Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.
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7/08/2021

Multa no montante anual máximo permitido por lei



É válida a deliberação da assembleia de condóminos no sentido de aplicar uma multa sempre que o atraso de liquidação da dívida para com o condomínio fosse superior a um determinado prazo, multa essa no montante anual máximo permitido por lei?

Em bom rigor, essa deliberação nada tem de inválida, estando de acordo com o preceituado no art. 1432º, nº 3 do CC, sendo que fixa as condições em que a multa é aplicável, porquanto, nos termo do art. 1434º, nº 1 do CC, a assembleia pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições do Código Civil, das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador, estabelecendo o nº 2 que o montante das penas aplicáveis em cada ano não pode exceder a quarta parte do rendimento colectável da fracção do infractor.
 
Importa salientar que o nº 2 do art. 1434° do CC, tem carácter imperativo e não supletivo, dado que ali se estipula que o montante das penas em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor, sendo que, o uso da expressão nunca, significa que esta meta tem carácter imperativo. 
 
Isto é, a lei fixa aqui um limite sancionatório para o condomínio, perante o atraso do condómino no pagamento da contribuição que lhe é devida, mas sempre sem deixar cair no seu puro arbítrio o montante dessa sanção. Esta será a melhor interpretação, numa perspectiva declarativa, que a norma comporta, por ser este aquele que melhor corresponde ao pensamento legislativo, para além de toda a sistematização e integração da norma em causa no diploma civilístico dedicado aos problemas do condomínio, sempre no uso dos ensinamentos a que se deve atender, bem como a todos os factores do art. 9º do CC. 

Assim, a aplicação de multas pelo atraso no pagamento das quotizações de condomínio, uma vez que se encontra prevista no Regulamento do Condomínio, a partir da data da respectiva aprovação em Assembleia, é vinculativa para todos os condóminos, mas desde que o Regulamento respeite a lei, no caso, o referido nº 2 do artigo 1434° do CC.

Para além disso, Pires de Lima e Antunes Varela, em CC Anotado, vol. III, pág. 450, em anotação a este normativo, explica que a própria limitação do montante da sanção pecuniária aplicável se insere numa linha geral de orientação do direito civil vigente - Artigos 812º, 494º, etc. -. Ora, tendo como certo que estamos na presença de uma norma imperativa e não supletiva, diremos então que, em primeiro lugar, o regulamento de qualquer condomínio tem de respeitar a lei e, por sua vez, as deliberações dos condóminos têm que respeitar, em primeiro lugar, a lei e, em segundo lugar, o regulamento. 

Esta, salvo havendo disposição em contrário, que aqui não há, é a ordem natural das situações, será a hierarquia que deve funcionar. Portanto, em nenhum regulamento e, claro, nem neste, pode ser imposta aos condóminos sanções pelo atraso no pagamento atempado da contribuição da sua quota de condomínio anualmente fixada, nem das despesas que, por força do regulamento, deliberação da assembleia de condóminos ou imposição legal que se venham a realizar ou sejam da sua responsabilidade, que desrespeitem e violem este normativo.

É que ninguém duvida que a aplicação de multas pelo atraso no pagamento das quotizações de condomínio, uma vez que se encontra prevista no Regulamento do Condomínio, a partir da data da respectiva aprovação em Assembleia, é vinculativa para todos os condóminos –, por todos, veja-se o Ac. R Porto, de 3/3/2008, em www.dgsi.pt -, mas sempre a ser entendida nos termos que acima expusemos.

5/15/2021

Acta executiva

 

Assembleia-Geral Extraordinária de Condóminos
 
Acta nº (...)

Da assembleia plenária

Aos (...) dias do mês de (...) de (...), pelas (...) horas e (...) minutos, reuniu em primeira convocatória, na (...) do edifício, a Assembleia-Geral de Condóminos com carácter Extraordinário, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, sito na direcção supra-mencionada.

A assembleia teve-se convocada pelo senhor Administrador, nos precisos termos preceituados no nº 1 do art. 1432º do CC, usando para o efeito ambas as modalidades prescritas (carta registada e aviso convocatório com confirmação da recepção assinada no competente livro de protocolo), tendo-se ambos os comprovativos, devidamente anexados à presente acta.

