Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

26 março 2024

ACSTJ 07/07/10: Eliminação de defeitos


Acórdão: STJ 
Data: 07 de Julho de 2010
Proc. nº 31/04.1TBTMC.S1.
Relator: Ferreira de Almeida

Descritores:
Empreitada. 
Defeito da obra. 
Denúncia. 
Acção directa. 
Execução específica. 
Resolução de contrato. 
Procedimento

Sumário:

I. A não eliminação dos defeitos (oportunamente denunciados pelo dono da obra ao empreiteiro) não confere àquele o direito de, de per si (directamente) ou por intermédio de terceiro, eliminar os defeitos reclamando, posteriormente, do empreiteiro o pagamento das despesas efectuadas, bem como o de exigir do obrigado (por antecipação) o adiantamento da verba necessária ao respectivo custeio.

II. O dono da obra (como credor de uma prestação de facto fungível) só poderá adregar um tal resultado através do recurso à via judicial, obtendo a condenação do empreiteiro nessa eliminação e, em caso de incumprimento do dictat condenatório, requerer, em subsequente execução (execução específica), o respectivo cumprimento, por terceiro à custa de devedor (art.ºs 828.º do CC e 936.º, n.º 1, do CPC).

III. Trata-se, pois, de um direito potestativo de exercício judicial, não legitimador de qualquer acção directa geral ou especial (de carácter unilateral) por banda do dono da obra, não podendo este substituir-se ao empreiteiro, eliminando sponte sua e de motu próprio os defeitos ou vícios da obra e apresentar-lhe seguidamente a conta das despesas, assim procedendo, em administração directa, à eliminação dos defeitos ou à realização de nova obra (autotutela não consentida por lei).

Isto a menos que se trate de reparações objectivamente urgentes, prementes ou necessárias (não tendo o empreiteiro procedido atempadamente à sua eliminação), casos em que o dono da obra poderá agir com base nos prin­cípios da acção directa geral ou do estado de necessidade plasmados nos art.ºs 336.º e 339.º, ambos do CC.

IV. Com vista a tal desideratum, impõe a lei ao dono da obra um iter procedimental ou sequencial de carácter obrigatório: denúncia em devido tempo ao empreiteiro dos defeitos exibidos pela obra, assim lhe conferindo (ao empreiteiro) a possibilidade da sua eliminação ou, em caso de impossibilidade dessa eliminação, exigir-lhe uma nova construção (art.º 1221.º, n.º 1, do CC); só se frustrada essa “démarche” lhe será facultado exigir (ao empreiteiro) a redução do preço acordado ou a resolução do contrato (art.º 1222.º, n.º 1, do mesmo diploma).

V. Não cabe ao comitente (dono da obra) a opção entre eliminar os defeitos ou realizar uma nova obra. É ao empreiteiro, tendo em conta as leges artis e os conhecimentos técnicos inerentes, que cabe averiguar se os defeitos são elimináveis. Se o dono da obra discordar da opinião do empreiteiro, compete ao tribunal decidir (com apelo a critérios objectivos) se os defeitos são ou não elimináveis.

Texto integral: vide aqui

20 março 2024

Proteção contra sismos deve ser obrigatória nos seguros de habitações



A Associação Portuguesa de Seguradores (APS) defende que a cobertura de risco sísmico seja obrigatório nos seguros de habitações e que seja criado um fundo para risco sísmico a ser gerido em conjunto pelas seguradoras e pelo Estado.

O Governo publicou um despacho a incumbir a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) a desenvolver a criação de um sistema de cobertura do risco de fenómenos sísmicos, devendo apresentar uma proposta até ao final do primeiro trimestre de 2024.

Num encontro esta quinta-feira com jornalistas, a APS defendeu que qualquer seguro de cobertura de habitações deve passar a incluir a cobertura de risco sísmico e que a maior parte do prémio desse seguro seja transferido para uma nova entidade, designada Sistema Nacional de Protecção de Riscos Catastróficos (numa primeira fase dedicado a riscos sísmicos e que no futuro pode ser alargado a grandes inundações e grandes incêndios), que irá gerir esse dinheiro e em caso de sismo cobrir as perdas nas habitações em Portugal.

