Uma questão de grande importância e, que reveste maior actualidade (vide ultima alteração legislativa com a introdução no regime da PH do art. 1424º-A do CC), prende-se com o caso de alguns proprietário(s)/condómino(s), com alguma frequência, interromperem a liquidação da(s) respetiva(s) quotas-partes nas despesas condominiais, entrando, consequentemente, em incumprimento.
Naturalmente, por maioria de razão, a aprovação e aplicação de “ penas pecuniárias” (bem diferente de juros de mora!...) aos condóminos remissos – apenas e só –, carece de um quórum deliberativo da maioria dos votos representativos do capital investido (51 ou 501 votos, consoante se delibere em percentagem ou permilagem).
Aqui achegados, importa observar se as sanções de natureza pecuniária deliberadas pela Assembleia de Condóminos se encontram abrangidas pelo art. 6º nº 1 do DL nº 268/94, de 25 de Outubro, não constituindo as actas de reunião de AG em que foram deliberadas título executivo.
Na anterior redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, o art. 6º, sob a epígrafe "Dívidas por encargos de condomínio", estatuía-se que:
1 - A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.2 - O administrador deve instaurar acção judicial destinada a cobrar as quantias referidas no número anterior.
Com a aprovação da Lei 8/2022, de 10 de Janeiro, este preceito passou a ter a seguinte redacção:
1 - A ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.2 - A ata da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no n.º 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.3 - Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.4 - O administrador deve instaurar ação judicial destinada a cobrar as quantias referidas nos n.os 1 e 3.5 - A ação judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.
Se o campo de aplicação da expressão “contribuições devidas ao condomínio” constante da parte inicial do artigo 6º, nº 1 do DL nº 268/94, de 25 de Outubro, devia ser perspectivado de forma restrita e por força da qual, a acta da assembleia de condóminos que deliberasse sobre a fixação de penas pecuniárias a aplicar aos condóminos incumpridores das respectivas obrigações, não constituía título executivo no que diz respeito a essas penalizações, por tais quantias não estarem abrangidas pelo preceituado no art. 6º, nº 1, do referido DL nº 268/94, não podendo, assim, servir de base à execução a instaurar pelo administrador para cobrança coerciva das mesmas, actualmente, por força do novo nº 3 deste preceito, as penas pecuniárias passam a ficar balizadas no sobredito conceito.
Importa contudo salientar que tanto a aprovação como a aplicação de “ penas pecuniárias”, tem como escopo a punição extrajudicial do(s) proprietátio(s)/condómino(s) pela inobservância de quaisquer disposições legais, das deliberações da Assembleia Geral dos Condóminos ou das decisões do administrador (cfr. nº 1 do art. 1434º do CC).
Em bom rigor, a figura das “penas pecuniárias” deve ter primeiramente como objectivo coagir o(s) devedor(es) (i.e. condóminos remissos), de forma indirecta – através da ameaça de uma quantia pecuniária suplementar – a cumprir(em) a prestação a que estava(m) inicialmente adstrito(s) (cfr. nº 1 do art. 762º do CC).
A aprovação e aplicação de “penas pecuniárias” encontra pleno enquadramento na expressão “contribuições devidas ao condomínio”, constante na 1ª parte do nº 1 do art. 6º do DL nº 268/94, de 25 de Outubro; bem como, no nº 1 do art. 1424º do CC.
Por outro lado, a aplicação de eventuais “penas pecuniárias” retrata e corresponde a um princípio geral de direito das obrigações, consubstanciado na “cláusula penal”, que as partes podem – e bem – fixar nos respectivos negócios jurídicos (cfr. art. 810º e 812º do CC).
Todavia, a fixação de quaisquer “penas pecuniárias” ao(s) condómino(s), aplicadas em cada ano civil, nunca poderá exceder a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor” (cfr. nº 2 do art. 1434º do CC).
Contudo, nesta factualidade, importa desde logo que se efectue algumas reflexões em torno do conceito “rendimento colectável”.
Destarte, o “rendimento colectável” anual da “fracção autónoma” deve aferir-se em função da taxa de imposto municipal sobre imóveis (cfr. art. 112º do CIMI, taxa fixada pelas respectivas assembleias municipais dentro de limites que podem variar entre 0,2 a 0,8%) ao valor patrimonial tributário da respectiva “fracção autónoma” (cfr. art. 7º do CIMI).
Presentemente, na “caderneta predial” (emitida pelo respectivo serviço de finanças) apenas consta o VPT (valor patrimonial tributário). Ora, esse valor é bem diferente do “rendimento colectável”...
Importa pois ressalvar que o “valor patrimonial tributário” consiste no valor atribuído ao prédio rústico ou urbano e que se encontra inscrito na matriz predial urbana. Este é averbado na “caderneta predial” pelo respectivo serviço de finanças e serve de base para calcular o IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis (cfr. art. 7º, 37º e ss. do CIMI – Código do Imposto Municipal sobre Imóveis).
A terminar, não poderia deixar de se aludir à eventual aplicação de “juros de mora”. Afinal, conforme já se salientos, existe uma profunda diferença entre “penas pecuniárias” e “juros de mora”.
Assim, na eventualidade de recurso à via judicial, já podem ser exigidos – também – “juros de mora” à taxa legal.
No entanto, podem ser estipulados juros de mora a taxa superior. Todavia, tal estipulação deve constar de documento escrito (Acta e/ou Regulamento, onde exista mútuo acordo entre credor(es) e devedor(es) relapso(s)*), não podendo ser fixados juros excessivos ou usuários (cfr. art. 1146º do CC); sob pena de serem apenas devidos os juros de mora na medida dos juros legais (cfr. nº 2 do art. 559º do CC).
* "Interpelado o condómino para pagar a sua prestação para as despesas do condomínio fica sujeito, se o não fizer, ao pagamento de juros de mora que são, em princípio, os legais – artigos 559º, 805º, nº1, 806º, nºs 1 e 2 e Portaria nº 263/99, de 12 de Abril, que fixa os juros legais em 7% ao ano.”