Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

06 dezembro 2024

Glossário jurídico - C


Para um maior e melhor conhecimento das terminologias usadas no domínio jurídico, o presente glossário alfabético foi projectado para apresentar as definições dos principais termos usados no campo do Direito.

Cabeça de casal


Aquele que administra os bens próprios de uma pessoa que faleceu ou os bens comuns do casal, no caso de aquele ter sido casado em regime de comunhão.

Caducar ou caducidade

Ficar sem efeito ou valor. Situação que se verifica quando uma lei deixa de vigorar por força de qualquer circunstância, independentemente da publicação de uma nova lei.

Capacidade

Aquilo que permite actuar no mundo do direito, isto é, praticar actos com efeitos jurídicos. Pode referir-se tanto a aptidões físicas ou psíquicas (por exemplo, idade ou saúde mental) como a outras faculdades ou condições, designadamente patrimoniais ou jurídicas.

Carta precatória

Meio pelo qual um juiz responsável por um determinado processo na sua jurisdição, solicita a um juiz de outra jurisdição para cumprir um acto necessário para o andamento do processo, o que pode envolver diversas diligências, como citações, depoimentos ou interrogatórios.

Carta rogatória

Solicitação por um tribunal ou autoridade nacional, para a prática de um acto processual que exija a intervenção de serviços judiciários a uma autoridade estrangeira. Neste caso, as diligências são desenvolvidas fora do território nacional. As cartas rogatórias são assinadas pelo juiz ou relator.

Caso julgado

Refere-se ao estado de um processo que se encontra definitivamente julgado por um tribunal, sem que seja possível interpor recurso ou reclamação da decisão judicial final, qualquer que seja o seu sentido e qualquer que seja o tribunal que a proferiu (1ª, 2ª ou 3ª instância, incluindo aqui a possibilidade de apresentação de recurso para o Tribunal Constitucional). O caso julgado tem por efeito impedir que a mesma acção (com as mesmas partes e o mesmo objecto) possa vir a ser de novo apresentada em tribunal.

Caução

Medida de coacção de natureza pecuniária que pode ser aplicada pelo tribunal a um arguido pela prática de um crime punível com pena de prisão.

Caução económica

Medida de garantia patrimonial aplicada em processo penal quando existe fundado receio de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento da pena pecuniária, das custas do processo ou de qualquer outra dívida para com o Estado relacionada com o crime.

Causa

Acção ou processo judicial, ao qual é atribuído um valor (o valor da causa) que se reflecte de diversas formas sobre o processo.

Cédula Profissional

A cada advogado ou advogado estagiário é entregue a respetiva cédula profissional, a qual serve de prova da inscrição na Ordem dos Advogados e habilita para o exercício da profissão.

Certidão

Documento autêntico pelo qual uma autoridade competente atesta a existência de um certo documento ou registo e em que, no primeiro caso, transcreve ou resume, total ou parcialmente, o conteúdo deste.

Cidadania

Por vezes designada como «direito a ter direitos». Condição de que beneficiam todas as pessoas pelo facto de pertencerem a uma determinada comunidade nacional ou internacional, e que lhes atribui direitos e deveres para com o Estado, as autoridades, as instituições sociais e os demais cidadãos. Implica cada vez mais um estatuto de universalidade e de igualdade (por exemplo, os cidadãos nacionais e os cidadãos estrangeiros e apátridas terão os mesmos direitos e deveres, fora algumas excepções).

Cidadão

Qualidade associada a qualquer pessoa na sua ligação a uma comunidade politicamente organizada e que assim é considerada pela lei (desde logo, a Constituição), com um estatuto que lhe concede um conjunto fundamental de direitos que pode ter a contrapartida de deveres. Conceito geralmente associado à pertença a um Estado (cidadão português) ou uma comunidade internacional (por exemplo, cidadão europeu).

Citação

A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento a uma pessoa de que foi posta contra ela uma acção judicial. A citação também serve para chamar pela primeira vez ao processo uma pessoa interessada na causa mas que nela não interveio inicialmente. Intimação judicial ou em nome de qualquer autoridade. Acto processual pelo qual o arguido ou interessado é chamado a juízo para se defender. Vincula o arguido ao processo, bem como aos seus efeitos.

Cláusulas Contratuais Gerais

São modelos negociais a que pessoas indeterminadas se limitam a aderir, sem possibilidade de discussão ou de introdução de modificações. Daí que a liberdade contratual, um dos princípios básicos do direito privado, se reduza à aceitação ou rejeição desses modelos definidos unilateralmente por entidades que desempenham um papel importante na vida dos particulares.

Cláusula Penal

Cláusula acessória através da qual as partes fixam uma sanção convencional (pena, multa, indemnização) que o credor pode pedir ao devedor que não cumpriu aquilo a que se obrigou. Estabelece a garantia do cumprimento das obrigações.

