Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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4/14/2022

Defeito da obra no contrato de empreitada

DECRETO-LEI Nº 47 344, de 25 de Novembro de 1966
(Actualizado até à Lei n.º 8/2022, de 10/01)

CAPÍTULO XII
Empreitada

SECÇÃO III
Defeitos da obra

ARTIGO 1218º 
(Verificação da obra) 

1. O dono da obra deve verificar, antes de a aceitar, se ela se encontra nas condições convencionadas e sem vícios. 
2. A verificação deve ser feita dentro do prazo usual ou , na falta de uso, dentro do período que se julgue razoável depois de o empreiteiro colocar o dono da obra em condições de a poder fazer. 
3. Qualquer das partes tem o direito de exigir que a verificação seja feita, à sua custa, por peritos. 
4. Os resultados da verificação devem ser comunicados ao empreiteiro.5. A falta da verificação ou da comunicação importa aceitação da obra.

 ARTIGO 1219º 
(Casos de irresponsabilidade do empreiteiro) 

1. O empreiteiro não responde pelos defeitos da obra, se o dono a aceitou sem reserva, com conhecimento deles. 
2. Presumem-se conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação da obra. 

ARTIGO 1220º 
(Denúncia dos defeitos) 

1. O dono da obra deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos seguintes, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu descobrimento. 
2. Equivale à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito. 

ARTIGO 1221º 
(Eliminação dos defeitos) 

1. Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção. 
2. Cessam os direitos conferidos no número anterior, se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito. 

ARTIGO 1222º 
(Redução do preço e resolução do contrato)

1. Não sendo eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o dono pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina.
 2. A redução do preço é feita nos termos do artigo 884º. 

ARTIGO 1223º 
(Indemnização) 

O exercício dos direitos conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito a ser indemnizado nos termos gerais. 

ARTIGO 1224º 
(Caducidade) 

1. Os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista no artigo 1220º. 
2. Se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da obra. 

ARTIGO 1225º 
(Imóveis destinados a longa duração) 

1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada tiver por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente. 
2. A denúncia, em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia. 
3. Os prazos previstos no número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previstos no artigo 1221º. 
4. O disposto nos números anteriores é aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado. 

ARTIGO 1226º 
(Responsabilidade dos subempreiteiros) 

O direito de regresso do empreiteiro contra os subempreiteiros quanto aos direitos conferidos nos artigos anteriores caduca, se não lhes for comunicada a denúncia dentro dos trinta dias seguintes à sua recepção.

3/25/2022

Direitos do Autor de Projecto de Arquitectura na Execução da Obra


Segundo o estabelecido no art. 1º do Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC), consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas que, como tais, são protegidas nos termos daquele código, incluindo-se nessa protecção os direitos dos respectivos autores. De acordo com o disposto no art. 9º do CDACD, o direito de autor abrange direitos de carácter patrimonial e direitos de natureza pessoal, denominados direitos morais (nº 1). No exercício dos direitos de carácter patrimonial, o autor tem o direito exclusivo de dispor da sua obra e de fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiro, total ou parcialmente (nº 2). Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, nomeadamente o direito de reivindicar a respectiva paternidade e assegurar a sua genuidade e integridade (nº 3). 
 
O direito do autor pertence ao criador intelectual da obra, salvo disposição expressa em contrário (art. 11º). A titularidade do direito de autor relativo a obra feita por encomenda ou por conta de outrem, quer em cumprimento de dever funcional quer de contrato de trabalho, determina-se de harmonia com o que tiver sido convencionado. Na falta de convenção, presume-se que a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por conta de outrem pertence ao seu criador intelectual (art. 14º).
 
Portanto, só quando tiver sido convencionado o contrário (com a entidade que encomendou o projecto ou para quem trabalha no regime de contrato de trabalho ou de dever funcional), é que o autor deixa de ser titular dos direitos de autor sobre a obra (projectos ou outras). Nos termos do art. 60º, nº 1, o autor de projecto de arquitectura ou de obra plástica executada por outrem e incorporada em obra de arquitectura, tem o direito de fiscalizar a sua construção ou execução em todas as suas fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade da obra com o projecto de que é autor. 
 
Quando edificada segundo projecto, não pode o dono da obra, durante a construção nem após a conclusão, introduzir nela alterações sem consulta prévia ao autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos (nº 2). Não havendo acordo, pode o autor do projecto repudiar a paternidade da obra modificada, ficando vedado ao proprietário invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial (nº 3). Em cada exemplar dos estudos e projectos de arquitectura e urbanismo, junto ao estaleiro da construção da obra de arquitectura e nesta, depois de construída, é obrigatória a indicação do respectivo autor, por forma bem legível. (art. 56º e 161º, nº 1, do CDADC). 
 
Também nos termos do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), aprovado pelo DL 555/99, de 16/12, com as alterações introduzidas, nomeadamente no art. 61º, está previsto que os titulares da licença ou autorização de construção (portanto, obras de criação de novas edificações), são obrigados a afixar uma placa em material imperecível no exterior da edificação, ou a gravar num dos seus elementos exteriores, com a identificação dos técnicos autores do respectivo projecto de arquitectura (e também, neste caso, do director técnico da obra). 
 
A repetição da construção de obra de arquitectura, segundo o mesmo projecto, só pode fazer-se com o acordo do autor (art. 68º n. 2, al. f) e j) e 161º nº 2, do CDADC). Quando edificada segundo projecto, encontra-se condicionada a possibilidade de, durante a construção e após a sua conclusão, o dono da obra introduzir alterações na mesma à obrigação de consulta prévia ao autor do projecto. A consequência do incumprimento desta condição (consulta) gera a responsabilidade civil do dono da obra pelas perdas e danos sofridos pelo autor do projecto (art. 60º, nº 2 do CDADC e 483º e ss do CC, em especial o art. 496º, para os danos não patrimoniais ou morais). 
 
Como ensina o Professor José de Oliveira Ascensão*, no conflito entre o direito ao projecto, cuja modificação teria de se realizar, e o direito de propriedade sobre o suporte, o edifício, este prevalece. Face à lei portuguesa, obra de arquitectura não é apenas o projecto mas também o edifício, havendo, assim, que conciliar o direito do autor do projecto com a propriedade, que não pode ficar dependente do arbítrio daquele durante toda a sua existência. Uma vez cumprida a consulta prévia do autor do projecto, o dono da obra pode, ainda que o autor do projecto não esteja de acordo com as alterações pretendidas, introduzi-las na obra arquitectónica, sendo conferido ao autor do projecto o direito de dele se desvincular, renegando a paternidade da obra alterada e impedindo o dono da obra de usar o nome do autor do projecto inicial (entenda-se não como renúncia ao direito de autor que está adquirido, e não se perde pelo facto das modificações, pois a obra modificada ainda é a mesma obra, por aplicação do nº 2 do art. 2º, mas apenas como proibição de invocação do nome do autor pela outra parte. 
 
O autor do projecto de arquitectura pode, a todo o tempo, voltar a considerar a obra como sua). É, portanto, lícito ao proprietário a modificação, doutra maneira o direito do autor do projecto seria o de se opor à modificação, o que foi justamente o que o legislador quis afastar. A lei não confere ao autor do projecto inicial de arquitectura um exclusivo no projecto de modificações. 
 
Assim, pode o dono da obra, consultado o autor do projecto inicial, decidir prosseguir a obra com outro técnico que possa elaborar e subscrever projectos de arquitectura. A substituição do autor do projecto (e também do director técnico da obra) está também prevista no RJUE (leitura a contrario da al. o), do nº 1, do art. 98º). Atenta a natureza específica do projecto arquitectónico que tem em vista a realização de uma obra cuja utilidade e fruição serão do dono da obra, a lei prevê uma protecção daquela obra intelectual e artística que não é absoluta, mas temperada pela vocação utilitária dos edifícios em que é necessário conciliar o mérito criador do autor do projecto com o específico interesse que a obra tem para os seus destinatários concretos (os proprietários). Assim, não se encontra vedada a introdução, pelo dono da obra, de alterações na obra projectada, desde que cumprido o ónus de consultar previamente o autor. A tutela penal do projecto arquitectónico encontra-se, no que ao crime de violação de direito moral (art. 198º) respeita, sujeita a pressupostos objectivos: 
 
- alguém arrogar a paternidade de um projecto que sabe não lhe pertencer;
- o atentado contra a genuinidade ou integridade do projecto, pela prática de acto que desvirtue a obra; e
- que o atentado possa afectar a honra ou reputação do autor.
 
