quem está a ser exigida uma penalidade de €5 por cada mês de atraso - a penalidade representa um valor correspondente a 18,13% por cada mês de mora, o que, feitas as contas, vem a corresponder a uma taxa de juros anual de 217,56%. Num segundo ano de mora, a taxa passa a ser de 435,12% e em três anos e meio é de 543,9% que é, sensivelmente, o que vem imputado ao Demandado relativamente às quotas vencidas em 2010 e pagas em 2013.

Vista nesta perspetiva, a cláusula penal em estudo revela-se, em termos de equidade, manifestamente excessiva. É que, não pode a sanção ser de tal forma pesada que exceda os normais ditames da vida em sociedade, podendo tomar-se como referência outras actividades em que a mora no cumprimento de uma obrigação pecuniária e os danos daí resultantes são antecipadamente calculados, mantendo-se um equilíbrio entre o sancionamento eficaz e a manutenção da sanção em limites que não levem ao desencorajamento da liquidação ainda que atrasada.

No caso presente, em face da desproporção da taxa de juro anual, a que efetivamente corresponde a aplicação da sanção de €5/mês, perante o regime geral da mora, justifica-se a redução equitativa de tal sanção por se revelar manifestamente excessiva (vide art. 812º do CC).

Note-se que, não havendo redução, permite-se, na prática, um verdadeiro enriquecimento do condomínio sem causa justificativa e à custa dos seus comproprietários pois os montantes recebidos situar-se-iam muito para além dos prejuízos sofridos. Por outro lado, e como já dissemos, essa redução não pode conduzir a um valor muito baixo sob pena de retirar eficácia à cláusula penal.

Posto que se nenhuma das partes aduzir factos que permitam conhecer as concretas qualidades do imóvel, nomeadamente, em termos de utilidades proporcionadas pelas partes comuns e, tão-pouco, o nível sócio económico dos seus comproprietários, resta-nos o bom senso, as regras da experiência comum e as orientações legais acima enunciadas. Em tais termos, afigura-se-nos adequado, partindo da base de €5/mês que foi a vontade expressa dos condóminos, fixar um limite máximo ao cálculo das penalidades, limite este que será igual ao valor da quota em mora.

Dito de outro modo, à deliberação de “ qualquer Condómino que apresente mensalidades em dívida por um período superior a 90 dias, acresce a cada uma das referidas mensalidades uma sanção pecuniária de €5 (cinco euros) mensal até à completa regularização das mesmas” acrescentaremos “ A sanção a aplicar terá como limite máximo um valor igual ao da(s) mensalidade(s) não paga(s)”.

No caso, as quotas não pagas perfazem, em 2010, €220,64; em 2011, perfazem €330,96 e em 2012 perfazem €220,64, o que dá um valor global de €772,24. Logo, a penalidade máxima exigível, segundo a equidade e atendendo à demora no pagamento, corresponde a um valor igual a essas quotas, logo, a €772,24.

09 julho 2024

ACTRL 26/01/21: Omissão de convocação


Tribunal: Relação de Lisboa
Processo: 27942/16.9T8LSB.L2-1
Relator: Eurico Reis
Data: 26 Janeiro 2021

Descritores:
Assembleia de condóminos
Omissão de convocação
Caducidade
Inconstitucionalidade

Sumário:

I. A revogação pelo Tribunal da Relação de Lisboa de um despacho saneador inicialmente proferido com o fundamento de que, não o tendo sido, deveria ter sido proferido despacho concedendo prazo à Autora para corrigir a petição inicial por si apresentada nestes autos, por forma a serem elencados também como réus, para além da Administração do Condomínio, todos os condóminos do prédio constituído em propriedade horizontal e não apenas os que votaram favoravelmente as deliberações tomadas na assembleia geral de condóminos, com a consequentemente determinação de que um tal despacho tinha de ser proferido, não implica necessariamente a anulação ou a declaração sem efeito do processado anterior a esse despacho revogado.