A competente convocação continha-se com o seguinte bosquejo:

Ponto único: Instauração de processo executivo aos condóminos proprietários da fracção correspondente ao (...), identificada com a letra (...), utilizada na descrição da fracção constante no registo predial.

Do termo de abertura

Exerceu as funções de Presidente da Mesa da Assembleia, adiante designada por MAG, o senhor (...) que verificou se estavam reunidos todos os condicionalismos intrínsecos à efectivação da reunião plenária, mediante a certificação do cumprimento das disposições legais aplicáveis, nomeadamente, na verificação da regularidade da convocação, da qualidade dos condóminos presentes e bem assim do quórum constitutivo.

A Assembleia-Geral Extraordinária dos Condóminos houve-se constituída, em primeira convocação, com a presença dos senhores condóminos que assinaram a competente lista de presenças, a qual será outrossim devidamente anexada à presente acta.

Havendo-se concluído que a mesma estava regularmente constituída e estava, por isso, em condições de validamente reunir e deliberar, o senhor Presidente da MAG, no uso da palavra, quis deixar um cumprimento de respeito e sentido de amizade aos senhores condóminos presentes, informando-os que esta poderia deliberar validamente, declarando consequentemente aberta a sessão plenária.

Do período antes da ordem de trabalhos

Seguidamente e no uso da palavra, o senhor Presidente da MAG, salientou que o senhor Administrador  havia manifestado o interesse no uso da palavra, e que começaria a sua intervenção, transmitindo aos senhores condóminos uma nota prévia que considerava relevante.

Neste sentido foi aquele de informar que, tendo sido interpelado na reunião anterior pelos então presentes, no sentido de avançar no imediato para a cobrança coerciva das dívidas havidas para com o condomínio, goradas que estavam todas as tentativas de acordo com as subsequentes promessas de pagamento, e pese embora o poder-dever de agir do Administrador, por força do preceituado na alínea e) do art. 1436º (funções do administrador) do CC, e art. 6º (dívidas por encargos de condomínio) do DL nº 268/94 de 25 de Outubro, entendeu aquele por adequado consultar a Assembleia dos Condóminos para obter a confirmação de tal expediente, justificando-se assim a feitura da presente.

Pronunciaram-se seguidamente os senhores condóminos que para o efeito solicitaram à MAG o uso da palavra, os quais para ratificar a pretensão anteriormente manifestada por alguns outros consortes, após o que, ninguém mais tendo manifestado o ensejo de usar da palavra, e esgotando-se desta forma o tema prévio relativo ao período antes da ordem de trabalhos, foi este encerrado.

Do período da ordem de trabalhos

O senhor Presidente da MAG procedeu subsequentemente à leitura do ponto único constante na respectiva ordem de trabalhos, sujeitando-o seguidamente à aprovação dos senhores condóminos. Obtida aquela, passou-se de imediato à apreciação da matéria constante na ordem do dia.

a) Sendo atribuída a palavra ao senhor Administrador, este foi de informar os condóminos presentes que, no seguimento das menções contidas nos competentes relatórios de contas, os proprietários da fracção autónoma correspondente ao (...) poente, para habitação, identificada com a letra (...), pertença do senhor (...), na proporção de 1/2 e, da senhora (...), na proporção de 1/2, não têm efectuado a pontual, regular e integral satisfação das comparticipações relativas à sua quota-parte das despesas de conservação e fruição aprovadas em proporção ao valor relativo da respectiva fracção, expresso em percentagem, do valor total do prédio;

b) Também salientou aquele que ambos estes condóminos se têm devedores das quota-parte das despesas de conservação e fruição referentes ao período entre (...) de (...) e (...) de (...), num montante global de € (...) (... euros e ... cêntimos).

c) Foi igualmente de ressalvar que os orçamentos das despesas a efectuar durante aqueles anos de (...) a (...), e que se tiveram aprovados em competentes reuniões plenárias convocadas expressamente para aquele efeito, na primeira quinzena de cada exercício administrativo, nos montantes globais de € (...) (... euros), € (...) (... euros), € (...) (... euros) e € (...) (... euros), respectivamente.

