Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

19 setembro 2023

Deliberações ineficazes

 
3.3 Deliberações ineficazes
 
A ineficácia em sentido estrito é uma das consequências jurídicas aplicáveis às deliberações das assembleias de condóminos, ainda que em todo o regime jurídico da propriedade horizontal só encontremos uma única referência a este vício, designadamente no nº 2 do art. 1433º do CC, reconhecendo-se assim a sua dignidade jurídica no âmbito desta matéria. 
 
A deliberação ineficaz é, então, uma deliberação válida à qual, “todavia, faltará um elemento especificamente indispensável para que realize a sua função – o seu requisito de eficácia”, carecendo, portanto, de “idoneidade funcional”.(110)
 
O conceito de ineficácia diz respeito a “alguma circunstância extrínseca”, sendo que em matéria de deliberações estaremos perante uma ineficácia relativa, e não absoluta, na medida em que se verificará em relação a certos condóminos, só por eles podendo ser invocada (a deliberação, “embora ineficaz noutras direcções, é inoponível a certas pessoas”).(111)
 
Em suma, a ineficácia impede que os efeitos de uma deliberação afectem determinados condóminos.(112)

Deliberações anuláveis - casos especiais


3.2.1 Deliberações anuláveis - casos especiais
 
A assembleia pode, por mera deliberação tomada por maioria simples, modificar ou revogar o regulamento vigente no condomínio,(101) mesmo que tal regulamento tenha sido aprovado por unanimidade. Estas deliberações não se confundem com as deliberações que violem, directa e concretamente, normas gerais e abstractas contidas no regulamento, cuja cominação é algo controversa na doutrina. 
 
Com efeito, para João Vasconcelos Raposo,(102) se o regulamento do condomínio integrar o título constitutivo, a sua modificação exige unanimidade (art. 1419º, nº 1).(103) pelo que serão “inválidas”as deliberações que desrespeitem as suas cláusulas,mesmo que aprovadas por todos os condóminos – salvo, claro, se antes da tomada de tal deliberação se modificar o regulamento de modo concordante com a deliberação que se pretende aprovar. Não obstante, o autor chama a atenção para o facto de, naquele caso, tal invalidade ser insindicável, pois se todos os condóminos a aprovaram, não existirá ninguém com legitimidade para a impugnar.
 
Por outro lado, entende que perante o desrespeito pelo regulamento do condomínio que não integre o título constitutivo, e uma vez que a lei não exige qualquer maioria especial para o modificar, não parece justificável considerar a existência de qualquer invalidade na deliberação tomada com respeito por todas as formalidades. “Nesse caso, a deliberação traduzirá ou uma alteração do regulamento de condomínio ou uma derrogação pontual do mesmo, o que, em qualquer dos casos, nada terá, a (seu) ver, de ilícito. ”Em sentido diferente, Pires de Lima e Antunes Varela (104) defendem que o legislador visa, aqui, impedir a tomada de deliberações concretas contrárias à regulamentação geral contida no regulamento, pelo que é necessário que assembleia proceda, em primeiro lugar, à devida modificação do regulamento e, só depois, à aprovação da solução pretendida.