Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

22 setembro 2023

Impugnação não judicial - Convocação AGE


4.1.1 Impugnação não judicial - Convocação AGE
 
As principais vantagens do recurso a esta via são evitar a litigiosidade entre os condóminos que, mais do que membros de um órgão da administração são vizinhos, partilhando o mesmo edifício (ou conjunto de edifícios) e, por outro lado, a possibilidade de obter uma regulamentação estável e num curto espaço de tempo sobre a questão que os levou a deliberar.
 
Para alguns autores, a redacção do nº 2 do art. 1433º não é clara.(133) Com efeito, é importante fazer uma leitura articulada com as restantes normas da Secção IV do Capítulo VI do Livro III do Código Civil, para entender o seu verdadeiro alcance.
 
Relativamente à legitimidade para convocar nova assembleia para revogação de deliberação inválida ou ineficaz, esta é indirecta,cabendo aos condóminos presentes que não aprovaram a deliberação e aos ausentes (134) exigir ao administrador tal convocação.(135) Caso os condóminos legitimados pretendam convocá-la directamente, estes terão de representar 25% do capital investido no prédio, nos termos gerais do art. 1431º.
 
Se o condómino legitimado optar por esta via, ele dispõe de 10 dias para a executar, sendo que o início da contagem deste prazo dependerá do facto de ele ter estado, ou não, presente na assembleia em que se aprovou a deliberação. Se esteve presente ou representado, o prazo conta-se desde a data da deliberação, independentemente da data em que a ata seja elaborada; se esteve ausente e não designou representante, o prazo conta-se da data em que tal deliberação lhe foi comunicada pelo administrador, por carta registada com aviso de recepção (nos termos do art. 1432.º, nº 6),(136) pelo que poderá beneficiar de um acréscimo de até 30 dias.(137)

21 setembro 2023

Impugnação das deliberações


4. Impugnação das deliberações
 
“Interessa ao condomínio a obtenção de segurança quanto à produção dos efeitos das deliberações da assembleia e à estabilidade de tais efeitos."(127)
 
Dada a primazia destes interesses, o legislador teve a preocupação de garantir que os interessados ficassem, num curto espaço de tempo, seguros da eficácia da deliberação ou, pelo menos, da possibilidade de a mesma ser suprimida.(128)
 
Todavia, tal como teremos oportunidade de ver, as disposições legais que regulam o regime das impugnações das deliberações condominiais “estão longe da clareza exigível em qualquer texto legal e não valoram adequadamente a realidade subjacente a tal regulação, o que as torna não raro profundamente iníquas”.(129)
 
Numa breve nota sobre a evolução do regime, refira-se que o DL nº 267/94, de 25 de Outubro, veio alterar a redacção dada pelo DL nº 40333, de 14 de Outubro, ao art. 1433º, referente à impugnação de deliberações da assembleia.(130)

20 setembro 2023

Deliberações inexistentes


3.4 Deliberações inexistentes
 
Há quem admita, além da invalidade (nulidade e anulabilidade)e da ineficácia em sentido estrito, a figurada inexistência do negócio ou do negócio inexistente (que, de acordo com a doutrina maioritária–que a aceita (118) -, se integra no quadro da ineficácia lato sensu, juntamente com os outros vícios.(119)) 
 
Quanto a nós, o seu reconhecimento parece-nos imprescindível, porquanto nenhuma invalidade (120) dará devida resposta às situações em que não se verifica sequer a aparência da materialidade ou do corpus correspondentes à noção de um determinado acto ou em que, verificando-se tal aparência, ela não corresponde a tal noção.(121)(122)
 
Feito este enquadramento, facilmente se depreende que a inexistência corresponde à falta mais grave e radical no âmbito dos vícios do negócio jurídico e que, por isso, não pode produzir quaisquer efeitos.(123)

Dado o exposto, estaremos perante uma deliberação inexistente quando os condóminos, em assembleia, não tenham tomado expressa posição sobre um qualquer assunto, apesar de, aparentemente, resultar da assembleia uma deliberação sobre a questão.(124)

19 setembro 2023

Deliberações ineficazes

 
3.3 Deliberações ineficazes
 
A ineficácia em sentido estrito é uma das consequências jurídicas aplicáveis às deliberações das assembleias de condóminos, ainda que em todo o regime jurídico da propriedade horizontal só encontremos uma única referência a este vício, designadamente no nº 2 do art. 1433º do CC, reconhecendo-se assim a sua dignidade jurídica no âmbito desta matéria. 
 
A deliberação ineficaz é, então, uma deliberação válida à qual, “todavia, faltará um elemento especificamente indispensável para que realize a sua função – o seu requisito de eficácia”, carecendo, portanto, de “idoneidade funcional”.(110)
 
O conceito de ineficácia diz respeito a “alguma circunstância extrínseca”, sendo que em matéria de deliberações estaremos perante uma ineficácia relativa, e não absoluta, na medida em que se verificará em relação a certos condóminos, só por eles podendo ser invocada (a deliberação, “embora ineficaz noutras direcções, é inoponível a certas pessoas”).(111)
 
Em suma, a ineficácia impede que os efeitos de uma deliberação afectem determinados condóminos.(112)

Deliberações anuláveis - casos especiais


3.2.1 Deliberações anuláveis - casos especiais
 
A assembleia pode, por mera deliberação tomada por maioria simples, modificar ou revogar o regulamento vigente no condomínio,(101) mesmo que tal regulamento tenha sido aprovado por unanimidade. Estas deliberações não se confundem com as deliberações que violem, directa e concretamente, normas gerais e abstractas contidas no regulamento, cuja cominação é algo controversa na doutrina. 
 
Com efeito, para João Vasconcelos Raposo,(102) se o regulamento do condomínio integrar o título constitutivo, a sua modificação exige unanimidade (art. 1419º, nº 1).(103) pelo que serão “inválidas”as deliberações que desrespeitem as suas cláusulas,mesmo que aprovadas por todos os condóminos – salvo, claro, se antes da tomada de tal deliberação se modificar o regulamento de modo concordante com a deliberação que se pretende aprovar. Não obstante, o autor chama a atenção para o facto de, naquele caso, tal invalidade ser insindicável, pois se todos os condóminos a aprovaram, não existirá ninguém com legitimidade para a impugnar.
 
Por outro lado, entende que perante o desrespeito pelo regulamento do condomínio que não integre o título constitutivo, e uma vez que a lei não exige qualquer maioria especial para o modificar, não parece justificável considerar a existência de qualquer invalidade na deliberação tomada com respeito por todas as formalidades. “Nesse caso, a deliberação traduzirá ou uma alteração do regulamento de condomínio ou uma derrogação pontual do mesmo, o que, em qualquer dos casos, nada terá, a (seu) ver, de ilícito. ”Em sentido diferente, Pires de Lima e Antunes Varela (104) defendem que o legislador visa, aqui, impedir a tomada de deliberações concretas contrárias à regulamentação geral contida no regulamento, pelo que é necessário que assembleia proceda, em primeiro lugar, à devida modificação do regulamento e, só depois, à aprovação da solução pretendida.