Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

24 abril 2023

RJUE - Art. 6º - Isenção e dispensa de licença ou autorização

Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação - Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 118/2019, de 17/09;

– Artigo 6.º – Isenção e dispensa de licença ou autorização;
– Artigo 89.º – Dever de conservação;
– Artigo 89.º-A – Proibição de deterioração;
– Artigo 90.º – Vistoria prévia;
– Artigo 91.º – Obras coercivas;
– Artigo 92.º – Despejo administrativo;
– Artigo 102.º – Embargo;
– Artigo 103.º – Efeitos do embargo;
– Artigo 104.º– Caducidade do embargo;
– Artigo 105.º – Trabalhos de correcção ou alteração;
– Artigo 106.º – Demolição da obra e reposição do terreno;
– Artigo 107.º – Posse administrativa e execução coerciva;
– Artigo 108.º – Despesas realizadas com a execução coerciva;
– Artigo 108.º-A – Intervenção da CCDR.
– Artigo 109.º– Cessação da utilização;



Artigo 6.º
Isenção de controlo prévio

1 - Sem prejuízo do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 4.º, estão isentas de controlo prévio:
a) As obras de conservação;
b) As obras de alteração no interior de edifícios ou suas frações que não impliquem modificações na estrutura de estabilidade, das cérceas, da forma das fachadas, da forma dos telhados ou coberturas ou que não impliquem a remoção de azulejos de fachada, independentemente da sua confrontação com a via pública ou logradouros;
c) As obras de escassa relevância urbanística;
d) Os destaques referidos nos n.os 4 e 5 do presente artigo.
2 - [Revogado].
3 - [Revogado].
4 - Os atos que tenham por efeito o destaque de uma única parcela de prédio com descrição predial que se situe em perímetro urbano estão isentos de licença desde que as duas parcelas resultantes do destaque confrontem com arruamentos públicos.
5 - Nas áreas situadas fora dos perímetros urbanos, os atos a que se refere o número anterior estão isentos de licença quando, cumulativamente, se mostrem cumpridas as seguintes condições:
a) Na parcela destacada só seja construído edifício que se destine exclusivamente a fins habitacionais e que não tenha mais de dois fogos;
b) Na parcela restante se respeite a área mínima fixada no projeto de intervenção em espaço rural em vigor ou, quando aquele não exista, a área de unidade de cultura fixada nos termos da lei geral para a região respetiva.
6 - Nos casos referidos nos n.os 4 e 5 não é permitido efetuar na área correspondente ao prédio originário novo destaque nos termos aí referidos por um prazo de 10 anos contados da data do destaque anterior.
7 - O condicionamento da construção bem como o ónus do não fracionamento previstos nos n.os 5 e 6 devem ser inscritos no registo predial sobre as parcelas resultantes do destaque, sem o que não pode ser licenciada ou comunicada qualquer obra de construção nessas parcelas.
8 - O disposto no presente artigo não isenta a realização das operações urbanísticas nele previstas da observância das normas legais e regulamentares aplicáveis, designadamente as constantes de planos municipais, intermunicipais ou especiais de ordenamento do território, de servidões ou restrições de utilidade pública, as normas técnicas de construção, as de proteção do património cultural imóvel, e a obrigação de comunicação prévia nos termos do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 73/2009, de 31 de março, que estabelece o regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional.
9 - A certidão emitida pela câmara municipal comprovativa da verificação dos requisitos do destaque constitui documento bastante para efeitos de registo predial da parcela destacada.
10 - Os atos que tenham por efeito o destaque de parcela com descrição predial que se situe em perímetro urbano e fora deste devem observar o disposto nos n.os 4 ou 5, consoante a localização da parcela a destacar, ou, se também ela se situar em perímetro urbano e fora deste, consoante a localização da área maior.