Coisa

Tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas. De fora, ficam todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que não podem ser alvo de apropriação individual. As coisas são imóveis ou móveis, simples ou compostas, fungíveis ou não fungíveis, consumíveis ou não consumíveis, divisíveis ou indivisíveis, principais ou acessórias, presentes ou futuras.

Cônjuges

Pessoas físicas unidas pelo casamento ou por uma união de facto. Em ambos os casos, a união confere-lhes direitos e obrigações que são recíprocas.

Conhecimento oficioso

Aquele que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.

Consulta jurídica

Actividade de aconselhamento jurídico que se traduz na interpretação e aplicação de normas jurídicas, tendo em vista o esclarecimento das dúvidas colocadas pelo cidadão/cliente. Uma das competências profissionais dos advogados nos termos Estatuto da Ordem dos Advogados.

Contrato de adesão

Contrato em que uma das partes, por norma uma empresa, formula o contrato e a outra parte limita-se a aceitar as suas condições, mediante a adesão ao modelo ou impresso que lhe é apresentado (podendo rejeitá-las, se não desejar ficar vinculado a esse modelo). As disposições do contrato denominam-se cláusulas contratuais gerais.

Contrato-promessa

Convenção pela qual alguém se obriga a celebrar um determinado contrato. O vínculo estabelecido nesta obrigação baseia-se na concepção de um contrato ulterior, este sim com a constituição do objeto pretendido pelos intervenientes. O contrato-promessa exige deste modo o aparecimento de um outro compromisso considerado como definitivo relativamente aos direitos e deveres a observar, constituindo assim um contrato provisório.

Coadjuvação

Quando um determinado órgão (coadjutor ou adjunto) fica encarregado de auxiliar um outro (o coadjuvado), pertencente à mesma pessoa colectiva no exercício das suas competências. Esse auxílio exerce-se através da prática de actos jurídicos ou de natureza material, observando-se, por exemplo, entre ministros e secretários de Estado ou entre presidentes da Câmara e vereadores.

Coacção

Crime que se verifica quando alguém leva outrem a uma acção ou à omissão, por meio de violência ou de ameaça. É um crime previsto e punido pelo Código Penal.

Co-autor

Aquele que com outra ou mais pessoas pratica o mesmo delito ou coopera na sua execução, prestando-lhe auxílio ou assistência.

Co-autoria

Realização conjunta, por mais de uma pessoa, de uma mesma infracção penal, com consciência de estar a contribuir na realização comum de um crime.

Coima

Distingue-se da multa, que, apesar de implicar também o pagamento de uma quantia em dinheiro pelo infractor, é uma penalidade aplicada por um juiz a quem pratica um crime.

Coisas imóveis

Distinguem-se entre coisas imóveis por natureza e coisas imóveis por relação. As coisas imóveis por natureza compreendem os prédios rústicos e urbanos e as águas, no seu estado natural. As coisas imóveis por relação, não sendo em si imóveis, incluem todas as outras coisas enumeradas pela lei como tal.

Comarca

Divisão judicial correspondente à jurisdição de um Tribunal de 1.ª instância. Cada comarca tem um tribunal designado pela sede da comarca onde se encontra instalado.

Competência territorial dos tribunais judiciais

Cada categoria de tribunais obedece a uma estrutura determinada, funcionando segundo o que está estabelecido pela lei. Um dos critérios de delimitação da competência de um tribunal é o critério geográfico. A área geográfica sob a jurisdição de um tribunal judicial de primeira instância chama-se “comarca”. Podem existir tribunais cíveis de primeira instância com competência territorial alargada, que abrangem mais do que uma comarca.

Os tribunais judiciais de segunda instância, os tribunais da Relação, também têm competência territorial delimitada, já que decidem os recursos das decisões proferidas por determinados tribunais de comarcas.

O Supremo Tribunal de Justiça tem competência em todo o território nacional.

Condenação

Atribuição pelo tribunal de uma pena ou obrigação a alguém considerado culpado de um ilícito. Punição.

Conselheiro

Título dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça.

Conselho Superior da Magistratura (C.S.M.)

Órgão de gestão e disciplina dos juízes dos Tribunais Judiciais. Compete-lhe nomear, colocar, transferir e promover, bem como exercer a ação disciplinar sobre os magistrados judiciais.

Conselho Superior do Ministério Público (CSMP)

Integrado na Procuradoria-Geral da República, é o órgão superior de gestão e disciplina dos magistrados do Ministério Público/MP. Compete-lhe nomear, colocar, transferir, promover, exonerar, apreciar o mérito profissional e exercer a ação disciplinar sobre esses magistrados do MP, com exceção do procurador-geral da República/PGR.

