Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

10 março 2022

Cessação do cardo de administrador

Ao contrato de administração de condomíniol, porque se trata dum contrato inominado, não tipificado na lei, não dispondo, por isso, de regulamentação específica, há que aplicar, além das cláusulas acordadas entre as partes (cfr. artº 405º do CC), as regras gerais dos contratos, mas também as normas dos contratos nominados, sempre que a analogia das situações o justifique, nomeadamente, as regras do mandato.

O cargo de administrador pode cessar:

Pelo acordo das partes: No caso de haver mútuo acordo, a cessação do contrato acaba por se operar sem divergências, dando-se primazia aos princípios gerais (cfr. art. 405º e 406º do CC), como o princípio da liberdade contratual, mesmo no que é referente à cessação, sendo certo que a circunstância relevante a mencionar na cessação por mútuo acordo consiste na necessidade de forma especial (documento escrito) para a sua validade, por razões de segurança.

Pelo decurso do prazo pelo que foi designado: Nos termos do art. 1435º, nº 4 do CC, o período de funções do administrador é de um ano, podendo ser renovável, sendo que para os devidos efeitos, o cômputo do prazo inicia-se aquando da aceitação da nomeação. Tratando-se da contratação de um terceiro, o cômputo inicia-se com a aceitação da proposta contratual.

Portas corta-fogo

Muitos são os condóminos que, por razões de segurança contra a intrusão de estranhos nas partes comuns do condomínio, adoptam medidas de vigilância e alarme para evitarem, nomeadamente, a ocorrência de furtos. No entanto, entre estas medidas, há quem pretenda trancar as portas corta-fogo.

Estas portas de compartimentação corta-fogo, são obrigatoriamente dotadas de um fecho automático, o qual, regra geral, pode ter-se realizado de duas formas: através das dobradiças que são dotadas de mola ou através de uma mola colocada no cimo da mesma, de forma a que as mesmas fiquem sempre na posição fechada, em particular quando instaladas em Câmara Corta fogo.

No entanto, é proibido, alterar as características das portas, assim como a colocação de quaisquer elementos, mesmo que provisórios que inibam o correcto funcionamento das ditas portas. E quem, de forma desavisada procede a qualquer tipo de obstrução, sem prejuízo da responsabilidade civil ou criminal (caso existam danos materiais ou humanos), a obstrução, redução ou anulação das portas resistentes ao fogo que façam parte dos caminhos de evacuação, das câmaras corta-fogo, das vias verticais ou horizontais de evacuação, ou das saídas de evacuação, é punível com coima de 370 até 3 700 euros, no caso de pessoas singulares, ou até 44 000 euros, no caso de pessoas colectivas.

26 fevereiro 2022

Barulho de animais

Acórdão: Supremo Tribunal de Justiça
Data: 3/10/2019
Descritores: Direito ao repouso
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Ruído

                      Abuso de direito
                      Boa fé
                      Direitos de personalidade
                      Direito de propriedade
                      Colisão de direitos

Súmula: I. Existe abuso de direito, nos termos do disposto no artigo 334º do Código Civil, quando alguém, detentor embora de um determinado direito, válido em princípio, o exercita, todavia, no caso concreto, fora do seu objetivo natural e da razão justificativa da sua existência e em termos apoditicamente ofensivos da justiça e do sentimento jurídico dominante, por exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou fim social ou económico desse direito.

II. O juízo sobre o abuso de direito está, assim, dependente das conceções ético-jurídicas dominantes na sociedade.

III. Não obstante a vivência nos meios rurais, impor que nas relações de vizinhança seja de tolerar os ruídos provocados pelos animais domésticos legitimamente criados nos quintais das residências, tais como galinhas e galos, e a suportar algumas contrariedades e incomodidades daí advenientes, a verdade é que essa tolerância e limitação deverá apenas ocorrer na medida adequada e proporcionada à satisfação dos interesses tutelados pelo direito dominante, para que todos possam continuar a viver em sociedade no ambiente rural que escolheram. 
 
IV. Assim, demonstrado que o direito dos autores ao sono e ao repouso está a ser interrompido e afetado, diariamente, entre as 3 e as 5 horas pelo barulho estridente dos galos e galinhas que os réus criam num anexo, que dista apenas 4,395 metros da casa dos autores, impõe-se ter por prevalecente o referido direito dos autores, enquanto emanação dos direitos fundamentais de personalidade, sobre o direito de propriedade dos réus e os interesses destes em fazer criação de galinhas e galos.

Reverter a imputação das comparticipações

Decorre do nº 1 do art. 1424º do CC, que o regime regra de imputação das comparticipações condominiais, salvo disposição em contrário inserida no título constitutivo da propriedade horizontal, é proporcional ao valor das respectivas fracções.

Para aprovação de imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra - ficarem as despesas de fruição e serviços comuns a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição -, é exigível que a deliberação seja aprovada por uma maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, sem qualquer oposição (cfr. nº 2 do art. 1424º do CC).

No entanto, após a alteração da forma de imputação das comparticipações, isto é, deixando-se de pagar na forma proporcional ao valor das respectivas fracções (percentagem ou permilagem), passando a fazer-se em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, caso no futuro se pretenda regressar ao regime regra de imputação das comparticipações condominiais de forma proporcional ao valor das respectivas fracções, isto é, deixando-se de pagar em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição para se regressar à forma proporcional ao valor das respectivas fracções, não é exigível a maioria qualificada de 2/3 sem oposição para reverter a alteração ao regime regra ao pagamento de despesas de condomínio, pois é incomparável a situação de a lei exigir tal maioria qualificada para a imputação das comparticipações condominiais de modo diverso do regime regra (em função da permilagem, de acordo com o art. 1424º, nº 2 do CC), e exigi-la para o regresso ao regime regra.

25 fevereiro 2022

DL nº 269/94 de 25/10

Decreto-Lei n.º 269/94
de 25 de Outubro

Para estimular os condóminos na mobilização dos recursos necessários à conservação ou reparação extraordinária de imóveis em regime de propriedade horizontal, importa criar mecanismos financeiros que possam prevenir a degradação do tecido urbano, através da constituição de um fundo de reserva para fazer face a obras nas partes comuns dos prédios.

As recentes alterações ao regime da propriedade horizontal introduzidas pelos Decretos-Leis n.os 267/94 e 268/94, ambos de 25 de Outubro, estabelecem a obrigatoriedade da constituição desse fundo de reserva, que poderá revestir a forma de uma «conta poupança-condomínio», caso haja deliberação nesse sentido da assembleia de condóminos, a qual pode anteceder a obrigatoriedade da constituição do fundo.

Aproveitando os princípios enformadores da conta poupança-habitação, que foi fundamentalmente criada para estimular o aforro para aquisição de casa própria, cria-se um mecanismo para permitir o aforro dos condóminos proprietários, a afectar à conservação e beneficiação dos edifícios em regime de propriedade horizontal, num momento em que os primeiros imóveis sujeitos a esse regime, relativamente recente no nosso ordenamento jurídico, carecem de obras mais vultosas do que as normalmente realizadas pela administração dos prédios.