II. E, porque essa anulação ou declaração sem efeito desse processado não foi decretada pelo Tribunal da Relação, uma vez que a Autora tinha apresentado, em tempo oportuno, uma resposta às excepções invocadas na primeira contestação introduzida em Juízo pelo Réu Condomínio, não é nula a decisão que apenas admitiu a segunda resposta da Autora na parte respeitante às novas questões suscitadas na segunda contestação apresentada pelo Réu Condomínio na sequência da nova petição inicial da Autora.


III. A omissão de convocação de um condómino para uma assembleia de condóminos consubstancia uma conduta que é, em termos conceptuais - lógicos e ontológicos -, totalmente inconfundível e distinta de uma deliberação aprovada numa tal assembleia, pelo que o disposto no art.º 1433º do Código Civil, e em particular o que aí se estatuí acerca do prazo de caducidade para intentar uma acção de anulação de deliberações da assembleia de condóminos, não pode aplicar-se à regulação da primeira dessas situações.


IV. E não existindo no Código Civil uma norma que expressamente regule e estabeleça os efeitos de um tal comportamento omissivo (não convocação de um condómino para a assembleia de condóminos), porque o tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio (art.º 8º n.º 1 do Código Civil), forçoso se torna encontrar uma solução jurídica para essa situação litigiosa.


V. Para efeito da construção dessa norma reguladora, é indispensável recordar que, nos termos do disposto no art.º 294º do Código Civil, os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei, tudo isto sendo certo que, por força do estatuído no art.º 295º do mesmo Código, aos actos jurídicos que não sejam negócios jurídicos são aplicáveis, na medida em que a analogia das situações o justifique, as disposições do capítulo precedente, e, sem lugar para qualquer dúvida, a convocação de um condómino para uma assembleia de condóminos é um acto jurídico.


VI. E, para o mesmo efeito, importa também lembrar que, como estabelecem, respectivamente, os nºs 2 e 1 do art.º 280º ainda do Código Civil, também aplicáveis à regulação dos efeitos dos actos jurídicos, cometidos ou omitidos, são nulos os negócios jurídicos contrários à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes, sendo também nulos os negócios jurídicos cujo objecto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável, não se aplicando aqui a ressalva prevista no art.º 281º («Se apenas o fim do negócio jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes, o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes.»), porque, repete-se, o que está em causa nestes autos é um acto jurídico unilateral (apesar de receptício).


VII. É eticamente indefensável e socialmente muito grave omitir um acto com essa dignidade institucional e legal, porque essa não convocação priva um condómino da possibilidade de participar na assembleia defendendo os seus interesses legítimos e os seus direitos, o que constitui uma falha inaceitável nas Sociedades que se organizam segundo o modelo do Estado de Direito (art.º 2º da Constituição da Republica), tanto mais que o direito à propriedade e à iniciativa privadas são direitos fundamentais de todas as pessoas, estando como tal reconhecidos, respectivamente, nos artºs 62º e 61º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e no art.º 17º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adoptada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas através da sua Resolução 217A (III), de 10 de Dezembro de 1948.


VIII. E é exactamente porque esses direitos têm esse mais elevado nível de protecção ética, institucional e legal (constitucional), que a sua violação constitui uma ofensa à ordem pública e aos bons costumes, logo, um abuso de direito.


Texto integral

Vide redacção do acórdão aqui.

Glossário do Condomínio - U


Para um maior e melhor conhecimento das terminologias usadas no regime da propriedade horizontal, o presente glossário alfabético apresenta as definições dos principais termos usados no âmbito condominial.

