Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

02 junho 2024

ACTRL 22/04/21: Exigibilidade da AGE


Tribunal: Relação de Lisboa
Processo: 23757/19.0T8PRT-A.L1-8
Data: 22-04-2021
Relator: Maria Amélia Ameixoeira

Sumário:

I– As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado, como decorre do art.1433º, nº1, do CC, - no prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes» (nº2);

-no prazo de 30 dias contados nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem» (nº3);
-o direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação» (nº4).

II– A inércia do administrador em convocar a assembleia extraordinária após lhe ser exigida pelo condómino impugnante ou a convicção por esse administrador de que não foram tomadas deliberações inválidas ou ineficazes, não faz coartar o direito desse condómino no sentido de ainda poder recorrer para a assembleia, sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem ou recorrer à acção de anulação.

III– E pelo contrário, a inércia do condómino impugnante que não vê a assembleia extraordinária marcada após a ter exigido nos 20 dias seguintes á sua impugnação, faz caducar o direito de propor a acção de anulação se no prazo de 60 dias após a data da deliberação, não o fizer.

IV– Se um condómino que esteja presente ou ausente tiver requerido a realização de uma assembleia extraordinária destinada a revogar as deliberações votadas na assembleia, e o administrador do condomínio a não convocou, como devia, no prazo de 20 dias, facto que ocorreu no caso em discussão nos presentes autos, em anos sucessivos, sem que o condómino/embargante/recorrido tenha interposto recurso desse acto negativo para a assembleia ou tenha optado pela via da arbitragem, devia então propor a acção anulatória, dentro do prazo legal de 60 dias, contados da data da deliberação primitiva, sob pena de caducidade.

V– Tendo o condómino/embargante, em 20 de Dezembro de 2018, e em 26 de Julho de 2019, remetido carta registada com AR dirigida ao Condomínio, impugnando as Assembleias e Deliberações de 4 de Dezembro de 2018, relativas ás Actas 33 e 34, e de 6 de Julho de 2019, relativa à Acta nº 35, pedindo que as mesmas sejam anuladas e declaradas ineficazes/nulas e exigindo a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, sem que as Assembleias tenham sido convocadas pelo Administrador, nem sequer o embargante/s recorreram para a Assembleia, nos termos do art.1348º, do CC, marcando eles próprios a data para a realização da pretendida Assembleia Extraordinária e caso discordassem de novo da deliberação, propusessem uma eventual acção anulatória das deliberações aqui tomadas, (nesta segunda hipótese) se fosse caso disso, nada tendo feito, é manifesta a caducidade do direito de intentar acção judicial de anulação.

VI– Interposta acção executiva em 23-11-2019, após o decurso dos referidos prazos, nada obstava à exequibilidade do título consubstanciado nas deliberações constantes das referidas Actas, devendo improceder a excepção dilatória de inexequibilidade de titulo executivo.

Texto integral: vide aqui

25 maio 2024

ACTRL 26/09/06: Administrador designado pelo construtor


Tribunal: TRL
Processo nº: 6324/2006-7
Relator: Diana Monteiro
Data: 26/09/2006

Acórdão:

I- É ineficaz, salvo ratificação, em relação ao representado (condomínio), nos termos dos artigos 268º, 1430º e 1435º do Código Civil, o contrato de conservação de elevadores em imóvel sujeito ao regime de propriedade horizontal que foi outorgado em representação do condomínio, depois de constituída a propriedade horizontal mas antes da eleição da administração do condomínio, por quem, a mando da construtora do imóvel exercia as funções de responsável pela manutenção do edifício.
II- Não é administrador provisório, nos termos e para os efeitos do artigo 1435º-A do Código Civil, a pessoa que a empresa construtora designou para exercer as funções de responsável pela manutenção do edifício.

Texto integral: Vide aqui

20 maio 2024

Os números por extenso na acta


No acto de lavramento de uma acta, os nomes numerais devem ter-se exarados por extenso?


Em Portugal, no domínio da legislação em vigor, e no que diz respeito ao Direito Privado, não existe qualquer disposição que imponha a obrigatoriedade de se escrever por extenso os números que ocorram no texto de uma acta.

Nesta conformidade, importa observar que, a regra é a da liberdade de forma. As únicas normas legais que impõem que nas actas os números devam ser escritos por extenso, são notariais.

Nesta tessitura, serão dois os motivos que justificam o acto de ser prática vulgar (muito embora não uniforme) de se escrever, nas actas, os números por extenso.

O primeiro motivo tem-se atinente ao espírito da cautela. Para se prevenirem eventuais erros ou lapsus calamis, recorre-se à grafia por extenso, na convicção de que, com este cuidado, a probabilidade de incorrer em erros ou lapsus é mais reduzida.

16 maio 2024

Violação art. 1424º, nº 3 e 4 - 4ª parte


Do regime da invalidade

Com alguma frequência encontramos informação no sentido de a violação de uma norma imperativa gerar necessariamente nulidade do negócio. É o que parece ser sugerido, por exemplo, pelo trecho de Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado, III, 2.ª ed., Coimbra Editora, 1987, p. 447, quando, em anotação ao art. 1433º do CC (que determina que as deliberações da assembleia contrárias à lei são anuláveis), escrevem: «no âmbito desta disposição não estão compreendidas, nem as deliberações que violam preceitos de natureza imperativa, nem as que tenham por objeto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia de condóminos». 

Se assim fosse, as deliberações contrárias à lei a que o art. 143º se reporta e que comina com a anulabilidade não seriam imperativas, seriam dispositivas e, nomeadamente, supletivas. Mas não pode ser assim (também reparando na incongruência, Jorge Morais Carvalho, Os limites…, cit., p. 151, nota 442). Normas supletivas são aquelas cujo conteúdo pode ser validamente afastado pelas partes, pelo que o negócio que as afasta é válido, logo, não anulável.

Violação art. 1424º, nº 3 e 4 - 3ª parte


No seguimento da análise efectuada nos dois artigos anteriores, relativamente ao facto de as deliberações das assembleias de condóminos que imponham uma repartição diferente da determinada pelos nº 3 e 4 do art. 1424 º do CC para as despesas neles previstas, por se terem deliberações com conteúdo negocial contrário à lei são, como tal, nulas, por via do disposto no art. 280º do CC, porquanto, a sanção da anulabilidade prevista no art. 1433º do CC aplica-se apenas às deliberações que violem normas legais imperativas que não digam respeito ao conteúdo negocial ou normas do regulamento de condomínio, importa agora atentar numa excepção a esta regra.

O STJ, em Ac. datado de 09/06/2016 (proc. nº 211/12.6TVLSB.L2.S1), decidiu que:
"I - O art. 1424.º, n.º 1, do CC contém um princípio geral que se traduz na obrigação de os condóminos suportarem, na proporção do valor da sua fracção, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício.
II - O n.º 3 do art. 1424.º do CC contém uma excepção ao referido princípio ao estabelecer que as despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem, i.e., dos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns (como sucede com um terraço que serve de cobertura a parte do prédio).
III - Há, porém, que distinguir, dentro dessas despesas, as chamadas despesas de manutenção das despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção de espaços exteriores a essas partes comuns que não são utilizados por aqueles condóminos: as primeiras são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles que deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais desse terraço; já as segundas são a cargo de todos os condóminos por as reparações a realizar constituírem um benefício comum de todos eles."