Portanto, exige-se que as alterações introduzidas, pela sua relevância no conjunto em que se inserem, provoquem dano ou desfiguração tal do projecto que este possa considerar-se afectado nas suas qualidades ou características mais marcantes. Não se verificando tais pressupostos (desvirtuamento da obra e honra ou reputação do autor afectadas) não se configurará crime de violação de direito moral. 
 
O legislador quis dotar a tutela penal de um requisito acrescido relativamente à tutela civil - a necessária implicação da alteração do projecto com a honra ou reputação do autor do mesmo. O Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo DL nº 119/92, de 30/6, determina, na parte respeitante à deontologia profissional, que o Engenheiro: - só deve assinar projectos de que seja autor ou colaborador (art. 88º, nº 5):

- apenas deve reivindicar o direito de autor quando a originalidade e a importância relativas da sua contribuição o justifiquem, exercendo esse direito com respeito pela propriedade intelectual de outrem (art. 89º, nº 2);
- deve recusar substituir outro Engenheiro, só o fazendo quando as razões dessa substituição forem correctas e dando ao colega a necessária satisfação (art. 89º, nº 5). A violação culposa daqueles deveres será considerada infracção disciplinar e o Engenheiro poderá ser punido disciplinarmente, após instauração do competente processo disciplinar. Tem sido jurisprudência dos órgãos disciplinares da Ordem dos Engenheiros considerar que, para os efeitos previstos no art. 89º, nº 5, do Estatuto, o termo “colega” poder ser extensivo aos arquitectos. 
 
Face ao exposto, poder-se-ão extrair algumas conclusões: 
 
1 - Os direitos do autor de projecto de arquitectura são direitos específicos dentro do esquema do Código.
2 - O autor do projecto tem o direito a fiscalizar a obra em todas as fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade da obra com o projecto de que é autor.
3 - O dono da obra pode introduzir alterações na obra projectada desde que cumprido o ónus de consultar previamente o seu autor.
4 - As alterações ilícitas (sem o acordo do autor) introduzidas no projecto arquitectónico permitem ao autor desvincular-se do projecto, rejeitando a sua paternidade e confere-lhe o direito a ser indemnizado pelos danos sofridos (patrimoniais e não patrimoniais).
5 - Para terem relevância criminal (permitir a condenação pela prática de um crime) as alterações ilícitas introduzidas têm de atentar contra a genuinidade ou integridade do projecto (prática de acto que desvirtue a obra) e que afectem a honra ou reputação do autor (por exemplo, o autor ver o seu nome falado, comentado ou envolvido em polémica devido ao efeito das alterações no projecto).
6 - A violação dos deveres deontológicos é punida disciplinarmente.

Bibliografia e Jurisprudência:
  • Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC), aprovado pelo DL nº 63/85, de 14/3, e alterado pelas Leis nº 45/85, de 17/9, 114/91, de 3/9, pelos DL nº 332/97 e 334/97, ambos de 27/11, e pela Lei nº 50/2004, de 24/8.
  • Direito Civil - Direito de Autor e Direitos Conexos - Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão, Coimbra Editora, 1992.
  • Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos - Anotado pelo Dr. Luiz Francisco Rebelo - 2ª edição, Âncora Editora, 1998.
  • Código Civil – edição DisLivro, 2002.
  • Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, aprovado pelo DL nº 555/99, de 16/12.
  • Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo DL nº 119/92, de 30/6.
  • Jurisprudência do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Engenheiros, 2003.
  • Ac. TRÉ de 26/2/1991 (integra o crime de contrafacção o facto de um autor de um projecto de arquitectura apresentar como seu um projecto de construção de uma casa decalcado de outro projecto elaborado por outro autor, sem o assentimento deste).
  • Ac. STJ, de 29/9/1993 (usurpação de obra artística - projecto de loteamento).
  • Ac. STJ, de 16/3/2000 (violação do direito moral de autor - pedido de parecer e estudos prévios sobre a viabilidade técnica e económica da solução contida numa proposta de concepção urbanística e arquitectónica sem autorização e conhecimento do seu autor).
  • Ac. STJ, de 11/4/2002 (contratos de projecto de arquitectura autónomos).
  • Direito Civil – Direito de Autor e Direitos Conexos - Coimbra Editora, 1992.
Publicado na Revista Ingenium nº 84
Novembro/Dezembro de 2004

3/24/2022

Vistoria para confirmar estado do imóvel


A comprovação do estado de conservação do edifício em geral ou de uma fracção autónoma em particular, é um dos serviços prestados pelas Câmaras Municipais, o qual se traduz na realização de uma vistoria e subsequente entrega do respectivo auto ao interessado.

Importa contudo sublinhar que o auto de vistoria emitido no âmbito deste pedido limita-se, em exclusivo, à descrição do estado em que se encontra determinado edifício ou fracção autónoma, listando as deficiências visíveis (caso estas existam) e nunca apontando possíveis causas ou fundamentos para os factos descritos.

De salientar que a apresentação de exposição à CM sobre o estado de conservação do edifício ou fracção autónoma, deve incluir informação detalhada sobre as deficiências existentes, danos causados, a morada completa do imóvel (incluindo o nº de porta e fracção), bem como outros elementos considerados relevantes.

A apresentação desta exposição tem por objectivo a verificação do exacto estado de conservação e, caso seja aplicável, a intimação do respectivo proprietário para realização das obras necessárias.

As edificações devem ser objecto de obras de conservação pelo menos uma vez em cada oito anos, devendo o proprietário, independentemente desse prazo, realizar todas as obras necessárias à manutenção da sua segurança, salubridade e arranjo estético.

RJUE

Artigo 89º
Dever de conservação


1 - As edificações devem ser objecto de obras de conservação pelo menos uma vez em cada período de oito anos, devendo o proprietário, independentemente desse prazo, realizar todas as obras necessárias à manutenção da sua segurança, salubridade e arranjo estético.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a câmara municipal pode a todo o tempo, oficiosamente ou a requerimento de qualquer interessado, determinar a execução de obras de conservação necessárias à correcção de más condições de segurança ou de salubridade ou à melhoria do arranjo estético.
3 - A câmara municipal pode, oficiosamente ou a requerimento de qualquer interessado, ordenar a demolição total ou parcial das construções que ameacem ruína ou ofereçam perigo para a saúde pública e para a segurança das pessoas.
4 - Os actos referidos nos números anteriores são eficazes a partir da sua notificação ao proprietário.
 
Artigo 90º
(Vistoria prévia)

1 - As deliberações referidas no n.º 2 e n.º 3 do artigo anterior são precedidas de vistoria a realizar por três técnicos a nomear pela câmara municipal.
2 - Do acto que determinar a realização da vistoria e respectivos fundamentos é notificado o proprietário do imóvel, mediante carta registada expedida com, pelo menos, sete dias de antecedência.
3 - Até à véspera da vistoria, o proprietário pode indicar um perito para intervir na realização da vistoria e formular quesitos a que deverão responder os técnicos nomeados.
4 - Da vistoria é imediatamente lavrado auto, do qual consta obrigatoriamente a identificação do imóvel, a descrição do estado do mesmo e as obras preconizadas e, bem assim, as respostas aos quesitos que sejam formuladas pelo proprietário.
5 - O auto referido no número anterior é assinado por todos os técnicos e pelo perito que hajam participado na vistoria e, se algum deles não quiser ou não puder assiná-lo, faz-se menção desse facto.
6 - Quando o proprietário não indique perito até à data referida no número anterior, a vistoria é realizada sem a presença deste, sem prejuízo de, em eventual impugnação administrativa ou contenciosa da deliberação em causa, o proprietário poder alegar factos não constantes do auto de vistoria, quando prove que não foi regularmente notificado nos termos do n.º 2.
7 - As formalidades previstas no presente artigo podem ser preteridas quando exista risco iminente de desmoronamento ou grave perigo para a saúde pública, nos termos previstos na lei para o estado de necessidade.