"A capacidade inicial seria dar resposta de 8.000 milhões de euros. No dia um [de uma catástrofe sísmica} o setor segurador poderia dar resposta a uma recuperação de habitações no valor de 8.000 milhões de euros e se a catástrofe for de 9.000 milhões de euros o Estado poria os restantes 1.000 milhões de euros", explicou o presidente da APS, José Galamba de Oliveira.

Galamba de Oliveira disse que este valor está a ser recalculado, uma vez que advém de um estudo feito em 2018, e que entretanto precisa de ser atualizado quer pelo valor da inflação quer de outros custos.

Numa primeira fase, para conseguir que este fundo tivesse uma capacidade de fazer face a perdas de 8.000 milhões de euros, Galamba de Oliveira disse que teriam de ser feitos acordos com resseguradoras internacionais para garantir essa cobertura.

Questionado sobre quanto serão agravados os seguros para as habitações caso a proteção de risco sísmico venha a ser obrigatória, afirmou que no estudo feito em 2018 o valor variava num aumento de 30 a 70 euros por ano (para um capital médio de 125 mil euros), admitindo que esse cálculo tem de ser refeito.

A associação que agrega as seguradoras que operam em Portugal mostrou um estudo da Swiss Re segundo o qual Portugal é o país da Europa mais exposto a risco sísmico (incluindo à frente de Itália). O maior risco é em Lisboa e Algarve.

Ainda segundo a APS, num evento severo, como o terramoto de Lisboa de 1755, as perdas podem atingir 20% do Produto Interno Bruto (PIB).

Depois de anos em que a APS falou deste tema sem ir avante qualquer legislação, a associação considera que agora nota vontade política e que há condições para haver um Fundo de Risco Sísmico "até final da atual legislatura", em 2026.

Questionado sobre as críticas dos mediadores de seguros, que dizem que muitas seguradoras recusam cobrir o risco sísmico, Galamba de Oliveira afirmou que isso acontece porque "hoje em dia muitas habitações não têm condições de segurança sísmica", mas também considerou que tornar esse seguro obrigatório levaria a ultrapassar esse problema.

"No modelo que aqui está, na medida em que é de cobertura obrigatória tem de haver resposta social", afirmou.

Já sobre as críticas que habitualmente os clientes fazem a seguradoras, de que quando accionam os seguros estas se tentam pôr de fora e não assumir encargos, Galamba de Oliveira disse ter conhecimento de situações de insatisfação, mas também afirmou que muitas acontecem porque as pessoas não contrataram o que pensam ter contratado ou o fizeram abaixo do que deveriam ter contratado (infrasseguro).

"O sector regulariza milhares e milhares de sinistros e a maioria dele sem problemas, muitas vezes não se trata de [a seguradora] pôr-se de fora, as pessoas pensam que têm cláusulas contratadas e na hora da verdade não [tinham]. Ainda o infrasseguro, tem um sinistro de 10 mil euros e a seguradora só paga 3.000 ou 4.000 porque há infrasseguro, a habitação não está segurada nos capitais certos", afirmou.

O presidente da APS explicou que muitas vezes as seguradoras não assumem porque também há deveres que os clientes não cumprem. Por exemplo, disse, quando há inundações as seguradoras vão ver telhados e muitas vezes não estavam devidamente mantidos.

"Contratualmente também há deveres do lado do tomador de seguro que não cumpre e acaba por resultar neste tipo de diferendos", disse.

Em 2022, segundo a APS, havia 5,9 milhões de habitações em Portugal, sendo que quase 2,7 milhões não têm qualquer seguro.

Das 3,1 milhões de habitações cobertas por seguros, 1,13 milhões têm seguros com riscos sísmicos e em 2,0 milhões os seguros não incluem riscos sísmicos.

Em Portugal apenas as habitações em prédio (propriedade horizontal) são obrigadas a ter seguro de incêndios (o nome técnico é seguro de incêndio, queda de raio ou explosão).

A APS defendeu ainda um registo nacional das habitações com seguro de incêndio (como existe dos seguros automóvel) já que, apesar de ser obrigatório em casas em prédio, é muitas vezes incumprida e não é controlada.