Conservador

Pessoa que tem a seu cargo os procedimentos relativos ao registo civil, predial, comercial ou automóvel.

Constituição

Lei fundamental da organização política, jurídica e económica de um país. Contém o conjunto de regras e princípios que conferem estabilidade e unidade a uma determinada comunidade nacional, influenciando determinantemente as outras leis (inferiores) desse país que a ela devem obedecer.

Constitucionalidade

Característica do que é constitucional, que está em concordância com as normas estabelecidas na Constituição.

Contestação

Peça processual, na qual o réu de uma ação responde, em juízo, a uma petição inicial negando, contrariando desdizendo ou discutindo.

Contra-ordenação

Infracção que não é crime mas que não deixa de ser sancionada por lei com uma determinada quantia, a pagar ao Estado, que se designa coima. É uma sanção penal de cariz administrativo, pois é aplicada por um órgão administrativo (por exemplo, o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, no campo das contraordenações estradais), embora a decisão deste possa depois ser impugnada em tribunal. O não pagamento da coima só pode implicar a penhora e venda de bens do faltoso. As condutas sancionadas pelo chamado direito de mera ordenação social não são suficientemente graves para justificar a criminalização, dado que normalmente não atingem valores sociais fundamentais.

Contrato

Acordo pelo qual duas ou mais partes (pessoas individuais ou colectivas) estabelecem entre si os seus direitos e deveres perante determinado assunto negociável, ajustando reciprocamente os seus interesses. Os contratos podem assumir várias categorias conforme a respectiva matéria, amplitude, duração ou forma.

Contrato de adesão

Contrato em que uma das partes, por norma uma empresa, formula o contrato e a outra parte limita-se a aceitar as suas condições, mediante a adesão ao modelo ou impresso que lhe é apresentado (podendo rejeitá-las, se não desejar ficar vinculado a esse modelo). As disposições do contrato denominam-se cláusulas contratuais gerais.

Contrato-promessa

Convenção pela qual alguém se obriga a celebrar um determinado contrato. O vínculo estabelecido nesta obrigação baseia-se na concepção de um contrato ulterior, este sim com a constituição do objeto pretendido pelos intervenientes. O contrato-promessa exige deste modo o aparecimento de um outro compromisso considerado como definitivo relativamente aos direitos e deveres a observar, constituindo assim um contrato provisório.

Contumácia

Quando o paradeiro do arguido é desconhecido e aquele ainda não tenha prestado termo de identidade e residência, nem concordado com julgamento na sua ausência. A declaração de contumácia implica a passagem imediata de mandado de detenção e a anulabilidade de negócios jurídicos de natureza patrimonial celebrados após a sua emissão.

Contumaz

Aquele que se coloca numa situação em que não é possível notificá-lo da acusação que lhe foi deduzida, do julgamento que se iria realizar ou da sentença que o condenou.

Convenção

Termo geralmente utilizado para indicar o acordo celebrado entre instituições internacionais, normalmente Estados soberanos que estabelecem acordos internacionais dos quais que resultam direitos e obrigações recíprocos, segundo as regras do direito internacional. Também se pode usar esta expressão como sinónimo de contrato, estabelecido, por exemplo, entre pessoas que vão casar-se (convenção antenupcial) ou no mundo laboral (convenção colectiva de trabalho).

Convolação

Alterar o estado civil, alterar uma acção ou passar de uma medida judicial para outra.

Corrupção

Abuso do poder confiado para obtenção de benefícios privados. A corrupção pode ser classificada como grande, pequena e política, dependendo do volume de dinheiro perdido e do sector em que ocorre.

Corrupto passivo

Aquele que é corrompido, aceitando a contrapartida que lhe é oferecida pelo corruptor para a prática de um acto contrário aos deveres das suas funções públicas (de político, autoridade ou funcionário).

Crime

Infracção punida pela lei como tal, geralmente associada à violação de valores ou interesses fundamentais da sociedade. A existência do crime depende da prática de determinados factos (por acção ou omissão), da intenção ou consciência de os praticar (dolo ou negligência) e das circunstâncias que rodearam a sua prática.

Crime de dano

Destruição no todo ou em parte, danificação, desfiguração ou tornar não utilizável coisa ou animal alheios.

Crime de dano qualificado

Destruição no todo ou em parte, danificação, desfiguração ou tornar não utilizável coisa ou animal alheios de valor consideravelmente elevado.

Crime de ódio

Crime contra as pessoas motivado pelo facto de a vítima pertencer a determinada raça, etnia, cor, origem nacional ou territorial, sexo, orientação sexual, identidade de género, religião, ideologia, condição social, física ou mental.