Quem pode solicitar

Pessoas singulares ou colectivas, públicas ou privadas, qualquer que seja a sua qualidade face ao edifício ou fracção autónoma.

Como e onde pedir

Os interessados podem aceder aos sites das respectivas Câmaras Municipais, as quais, disponibilizam um formulário online.

Quanto custa

Os interessados devem consultar a Tabela de Taxas Municipais.

Legislação

Regime Jurídico das Edificações Urbanas - Decreto-Lei n.º 555/99 de 16/12
Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação da respectiva CM

Auto de Vistoria - Exigências

Vou aqui replicar uma queixa apresentada por um condómino ao Provedor Municipal, relativamente ao cumprimento das exigência legais atinentes aos Autos de Vistoria.

RECOMENDAÇÃO
 
Objecto da queixa: O cidadão apresentou queixa escrita ao Provedor Municipal alegando, no essencial, que fez várias diligências junto da Câmara Municipal e dos Tribunais, para resolver o problema da infiltração de águas na sua residência, mas ainda não conseguiu solução para o mesmo.
 
A queixa foi admitida, tendo sido solicitado ao Gabinete do PER o processo referente ao “auto de vistoria” a que o queixoso aludiu naquela mesma peça.
 
Pode dar-se como assente o seguinte: O queixoso solicitou a intervenção da Câmara Municipal no sentido de ser interpelado o proprietário da fracção autónoma situada sobre a que lhe pertencente, no sentido de proceder à reparação das deficiências existentes na construção, (varanda?) por forma a evitar as infiltrações que se verificam no tecto da sala da sua própria fracção. 
 
Nos termos do disposto no art.º 10º do R.G.E.U. foi ordenada uma vistoria, à qual se procedeu com elaboração do seguinte parecer: “Para corrigir as anomalias apontadas, torna-se necessário proceder a obras de reparação na varanda do 4º andar, por forma a evitar as infiltrações verificadas no tecto da sala do 3º andar.” 
 
O auto foi rectificado passando dele a constar 3º e 2º andar respectivamente. 
 
A providência cautelar não especificada intentada pelo aqui queixoso no Tribunal da Comarca de Cascais, onde pedia a intimação do condómino para proceder às obras apontadas no auto de vistoria da Câmara Municipal, foi indeferida, no essencial com a seguinte fundamentação: “...da respectiva causa de pedir não se alcança quais os estragos que uma divisão da sua residência apresenta, nem qual seja essa divisão, quando é que foram causados os invocados estragos ou quais as obras que pretende o requerido seja compelido a efectuar.”
 
O queixoso percorreu duas vias para tentar alcançar o seu desiderato, que é, como vimos, a reparação de uma deficiência, ao que parece na varanda do andar superior ao que lhe pertence e que aponta como causa de uma infiltração de águas no tecto da sua própria sala. 
 
Recorreu à Câmara e obteve a realização de uma vistoria nos termos do disposto no art.º 10º do R.G.E.U., então ainda em vigor, e ao Tribunal onde viu indeferida a sua pretensão para intimação do aludido proprietário para fazer as reparações tendentes a por termo às infiltrações de água. 
 
O indeferimento decidido pelo Tribunal não nos merece qualquer reparo. A causa de pedir (facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido) assenta no auto de vistoria e este, como vamos ver, não é idóneo a estribar o pedido formulado. 
 
Vamos explicar a razão desta concordância com a decisão judicial de indeferimento. 
 
Como é sabido a prova pericial faz-se mediante arbitramento, que pode consistir em exame, vistoria ou avaliação. A vistoria, modalidade que aqui nos interessa, tem por fim a averiguação, feita por peritos, de factos que tenham deixado vestígios ou sejam susceptíveis de inspecção ou exame ocular e recai sobre imóveis. 
 
Isto significa que a vistoria se traduz na percepção, por meio de pessoas idóneas, de factos presentes ou na determinação das ilações que deles se possam tirar acerca de outros, (factos) caso dependa de conhecimentos científicos ou técnicos especiais, isto é, de regras da experiência que não fazem parte da cultura geral ou da experiência comum. 
 
Aquilo que os peritos dotados de conhecimentos especiais devem, por isso, descrever são factos directamente percepcionados ou determinados por ilações retiradas dessa observação. Isto mesmo se retira do art.º 10º do R.G.E.U., entretanto revogado, e do art.º 90º (nº 4) do D.L. n.º 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo D.L. n.º 177/01 de 4 de Junho que o substituiu. O auto de vistoria deve conter a identificação do imóvel, a descrição do estado do mesmo e as obras preconizadas.
 
O auto de vistoria, elaborado na sequência do pedido de intervenção da Câmara por parte do agora queixoso, apenas alude a “anomalias apontadas” e “a obras de reparação na varanda por forma a evitar as infiltrações verificadas no tecto da sala do 3º andar.” 
 
Não cumpre, manifestamente, as exigências legais porquanto não só não descreve o estado do imóvel, (factos concretos percepcionados...,v. g., rachas, manchas, humidade visível, tinta e/ou estuque soltos etc...ou determinados por ilações...,v. g., aqueles factos são consequência directa e necessária de infiltração de água proveniente de...) como também as obras preconizadas (factos, v.g., é necessário remover ... e depois aplicar ... etc...) 
 
Não fazendo o auto tal descrição e limitando-se a petição introduzida em juízo, no essencial, a remeter para o mesmo, facilmente se conclui que a causa de pedir estava deficientemente formulada. A providência cautelar “não tinha pés para andar”, por deficiência é certo do auto de vistoria, mas sobretudo do requerente que não supriu, como devia, tal deficiência. 
 
Explicada esta vertente da questão, importa agora analisar a intervenção dos serviços da Câmara, essa sim “sindicável” nesta sede. A vistoria retratada no auto é deficiente e, como tal, deverá ser corrigida nos termos indicados. Uma coisa é certa, o munícipe não pode ser penalizado por tal facto e tem direito a ver analisado o pedido de intervenção formulado. 
 
Em nova vistoria deverá verificar-se o estado do imóvel, apurarem-se as obras consideradas necessárias a solucionar o problema, disto se lavrando novo auto corrigido em conformidade, seguindo-se os demais termos hoje previstos nos art.ºs 89º a 91º do citado D.L. n.º 555/99 com as alterações introduzidas pelo D.L. n.º177/01. 
 
A confirmarem-se as queixas do munícipe não restarão dúvidas quanto a estar-se perante um caso de obras urgentes de conservação necessárias à correcção de más condições de salubridade e eventualmente de segurança... 
 
Transparece da queixa a ideia de que o condómino proprietário da fracção situada por cima da pertencente ao queixoso não colabora na resolução do problema. Não descortinamos qual a razão desta falta de colaboração. Todavia, caso o referido proprietário, regularmente notificado, não cumpra o que lhe for determinado na sequência da nova vistoria, deverão os serviços dar início ao procedimento coercivo a que hoje alude o art.º 91 do citado Dec. Lei. 
 
Finalmente, importa enfatizar que a descrição do estado do imóvel e a indicação precisa das obras preconizadas é indispensável, desde logo para que possa aferir-se do cumprimento integral ou defeituoso determinado e o valor estimado para essas mesmas obras em vista da eventualidade da sua realização coerciva. 
 
Formula-se, assim, a seguinte recomendação dirigida aos departamentos competentes para ordenar vistorias a imóveis: A vistoria traduz-se na percepção, por meio de pessoas idóneas, de factos presentes ou na determinação das ilações que deles se possam tirar acerca de outros, (factos) caso dependa de conhecimentos científicos ou técnicos especiais, isto é, de regras da experiência que não fazem parte da cultura geral ou da experiência comum. 
 
A vistoria em causa não cumpre, manifestamente, as exigências legais, porquanto o respectivo auto não só não descreve o estado do imóvel, (factos concretos percepcionados..., v. g., rachas, manchas, humidade visível, tinta e/ou estuque soltos etc...ou determinados por ilações...,v. g., aqueles factos são consequência directa e necessária de infiltração de água proveniente de...) como também as obras preconizadas (factos, v.g., é necessário remover ... e depois aplicar ... etc...)
 
A vistoria retratada no auto é deficiente e, como tal, deverá ser corrigida nos termos indicados. 
 
