Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

6/14/2022

Junção de fracções


No âmbito do direito de propriedade, o princípio consagrado na lei é o de que qualquer proprietário pode exigir judicialmente contra qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade com as consequências daí resultantes, sendo este direito dotado de uma manifestação de sequela, como característica fundamental do conteúdo de um direito real.

A natureza deste direito permite que o proprietário goze, de modo pleno (mas não absoluto) e exclusivo, dos direitos de uso, fruição e disposição do bem em causa, nos termos que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas (cfr. art. 1305º do CC).

Tudo isto para dizer que, não pode qualquer proprietário ser privado, lesado ou cerceado nos seus direitos, fora dos casos expressamente previstos na lei, e independentemente da qualidade atribuída ao lesante: quer este seja possuidor, quer mero detentor ou um qualquer proprietário. E para melhor se exemplificar, importa um debruçar sobre dois exemplos muito concretos.

Junção de fracções do mesmo prédio

Neste preceito legal vem referido que “… não carece de autorização dos restantes condóminos a junção numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas…” (cfr. nº 1 do art. 1422º-A do CC), sendo que nestas situações, cabe aos condóminos que juntaram as fracções “… o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública, introduzir a correspondente alteração no título constitutivo…” (cfr. nº 4 do citado dispositivo legal).

Na verdade, como já se decidiu no Ac. do TRL de 1/2/1990 In Cj, t. I, pág. 155 (relator: Abraches Martins); “o proprietário de fracções autónomas contíguas pode interligá-las sem prévia autorização dos demais condóminos e sem que daí resulte perda da respectiva autonomia, desde que não ofenda paredes mestras ou ponha em causa a estrutura e segurança do edifício…”.

“Assim, quando a unificação das fracções exija obras de adaptação- e essa circunstância ocorrerá com mais acuidade, nos casos de sua contiguidade vertical- tais obras não poderão prejudicar a segurança do edifício, nem a sua linha arquitectónica ou o seu arranjo estético, a menos que, neste caso, seja obtida autorização da Assembleia dos Condóminos conforme o nº 3 do art. 1422º, de modo que faltando essa autorização ou havendo prejuízo da segurança do edifício, não será viável a unificação das fracções …” Rui Vieira Miller, in “A propriedade horizontal”, pág. 191/2; no mesmo sentido, Aragão Seia, Propriedade horizontal”, pág. 114.

Junção de fracções de prédios contíguos

Neste concreto, desde logo o princípio geral contido no art. 1420º do CC, que determina que cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, esclarecendo-se, no seu nº 2, que o conjunto desses direitos é incindível, não podendo nenhum deles ser alienado separadamente, integrando-se na concepção de partes comuns do edifício, as colunas, os pilares, o solo, as paredes mestras e as partes restantes que integram a estrutura do prédio, por força do preceituado no art. 1421º, nº 1, alínea a), do CC.

Por sua vez, pela tradução dos art. 1422º e 1422º- A, ambos do CC, facilmente se depreende que estes proíbem a junção ou anexação de fracções autónomas de edifícios diferentes e vedam, através da construção de obras novas, qualquer possibilidade de prejudicar a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, assim como a prática de quaisquer actos que tenham sido proibidos por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.Junção de fracção com parte de outra

O art. 1422º-A do CC prevê excepções à regra contida no art. 1419º, nº 1 do mesmo diploma. Com efeito, não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que sejam contíguas (nº 1), sendo que a contiguidade é dispensada quando se trate de fracções correspondentes a arrecadações e garagens (nº 2).

Assim, a anexação de uma fracção a uma parte de outra fracção, não é permitida, desde logo, porque a situação não cabe em nenhuma das hipóteses previstas no art.1422º-A do CC, uma vez que não se trata nem de caso de junção nem de divisão de frações autónomas. Consequentemente, o preceito que se adequa a tal situação é o art. 1419º, nº 1 do CC que para a modificação do TCPH exige o acordo de todos os condóminos expresso em escritura pública ou documento particular autenticado.

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