d) E mais informou aquele que a fracção autónoma correspondente ao (...) poente, identificada com a letra (...), possui fixado um valor relativo, expresso em percentagem de (...%) com relação ao valor total do prédio;

e) Nesta tessitura, foram de apreciar os considerandos indicados infra:

§1. Estão vencidas e não pagas as comparticipações dos meses de (...) a (...) de (...) no
montante de € (...) (... euros com ... cêntimos);

§2. Estão vencidas e não pagas as comparticipações dos meses de (...) a (...) de (...) no
montante de € (...) (... euros com ... cêntimos);

§3. Estão vencidas e não pagas as comparticipações dos meses de (...) a (...) de (...) no
montante de € (...) (... euros com ... cêntimos);

§4. Estão vencidas e não pagas as comparticipações dos meses de (...) a (...) de (...) no
montante de € (...) (... euros com ... cêntimos);
 
f) Entretanto os proprietários da fracção autónoma correspondente ao (...), compelidos pelas administrações em cada ano do correspondente exercício, efectuaram apenas quatro pagamentos isolados, no montante global de € (...) (... euros com ... cêntimos).

g) Avulta desde logo que, compulsados todos os valores supra-mencionados, constatou-se uma primitiva dívida de € (...) (... euros com ... cêntimos) à qual houve a abater os € (...) (... euros com ... cêntimos) entretanto pagos, pelo que, o capital final ainda em dívida, cifra-se nos € (...) (... euros com ... cêntimos).
 
h) Em face desta factualidade e do recorrente incumprimento quer do pagamento, quer dos acordos entretanto feitos, esta assembleia deliberou com o voto favorável de todos os condóminos presentes no sentido de se proceder à cobrança coerciva da dívida havida, nos termos preceituados no art. 6º do DL nº 268/94, à que acrescerão os juros de mora à taxa legal, pelo que serão peticionados a título de capital e juros, e bem assim, dos honorários e das despesas do agente de execução.

Do termo de encerramento

Concluída a discussão do ponto constante da ordem de trabalhos, nada mais havendo a tratar, e ninguém mais tendo manifestado qualquer intenção de usar da palavra, o senhor Presidente da MAG solicitou um voto de confiança para que a acta por aquele fosse lavrada em momento oportuno, o qual lhe foi conferido com os votos favoráveis de todos os presentes.
 
Nesta conformidade, deu o senhor Presidente da MAG por concluídos os trabalhos desta assembleia, saudando finalmente os senhores Condóminos pela presença, manifesto interesse na matéria debatida, contribuição e deferência demonstrada para o bom andamento da reunião, dando assim por encerrada a presente sessão plenária.

Eram (...) horas e (...) minutos.

Para constar e devidos efeitos, na data infra, se lavrou a presente acta da assembleia, fornecendo todos os elementos necessários à apreciação da legalidade das deliberações nela tomadas, tendo-se esta composta por quatro folhas avulsas, impressas e com o verso em branco que, postas a aprovação de todos os condóminos presentes, após lidas, achadas conformes na sua redacção com o que de essencial se passou, vão ser as três primeiras rubricadas e a quarta assinada, em sinal de aprovação.

Devidamente subscrita e validada nesses termos, ter-se-à a mesma anexa ao respectivo livro, à guarda do senhor Administrador, que enviará cópias aos ausentes e distribuirá ainda cópias por quem as solicitar.

Aos (...) dias do mês de (...) de (...)


O senhor Presidente da MAG
 
___________________________
 
O senhor Administrador
 
______________________________
 
Os senhores Condóminos

5/01/2021

Quotas prescrevem em 5 anos

O art. 310º, do CC, elenca várias situações que prescrevem no prazo de 5 anos (cfr. al. a) a f)), sendo que na al. g), refere expressamente que também prescrevem no mesmo prazo “…Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis…”. Ora, como referido na doutrina, a razão de ser da fixação deste prazo curto, tem por finalidade evitar que o credor, retardando a exigência dos créditos periodicamente renováveis, os deixe acumular ao ponto de tornar excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor.