Contém as alterações dos seguintes diplomas:
- DL n.º 177/2001, de 4/06
- Lei n.º 60/2007, de 04/09
- DL n.º 26/2010, de 30/03
- DL n.º 136/2014, de 09/09
- Lei n.º 79/2017, de 18/08
 
 
Diversos 
 
1. Sobre o destaque de parcelas de terreno em perímetro urbano, cfr. o Parecer n.º 115/2005, de 25.10.2005, da CCDR do Alentejo, sendo relatora Gertrudes Maria C. do Castelo Gonçalves.
2. Sobre o destaque de parcelas de terreno fora do perímetro urbano, cfr. o Parecer n.º 137/2005, de 15.12.2005, da CCDR do Alentejo, sendo relator Luís Manuel Rosmaninho Santos.
3. Cfr. também o artº 50 do presente diploma sobre fraccionamento de prédios rústicos e respectivas notas. 
 
Jurisprudência:
 
1. Acórdão do STJ de 24-05-2011
EMPARCELAMENTO.
PRÉDIO RÚSTICO.
DIREITO DE PREFERÊNCIA.
UNIDADE DE CULTURA.
FIM NÃO AGRÍCOLA.
EXPLORAÇÃO AGRO-PECUÁRIA.
Processo n.º 1543/04.2TBVIS.C1.S1.
Sumário:
1. Deve qualificar-se, para os efeitos do nº1 do art. 1380º do CC, como de «sequeiro», de modo a envolver a aplicação da área da unidade de cultura mais ampla, o prédio rústico em que há muito se não verificava o cultivo de qualquer planta, legume ou vegetal, inexistindo nele qualquer sistema de rega, de aproveitamento de águas, incluindo as pluviais - por, neste concreto circunstancialismo, inexistir o menor índice que pudesse configurá-lo - face ao uso efectivo e predominante que lhe vinha sendo dado - como terreno de «regadio».
2.Não existe o direito de preferência do proprietário de terreno confinante, fundado naquele normativo, quando o prédio rústico alienado está exclusivamente afectado, em termos administrativamente lícitos, a uma exploração agro-pecuária que envolve a implantação, em prédio misto contíguo, de um estabelecimento de exploração agro pecuária, - destinando-se, deste modo, o prédio alienado a fins de produção animal que extravasam manifestamente uma primacial função agrícola ou a exploração florestal ou silvo-pastorícia dos terrenos.
Relator: Lopes do Rego
- Ver no SIMP
- Ver na DGSI

Como se calcula o valor relativo de cada fracção



O escopo do presente artigo justifica-se no fundo por ao longo do tempo me confrontar amiudadas vezes, com o facto de alguns condóminos questionarem da legalidade de, duas fracções autónomas aparentemente iguais possuírem percentagens ou permilagens diferentes ou de fracções com uma área menor que outras, poderem possuir uma percentagem ou permilagem maior.
 
A questão recorrente: será isto legal? Não devia haver um critério proporcional?
 
Apreciando, importa desde logo iniciar o presente escrito, com a determinação daquela que poderá ser a possível, a melhor ou mais exacta definição dos diversos conceitos em presença e que nos aproveitam.

Começando pelo conceito de «área da fracção», qualquer pessoa, mesmo sem especial formação, tem um conceito geral sobre o que é ou representa a expressão «área de uma fracção». No entanto, se se quiser ser o mais objectivo e concreto possível, confronta-se este desiderato com vários conceitos ou, melhor dito, diversas definições de «área da fracção».

Assim, o conceito de «área da fracção» para o promotor imobiliário ou o construtor civil, enquadra-se desde logo na área da fracção autónoma na vertente do custo. Para qualquer um deles, é natural e legitimamente relevante saber qual a área de construção de cada fracção, porquanto este dado é fulcral para se determinar qual o valor pelo qual irá colocar à venda a referida fracção.

No que concerne à Administração Fiscal, o conceito «área da fracção» tem em consideração, não só a área habitacional da fracção (área bruta privativa) mas também a área destinada a outras finalidades, nomeadamente, arrecadações, garagens, etc. (área bruta dependente), critérios que na acepção legal confluem para a determinação do respectivo valor patrimonial tributário.

