Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

5/05/2024

Auditoria às contas do condomínio


Quem reside ou administra prédios constituídos em regime de propriedade horizontal tem plena consciência de que, a "saúde financeira" do condomínio depende de uma criteriosa administração dos dinheiros comuns, sendo crível, que, como em qualquer outra actividade, esta é passível de falhas, sejam elas involuntárias ou mesmo voluntárias (má fé), pelo que importa atalhar quaisquer eventuais irregularidades destas naturezas..
 
A auditoria de contas de condomínios é uma ferramenta à disposição do administrador e/ou da assembleia dos condóminos com a finalidade de garantir a integridade das contas do condomínio, e consiste em um processo de verificação da regularidade em procedimentos contáveis, fiscais, tributários e laborais na gestão dos dinheiros dos proprietários. Por outras palavras, é um pente-fino realizado nas contas do condomínio.

Quando essa auditoria deve ser realizada?
 
Este procedimento de verificação da regularidade das contas pode ser efectuado de forma preventiva ou reactiva, em qualquer dos casos, podendo estar previsto em sede do regulamento ou ser requeridas pelo administrador ou pelos próprios condóminos.  
  • No primeiro caso, as contas passam por verificações regulares, numa periodicidade previamente definida em sede do regulamento de condomínio (por exemplo, de 2 em 2 anos), auxiliando o administrador e contribuindo para uma maior transparência no trabalho realizado. Neste modelo, os erros contabilísticos são corrigidos imediatamente, melhorando o processo de administração.
  • No segundo caso, por solicitação dos condóminos, realiza-se uma conferência das contas, diante de suspeitas de irregularidades ou falhas graves do ponto de vista contabilístico. Essa forma de utilizar a auditoria permite a produção da prova de fraudes para futuras providências.
Importa desde logo ressalvar que a auditoria deverá ser realizada por uma empresa de contabilidade independente, com capacidade técnica e experiência, garantindo-se desta forma a isenção e idoneidade do processo, não devendo a mesma ser apenas utilizada como ferramenta aquando da detecção de alguma irregularidade na contratação e pagamento de contas, mas como prevenção à eventuais falhas ou fraudes. 
 
Nesta conformidade, pode-se dividir as falhas e fraudes na administração em duas categorias: irregularidades causadas por má-fé ou por má gestão.
 
Má-fé vs má gestão

Contrários à requerida transparência na prestação de contas, os actos de má-fé e de má gestão são situações que podem afectar qualquer condomínio, carecendo estas de se ter diferenciadas,
seja pelos seus efeitos distintos, seja para efeitos de responsabilização.
 
Assim, a má-fé ocorre quando há a intenção do gestor responsável em obter uma qualquer vantagem sobre as contas do condomínio (por exemplo: apropriação dos recursos ou pagamentos de despesas particulares). Por seu turno, a má gestão ocorre quando há o desconhecimento ou omissão do gestor sobre determinados actos (por exemplo: negligência com a renovação de documentos).

Tanto a má-fé quanto a má gestão podem resultar na perda do cargo ou na rescisão do contrato e levar o administrador a responder perante a justiça, exigindo-se-lhe, o ressarcimento dos valores desencaminhados ou a indemnizar o condomínio pelas perdas ou danos causados.
 
Entre os problemas mais comuns que costumam resultar no processo de auditoria estão as seguintes situações:
  • Desvios ou suspeita de desvios de dinheiro;
  • Falta de cumprimento de obrigações fiscais;
  • Falta de cumprimento de obrigações laborais;
  • Ausência de transparência sobre a situação do caixa do condomínio;
  • Contratos assinados com as empresas prestadoras de serviços;
  • Irregularidade no pagamento às empresas prestadoras de serviços;
  • Organização das contas, sub-contas e impostos.
Uma auditoria pode e deve envolver todas as áreas de gestão do condomínio, mas, em geral, tem um maior foco nas questões administrativas e laborais, contratos com as empresas prestadoras de serviços, contas relativas às áreas comuns e outras transacções financeiras do dia-a-dia do edifício.

Esse último segmento é bastante sensível, porque também é nele que residem as maiores suspeitas de fraudes e favorecimentos. Gestores irresponsáveis podem privilegiar amigos e familiares na escolha das firmas responsáveis pelas intervenções, em troca de comissões ou outros favores.