Acresce ressalvar que nesse mesmo sentido, vai a jurisprudência, como é o caso do Ac. do STJ, de 02.05.2002, onde, a propósito de uma situação de prescrição a curto prazo, se decidiu que “…O prazo da prescrição, começa a contar-se da exigibilidade de cada prestação. Tal prescrição, interrompe-se, todavia, pela citação ou qualquer acto que exprima a intenção de se exercer o direito. A razão de ser de um prazo curto de prescrição das prestações periodicamente renováveis é evitar que o credor as deixe acumular tornando excessivamente onerosa a prestação a cargo do devedor…”.

Ora, salvo o devido respeito, e no seguimento do entendimento que se tem como a melhor doutrina e jurisprudência, afigura-se ser esta, justamente, a situação atinente às quotas de condomínio ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos que são consideradas prestações periodicamente renováveis.

Na verdade, não parece curial qualquer tese no sentido de que as prestações em dívida constituem prestações instantâneas fraccionadas, porquanto estas ocorrem quando, existindo uma única prestação, instantânea por natureza, esta é realizada por partes, ou seja, executada por diversas parcelas, em consequência de convenção das partes, sendo que o objecto global da prestação é, neste caso e ao invés do que sucede na prestação duradoura, desde o início fixado, mas a execução é escalonada no tempo, realizando-se por diversas fracções ou prestações. É o que acontece, por exemplo, na venda a prestações, relativamente à prestação de preço.

Pelo contrário, quando, em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam – posto que decorrentes de uma só relação obrigacional – diversas prestações (isto é, prestações repetidas) a satisfazer regularmente ou sem regularidade exacta, teremos as chamadas prestações reiteradas, repetidas, contrato sucessivo ou periódicas. Por outras palavras, no domínio das chamadas prestações duradouras, isto é, aquelas que não se esgotam num só momento, antes se distendendo no tempo, uma prestação diz-se periódica quando, protelando-se no tempo, tem de ser realizada em momentos sucessivos, com espaçamento em regra regular.

Entende-se ser este o caso das ditas despesas condominiais, ou melhor dizendo, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum…”, como é referido no art. 1424º, nº 1, do CC, que integram, assim, a situação prevista na já referida al. g) do art. 310º, do CC, estando, pois, sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos.

Como ensina Aragão Seia “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio constam de um orçamento a elaborar anualmente, sendo depois repartidas pelos condóminos, geralmente em prestações mensais nos termos do art. 1424º por representarem a contrapartida do uso e fruição daquelas partes comuns. Essas prestações renovam-se, pois, anualmente, enquanto durar o condomínio – art. 1424º e 1431º. Assim sendo, prescrevem no prazo de 5 anos - al. g) do art. 310° - e o prazo da prescrição começa a correr da data em que a prestação pode ser exigida (cfr. nº 1 do art. 306º do CC.

E é também este o entendimento dominante, senão unânime, da nossa jurisprudência, podendo-se citar, entre outros, o Ac. do STJ de 14.12.2000, onde se sustentou que “…Quando as prestações de um condómino respeitam a despesas do condomínio atinentes a serviços de segurança, vigilância, limpeza, água e electricidade e seguro do prédio, o prazo de prescrição das mesmas é de cinco anos…”.

Do Ac. da Relação de Coimbra, de 14.11.2006 colhe-se também: “…O novo condómino, ao adquirir a respectiva fracção, não fica automaticamente sujeito à obrigação de pagar as eventuais despesas de condomínio ou de conservação do imóvel em dívida, apenas respondendo pelas obrigações que se vençam após a sua investidura na qualidade de condómino – obrigações «ob rem» ou «propter rem de dare», não ambulatórias. A obrigação do condómino de pagar as despesas de condomínio e de conservação do imóvel já vencidas está sujeita ao regime da prescrição previsto no art. 310º, al. g), do CC – 5 anos…”.