Usucapião

A usucapião é a aquisição originária de um direito real (da propriedade) com fundamento na posse de longa duração. Por outras palavras, tem o direito de invocar a usucapião quem tenha sido possuidor de uma coisa durante um longo período, tornando-se proprietário ao fazê-lo. Através da usucapião, a «propriedade diminuída» que é a posse transforma-se em propriedade plena ou, noutra maneira de ver a coisa, a mera «relação de facto» com uma coisa transforma-se numa «relação de direito». Esta destrói qualquer outro direito anterior; o que significa que, feita a prova da posse boa para usucapião, fica provado o direito real de que o autor se arroga (art. 1287º CC)

08 julho 2024

Prescrição dívidas


Conforme decorre do disposto no nº 1 do art. 298º do CC, a prescrição traduz-se no “não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei” de direitos que a lei não qualifique como indisponíveis ou declare dela isentos. Assim, a prescrição visa salvaguardar a segurança e a estabilidade das relações jurídicas, garantindo ao beneficiário da mesma a possibilidade de, transcorrido que seja, um determinado tempo fixado na lei, recusar o cumprimento que lhe venha a ser exigido, conforme decorre do art. 304º do CC que determina que, “uma vez completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.

Como refere Pais de Vasconcelos (Teoria Geral do Direito Civil, 5.ª Edição, Almedina, pag. 380), “a prescrição é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício, e traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita. Se o credor, ou o titular do direito, deixar de o exercer durante certo tempo, fixado na lei, o devedor, ou a pessoa vinculada, pode recusar o cumprimento, invocando a prescrição”.
Uma vez invocada, a prescrição constitui um facto impeditivo do direito invocado pelo credor daquele que a invoca.

É de salientar que a prescrição não configura um facto extintivo, na medida em que não extingue a obrigação prescrita, a qual subsiste, embora convertida em obrigação natural e, daí que, o nº 2 do art. 304º do CC estabeleça que, cumprida a obrigação prescrita, não há lugar à repetição do indevido.

A prescrição constitui uma excepção que permite ao devedor impedir o exercício do direito de crédito pelo credor (cf. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 9.ª Edição).

O prazo ordinário de prescrição é de 20 anos (art. 309º do CC), daí resultando que se não houver disposição legal que sujeite especificamente o crédito a um prazo de prescrição diferente, a prescrição do mesmo só ocorre uma vez ultrapassado aquele prazo. Todavia, no art. 310º do CC estabelecem-se diversos casos em que o prazo de prescrição é mais curto.

Destarte, pese embora o dito prazo ordinário da prescrição (20 anos), hão prazos mais curtos, excepcionais, de 5 anos (art. 310º do CC), de 6 meses (art. 316º do CC) ou de 2 anos (art. 317º do CC). 

O art. 310º, do CC, em especial, elenca várias situações que prescrevem as situações que se balizam no prazo de 5 anos [cfr. al. a) a f)], sendo que na al. g), refere-se expressamente que também prescrevem no mesmo prazo “…Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis...”.

Conforme ensinam Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, vol. I, pag. 280), “não se trata, nestes casos, de prescrições presuntivas, sujeitas ao regime especial estabelecido nos art. 312º e seguintes, mas de prescrições de curto prazo, destinadas essencialmente a evitar que o credor retarde demasiado a exigência de créditos periodicamente renováveis, tornando excessivamente pesada a prestação a cargo do devedor”.

Como refere a doutrina, a razão de ser da fixação deste prazo curto, tem por finalidade evitar que o credor, retardando a exigência dos créditos periodicamente renováveis, os deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor. E, no mesmo sentido, vai a jurisprudência, como é o caso do Ac. do STJ, de 02.05.2002, onde, a propósito de uma situação de prescrição a curto prazo, se decidiu que:

“O prazo da prescrição, começa a contar-se da exigibilidade de cada prestação. Tal prescrição, interrompe-se, todavia, pela citação ou qualquer acto que exprima a intenção de se exercer o direito. A razão de ser de um prazo curto de prescrição das prestações periodicamente renováveis é evitar que o credor as deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor...”. 

Ora, salvo o devido respeito, e no seguimento do entendimento que temos como a melhor doutrina e jurisprudência, afigura-se-nos ser esta, justamente, a situação atinente às quotas de condomínio, ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos, constituem obrigações reais, que ambulatórias ou não ambulatórias, são prestações periodicamente renováveis.

