Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

5/25/2022

Contratos de seguros

Sobresseguro 

Actualmente, i.e., desde que se procedeu à reforma do Regime Jurídico dos Contratos de Seguro de 2008, é clara a diferença entre sobresseguro e pluralidade de seguros, conceitos normativamente autonomizados. 

A pluralidade reporta-se a situações em que mais que um contrato foi celebrado na ordem jurídica entre as quatro identidades (pessoa segura, tempo, risco e interesse). O sobresseguro, por outro lado, na terminologia do art. 132º nº 1 do RJCS reporta-se a situações em que o valor do seguro ultrapassa do valor do interesse em segurar, i.e., em que o valor do capital seguro ultrapassa o valor económico da coisa, direito ou património objecto do contrato. 

Trata-se de um contrato único, com a referida dessincronia entre capital e valor do objecto seguro. A solução instituída pelo nosso ordenamento estabelece licitude deste contrato, com possibilidade de redução e, estando tomador ou segurado de boa-fé, a restituição dos sobre-prémios pagos nos últimos dois anos (cfr. art. 132º nºs 1 e 2 do RJCS).

Assim, se actualmente os conceitos não são confundíveis, antes da reforma a cisão não era tão manifesta. O Cod.Com. aproximava os conceitos e a doutrina não os distinguia (Pedro Romano Martinez, Direito dos Seguros, Principia 2006, pág. 93, antes da classificação legal, qualificava a multiplicidade de contratos como uma modalidade de sobresseguro). 

Em sentido impróprio o regime da pluralidade de seguros e do sobresseguro traduzem uma regulação equivalente de situações em que o valor de indemnizações excede o valor dos interesses seguros. A Lei dos Contratos de Seguro (leia-se, RJCS), alterou os conceitos mas, materialmente, as respostas legais entre o regime da pluralidade e o de sobresseguro (actualmente em sentido próprio) são aproximadas, fazendo funcionar o princípio indemnizatório e, portanto, reduzindo aos danos os limites indemnizatórios (cfr. art. 128º ex vi art. 132º nº 1). 

Pode, assim, dogmaticamente, continuar a fazer-se uma aproximação entre ambos os conceitos. Assim, Menezes Cordeiro, Direito dos Seguros, Almedina, 2013, pág. 752 a 754, que continua a agrupar o estudo de sobresseguro e pluralidade de seguros. 

Cosseguro 

Em Portugal as situações de cosseguro estão reguladas no art. 62º LCS, que prevê sempre um contrato de seguro único, com uma apólice singular emitida pelo líder e, portanto, as maiores dúvidas na definição dos limites entre cosseguro e pluralidade esbatem-se. Não há cosseguro plural. As doutrinas espanhola e italiana admitem possibilidade de cosseguro operacionalizado com vários contratos de seguro (Neste sentido, Fernando Sabchez Calero, et al, Ley de Contrato de Seguro. Comentarios a la Ley 50/1980, de 8 de octubre y a sus modificaciones, pág. 549).

A doutrina francesa, de forma possivelmente a criar maiores dificuldades interpretativas que as que pretende resolver, entende mesmo que o cosseguro integra o conceito de pluralidade de seguros lato sensu (ficando a pluralidade em sentido estrito para situações do tipo da previsão do art. 133º. Neste sentido, Bernard Brinier e Jean-Michel do Carmo Silva, (coordenação), Code des Assurances Commenté, pág. 165 e, Claude J. Berr e, Hubert Groutel, Code des Assurances, 9ª ed., Éditions Dalloz, 2003, pág. 69.

Pode, em qualquer caso e a despeito da imperatividade de contrato único no nosso ordenamento, traçar-se o grande elemento distintivo conceptual na existência de um acordo prévio entre seguradores para segurar um mesmo interesse e risco, acordo que será inexistente nas situações de pluralidade. 

Resseguro 

Seja no caso de pluralidade de seguros ou no caso de resseguro, a execução dos contratos e o pagamento das prestações previstas são accionadas pelo mesmo evento ocorrido no mundo físico. Um mesmo sinistro põe em execução dois contratos. Todavia, no caso de resseguro, os riscos seguros são diversos. 

Na pluralidade de seguros são reguladas contratualmente as consequências de um mesmo sinistro, relativo aos mesmos risco e interesse. Já o resseguro cobre os riscos assumidos num contrato por um segurador ou por anterior ressegurador (cfr. art. 72º da LCS). 

O risco e interesse são, assim, nos casos de resseguro, os atinentes à própria actividade seguradora, decorrentes da mera possibilidade de suportar indemnizações contratualmente previstas, após produção de um evento danoso segurado ou ressegurado anteriormente. 

O seguro subsidiário e o seguro complementar 

Outras figuras jurídicas próximas da pluralidade de seguros são as de seguro subsidiário e de seguro complementar. No seguro subsidiário o primeiro segurador não chega a estar obrigado ao pagamento de indemnização, ganhando eficácia o seguro subsidiário quando ocorra circunstância contratualmente prevista que activa a eficácia do seguro subsidiário e desactiva a do seguro principal. 

Tal ocorrerá, tipicamente, em determinadas circunstâncias prefiguradas. Serão situações como a insolvência do 1º segurador, a ineficácia do 1º contrato por ocorrência de qualquer circunstância prevista ou situações em que o 2º contrato seja eficaz caso os danos ultrapassem certos limites. Assim, Fernando Sanchez Calero et al, Ley de Contrato de Seguro. Comentarios a la Ley 50/1980, de 8 de octubre y a sus modificaciones, pág. 547. 

No seguro complementar um dado contrato torna-se eficaz não ao 1º evento mas ao 2º ou 3º, como, em termos paradigmáticos, ocorrerá em certos seguros de incêndio, ou quando o segundo contrato funcione como forma de reforçar o capital seguro pelo primeiro, complementado o valor das prestações até ao limite dos danos. 

De comum entre ambas as situações deve assinalar-se a possibilidade de accionamento de dois ou mais contratos por força de dado evento com relevo jurídico mas, em qualquer dos casos, sem identidade de riscos. 

Os contratos têm campos de aplicação diversos, sendo eficaz um quando não seja ou deixe de ser outro (no caso de seguro subsidiário) ou activando-se o segundo contrato quando os danos atinjam certo limite ou quando ocorra repetição de evento idêntico ao que determinou execução do primeiro contrato (no seguro complementar). 

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