Contudo, para o comum promitente-comprador, interessado na aquisição de uma qualquer fracção autónoma, regra geral, ele estará naturalmente mais interessado em verificar qual é a área útil da potencial fracção, ou seja, a área que se terá afecta à vivência do seu quotidiano familiar.

Por outro lado, temos o conceito de «percentagem» ou «permilagem», consoante o prédio esteja constituído em 100 ou 1 000 unidades. Ora, consultando um vulgar dicionário de língua portuguesa, «percentagem» é a proporção calculada em relação a uma grandeza de cem unidades.

Vale pois isto por dizer que, a área da fracção representará, em termos gerais, a concreta medição da mesma, ao passo que a percentagem / permilagem da fracção representa uma proporção do seu valor relativo com relação ao valor total do prédio. Será portanto, uma parte proporcional de um todo, pelo que, se o cálculo e determinação das áreas do imóvel obedecerão, em conformidade, no plano urbanístico e fiscal, aos critérios definidos em Lei e demais regulamentação aplicável, razoavelmente se poderá atender, por princípio, a tais elementos como pressupostos definidores do valor total do prédio e os valores relativos das partes autonomizadas que o compõem (as fracções autónomas), sem prejuízo, ainda, do valor especulativo (o chamado «valor de mercado») do prédio, atendendo designadamente à localização, as acessibilidades, infraestruturas e serviços limítrofes que servirão os respectivos proprietários. Temos ainda o valor de construção/reconstrução do prédio, ou seja, o custo que será necessário suportar pela construção do prédio, ou pela sua reconstrução, em caso de perda total do mesmo.

Nesta factualidade, qual será então o valor de um prédio que deve ser tido em conta para efeitos de calculo da permilagem de cada uma das suas fracções autónomas? O valor de construção e/ou reconstrução do prédio, o valor fiscal (VPT) ou o valor de mercado?

Estatui o art. 1418º, nº 1 do CC que “No titulo constitutivo, serão especificadas as partes do edifício correspondentes às várias fracções, por forma que estas fiquem devidamente individualizadas, e será fixado o valor relativo a cada fracção, expresso em percentagem, do valor total do prédio.”Decorre deste preceito que é através do Título Constitutivo da Propriedade Horizontal que se fixa a percentagem ou permilagem atribuída a cada fracção autónoma com relação ao valor total do prédio.

A título meramente ilustrativo, importa observar que a questão atinente ao valor relativo de cada fracção, foi bastante debatida no âmbito regime dos empreendimentos turísticos em propriedade plural, tendo o legislador estabelecido uma fórmula especifica para esse efeito, através do Dec. Regulamentar nº 8/89 de 21 de Março, que seria posteriormente revogado pelo DL nº 167/97 de 04 de Julho.

Pelo exposto, não obstante a área locável e/ou habitável do imóvel, possa ser definível por aplicação das formulas para o respectivo cálculo, havidas previstas na legislação urbanística e fiscal, não podemos olvidar que outros factores concorrem directamente para a determinação do valor económico do prédio e das suas partes integrantes em geral, e das fracções autónomas que o compõem, em especial.

À luz destes considerandos, resulta portanto que as percentagens ou permilagens atribuídas às fracções autónomas, para além das áreas locáveis e/ou habitáveis das fracções autónomas (v.g., os metros quadrados que totalizam a área útil), poderá atender a outros factores que pela sua natureza, justifiquem a respectiva integração nas respectivas proporcionalidades, a saber
 A outros elementos comummente identificados como componentes majorativos de qualidade e conforto (ar-condicionado, aspiração central, aquecimento central, acabamentos mais nobres), etc.);
  • A eventuais partes comuns de afectação comum que as servem (salão de festas, piscina, zona de barbeque, parque infantil, campo ténis, etc.) ou exclusiva (terraço, jardim, etc.);
  • À localização mais, ou menos privilegiada (zona mais nobre ou inserida numa área urbanística mais favorecida), a factores panorâmicos (visão para um melhor horizonte paisagístico) à exposição solar (fracção mais soalheira), à existência de equipamentos comunitários (culturais, educação, saúde, lazer e similares) e serviços públicos e privados (redes de abastecimento água, gás, esgotos e eléctrica, etc.).(1)
 Respingando o quadro factual supra descrito, a resposta à questão atinente à possibilidade de uma fracção detentora de uma área menor poder possuir uma percentagem ou permilagem superior que uma outra, com uma área maior, é a de que, tal medida não esbarra em qualquer ilegalidade.