Em nova vistoria deverá verificar-se o estado do imóvel, apurarem-se as obras consideradas necessárias a solucionar o problema, disto se lavrando novo auto corrigido em conformidade, seguindo-se os demais termos previstos na lei. 
 
Cascais 07/07/03 
O Provedor Municipal 
Alberto M. G. Mendes

3/22/2022

Alterar a porta da fracção autónoma

Se um condómino pretender alterar a porta de entrada da sua fracção autónoma, deverá primeiramente aferir se no condomínio existe um regulamento inserido no título constitutivo da propriedade horizontal (cfr. artº 1418º, nº 2 al. b)), e havendo-o, verificar o que preceitua o mesmo a esse respeito. Se o título (ou este regulamente nele inserido) se tiver omisso, nada obsta a que o condómino concretize o seu desiderato, mesmo que, eventualmente, o (outro) regulamento do condomínio (cfr. artº 1429º-A) disciplinar a esse respeito.

Vejamos o que diz a lei na redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10:

ARTIGO 1422.º (Limitações ao exercício dos direitos) 
 
1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
2. É especialmente vedado aos condóminos:
a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;

b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;
c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada;
d) Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou, posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.
3. As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.
4. Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

Atente-se que a letra da lei não proíbe, apenas veda que as obras se tenham susceptíveis de prejudicar a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício. Por outro lado, o conceito de prejuízo é muito subjectivo, mas para que seja efectivamente atendido, teria que se verificar uma alteração muito evidente, nomeadamente, alterando o estilo cromático. De salientar que, perante a necessidade de se proceder à substituição de um determinado elemento, instalado muitos anos antes, muito dificilmente se conseguirá outro rigorosamente igual, logo, dever-se-à procurar um o mais idêntico parecido. Não ser rigorosamente igual não significa uma alteração que colida com a lei.

Decorrentemente, de acordo com este preceito legal, aos condóminos mostra-se vedada a possibilidade de realizar obras que causem prejuízo ou modifiquem à linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício. Tem-se entendido que a linha arquitectónica se reporta ao “conjunto dos elementos estruturais de construção que, integrados em unidade sistemática, lhe conferem a sua individualidade própria e específica” e o arranjo estético do edifício “ao conjunto de características visuais que conferem unidade sistemática ao conjunto” (entre outros, os Acórdãos do STJ. de 20/7/82, B.M.J. 319º, pág. 301; e de 17/2/2011, Proc. n.º 881/09.2TVLSB.L1.S1, citando Aragão Seia, “Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 105).

Atente ainda neste súmula da decisão do Ac. da Rel. de Lisboa de 23.03.2012:
Ora, como escreve P. Lima e A. Varela, ob. citada, pág. 425, “quanto às limitações relativas à estética do edifício, é evidente que apenas se aplicam aos elementos da fracção autónoma visíveis do exterior (porta ou portas de acesso, janelas, persianas, varandas, etc.). Um condómino, por exemplo, não pode vedar a sua varanda, transformando-a num compartimento fechado, ou substituir as janelas por outras que não se harmonizem com as demais fracções”.

2/17/2022

Interpretação do nº 3 art. 1424º CC

Art. 1424º
(Encargos de conservação e fruição)

1 – Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das fracções no momento das respectivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas fracções.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação.
3 – As despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
 
Escreve Aragão Seia, in " Propriedade Horizontal", 2ª ed., 202, pág 129: " se no último piso houver um terraço de uso comum ou na cave existirem arrumos de todos os condóminos, ao lado de fracções utilizadas individualmente, todos os condóminos terão que suportar os encargos com as escadas que lhe dão acesso, embora as utilizem esporadicamente". E acrescenta: "não se pode considerar isento de responsabilidade pelos encargos de conservação e fruição das partes comuns do prédio, qualquer condómino cuja fracção esteja objectivamente em condições de ser servida por essas partes, só porque delas se não quer servir".
 
E claro é que a assembleia de condóminos sempre poderá deliberar a adopção de um critério equitativo/proporcional em função da regularidade ou da intensidade da utilização das partes comuns, como por exemplo dos diversos lanços das escadas comuns de acesso aos andares superiores (cfr. nº 2 art. 1424º do CC). Porém, neste caso concreto, o autor refere-se aos condóminos das fracções habitacionais. E se no prédio houverem fracções comerciais ou outras, sem acesso ao interior? 
 
Neste caso, torna-se patente que as escadas comuns servem exclusivamente algum ou alguns condóminos, não se prestando a poderem servir (também) as demais fracções autónomas do prédio (com saída directa para a via pública), pelo que não se encontram objectivamente em condições de afectação ao uso comunitário de todos os condóminos.
 
O nº 1 do art. 1424º, salvo disposição em contrário (leia-se, incluída no Título Constitutivo da Propriedade Horizontal), contém um princípio geral que se traduz na obrigação de todos os condóminos terem de suportar, na proporção do valor das respectivas fracções autónomas, as despesas necessárias à conservação, serviços de interesse comum e as de fruição das partes comuns do edifício (o nº 2 contém uma segunda excepção sobre a forma como ficam a cargo dos condóminos, a qual, para o caso vertente, não nos aproveita).

O nº 3 do art. 1424º contém uma terceira excepção, esta ao referido princípio ao estabelecer que as despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem, i.e., dos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns (como sucede por exemplo com um terraço que serve de cobertura a apenas uma parte do prédio).

Há, porém, que distinguir, dentro dessas despesas, as chamadas (i) despesas de conservação/manutenção das (ii) despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção de espaços exteriores a essas partes comuns que não são utilizados por aqueles condóminos:

- as primeiras (i) ficam a cargo dos condóminos que usam e fruem dos lanços de escadas por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles que deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais desses lanços;

- já as segundas (ii) ficam necessariamente a cargo de todos os condóminos por as reparações a realizar constituírem um benefício comum de todos eles (por exemplo, para se poder aceder ao telhado, parte imperativamente comum e ao serviço de todo o condomínio, necessário é utilizar os lanços de escadas).

Neste mesmo sentido pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 9/6/2016, com jurisprudência nacional fixada (Ac. do STJ de 1/6/2010, proc. nº 95/2000). Da decisão recorrida, defendia-se que o o nº 3 do art. 1424º do CC compreendia na sua previsão quer as despesas de manutenção quer as despesas de fruição de um terraço de cobertura, que é de uso exclusivo de um condómino, imputando tais encargos com partes comuns à responsabilidade dos condóminos que as usam exclusivamente, com exclusão dos demais condóminos.

O art.1424º nº 1 do CC contém um princípio geral que se traduz na obrigação dos condóminos suportarem, na proporção do valor da sua fracção, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício.

As obrigações referidas neste artigo quanto às despesas de conservação e fruição das partes comuns do edifício, constituem um exemplo típico de obrigações “propter rem”, isto é, de obrigações impostas, em atenção a certa coisa, a quem for titular desta. Dada a conexão funcional existente entre a obrigação e o direito real, a pessoa do obrigado é determinada através da titularidade da coisa: é obrigado quem for titular do direito real.

O nº 3 do art.1424º estabelece uma excepção ao princípio geral dizendo que: “As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem”.

Quando a lei fala em escadas ou partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos quer referir-se, ao mencionar estes, às respectivas fracções autónomas, atribuindo a responsabilidade das despesas aos titulares das fracções a que dão serventia exclusiva aqueles lanços de escada ou partes comuns.

Mais diz aquele, que o legislador ao considerar os terraços como coisas comuns teve em vista a integração dos mesmos na estrutura do prédio e afectos à função de cobertura como de telhado se tratasse, seja de parte seja da totalidade do edifício. Fundamentalmente interessa a função de protecção do edifício contra os elementos atmosféricos. O mesmo princípio é válido para o vão de escadas que também integra a estrutura do prédio, com a função de acesso vertical, seja de parte ou da totalidade do edifício, e mesmo que destinado ao uso exclusivo de alguns dos condóminos, não deixando por isso de ser forçosamente comum pela função capital de acesso ao interior e/ou telhado do imóvel que no interesse colectivo exerce em relação a toda a construção.