Na verdade, não nos parece curial a tese no sentido de que as prestações em dívida constituam per si prestações instantâneas fraccionadas. Estas ocorrem quando, existindo uma única prestação, instantânea por natureza, esta é realizada por partes, ou seja, executada por diversas parcelas, em consequência de convenção das partes. 

O objecto global da prestação é, neste caso e ao invés do que sucede na prestação duradoura, desde o início fixado, mas a execução é escalonada no tempo, realizando-se por diversas fracções ou prestações. Ao invés, quando, todavia, em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam — posto que decorrentes de uma só relação obrigacional — diversas prestações (isto é, prestações repetidas) a satisfazer regularmente ou sem regularidade exacta, teremos as chamadas prestações «reiteradas, repetidas, contrato sucessivo» ou «periódicas» («lato sensu»). 

Por outras palavras, no domínio das chamadas prestações duradouras, isto é, aquelas que não se esgotam num só momento, antes se distendendo no tempo, uma prestação diz-se periódica quando, protelando-se no tempo, tem de ser realizada em momentos sucessivos, com espaçamento em regra regular. 

Entende-se ser este o caso das ditas despesas condominiais, ou melhor dizendo, “as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum”, como é referido no art. 1424º, nº 1, do CC, que integram, assim, a situação prevista na já referida al. g) do art. 310º, do CC, estando, pois, sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos.

Como ensina Aragão Seia “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do art. 1424º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio — art. 1424º e 1431º. Assim sendo, prescrevem no prazo de cinco anos - al. g) do art. 310º - e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida — cfr. nº 1 do art. 306º CC (…)”.

Mas, todavia, conforme se sublinhou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-07-2019 (Pº 7503/16.3T8FNC-A.L1-7, rel. DIOGO RAVARA), não é forçoso que assim seja:

Com efeito, se é verdade que aquelas despesas sejam impostas com periodicidade mínima, não é forçoso que as mesmas sejam periódicas, porquanto se podem ser fixadas a forfait e cobradas anual, trimestral, ou mensalmente, também podem ter caráter pontual (como sucede relativamente a despesas decorrentes de obras de conservação extraordinárias) – neste sentido cfr. acs. RP de 14-05-2015 (Carlos Gil), p. 388/11.8TJPRT-A.P1, e de 04-02-2016 (Aristides Rodrigues de Almeida), p. 2648/13.4TBLLE-A.P1.

De qualquer modo, como bem apontaram ARAGÃO SEIA e ABÍLIO NETO, as “quotas” ou contribuições fixadas e cobradas com aquele ritmo anual, semestral, trimestral ou mensal têm natureza periódica e por isso ficam sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos previsto na al. g) do art.º 310º do CC – No sentido exposto cfr., entre outros, os arestos já citados, bem como os acs. RL 21-06-2011 (Mª Amélia Ribeiro), p. 7855/07.6TBOER-A.L1; RP 27-05-2014 (Vieira e Cunha), p. 4393/11.6TBVLG-A.P1; e RE 14-05-2015 (Francisco Xavier), p. 3202/09.0TBLLE-A.E1”.

Haverá, pois, que apurar se o objecto da prestação é determinado em função do respectivo tempo de duração (prestação duradoura, de execução continuada ou periódica), ou antes se é essencialmente determinado em função do valor do bem adquirido (prestação fraccionada), sendo que, só para as prestações duradouras de natureza reiterada ou periódica valerá a prescrição de 5 anos a que se reporta o disposto no art. 310º al. g) do CC, enquanto que, as prestações fraccionadas ou repartidas cairiam no âmbito da prescrição ordinária de 20 anos.