Dito isto, os valores relativos de todas as fracções autónomas, são determinantes para a organização e administração dos condomínios, expresso, para o efeito, nas respectivas percentagens ou permilagens atribuídas, nomeadamente: 
  • para o apuramento do quórum constitutivo legalmente exigível para a realização das reuniões em Assembleia Geral de Condóminos, em primeira ou segunda convocatória (art. 1432º, nº 3 e 4 do CC);
  • para a imputação do número de votos e respectivo sentido que determinarão a aprovação ou rejeição das propostas constantes da ordem de trabalhos (art. 1430º, nº 2 do CC);
  • para a fixação da comparticipação nas despesas com os encargos comuns ordinários e extraordinários do condomínio (art. 1424º do CC) e bem assim, da distribuição de eventuais receitas (art. 1436º, al. d) do CC).

Finalmente, importa salientar que o cálculo atinente ao valor da percentagem ou da permilagem é da responsabilidade do promotor ou construtor e não do Administrador do condomínio, no entanto, nada obsta a que, posteriormente, havendo o acordo de todos os condóminos (leia-.se, mediante deliberação aprovada por unanimidade), estes possam, modificar o valor relativo havido fixado para cada fracção autónoma, expresso em percentagem ou permilagem, por escritura pública ou DPA (art. 1419º do CC).


As percentagens ou permilagens estão registadas num documento que se chama Título Constitutivo da Propriedade Horizontal, ou seja a Escritura Pública da constituição do regime de  propriedade horizontal que poderá ser obtido no respectivo Cartório Notarial.

Como é calculada a percentagem ou permilagem?

A título meramente ilustrativo, atentemos num singelo exercício que tem unicamente em consideração a área em metros quadrados.  Esta é pois calculada tendo em consideração a área ocupada por cada fracção autónoma, medida pelo respectivo  perímetro (o extradorso das paredes exteriores e pelo meio das paredes confinantes com outras fracções ou partes comuns). 

Assim tomemos por exemplo, um edifício constituído em propriedade vertical (ou total) com 4 fracções, que se pretende constituir em regime de propriedade horizontal:

Fracção A, T3 com 250 m2;

Fracção B, T2 com 200 m2;

Fracção C, T3 com 250 m2;

Fracção D, T1 com 100 m2.

Estas quatro fracções autónomas totalizam 800 m2. Para se calcular a percentagem ou permilagem a atribuir a cada fracção autónoma, basta efectuar a seguinte operação aritmética: 

Fracção A: 250 : 800 = 0,3125 = 31,25% (ou 312,5 por 1000)

Fracção B: 200 : 800 = 0,25 = 25% (ou 250/1000).

Fracção C: 250 : 800 = 0,3125 = 31,25% (ou 312,5 por 1000)

Fracção D: 100 : 800 = 0,125 = 12,5% (ou 125/1000).

Permilagens: 312,5 (A) + 250 (B) + 312,5 (C) + 125 (D) = 1 000 

Votos: 312 (A) + 250 (B) + 312 (C) + 125 (D) = 999 (2)

 

Notas:

(1) Este exemplo é válido para fracções idênticas, porém situadas em zonas diversas. 

(2) Apenas são consideradas as unidades inteiras que couberem na percentagem ou permilagem a que o art. 1418 se refere (art. 1430º, nº 2 do CC)