Dúvidas não subsistem que as ditas despesas de manutenção são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço (e por extensão interpretativa, dos lanços de escadas) por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles quem deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais do mesmo terraço (leia-se também, lanços de escadas).

Argumenta-se ainda no competente Acórdão que "Ora as deficiências estruturais da obra e a manutenção de materiais situados em espaços não utilizados pelos condóminos do primeiro piso não podem implicar despesas que onerem apenas alguns condóminos já que as reparações a realizar serão benefício comum de todos os condóminos.

Assim, sendo as obras, a reparar no terraço, resultantes, não do uso normal das mesmas pelos condóminos que dele se servem em exclusividade, mas de deficiência na construção ou de não manutenção de materiais exteriores ao dito terraço, todos os condóminos devem participar no custo das reparações, na proporção do valor das suas fracções."
 
Algumas situações concretas:
 
I) Em um edifício com arrumos no sótão, todos os condóminos, sem excepção, contribuem para as despesas de conservação/manutenção e de reparação resultantes, não do uso normal dos lanços de escadas comuns do edifício pelos condóminos que deles se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção desses espaços ou partes comuns;
 
II)  Em um edifício sem arrumos no sótão, apenas os condóminos que fruem dos respectivos lanços, contribuem para as despesas de conservação/manutenção, mas nas despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção desses espaços ou partes comuns, são da responsabilidade de todos, mesmo quando não são utilizados por aqueles condóminos;
 
III)  Em um edifício com fracções que tenham saída directa para a via pública (i.e., fracções comerciais e análogas), apenas os condóminos que fruem dos respectivos lanços, contribuem para as despesas de conservação/manutenção, mas nas despesas de reparação resultantes, não do uso normal das partes comuns do edifício pelos condóminos que delas se servem, mas de deficiência na construção ou de falta de manutenção desses espaços ou partes comuns, são da responsabilidade de todos, mesmo quando não são utilizados por aqueles condóminos;
 
Nestas exemplificações, a título meramente ilustrativo, consideram-se despesas de conservação/manutenção a pintura das paredes ou o arranjo de azulejos caídos das paredes ou tijoleiras partidas dos pavimentos; já as despesas de reparação cingem-se por exemplo, ao surgimento de fissuras quer nas paredes ou lanços de escadas...

2/16/2022

Obras sem contrato

De acordo com a noção que nos é dada pelo art. 1207º do CC: "Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço", sendo que este (o contrato de empreitada de obras particulares) pode (mas não deve) ser apenas verbal. Assim, quando, por exemplo, o administrador do condomínio contrata um profissional para efectuar obras de conservação, manutenção ou inovações, ou quando um condómino contrata um profissional para remodelar ou pintar a casa, está este a celebrar com ele um contrato de empreitada, tal como quando vai a uma oficina para reparar o seu automóvel ou contrata com uma engomadoria para passar a sua roupa a ferro.

Importa contudo observar que, independentemente da forma do contrato, age com culpa, por violação de disposições legais que se destinam a tutelar interesses públicos (que protegem também certos interesses particulares), o empreiteiro que executa uma obra sem projecto e sem licença, e sem observância das melhores normas da arte de construir, e sem os requisitos necessários para lhe garantir as necessárias condições de segurança e solidez.

Acresce também sublinhar que, não afasta a culpa do empreiteiro a circunstância de este argumentar que se limitou a executar a obra de acordo com a vontade do dono da obra (condómino ou condomínio). De lembrar que, em termos jurídicos o consumidor que celebra um contrato de empreitada é denominado dono da obra e o profissional que executa essa mesma obra é o empreiteiro.

Após escolher o profissional, o condómino (se se tratar de obras no interior da sua fracção autónoma) ou o administrador (se se tratar de obras nas partes comuns), deve pedir ao profissional para que, no orçamento, o modo de execução da obra seja o mais discriminado possível, designadamente quanto aos materiais utilizados, prazo da execução da obra ,o preço da prestação do serviço e as condições de pagamento.

E de modo a ficarem mais salvaguardados quanto a possíveis incumprimentos, o condómino/administrador não deverá aceitar pagar todo o serviço em adiantado. Atente-se que nos termos do nº 2 do art. 1211º do CC, o preço deve ser pago no acto da aceitação da obra, pese embora seja usual o empreiteiro solicitar que seja adiantado parte do pagamento para compra de materiais.

No entanto, não basta confiar o trabalho a um qualquer profissional só porque conhecem-se terceiros que já contrataram com aquele a realização de trabalhos semelhantes, se bem que as referências são importantes. O mais avisado é pedir informações de outros trabalhos já realizados pelo empreiteiro e telefones de contacto para poderem falar com esses clientes é um modo de se evitar em dissabores futuros.

Por outro lado, o conhecimento da sede física do profissional é de particular importância, caso seja necessário responsabilizar o empreiteiro por qualquer incumprimento do contrato ou pelo seu cumprimento defeituoso, porquanto, o meio de contactar com o profissional deverá ser por via de carta registada com aviso de recepção enviada para a morada do escritório do empreiteiro.

Não menos importante é optar-se por profissionais idóneos e não por "biscateiros". Assim, quando as obras a executar têm um valor considerável, pode-se e deve-se optar por um empreiteiro detentos de Alvará. Saber se o empreiteiro tem alvará activo (o alvará é válido por um período máximo de 12 meses) significa que têm pelo menos os impostos do ano anterior regularizados, o que dá mais garantias de que a sua actividade profissional está devidamente legalizada. A situação do alvará do empreiteiro está acessível em:
http://www.inci.pt/Portugues/Construcao/consultaemp/Paginas/Alvara.aspx

Ora, não havendo contrato escrito e enfermando a obra de vícios, é extra-contratual, a definir nos parâmetros do art. 483º do CC, a responsabilidade de empreiteiros pelos defeitos e/ou danos sofridospelo condómino/condomínio.

Caso a obra apresente defeitos cabe ao condómino/administrador o dever de os denunciar, dentro dos trinta dias seguintes ao seu conhecimento (nos termos do nº 1 do art.1220º do CC), por carta registada c/aviso de recepção. Se os defeitos puderem ser suprimidos o consumidor tem direito de exigir a sua eliminação. Se não puderem ser eliminados, o consdómino/administrador pode exigir a reparação. Não sendo nem eliminados ou feita nova instalação, pode -se exigir a redução do preço ou a resolução (rescisão) do contrato, caso os defeitos impossibilitem o funcionamento do bem em causa.

De salientar que, desde a entrada em vigor do DL 84/2008, de 21/5, que os bens fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada passam a estar sujeitos ao regime das garantias da venda de bens de consumo, significando que, se os bens, fornecidos pelo empreiteiro, apresentarem defeitos conferem ao consumidor o direito de exigir que a conformidade seja reposta, sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, redução adequada do preço, ou resolução do contrato.

Caso se manifestem defeitos nos materiais ou utensílios utilizados para a execução da obra, o condómino/administrador tem 2 ou 5 anos, a contar do seu fornecimento, para exercer o direito de reclamação, consoante se trate respectivamente de bens móveis ou imóveis, designadamente por estarem integrados em bens imóveis. Havendo substituição dos materiais/utensílios pelo empreiteiro, os novos materiais/utensílios que substituíram os primeiros gozam também de um prazo de garantia de 2 ou 5 anos, consoante se trate respectivamente de coisa móvel ou imóvel.

Assim, desde a entrada em vigor do DL 84/2008, um condómino que contrate um profissional para pintar a sua fracção ou um administrador para pintar o prédio, a tinta que o empreiteiro usa para pintar a fracção/prédio confere ao condómino/administrador 5 anos de garantia sobre este material, desde que fornecido pelo empreiteiro, sublinhe-se.

Portanto, ressalva-se que, para exercer os seus direitos, o consumidor deve denunciar a falta de conformidade dos bens de consumo fornecidos pelo empreiteiro num prazo de 2 meses, caso se trate de bem móvel, ou de 1 ano, se se tratar de bem imóvel, a contar da data que tenha detectado esse defeito.

Finalmente, importa referir que o não cumprimento do prazo estipulado no contrato, ou se não o houver, no orçamento, não determina automaticamente o incumprimento do contrato (seja ele escrito ou verbal) por culpa do empreiteiro.