No mesmo sentido, também se pronunciaram o Ac. do TRL, de 16.03.2010, e o Ac. da Relação de Lisboa, de 22.04.2010: “…As prestações relativas às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do condomínio prescrevem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 310º, al. g) CC…”. Neste último aresto, aliás, chama-se justamente a atenção para o facto de que “…o estabelecimento deste prazo curto de prescrição tem por finalidade evitar a acumulação de dívidas, impedindo que estas atinjam montantes elevados e acarretem a ruína do devedor (cfr. Vaz Serra, «Prescrição extintiva e caducidade», BMJ, 106.º, pgs. 107 e 121)…”.

4/23/2021

Execução de dividas actuais e futuras

 

DL 268/94 de 25/10

Artigo 6º
Dívidas por encargos de condomínio



1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

2 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior.

Resulta do art. 1436º, al. e) do CC que são funções do administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela assembleia, exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas. Atente-se que o legislador utilizou o termo «exigir» em detrimento de «pedir», dando-lhe desde logo uma conotação de obrigar ao cumprimento, e no limite, pleitear.

O Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 10/1/2003 decidiu que:
"I - As actas das reuniões das assembleias de condóminos constituem títulos executivos quando deliberem sobre o montante de contribuições devidas ao condomínio, já apuradas ou futuras, desde que sejam certas, líquidas e exigíveis.
II - O condomínio pode demandar, na mesma execução, vários condóminos que se encontrem em incumprimento."

Fundamentação
 
Dispõe o art. 45º do CPC que:
1- Toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
2- O fim da execução, para o efeito do processo aplicável, pode consistir no pagamento de quantia certa, na entrega de coisa certa ou na prestação de um facto, quer positivo, quer negativo.
 
Por sua vez, resulta da al. d) do art. 46º do CPC que entre outros, podem servir de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.

Nesta situação encontra-se a previsão do art. 6º nº 1 do DL 268/94 de 25/10 que estatui que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante de contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
 
Por sua vez o art. 1º, nº 1, do mesmo diploma estabelece que “são obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado.” O nº 2 do mesmo artigo acrescenta que “as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções”.
 
Ora, o que o supra referido DL veio fazer, conforme resulta do seu preâmbulo, foi «desenvolver alguns aspectos do regime da propriedade horizontal» com o «objectivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o (seu) regime (…) facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros». E um dos instrumentos de que o legislador se socorreu para atingir essa eficácia foi precisamente a de conferir força executiva às actas das reuniões das assembleias de condóminos, nos termos do supra citado art. 6º daquele DL. 
 
Adjectivam pois as citadas normas daquele DL preceitos de natureza substantiva do regime da propriedade horizontal, maxime as previstas nos art. 1424º, 1431º, 1436º e 1437º do CC. Com efeito, os condóminos devem contribuir para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum, em regra em montante proporcional ao valor das respetivas frações (cfr. art. 1424º nº 1 do CC).
 
Por sua vez, caberá ao administrador elaborar o orçamento das receitas e despesas relativas a cada ano (al. b) do art. 1436º do CC), o qual deverá ser sujeito a aprovação em assembleia dos condóminos, convocada pelo administrador para a primeira quinzena de Janeiro de cada ano (cfr. art. 1431º do CC).
 
Aprovado o orçamento, caberá ao administrador cobrar as receitas e efectuar as despesas comuns (e outras para as quais tenha sido autorizado - cfr. art. 1436º al. d) e h) do CC) e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas (cfr. art. 1436º al. e) do CC), sendo que para o efeito, poderá agir em juízo contra o condómino relapso (cfr. nº 1 do art. 1437º do CC), instaurando desde logo acção executiva, para o que dispõe, como título executivo, da acta da assembleia em que se tenha deliberado as despesas e a contribuição de cada condómino para as mesmas.
 
