Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

06 agosto 2024

Danos causados por animais - Dono


1ª parte: vide aqui

Posteriormente, nos art. 499º e seguintes do CC surge uma outra subsecção da responsabilidade civil: a responsabilidade civil pelo risco.

Aqui, deixamos de assentar a obrigação de indemnizar na prática ou omissão de uma conduta do agente, mas sim no facto de, em determinadas situações, empregarmos meios dos quais obtemos vantagens, meios esses que envolvem determinados riscos. Esta responsabilidade fundamenta-se no princípio ubi commoda, ibi incommoda, pois quem tira proveito de uma determinada actividade perigosa, que acarreta riscos, deve também responsabilizar-se pelos danos que dela possam advir.

Por esse motivo, já não está patente neste regime a apreciação da culpa, uma vez que, se o agente cria uma situação de risco para dela retirar proveitos, deverá ser responsável pelos danos resultantes dela, independentemente da sua culpa.

É aqui que se insere a segunda hipótese de responsabilidade que pretendemos analisar, a responsabilidade do utente do animal. Quanto a este, sabemos que “quem no seu próprio interesse utilizar quaisquer animais responde pelos danos que eles causarem (…)”, conforme se encontra previsto no art. 502º do CC.

Não se confunda este preceito com a responsabilidade anteriormente explicada, pois enquanto essa assenta na mera obrigação assumida de guardar e vigiar os animais e, por sua vez, uma falha no exercício dessa obrigação (a já mencionada culpa in vigilando), a ideia aqui presente é a de que quem utiliza no seu próprio interesse animais, que são seres que não dispõem de racionalidade suficiente e, consequentemente, constituem fonte de perigo pela imprevisibilidade dos seus comportamentos, deve acarretar com as consequências do risco especial que envolve a utilização dos mesmos.

Uma vez que, como acima descrito, não se tem em consideração o critério da culpa, nesta responsabilidade cumpre verificar os seguintes pressupostos: a utilização dos animais no seu próprio interesse e em seu proveito, que ocorra um dano e que este proceda do perigo especial que envolve a utilização desses animais, ou seja, a verificação do nexo de causalidade entre o facto e o dano ocorrido.

Outra particularidade do disposto no art. 502º do CC é a de que, diferentemente do regime preceituado no art. 493º do mesmo compêndio, esta responsabilidade abrange sujeitos diferentes, estando aqui compreendidos aqueles que têm um direito real de gozo sobre o animal, que são, tal como refere Antunes Varela “o proprietário, o usufrutuário, o possuidor, o locatário, o comodatário, etc.”.

Não obstante, é certo que, normalmente, é o utente do animal aquele que também o guarda, o que leva a que várias vezes recaia sobre si não só a responsabilidade pelo risco, como também a do art. 493º do CC. Contudo, apesar do dever de vigilância recair originariamente sobre ele, este consegue “afastar tal presunção, provando que outra pessoa assumiu esse encargo, tendo o animal à sua guarda”, ou seja, provando que, por meio de algum negócio jurídico, se transferiu o domínio daquele animal para outrem, passando este a ser o seu detentor e obrigado à vigilância.

Ilidida essa presunção, passamos a ter, então, duas pessoas na equação com direitos e deveres sobre o animal.

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