Como realizar a auditoria de contas

A auditoria das contas do condomínio é um processo crucial para garantir a transparência e a correcta gestão dos recursos financeiros dos condóminos.

Este procedimento envolve desde logo uma análise detalhada de todas as receitas e despesas do condomínio, verificando se os fundos estão a ser utilizados de forma adequada e conforme as decisões tomadas em assembleia. A auditoria inclui a revisão de documentos como extratos bancários, recibos, facturas, e contratos de prestação de serviços, assegurando que todas as transacções financeiras estejam de acordo com as normativas legais e as diretrizes internas do condomínio. Além disso, avalia-se a adequação dos processos de cobrança de quotas e a gestão do fundo comum de reserva. Este processo é fundamental para manter a confiança entre os condóminos e a administração do condomínio, especialmente em situações onde há dúvidas ou preocupações quanto à integridade financeira do mesmo. Uma auditoria bem realizada pode também identificar oportunidades de optimização de custos e melhorias na gestão financeira do condomínio.

A realização da auditoria de contas em condomínio pode enfrentar vários desafios. Um dos principais é a resistência que pode surgir por parte das empresas de administração do condomínio, que podem ver a auditoria como uma desconfiança em relação ao seu trabalho. É essencial que o processo de auditoria seja comunicado como uma prática de rotina, necessária para a saúde financeira do condomínio, e não como uma medida extraordinária.

Outro desafio comum é a organização e a manutenção adequada dos registros financeiros. Em muitos casos, a falta de documentação adequada pode dificultar a realização de uma auditoria eficiente. Aqui, a actuação do contabilista é crucial para orientar os responsáveis pela administração do condomínio na organização adequada dos documentos financeiros.

Para realizar uma auditoria às contas em condomínio de forma eficaz, eis alguns passos que serão cruciais:
  • Seleccionar de um auditor qualificado: É importante escolher um profissional ou uma empresa de auditoria com experiência comprovada em contas.
  • Efectuar uma análise documental: O auditor deve ter acesso a todos os documentos financeiros do condomínio, incluindo extractos bancários, recibos, notas fiscais e contratos.
  • Efectuar uma verificacação de conformidade: O auditor precisa verificar se as despesas realizadas estão de acordo com as decisões tomadas em assembleias e se seguem as normas legais vigentes.
  • Elaboração de um relatório de auditoria: Após a análise, o auditor deve elaborar um relatório detalhado, apontando as constatações e, se necessário, recomendações para melhorias.
Importa contudo ressalvar que nem sempre as falhas decorrem de actos de "corrupção". Muitas vezes, por mero desconhecimento, a administração pode incorrer em erros de natureza procedimental que podem causar, directa ou indirectamente prejuízos ao condomínio.

Nesta conformidade, e para se evitarem situações como esta, é bom seguir as seguintes orientações:
  • Contratar uma administração capaz e idónea na gestão patrimonial e financeira do condomínio - em especial que conte com o auxílio de um contabilista;
  • Exigir que a prestação do serviço de administração do condomínio seja realizada mediante a celebração de um contrato escrito;
  • Exigir que o administrador possua e apresente um competente Seguro de Responsabilidade Civil Profissional; 
  • Elaborar um Código de Ética e de Conduta, em anexo ao Regulamento do Condomínio que vincule, tanto a administração, como os condóminos;
  • Criar uma separação orgânica entre o cargo de administrador e a presidência da mesa da assembleia dos condóminos;
  • Elaborar um Regimento que regule a actuação da mesa e bem assim, do funcionamento da própria assembleia dos condóminos;
  • Estabelecer a obrigatoriedade da feitura de auditorias externas com uma periodicidade mínimo de 3 em 3 anos.
A gestão financeira de um condomínio é uma tarefa complexa, repleta de nuances e responsabilidades. Neste contexto, a auditoria de contas de condomínio emerge como uma ferramenta essencial para garantir a transparência e a eficácia na administração desses recursos. A auditoria de contas em condomínio pode ser mais uma ferramenta - vital - para garantir uma gestão financeira transparente e eficiente. 

São atitudes como estas que possibilitam conquistar a seriedade nos serviços administrativos que são prestados ao condomínio.

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