A este propósito têm surgido divergências na jurisprudência quanto à expressão utilizada no referido art. 6º, nº 1, do DL 268/94 de 25/10 “contribuições devidas ao condomínio”. Afigura-se que tal expressão tanto abrange as “contribuições que vierem a ser devidas ao condomínio”, como as “contribuições já em dívida ao condomínio”, ou seja, quer as contribuições futuras, quer as contribuições já apuradas, em que se verifique ou venha a verificar falta de pagamento. Não se vislumbra justificação para distinguir. Neste sentido cfr. entre outros, Ac. da Relação Porto proc. nº RP200504210531258, de 21/04/2005 e de 24/2/2011, proc. nº 3507/06.2TBMAI-A.P1, Ac. TRL de 29./6/2006, proc. nº 5718/2006-6, e de 18/03/2010, proc. 85181/05.0YYLSB-A.L1-6, Ac. TRE de 17/02/2011, proc. nº 4276/07.4TBPTM.E1, acessíveis in www.dgsi.pt .
 
No entanto, as contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer outros montantes referidos naquele normativo têm de ser certas, exigíveis e líquidas (cfr. art. 802º do CPC) uma vez que estes três requisitos condicionam a admissibilidade da acção executiva.

4/14/2021

A ambulatoriedade e não ambulatoriedade das dívidas

Aquando da aquisição/alienação de fracções autónomas, mantendo o alienante dívidas para com o Condomínio, a quem deve a administração do condomínio exigir o pagamento: do anterior proprietário da fracção, ou do actual titular do direito real?

Existem fundamentalmente 2 orientações: 

Ambas afirmam que as obrigações contidas no disposto no art. 1424º do CC são obrigações propter rem, ou seja obrigações do titular do direito de propriedade. Há assim, quem entenda (cfr. entre outros, Ac. Rel. Lisboa, de 02/02/2006), que se trata tipicamente de obrigações propter rem, mas que, no entanto, não terão uma sua característica que as define, e que é a ambulatoriedade. Será o caso das obrigações que decorrem do uso normal do bem e por isso sua contrapartida, como por exemplo a quota paga ao condomínio, em regra, mensalmente, para fazer face às despesas com limpeza das partes comuns, manutenção geral e custos de administração.

Já não será assim com obrigações que impliquem melhorias, alterações, reparações, que será o novo proprietário a tirar proveito delas, apesar de tais despesas terem sido deliberadas e aprovadas em AG, pelo anterior proprietário e condómino. Estas já transitariam para o novo titular do direito real, acompanhando a fracção autónoma, e integrando o seu património, independentemente de este concordar ou não com elas, sendo responsável pelo seu pagamento.

Outros entendem que toda e qualquer obrigação propter rem, ou obrigação real, terá as características que lhe são próprias, e que as definem, como é o caso da ambulatoriedade, e a sua titularidade ser determinada pela titularidade do direito real de propriedade, e não intuitu personae, ou pessoalmente, como na generalidade das obrigações.

Desde logo, aquela primeira posição gera uma dificuldade: quais as obrigações do art. 1424º do CC que, apesar de serem propter rem, não têm ambulatoriedade, e quais as que sim? Ou seja, para todas elas podem ser defensáveis as duas hipóteses, de acordo com o interesse da parte que alega, proporcionando o recurso aos tribunais e viabilizando a divisão na Jurisprudência, com todas as consequências que isso traz.

A Lei, no art. 1424º do CC, não faz distinção do tipo de encargo ou despesa, ou do momento do nascimento da obrigação de pagamento, nem estabelece dois regimes diferentes. E bem. A Administração do Condomínio não há-de conhecer, nem terá obrigação de conhecer, em que termos são celebrados os negócios jurídicos entre alienantes e adquirentes, das fracções autónomas que constituem o prédio, designadamente se os celebram sob condição de ficarem liquidadas as dívidas com o Condomínio, ou não; com redução proporcional do preço; se o alienante informou ou não o adquirente, etc..

À Administração de Condomínio cabe-lhe tão somente cobrar as dívidas existentes, intimando os condóminos a fazê-lo e, se estes não procedem voluntariamente ao pagamento, cobrá-las recorrendo à via judicial. Não vai, no entanto, fazê-lo sem deixar acumular um montante que justifique enveredar por tal caminho, quer por não ter que estar a par nem presente no momento em que são celebradas as compras e vendas, quer por razões de gestão, quer por falta de meios financeiros, o que é cada vez mais usual. 