Trata-se de uma evidência que as obrigações não reais, respeitantes a direitos disponíveis, se encontram sujeitas a prazos de prescrição, sendo o mais longo de 20 anos, aspecto que não é posto em causa pelo instituto da propriedade horizontal. A obrigação exequenda reporta-se a uma obrigação pecuniária e não tem natureza real.

02 julho 2024

Deliberações unânimes e assembleias universais


O art. 54º nº1, do Código das Sociedades Comerciais (CSC) consagra as figuras das deliberações unânimes por escrito e das assembleias totalitárias ou universais, permitindo, respectivamente, que a vontade social se manifeste fora do conclave ou em assembleia não regularmente convocada, ou sobre assunto não previamente tabelado.

Este art. 54º CSC, sob a epígrafe «Deliberações unânimes e assembleias universais», regula dois tipos de situações: A primeira é a possibilidade de, em qualquer sociedade, os sócios poderem «tomar deliberações unânimes por escrito». Trata-se de uma forma de deliberação em que se prescinde da reunião (vulgo, “assembleia geral”) dos sócios e do método colegial. Precisamente porque este método ou forma afasta o método ou forma tradicional (reunião da assembleia geral) a lei exige que todos os sócios concordem com as propostas de deliberação. A segunda situação regulada é a das assembleias gerais universais, também chamadas “totalitárias”.

Essas assembleias gerais caracterizam-se por serem reuniões em que não foram observadas as formalidades legais relativas à sua convocação, mas em que, estando presentes todos os sócios ou representados todos os sócios e todos manifestando a vontade de que a reunião se constitua como assembleia geral para deliberar sobre determinado ou determinados assuntos, tal é legalmente admissível.

Bem se compreende que quer a deliberação unânime por escrito quer a assembleia universal só sejam viáveis em sociedades com um reduzido número de sócios. Diferente é a deliberação por voto escrito, prevista no art. 247º nºs 1 e 2, também do CSC, só admissível nas sociedades por quotas ou em nome colectivo.

Contudo, no que aqui nos aproveita, sempre se pode dizer que, no âmbito da propriedade horizontal, o voto por escrito, dentro ou fora do conclave, e que "in casu", irreleva, não é admissível, porquanto, inexistindo dialéctica, não há troca de opiniões, de argumentos e de novas informações.

No que concerne à assembleia universal, esta pressupõe a presença de todos os condóminos - pessoalmente ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - e de estar ínsito o propósito de deliberar sobre assuntos de interesse para o condomínio e existir acordo unânime no sentido de se deliberar sobre determinado(s) assunto(s).

Nesta factualidade, importa desde logo salientar que a deliberação final da assembleia totalitária não exige a unanimidade, sendo aprovada nos termos gerais (maiorias simples ou qualificadas quando a matéria em discussão assim o exija).

Trata-se pois, este, de um procedimento concludente e inequívoco da vontade de os condóminos se reunirem sem a necessidade de se observarem os exigidos requisitos havidos fixados no art. 1432º do CC, e de deliberar, pelo que, nenhum terá legitimidade para colocar em crise o que se decidir em plenário, argumentando, no caso, que enferma a assembleia de anulabilidade por vício por a assembleia não ter sido regularmente convocada, ou, sendo-o, com discussão de assuntos não incluídos previamente na ordem de trabalhos.

A assembleia totalitária ou universal justifica-se por, face à presença do universo dos condóminos, estar garantida uma plena participação para se lograr a obtenção de deliberações válidas, independentemente de, a montante, não existir uma convocatória formalmente regular ou de o assunto não estar previamente inscrito na respectiva ordem de trabalhos.

Aduz-se daqui, obviamente que, havendo a assembleia convocada nos termos fixados na lei, e contanto estejam presentes e/ou representados por mandatários, todos os condóminos que reúnam a totalidade do capital investido no prédio, nada obsta a que, havendo o acordo de todos, se incluam novas matérias na ordem de trabalhos e sobre as mesmas se delibere.

