Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

4/26/2024

Colocação antenas telhado

Tribunal: Relação Porto
Processo: 0720180
Data: 06-03-2007
Relator: Mário Cruz

Sumário:

I- A colocação de armário de transmissões e antenas no telhado, pelas suas dimensões, colocação e exposição alteram o arranjo estético e a linha arquitectónica do edifício.
II- Não pode ser aplicável a regra da unanimidade dos condóminos para a aprovação de deliberações que tenham em vista a celebração de um contrato de arrendamento que afecte as partes comuns do edifício.
III- Dependem de aprovação da maioria dos condóminos, sendo que estes devem representar também dois terços do capital investido.

Texto integral: vide aqui

Tribunal: Relação Lisboa
Processo: 4853/2003-6
Data: 03-07-2003
Relator: Urbano Dias

Sumário:

De acordo com o nº 2 do art. 1024º do CC, o arrendamento de prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes administradores só se considera válido quando os restantes proprietários manifestem, antes ou depois do contrato, o seu assentimento.
Isto significa que o contrato de arrendamento de uma parte comum de um prédio em propriedade horizontal só é válido se todos os condóminos estiverem de acordo, caso contrário o mesmo será nulo.

Texto integral: vide aqui

Do recurso para a Supremo:

Tribunal: STJ
Processo: STJ_07B3607
Data: 09-03-2009

Súmula:

A analogia tem de encontrar-se, portanto, dentro do regime específico das normas próprias da propriedade horizontal, e não dos regimes subsidiários dos direitos de propriedade e compropriedade.
Entendemos por isso não poder ser aplicável a regra da unanimidade dos condóminos para a aprovação de deliberações que tenha em vista a celebração de um contrato de arrendamento que afecte partes comuns do edifício.
De resto, e à laia de complemento, sempre se dirá que um prédio constituído em propriedade horizontal não pode considerar-se um prédio indiviso, pelo que nos parece forçada, até por isso, a chamada à colação do regime previsto no art. 1024.º ao caso em presença.”

Texto integral: vide infra:

A analogia tem de encontrar-se, portanto, dentro do regime específico das normas próprias da propriedade horizontal, e não dos regimes subsidiários dos direitos de propriedade e compropriedade.
Entendemos por isso não poder ser aplicável a regra da unanimidade dos condóminos para a aprovação de deliberações que tenha em vista a celebração de um contrato de arrendamento que afecte partes comuns do edifício.
De resto, e à laia de complemento, sempre se dirá que um prédio constituído em PH não pode considerar-se um prédio indiviso, pelo que nos parece forçada, até por isso, a chamada à colação do regime previsto no art. 1024.º ao caso em presença.”
Antes de mais, cumpre esclarecer que a questão de saber se o art. 1024º/2 do CC se aplica ou não à propriedade horizontal se restringe a determinar se é ou não aplicável ao arrendamento de partes comuns, porque só essas podem ser tratadas como um “prédio indiviso”; só aliás em relação às partes comuns é que o art. 1420º/1 do CC afirma que cada condómino é “comproprietário”.
Não se confunde o arrendamento de uma fracção autónoma com o arrendamento de partes comuns.
O arrendamento de uma fracção autónoma, que pela própria natureza da propriedade horizontal implica a possibilidade de utilização, pelo arrendatário, das partes comuns, respeita ao exercício dos poderes de proprietário exclusivo de cada condómino. Mas, em tal eventualidade, essa utilização está sujeita às mesmas restrições que teriam de ser respeitadas pelo próprio condómino, proprietário da fracção arrendada.
Diferentes problemas levanta o arrendamento de partes comuns, que necessariamente afecta em termos que não resultam da função instrumental que desempenham relativamente à utilização das fracções autónomas. Por isso se coloca, desde logo, o problema de saber a quem cabe o poder de o decidir – ao administrador ou à assembleia de condóminos; e, competindo à assembleia, o de determinar como tem de ser aprovada a correspondente deliberação – unanimidade ou maioria, e que maioria.
Faz pois todo o sentido averiguar se o art. 1024º/2 do CC é ou não aplicável ao arrendamento de partes comuns, no âmbito da PH.
Contrariamente ao acórdão recorrido, entende-se que é necessária a unanimidade dos condóminos (não se questionando, naturalmente, a possibilidade de tal unanimidade se manifestar pelo modo previsto no art. 1432º/5 do CC), nos termos conjugados do disposto no art. 1024º/2 e no art. 1420º/1, ambos do CC.
A aplicação destes preceitos não implica o reconhecimento de nenhum caso omisso, a preencher por analogia, mais ou menos próxima. O art. 1024º/2 contém uma regra própria do contrato de arrendamento; tal como as demais que a lei define para tal contrato, é aplicável no âmbito da PH, porque nenhuma regra específica deste instituto se lhe opõe, nem directa, nem indirectamente (como poderia na verdade resultar das normas definidas para a formação da vontade na assembleia de condóminos).
É incontestável, como aliás se viu já, que a lei regulou a administração das partes comuns, no âmbito da PH; não previu expressamente, porém, a formação da vontade de decidir celebrar um contrato de arrendamento de partes comuns.
É igualmente incontestável a qualificação legal da locação como acto de administração ordinária, desde que celebrada por prazo não superior a 6 anos; e que, no caso, não se põe o problema do significado efectivo do prazo convencionado, como se poderia colocar em relação a contratos de arrendamento que excluam (pelo menos por princípio) o direito do senhorio de denunciar o contrato para o termo do prazo.
Todavia, o mesmo art. 1024º do CC, que afirma essa qualificação, afasta desde logo dificuldades que criaria a sua articulação meramente formal com a atribuição a todos os comproprietários do direito de administrar a coisa comum. Não seria realmente aceitável que um comproprietário pudesse impor aos demais as consequências próprias da incidência de um arrendamento no prédio indiviso, já atrás apontadas.
São essas mesmas consequências, aliás, que materialmente justificam a adequação da regra da unanimidade ao arrendamento de partes comuns na PH; e que excluiriam liminarmente a conclusão de que a decisão de arrendar partes comuns, ainda que por prazo não superior a seis anos, figuraria entre os poderes do administrador da PH. Note-se, quanto a este ponto, que o art. 1436º do CC não confere ao administrador, genericamente, o poder de praticar actos de administração ordinária, antes conferidos à assembleia de condóminos (art. 1430º/1).
E, diga-se ainda, são essas mesmas consequências que afastam a hipotética afirmação de que seria incongruente exigir unanimidade para a prática de um acto de administração e não a impor relativamente a diversos actos especialmente relevantes, para os quais a lei se satisfaz com maiorias qualificadas. Assim, por exemplo, para as decisões de aprovação de “obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício” (art. 1422º/3) ou que “constituam inovações” (art. 1425º/1), de alteração do uso, “sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma” (nº 4) ou de reconstrução, em caso de destruição do edifício que não atinja ¾ do seu valor (art. 1428º/2). Ou para as deliberações em que o legislador revela que preferiria a unanimidade – preferência que se manifesta ao exigir a inexistência de oposição – mas em que se satisfaz com a aprovação por maioria simples ou qualificada sem votos contra, como ocorre com a proibição de actos ou actividades não vedados pelo título constitutivo (art. 1422º/2 al. d)), com a autorização de divisão de fracções autónomas, quando não permitida no TCPH (art. 1422º/3-A), com a inclusão, no regulamento do condomínio, de critérios de repartição das despesas relativas a serviços de interesse comum (art. 1424º/2).
É manifesta em várias hipóteses a intenção do legislador de facilitar a administração do prédio; essa intenção, todavia, não o levou – como poderia ter feito por ocasião da revisão do regime da PH em 1994, que consabidamente teve em vista um aumento da eficiência na administração dos prédios submetidos a tal regime –, a afastar a regra da unanimidade para a decisão de dar de arrendamento partes comuns do prédio.
A terminar este ponto, relembra-se o que atrás se disse sobre a impossibilidade de fazer cessar a indivisão das coisas comuns; na verdade, essa impossibilidade justifica uma maior exigência para a aprovação de actos que, como o arrendamento, visam atribuir o direito de as utilizar.
As deliberações impugnadas na presente acção não obtiveram, pois, a unanimidade necessária para o efeito. Embora imediatamente com conteúdo diferente, todas se destinam a permitir o arrendamento de parte ou partes comuns do prédio dos autos.
Nos termos do disposto no art. 1433º/1 do CC, tais deliberações são anuláveis, “a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado”.
O exercício do direito de anulação de deliberações de uma assembleia de condóminos pode, naturalmente, ser abusivo, nos termos gerais do art. 334º do CC, como sustenta a recorrente Optimus – Telecomunicações, S.A.
Ora a verdade é que, ainda que tivesse sido atendida pelo acórdão recorrido a sua pretensão de ampliação da base instrutória (cfr. acórdão recorrido, fls. 2386 e ponto 2.6 das alegações), e que os factos correspondentes fossem havidos como provados, ainda assim não procederia a alegação de abuso de direito.
Desde logo, nada no processo permite concluir, por exemplo – e o ónus da prova do preenchimento dos requisitos do abuso caberia aos recorrentes – que a actuação da autora (e demais recorridos) tenha de qualquer modo criado nos recorrentes a convicção fundada de que não iriam reagir contra a aprovação das deliberações impugnadas, de forma a que merecesse tutela a confiança assim gerada.
Para além disso, e porque só um excesso manifesto dos limites do direito de anulação, em violação das regras da boa fé, dos bons costumes e do fim social ou económico com que o mesmo é atribuído o tornaria abusivo, não seria a prova de que o arrendamento traria grandes vantagens ao condomínio e graves prejuízos à recorrente Optimus – Telecomunicações, S.A. e aos serviços por ela prestados que permitiria concluir pelo abuso.
Deixando de lado as restrições de acesso aos locais ocupados, eventualmente não significativas, e a falta de prova de que a segurança do prédio é realmente posta em causa, os termos em que o risco para a saúde ficou assente é suficiente para se não poder concluir pelo manifesto abuso de direito, não sendo necessária, neste âmbito, a prova de que a instalação e funcionamento do equipamento no telhado do prédio é efectivamente prejudicial à saúde.
Recorde-se que não é esse o fundamento da invalidade das deliberações, mas sim a falta de unanimidade na sua aprovação; neste contexto, basta o risco de prejuízo para a saúde para excluir o abuso do direito de anulação.
Aqui chegados, nada mais há que analisar. A exigência da aprovação por unanimidade prejudica a apreciação das questões colocadas nas conclusões 2ª a 12ª das alegações dos recorrentes BB e outros (quanto às conclusões 2ª a 6ª, na parte em que excedem o que se disse já no ponto 9 deste acórdão) e nas conclusões 9ª a 15ª das alegações da recorrente Optimus – Telecomunicações, S.A.
Nestes termos, decide-se:
a) Não conhecer do recurso interposto por Optimus – Telecomunicações, S.A., na parte em que respeita à impugnação da decisão de negar provimento ao agravo interposto em 1ª Instância;
b) Quanto ao mais, negar provimento a ambos os recursos, confirmando, ainda que por fundamento diferente, o acórdão recorrido.
Custas pelos recorrentes.
Lisboa, 19 de Março de 2009
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (Relatora)
Salvador da Costa
Lázaro Faria

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