De notar, que apenas desde há bem pouco tempo vai sendo conferido apoio judiciário aos Condomínios, tendo em conta a sua insuficiência económica, já que porque são entidades jurídicas equiparadas a pessoas colectivas, se presumia que sempre arrecadavam avultados lucros, ou sendo vários os condóminos todos contribuíam (o que não corresponde à realidade dos Condomínios).

Também, tratando-se de quotas pagas, em regra, mensalmente, a Administração não vai obviamente intentar uma acção judicial por mês, para cobrar coercivamente as quotas que não foram pagas voluntariamente, mesmo que coligasse todos os faltosos. Ainda por muitas outras razões, tal seria praticamente inviável.

Finalmente, e uma vez que em relação às alienações/aquisições de fracções autónomas do prédio, a Administração do Condomínio é um terceiro, como se referiu anteriormente, ao intentar uma acção contra o anterior proprietário para cobrar as quotas que não lhe tenham sido pagas, podia correr o risco de ver a sua acção cair por terra, desde logo por o anterior proprietário vir a ser considerado parte ilegítima na acção, ou defendendo-se, invocando por exemplo que foi reduzido o preço tendo em atenção a dívida, que o Condomínio desconhecerá, e não tendo obrigação de conhecer, vê-o ser absolvido do pedido.

Ora tudo isto acarreta custos, de tempo despendido, e de dinheiro com taxas e custas judiciais, e ainda com o patrocínio judicial (que é obrigatório), que muitas vezes o Condomínio não conseguirá suportar. Não poderá recorrer a Injunção, uma vez que no caso concreto a obrigação de pagamento não decorre de qualquer contrato. E, se tiverem sido vários os "anteriores proprietários" chega a não compensar ir cobrar de cada um deles, até acertar no verdadeiro devedor!

Assim, negar-se à Administração, a possibilidade de reclamar as dívidas provenientes de falta de pagamento ao Condomínio das quotas, mensais ou não, fixadas em Assembleia anual, do actual proprietário - que terá sempre oportunidade de ser reembolsado por via de regresso, se não for ele o responsável - é fomentar o incumprimento destas obrigações.

Igualmente, quanto ao adquirente, novo proprietário, há que referir que, antes de comprar, não deve deixar de recolher algumas informações importantes acerca da fracção que pretende comprar. Tem aliás o dever de se informar, não só no que toca ao registo predial e no que lá possa estar inscrito, bem como deverá inteirar-se junto do Administrador do Condomínio, do teor do Regulamento em vigor, se existem despesas já aprovadas para obras que ainda não tenham sido executadas, e ainda se existem dívidas da responsabilidade da fracção que vai adquirir; da mesma forma que tem o dever de se informar junto da CM, dos empreendimentos, acessibilidades, expropriações, previstos para o local que pretende que venha a ser a sua residência. Isto constitui um verdadeiro dever, tal como o alienante terá que prestar informações essenciais acerca do negócio.

Por fim, o actual proprietário, se mesmo interpelado para o efeito pela Administração do Condomínio, não proceder ao pagamento voluntário das dívidas do anterior proprietário, e deixar que o Condomínio intente a competente acção judicial para cobrança dos aludidos créditos, poderá sempre levantar nos autos o incidente de Intervenção Principal Provocada, chamando o anterior proprietário à demanda, com fundamento no direito de regresso que eventualmente terá por ter adquirido a fracção sem ónus, encargos ou responsabilidades, conseguindo dessa forma inverter o ónus da prova na acção de regresso que se lhe seguir, no caso de vir a ser condenado ao pagamento.

Em conclusão, a Lei estabelece um só regime para as obrigações do condomínio que são tipicamente obrigações propter rem. O seu cumprimento pode ser exigido do actual proprietário. Porém, também confere os mecanismos necessários para aquele que é chamado a cumprir uma obrigação alheia, vir a exigir o reembolso do verdadeiro responsável, por via do direito de regresso; e ainda de exigir o ressarcimento dos prejuízos eventualmente sofridos com a situação.