Neste cenário, o condómino/administrador deverá previamente interpelar o empreiteiro, notificando-o para que cumpra o contrato em atraso, devendo esta competente notificação ser feita por carta registada c/aviso de recepção para o seu domicílio profissional, e na qual, dever-se-à estabelecer um novo prazo (tido por razoável) para que o empreiteiro cumpra com o acordado, sendo que só a partir do não cumprimento deste último prazo será possível responsabilizar o empreiteiro e por termo ao contrato de empreitada, exigindo-se-lhe subsequentemente tudo quanto se houver pago injustificadamente.

Não cumprindo voluntariamente, ou não havendo acordo nas verbas (o que normalmente ocorre nestes casos), o diferendo terá que ser resolvido através de um Julgado de Paz (se o montante da causa não ultrapassar o limite fixado pela competência dis mesmos - 15 000€) ou em tribunal.

Nota: Quando não haja Julgado de Paz no concelho que seria territorialmente competente, os interessados podem utilizar qualquer Julgado de Paz, embora só para mediação, e se as partes não a recusarem

1/27/2022

Junção de fracções autónomas

No que concerne à questão da junção de fracções autónomas, de acordo com o art. 1422º-A, nº 1 do CC "Não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas", sendo que o nº 2 determina que "Para efeitos do disposto do número anterior, a contiguidade das fracções é dispensada quando se trata de fracções correspondentes a arrecadações e garagens".

No caso em apreço, dimana do mesmo preceito que cabe ao condómino que juntou as fracções autónomas o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública ou documento particular autenticado, introduzir a correspondente alteração do título constitutivo (nº 4), sendo que o acto deve ser comunicado ao administrador no prazo de 30 dias (nº 5).

No entanto, e no domínio substantivo as normas que regulam a propriedade horizontal, importa desde logo ressalvar o princípio geral contido nos art. 1422º e 1422º- A, ambos do CC, que proíbem a junção ou anexação de fracções autónomas de edifícios diferentes e vedam, através da construção de obras novas, qualquer possibilidade de prejudicar a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, assim como a prática de quaisquer actos que tenham sido proibidos por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.

No âmbito do direito de mera propriedade o princípio consagrado na lei é o de que qualquer proprietário pode exigir judicialmente contra qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade com as consequências daí resultantes. A natureza absoluta deste direito permite que o proprietário goze, de modo pleno e exclusivo, dos direitos de uso, fruição e disposição do bem em causa, nos termos que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas (cfr. art. 1305º do CC).

Tudo isto para dizer que, não pode qualquer proprietário ser privado, lesado ou cerceado nos seus direitos, fora dos casos expressamente previstos na lei, e independentemente da qualidade atribuída ao lesante: quer este seja possuidor, quer mero detentor ou um qualquer proprietário.

Face ao que antecede, e ao que decorre quer da lei, enquanto mero direito de propriedade, quer do estatuto da propriedade horizontal, enquanto comproprietário, a conclusão que se impõe é a de que os condóminos podem proceder à junção de duas ou mais fracções autónomas, sem carecer de qualquer autorização do condomínio, contanto sejam contíguas (excepto se se tratar de arrecadações e/ou garagens), sem que tais obras importem numa violação do preceituado no art. 1422º do CC (isto é, a remoção de paredes - contanto não susceptíveis de colocar em causa a segurança do edifício -, não modificam a linha arquitectónica).

Divisão de fracções autónomas

No que se refere à questão da divisão de uma fracção autónoma, dimana do art. 1422º A, nº 3 do CC que “Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.”

No caso vertente, cabe ao condómino que cindiu a fracção autónoma o poder de, por acto unilateral constante de escritura pública ou documento particular autenticado, introduzir a correspondente alteração no Título Constitutivo da Propriedade Horizontal (nº 4), devendo o acto ser comunicado - formalmente, sublinhe-se -, ao administrador no prazo de 30 dias (nº 5).

No mais, e face ao disposto no art. 1419º, nº 1 do CC – e não se verificando nenhuma das excepções previstas no art. 1422º-A do mesmo diploma -, a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal apenas é possível quando ocorra acordo expresso de todos os condóminos, devidamente formalizado em escritura pública ou documento particular autenticado e nunca através de decisão judicial. Daqui se conclui portanto que, exceptuando as ressalvas contidas no art. 1422º-A, a modificação do TCPH apenas pode ser efectuada em conformidade com o preceituado no art. 1419º, nº 1 do CC e não por decisão judicial.

Importa contudo salientar que, se autorizada pelo Título Constitutivo ou no silêncio deste, obtida a autorização em reunião plenária sem oposição, o condómino não carece do acordo de todos os condóminos (entenda-se, deliberação tomada por unanimidade) para poder proceder à modificação do documento constitutivo. Aliás, não faria qualquer sentido, o condómino obter a aprovação sem qualquer oposição e posteriormente surgisse algum condómino a opor-se à alteração do título.

Cumpre agora perguntar, as obras de divisão de uma fracção autónoma, podem também inserir-se no capítulo das inovações?

A este respeito, o Tribunal da Relação de Lisboa refere no seu acórdão de 15/12/2011 que:

“I – Em matéria de “obras novas” realizadas pelos condóminos o legislador optou por não definir o que são obras “inovadoras” nem consagrar na lei o que deve entender-se por inovação. 

II – Deixando, e bem, esse papel para a jurisprudência, que deverá, caso a caso, enquadrar no referido conceito as obras que os condóminos realizarem e que, em face do caso concreto e das circunstâncias fácticas apuradas, possam ser consideradas como tal. 

III – Se atentarmos no próprio significado etimológico da expressão, concluímos que “inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Portanto, obras inovadoras serão aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. 

IV – Inovadoras serão também aquelas obras que alteram a edificação no seu estado original, modificando o seu estado primitivo. Com alterações que tanto podem ser de substância, como de forma, em modificações relativas ao seu destino ou afectação da fracção do imóvel ou das partes comuns do edifício.”

1/26/2022

Diferença entre art. 1422º e 1425º CC

A aprovação da alteração da linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício ou das inovações, numa apreciação mais desavisada, parece apenas necessitar de uma aprovação por uma maioria representativa de 2/3 do capital do prédio, ainda que possam existir votos contra, de acordo com o disposto no art. 1422º nº 3 e no art. 1425º nº 1, ambos do Código Civil e que se passam a transcrever.

Artigo 1422º nº 3 do Código Civil

“As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.”

Artigo 1425º nº 1 do Código Civil

“Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.” 

De facto, em ambos se preceitua que a maioria qualificada exigida é a de 2/3 do capital investido (não do número de votos dos condóminos presentes e/ou representados em plenário), no entanto, importa atentar num singelo pormenor:


Artigo 1422º nº 3 do Código Civil

“maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.”

Artigo 1425º nº 1 do Código Civil

“maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.”

Portanto, no art. 1422º apenas é exigida uma maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio, enquanto que no art. 1425º, é exigida uma dupla maioria, a maioria dos condóminos (metade + 1), devendo essa maioria representar 2/3 do valor total do prédio.

Concretizando com um singelo exemplo de um edifício com 8 fracções: no primeiro caso, exige-se um vencimento com 67 ou 667 votos (consoante se delibere em percentagem ou permilagem), mesmo que sufragados pela minoria de condóminos (por exemplo 3, votando os outros 5 contra). No segundo, também é exigido um vencimento com os referidos 67 ou 667 votos, mas neste sufragados necessariamente pela maioria dos condóminos, que no caso, serão 5 (metade + 1).

De salientar que ambas estas maiorias qualificadas são exigidas tanto em primeira, como em segunda convocação da assembleia de condóminos.

6/23/2021

Usos do Fundo Comum Reserva

O FCR tem-se estatuído no art. 4 do DL 268/94 de 25/10, sendo portanto de constituição obrigatória, cujo seu valor é resultado das comparticipações de todos os condóminos, para ajudar a pagar as obras de conservação que sejam necessárias efectuar no futuro. Importa pois sublinhar que este aforro visa exclusivamente a realização de obras de conservação extraordinária nas partes comuns do edifício, competindo à assembleia de condóminos fixar, anualmente, o valor percentual da comparticipação, que nunca será inferior a 10% da quota-parte de cada condómino nas despesas correntes do condomínio. 
 