Vale isto por dizer que, são requisitos de regularidade da assembleia universal a presença de todos os condóminos - por si, ou devidamente representados por mandatário com poderes especiais - o estar ínsito o propósito de deliberarem sobre assuntos com interesse para o condomínio e o acordo unânime de se deliberar sobre essas determinadas temáticas.

Porém, já não será de exigir a unanimidade na tomada de deliberações subsequentes, as quais que serão aprovadas nos termos gerais - cfr. neste sentido douta opinião do Dr. Pedro Maia "Deliberações dos sócios" in "Estudos de direito das sociedades", 5ª ed., 2002, 175, e Cons. Pinto Furtado, "Deliberações dos Sócios".


Actos de administração ordinários vs extraordinários



Resulta do disposto no art. 1430º/1 do CC que a administração das partes comuns do edifício compete, em primeira linha, à assembleia dos condóminos, mediante a tomada de deliberações colegiais, tomadas em plenário, por maioria simples ou qualificadas, atento o capital investido (cfr. art. 1418º/1 CC) e a executar pelo administrador (cfr. art. 1436º CC).

Nesta factualidade, cabe-lhe, portanto, deliberar relativamente a todos e quaisquer actos no âmbito da administração ordinária, e bem assim, da administração extraordinária. 

Dito isto, cumpre todavia distinguir como podemos estabelecer a definição sobre qual o tipo de actos que devem ser havidos como de administração ordinária ou extraordinária?

Desde logo, sempre podemos afirma que um qualquer acto de administração, para ser qualificado como de administração ordinária ou administração extraordinário, não só não depende de um qualquer critério quantitativo como, por outro lado, não existe consenso suficiente para se definir quais os elementos qualitativos bastantes que permitam realizar um exercício seguro de qualificação jurídica. 

Daqui resulta que tudo depende, portanto, de uma competente análise, realizada casuísticamente, às atribuições da pessoa colectiva ou a ela equiparada (como é o caso dos condomínios), da sua actividade habitual e ainda de outros elementos factuais que importam trazer à lide.

Assim, serão actos de administração ordinária ou de gestão corrente, os que atendam às necessidades normais e quotidianas, os que preparam a execução de actos definitivos, e os actos praticados em áreas de maior discricionariedade contanto não comportem decisões de fundo susceptíveis de impedir ou condicionar os condóminos e que não corporizem inovações ou alterações no condomínio.

Nesta conformidade, serão, ao invés, actos de administração extraordinária ou de disposição, aqueles que exorbitam os actos da mera administração ordinária, ou seja, que se contenham de carácter definitivo e totalmente vinculativos, e ainda que traduzam inovações ou alterações atinentes à situação precedente havida no condomínio.

A este propósito, e com as devidas adaptações, podemos atentar às palavras de Pires de Lima e Antunes Varela que nos ensinam que:

"A administração pode ser ordinária ou extraordinária: 
  • é ordinária quando se destina a prover à conservação dos bens ou a promover a sua frutificação normal; 
  • é extraordinária quando visa a realização de benfeitorias ou melhoramentos nas coisas ou a frutificação anormal (leia-se, excepcional)* dos bens"
Ora, a título meramente ilustrativo, a possibilidade legal de se celebrarem contratos de duração limitada, o que constitui uma ruptura com o anterior princípio da renovação automática dos contratos de arrendamento para fins habitacionais, faz com que estes possam traduzir-se em simples actos de administração ordinária e não em actos de disposição (cfr. art. 1305º CC), como era anteriormente entendido.

Artigo 1024º
(A locação como acto de administração)

1. A locação constitui, para o locador, um acto de administração ordinária, excepto quando for celebrada por prazo superior a seis anos.
2. Porém, o arrendamento de prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes administradores só se considera válido quando os restantes comproprietários manifestem, antes ou depois do contrato, o seu assentimento; se a lei exigir escritura pública para a celebração do arrendamento, deve o assentimento ser prestado por igual forma.

Notas:
* Entre parêntesis, sublinhado nosso.