Processo: 3124/17.1T8MTS.P1
Relatora: Fernanda Almeida
Data: 03-06-2019
Descritores:
Deliberações da assembleia de condóminos
Propriedade horizontal
Parte comum
Obras de conservação
Sumário:
Apreciação
Em causa está a parte do tecto da fracção que é um telhado constituído por placas de fibrocimento pois são estas que demandam obras de reparação, uma vez que várias placas estão danificadas, permitindo a entrada da chuva.
Considerou a sentença que, não servindo a cobertura em causa qualquer outro espaço do prédio em PH, será caso de aplicação do disposto no nº 3 art. 1424º CC, segundo o qual «As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem».
Entendeu a recorrente que este telhado tem uma função de cobertura e protecção não apenas desta fracção, mas de todo o edifício, destinando-se a garantir a estabilidade do prédio no seu todo. Assim, as obras de intervenção sobre tal elemento interessavam directamente a todos, posto que não intervindo em situação de degradação é todo o imóvel que se degrada.
Nos termos do disposto no art. 1421º, nº 1 b) CC, o telhado e os terraços de cobertura são comuns e são-no ainda que destinados ao uso de qualquer fracção. Já de acordo com o art. 1424º, nº 1 CC, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns são pagas pelos condóminos na proporção do valor das suas fracções.
Este art. 1424º refere-se a despesas de conservação e fruição (conforme consta da sua epígrafe). Não estabelece qualquer distinção entre despesas de conservação ordinária e extraordinária[1].
Não há dúvida de que o telhado é parte comum e a sentença afirma-o. Mas também se diz – e a recorrente não o colocou em causa – que esta parte comum apenas serve a fração da mesma e não tem uma função de cobertura relativamente a qualquer outra fracção. Ou seja, a sentença separou claramente esta fracção das restantes partes do imóvel e a lei também admitiu que, no imóvel em PH, quanto às partes comuns, apenas o condómino que delas se sirva seja responsável pelos respetivos encargos de conservação e fruição (nº 3 do art. 1424º CC).
Não se dúvida que o legislador sabia que os prédios em PH constituem não só uma unidade jurídica, mas também uma unidade física e que, mesmo quando apenas utilizadas por um dos condóminos, as partes comuns precisam de manutenção de tal forma que a sua degradação não deixará de afectar o todo.
Este argumento – o que de não cuidando de uma parte é o todo que pode ser afectado – não inibiu o legislador de estabelecer que pelas despesas de conservação e fruição dessa parte é apenas responsável o condómino que delas se serve em exclusividade. Assim sendo, relativamente ao telhado de uma fracção que apenas serve de cobertura àquela fração e não já, mesmo que indirectamente, a todo o imóvel, é responsável pelas despesas de conservação e fruição o titular da fracção em causa.
Para que se considerasse de forma diferente seria mister que nos factos provados resultasse algo diferente do que consta do pedido, nomeadamente que existiria uma unidade ou um continuum entre o restante prédio e este telhado de tal forma que não pode fazer-se intervenção num deles sem afectar o restante, ou ainda que este telhado segue para outras fracções.
Porém, nada foi apurado quanto a essa situação e a alegação da recorrente segundo a qual a segurança do prédio ficará em causa se um telhado de uma sua fracção, ainda que autónomo, sofrer degradação, mormente por efeito da entrada de água, é abstratamente válida para todas as situações de partes comuns que sirvam em exclusivo algum dos condóminos e que fiquem degradadas, sendo que, mesmo assim, o legislador permite que as obras de conservação e fruição que lhe respeitam não onerem quem delas se não serve. Já não assim outro tipo de obras mais profundas como sejam as despesas de reconstrução ou as que não sejam unicamente imputáveis ao uso da fracção posto que a norma alude expressamente a encargos de conservação e fruição.
Observando os arestos citados pela recorrente, verifica-se que em ambos se trata de situações de telhados ou coberturas que, servindo imediata e directamente uma das fracções, têm uma função indirecta de cobertura de outras frações (no ac. desta Relação, trata-se de um terraço exclusivo de uma das fracções, mas cujo piso serve de cobertura à fracção inferior; no ac. do STJ, curou-se de terraços intermédios que serviam de cobertura, ainda que parcial, a fracções de pisos inferiores). Donde, estando em causa despesas de conservação e fruição relativas a telhado que serve em exclusivo uma fração, nos termos do art. 1424º, nº 3, CC, é por elas responsável apenas o respectivo titular[2].
Por conseguinte impôs-se a mantutenção da sentença recorrida.
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[1] Cfr. Ac. TRP, de 4/12/2000, Proc. 0051266:
I - São três os tipos de obras que podem ter lugar nos prédios urbanos usufruídos mediante contrato de arrendamento:a) obras de conservação ordinária - reparação e limpeza geral do prédio, obras impostas pela Administração Pública e, em geral, as destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração;b) obras de conservação extraordinária - ocasionadas por defeito de construção do prédio ou por caso fortuito ou de força maior, e, em geral, as que não sendo imputáveis a acções ou omissões ilícitas perpetradas pelo senhorio, ultrapassem, no ano em que se tornem necessárias, dois terços do rendimento líquido desse mesmo ano;c) obras de beneficiação - todas as restantes.
[2] Neste sentido, ac. STJ, de 9/6/2016, Proc. 211/12.6TVLSB.L2.S1:
I- O art. 1424.º, n.º 1, do CC contém um princípio geral que se traduz na obrigação de os condóminos suportarem, na proporção do valor da sua fracção, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício.II - O n.º 3 do art. 1424.º do CC contém uma excepção ao referido princípio ao estabelecer que as despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem, i.e., dos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns (como sucede com um terraço que serve de cobertura a parte do prédio).III - Há, porém, que distinguir, dentro dessas despesas, as chamadas despesas de manutenção das despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção de espaços exteriores a essas partes comuns que não são utilizados por aqueles condóminos: as primeiras são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles que deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais desse terraço; já as segundas são a cargo de todos os condóminos por as reparações a realizar constituírem um benefício comum de todos eles.