Acresce ressalvar que este fundo de reserva deve ser encaminhado para uma conta bancária autónoma. De salientar que as gestões das contas do condomínio devem ter-se necessariamente feitas com o consentimento do administrador e de um condómino nomeado pela assembleia para aquele efeito. 

Impondo o art. 4 nº 1 do DL 268/94 que o FCR apenas serve para custear as despesas de conservação do edifício, há que apurar a natureza das obras e por força do art. 2º, al. f) do DL 555/99 de 16/12 (RJUE) as obras de conservação são definidas como os obras destinadas a manter uma edificação nas condições existentes à data da sua construção, reconstrução ampliação ou alteração, designadamente obras de restauro, reparação ou limpeza.
 
Como se vê o legislador utiliza no RJUE certos conceitos (obras de edificação de alteração ou conservação) que não coincidem com os conceitos utilizados no CC como noutra legislação avulsa (obras de conservação ordinária, extraordinária e beneficiação, inovações). Por exemplo, na PH, que nos ocupa, o legislador distingue as obras destinadas à conservação e fruição das partes comuns (cfr. art.º 1424º) das obras que constituam inovações que o legislador não define mas que exemplifica no nº 2 do art.º 1425º em relação a certos edifícios com pelo menos 8 fracções (ascensores, instalação de gás canalizado, colocação de rampas de acesso para mobilidade condicionada, colocação de plataformas elevatórias quando não exista ascensor com porta de cabine com dimensões regulamentares para pessoa em cadeira de rodas). 
 
Mas é sabido que as inovações não são apenas essas e que não existe uma coincidência entre os conceitos de inovações e obras de alteração tal como o legislador utiliza o conceito no RJUE e legislação adrede. As inovações materiais são transformações ou acrescentamentos à identidade estrutural do prédio mais ou menos importantes que se destinam a conservá-lo, a melhorá-lo, ou a dar-lhe aptidão para proporcionar ao utente certo uso recreativo, no caso do arrendamento não são uma forma de uso mas uma obra ou implantação destinada a manter ou elevar a qualidade ou a proporcionar algum recreio ao uso do arrendatário.
 
No CC, vista a obra sob o ponto de vista da despesa, encontramos o conceito de benfeitorias no art. 216º, nº 1, que são as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa, distribuindo-as pelas necessárias, úteis e voluptuárias, umas são modificações na essência intrínseca da coisa porque se unem ou incorporam sem identidade própria na substância do prédio e outras são extrínsecas porque muito emboras unidas e incorporadas na estrutura do prédio não chegam a fundir-se na sua essência permanecendo com autónima identidade, e quanto a estas salvo estipulação em contrário no termo do contrato para efeitos de indemnização pelo senhorio é equiparado nos termos do art. 1046º do CC ao possuidor de má-fé com remessa para os art. 1273º a 1275º do CC, dizendo-se necessárias as indispensáveis à conservação da coisa e úteis as que não sendo indispensáveis a sua conservação lhe aumentam todavia o valor e o arrendatário como possuidor de má-fé tem direito a ser indemnizado das benfeitorias necessárias que tenha realizado na coisa (1ª parte do art. 1273º, nº 1 do CC) e quanto às úteis tem direito a levantá-las se o poder fazer sem detrimento da coisa ou não o podendo a ser indemnizado segundo as regras do enriquecimento sem causa (2ª parte do art. 1273º, nº 1 do CC) ou seja o senhorio deverá prestar-lhe tudo quanto tenha obtido à custa do empobrecimento ou se a restituição não for possível o valor correspondente (cfr. art. 479º nº 1 do CC). 
 
O art. 29º da Lei 6/2006, para os contratos anteriores ao RAU ou ao DL 257/95, trouxe uma inovação porque segundo este preceito o arrendatário aquando da cessação do contrato e salvo estipulação em contrário passa a ter o direito a compensação pelas obras licitamente feitas nos termos aplicáveis às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé, contendo disposição idêntica o art. 1074º nº 5 do CC para os contratos posteriores. 
 
A disciplina descrita é meramente supletiva podendo ser afastada por convenção em contrário, como expressamente o declarou na primitiva formulação o art. 1046º nº 1, do CC, e ora se ressalva nos art. 29º, nº 1 da Lei 6/06 e 1074º nº 5, do CC, e esta cláusula sempre foi considerada legítima, legitimidade, ora reforçada, pelas ressalvas. Como o arrendamento é sempre remunerado pode, hoje em dia, estipular-se, legitimamente, no respectivo contrato, que corram por conta do arrendatário ou mesmo de terceiro, sem direito a compensação findo o contrato, as obras de conservação ordinária ou extraordinárias do prédio ou fracção, o que é valido para arrendamentos habitacionais ou não habitacionais.

Mas em causa o conceito de obras de conservação utilizado pelo legislador aquando da criação do Fundo de Reserva. Da panóplia de conceitos legais resulta que as obras de conservação ordinária e mesmo extraordinária têm na sua génese a ideia da necessidade de evitar ou impedir o agravamento da deterioração, destruição, perda da coisa, a indispensabilidade para a conservação do imóvel, ou seja, das características que o imóvel possuía aquando da sua construção ou reconstrução.
 
E, de novo o conceito de deterioração já acima suficientemente explanado que traz associadas as ideias de dano, decomposição, estrago. Mesmo que se entenda que as obras não possam qualificar de inovação, por não ter ocorrido uma alteração ou transformação estrutural no edifício, impõe-se concluir-se que se trata de obras de conservação sempre seria necessário que resultasse comprovada a existência de um qualquer dano, estrago, decomposição dos referidos materiais quer os de revestimento que incorporaram o chamado projecto de arquitectura quer os dos sistemas de rede eléctrica, iluminação e segurança. Contudo, como acima se disse há que provar a deterioração dos revestimentos e a deterioração destes últimos sistemas.
 
Deste entendimento, resulta a ideia de que os pavimentos, paredes, tectos, portas de entrada e evacuação existentes no hall de entrada comum do edifício, bem assim como os sistemas de rede eléctrica, iluminação e segurança aí existentes que já se encontrem deteriorados ou obsoletos (em face da idade do edifício), porque naturalmente danificados ou tecnologicamente desactualizados, resulta a conclusão de que tais obras não podem ser qualificadas de conservação, pelo que as despesas efectuadas inserem-se em melhoramentos do edifício, valorizando-o, por isso o seu custeamento não pode ser feito com o Fundo Comum de Reserva.
 
 

6/01/2021

Obras - regras

O art. 1305º do CC coloca ao lado dos poderes de que goza o proprietário (uso, fruição e disposição), as restrições ou limites impostas por lei, sendo que tais restrições podem ser de direito público, como a expropriação por utilidade pública, ou de direito privado, como as que derivam de relações de vizinhança, que têm em vista regular conflitos de interesses que surgem entre vizinhos.

No que concerne à realização de obras nas fracções autónomas, a sua feitura está desde logo sujeita aos condicionalismos impostos pelo regime da propriedade horizontal e cumulativamente pela salvaguarda das boas relações de vizinhança.

Destas sortes, sobre os condóminos que pretendam proceder à realização de quaisquer tipo de obras nas suas respectivas fracções autónomas, impendem duas obrigações:

- Devem respeitar o horário fixado pela lei, sendo que as obras apenas podem ser realizadas nos dias úteis entre as 8 e as 20 horas, para salvaguarda do direito ao descanso dos restantes condóminos (cfr. art. 16º , nº 1, DL 9/2007, de 17/01/2007, que aprova o Regulamento Geral do Ruído).

- Devem informar o administrador que, por sua vez, publicitará em local de passagem a informação aos restantes condóminos relativamente às obras que se irão realizar – nomeadamente, o período de tempo em que a mesma irá decorrer, mencionando em que período horário possa ocorrer maior intensidade de ruído (cfr. art. 16º , nº 2, DL 9/2007, de 17/01/2007, que aprova o Regulamento Geral do Ruído).

No entanto e não obstante estas regras, importa salientar que nos termos do art. 17º do mesmo diploma, não estão sujeitos às limitações previstas nos art. 14º (Actividades ruidosas temporárias), 15º (Licença especial de ruído) e 16º (Obras no interior de edifícios), os trabalhos ou obras em espaços públicos ou no interior de edifícios que devam ser executados com carácter de urgência para evitar ou reduzir o perigo de produção de danos para pessoas ou bens. 

Acresce também ressalvar que nos termos do art. 18º (Suspensão da actividade ruidosa) as actividades ruidosas temporárias e obras no interior de edifícios realizadas em violação do disposto nos art. 14º a 16º do referido regulamento são suspensas por ordem das autoridades policiais, oficiosamente ou a pedido do interessado, devendo ser lavrado auto da ocorrência a remeter ao presidente da câmara municipal para instauração do respectivo procedimento de contra-ordenação. 

A fiscalização do cumprimento das normas previstas no presente Regulamento Geral do Ruído compete:

(i) à Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território; 

(ii) à entidade responsável pelo licenciamento ou autorização da actividade; 

(iii) às comissões de coordenação e desenvolvimento regional;

(iv) às câmaras municipais e polícia municipal, no âmbito das respectivas atribuições e competências; 

(v) às autoridades policiais e polícia municipal relativamente a actividades ruidosas temporárias, no âmbito das respectivas atribuições e competências; e 

(vi) às autoridades policiais relativamente a veículos rodoviários a motor, sistemas sonoros de alarme e ruído de vizinhança (cfr. art. 26º do diploma).

Nos termos do art. 28º (Sanções) constitui contra-ordenação ambiental leve, a realização de obras no interior de edifícios em violação das condições estabelecidas pelo nº 1 do art. 16º e o não cumprimento da obrigação de afixação das informações nos termos do nº 2, e ressalvando-se no nº 3 deste preceito que a negligência e a tentativa são puníveis, sendo nesse caso reduzido para metade os limites mínimos e máximos das coimas referidos no presente Regulamento. 

Dispõe também o art. 30º (Processamento e aplicação de coimas), no seu nº 1 que "o processamento das contra-ordenações e a aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias é da competência da entidade autuante, sem prejuízo do disposto nos números seguintes", pelo que, no que nos aproveita, aplica-se precisamente o que estatui o número seguinte: "Compete à câmara municipal o processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas e sanções acessórias em matéria de actividades ruidosas temporárias e de ruído de vizinhança."

5/28/2021

Capoto vs Inovações


A alteração de uma fachada para capoto constitui uma inovação? Ou estas obras realizadas no edifício constituem apenas benfeitorias de cariz estético?

Das inovações

No conceito de inovação a que se refere o art. 1425º do CC cabem tanto as alterações introduzidas na substância ou forma da coisa, como também as modificações na afectação ou destino da coisa comum, sendo que para efeitos dessa disposição, obras inovadoras são apenas aquelas que trazem algo de novo, de criativo, em benefício das coisas comuns do prédio já existentes, ou que criam outras benéficas coisas comuns; ou pelo contrário, obras que levam ao desaparecimento de coisas comuns existentes, com ou sem prejuízo para os condóminos. 

Estabelece o artigo 1425º do CC:

"1- As obras que constituem inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.

2- Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns.

Importa, desde logo, dizer que as obras aqui previstas e que integram a qualificação de “inovações”, são aquelas que dizem respeito às partes comuns (cfr. o seu nº 2, conjugado com o nº 1, onde se exige a aprovação da maioria dos condóminos), maioria que não faria sentido se as obras fossem concretizadas no interior de cada habitação pelo próprio proprietário e em prol deste, e sem qualquer interferência nos direitos dos restantes condóminos.

Já se se tratar de obras nas fracções pertença exclusiva de um ou cada um dos condóminos rege o art. 1422º, nº 2, al. a) do CC. Nesta circunstância o legislador impõe, como é natural, apenas que se respeite a segurança e a linha arquitectónica do edifício, de modo a preservar as relações de boa vizinhança e o justo equilíbrio de vivência social entre diversas pessoas, e não prejudicar estas. Para além de se pretender preservar a segurança do imóvel e de quem lá habita e a parte estética do edifício.

Relativamente às partes comuns, o nº 2 do art. 1425º do CC prevê que não serão permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como comuns.

Das benfeitorias

No que diz respeito às benfeitorias, preceitua o art. 216º do CC:

 “1. Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa.
2. As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias.
3. São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante”.

Se as obras na fachada do edifício decorreram em virtude de infiltrações de água no interior das habitações do referido edifício, e estando já em causa questões de habitabilidade, as mesmas são consideradas benfeitorias necessárias, já que, visam evitar a deterioração da coisa/edifício. Nessa sequência, a alteração da fachada para capoto não pode assim ser considerada inovação, mas obra de impermeabilização necessária, por estar em causa a habitabilidade dos condóminos do prédio.

Entende-se, assim, que as deliberações em causa são tomadas por maioria dos votos representativos do capital investido (cfr. art. 1432º do CC), como é este o caso.

Acresce que o acabamento em capoto da fachada do edifício promove a eficiência energética e conclui que a eliminação de pedra (granito) e a substituição por capoto, desde que confira acabamento exterior idêntico não constitui uma alteração de fachada, nomeadamente para efeitos de pedido de licenciamento ou autorização administrativa. 

Das paredes

O termo paredes abrange as paredes das fachadas, das empenas, de separação entre habitações, de caixas de escada e interiores ou divisórias. As paredes mestras são assim designadas por, nos edifícios, suportarem as cargas permanentes e acidentais.
 
É de entender que as paredes exteriores, que delimitam o perímetro da construção,“embora não sendo mestras ou resistentes no verdadeiro sentido do termo, ao serem construídas tendo em vista não só as exigências de segurança, como também as de salubridade, especialmente no que respeita à protecção contra a humidade, as variações de temperatura e a propagação de ruídos e vibrações, podem ser consideradas como elementos estruturais das edificações e, portanto, paredes mestras“ (cfr. Aragão Seia , Propriedade Horizontal, 2.ª ed, pág. 72).

Também Sandra Passinhas (A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pág. 31) sustenta que “as paredes perimetrais ( paredes exteriores que delimitam o edifício), mesmo quando não tenham a função de paredes mestras, delimitam a superfície coberta, determinando a consistência volumétrica do edifício e delineando o perfil arquitectónico, pelo que são de considerar comuns a todos os condóminos e destinadas ao serviço exclusivo do próprio edifício“.

As inovações em partes comuns dirigem-se ao melhoramento ou ao uso mais cómodo ou ao melhor rendimento da coisa comum, isto é, essas alterações não se destinam a privilegiar o proprietário da fracção, mas sim a coisa comum (cfr. Ac. STJ de 4/10/95, Bol. 450-492).

Que conclusão?

Destarte, a questão que importa responder é a seguinte: 

Afinal o que são obras inovadoras?

Em que consistem tais obras?

Dúvidas não existem de que inovações se distinguem da simples reparação ou reconstituição das coisas. Etimologicamente “inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Obras inovadoras serão, portanto, aquelas que trazem algo de novo ao que já existe, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. São aquelas que alteram a edificação no seu estado original (No mesmo sentido cfr. Ac. TRP de 11/5/2015 e João Alves, in “Propriedade Horizontal”, Coimbra Editora, pág. 116.).

Inovadoras serão também aquelas obras que levam ao desaparecimento de coisas comuns existentes com prejuízo para os condóminos ou introduzam modificações na sua afectação ou destino, alterando o seu estado primitivo, alterações que tanto podem ser de substância, como de forma (especialmente o nº 1 do citado art. 1425º do CC), como modificações relativas ao seu destino ou afectação da fracção do imóvel (especialmente o nº 2 da mesma disposição).

No conceito de inovação, que corresponde ao pensamento do art. 1425º do CC tanto cabem as alterações introduzidas na substância ou forma da coisa, como as modificações estabelecidas na sua afectação ou destino ( cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2.º ed, pág. 434 e Aragão Seia, obra citada, pág. 139).

Resulta claramente do regime legal citado que o legislador optou por não definir o que são obras inovadoras nem consagrar na lei o que deve entender-se por inovação, deixando, portanto, esse papel para a jurisprudência que deverá, caso a caso, enquadrar no referido conceito as obras que os condóminos realizarem e que, em face do caso concreto e das circunstâncias fácticas apuradas, possam ser consideradas como tal.