Crime particular

Crime que ofende valores de interesse pessoal e que só pode ser investigado e julgado mediante apresentação de queixa-crime pelo ofendido. Requer a sua participação activa no processo, através da sua constituição como assistente do Ministério Público, o que lhe permite sugerir determinadas diligências de prova.

Na sequência da investigação levada a cabo pelas autoridades, o ofendido é notificado para, se quiser, apresentar acusação contra o arguido. Se não o fizer, o processo é imediatamente encerrado. Distingue-se de crime público e de crime semi-público.

Crime público

Crime que ofende o interesse geral e cuja investigação não depende de queixa. O processo é da iniciativa do Ministério Público, independentemente da vontade do ofendido.

Crime semi-público

Crime cuja investigação depende da apresentação de uma queixa-crime junto das autoridades competentes, por parte do ofendido.

Culpa

Conduta omissiva da diligência exigível, isto é, negligência, leviandade ou imprudência. A doutrina distingue tradicionalmente na culpa dois graus: a culpa consciente (em que o agente prevê a possibilidade do resultado ilícito, mas age para alcançar um fim lícito, na esperança temerária de que aquele não se produza) e a culpa inconsciente (o agente não previu o resultado ilícito, mas este era objectivamente previsível). A determinação do grau de culpa do agente é relevante para certos efeitos, como, por exemplo, para fixar a quota na dívida indemnizatória ou para determinar o montante da indemnização por danos não patrimoniais.

Cúmplice

Quem, por qualquer forma, presta auxílio material ou moral ao autor da prática de um facto ilícito, apoiando e colaborando a sua execução e tornando-se também responsável por esse crime ou falta.

Cumprimento

Acto de executar uma determinação judicial.

Cumprimento defeituoso

O cumprimento defeituoso constitui um tipo de não cumprimento das obrigações, e são-lhe aplicáveis as regras gerais da responsabilidade contratual.

Cúmulo jurídico

Pena única ou pena total que corresponde ao conjunto das penas que correspondem a cada um dos crimes ou infracções.

05 dezembro 2024

Restituição valores adiantados


Tribunal: Julgado de Paz de Lisboa
Processo: 950/2008-JP
Data: 15-01-2009

Sentença:


A, e mulher, B, vieram propor contra C, sito em Lisboa, representada pela D, com sede em Lisboa, todos melhor identificados nos autos, a presente acção consubstanciada na alínea c) do nº1 do artº. 9º da Lei 78/2001, de 13 de Julho, pedindo a condenação destes na devolução aos Demandantes do valor de € 8,65 (oito euros e sessenta e cinco cêntimos), que estes pagaram a mais com as quotas dos meses de Março a Julho de 2008 e, bem assim, que seja declarado que os Demandantes não devem à Demandada nenhuma “quota administrativa”.

Alegam, em síntese, que são proprietários da fracção autónoma correspondente a um andar do prédio sito em Lisboa, tendo sido sócios da Demandada até 3 de Março de .../2008, data em que apresentaram a sua demissão, conforme Doc. 3 junto aos autos. No entanto, desde essa data, a Demandada tem insistido em cobrar a quantia de € 1,73 (um euro e setenta e três cêntimos), supostamente de “quota administrativa”, além da quota normal de condomínio, fixada em € 35,51 (tinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos). Os Demandantes já interpelaram a Demandada no sentido desta informar a que se refere a “quota administrativa” mas, até à presente data, esta não prestou qualquer esclarecimento. Alegam ainda os Demandantes que pagaram a mais, além da quota de condomínio, o valor de € 8,65 (5 x € 1,73) nas quotas referentes a Março a Julho de 2008. Mais referem que as quotas de condomínio de Agosto a Outubro de 2008 não foram pagas porque a Demandada só aceita o pagamento conjuntamente com a referida “quota administrativa”.
Juntam 11 documentos.

A Demandada, regularmente citada, não contestou. Não houve lugar a mediação. Verificam-se os pressupostos processuais de regularidade e validade da instância, inexistindo questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa. A questão a decidir por este tribunal reside em apurar se assiste razão aos Demandantes, nomeadamente se lhes deve ser devolvida a quantia de € 8,65 (oito euros e sessenta e cinco cêntimos) e, bem assim, se estes devem pagar a “quota administrativa” reclamada pela Demandada.

Cumpre apreciar e decidir.
Aberta a Audiência e estando todos presentes, foram ouvidas as partes, nos termos do disposto no art. 57º da LJP, tendo-se explorado todas as possibilidades de acordo, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 26.º do mesmo diploma legal, o que não logrou conseguir-se, pelo que se procedeu à Audiência de Julgamento, com observância do formalismo legal.

A convicção probatória do Tribunal, de acordo com a qual selecciona a matéria dada como provada ou não provada, ficou a dever-se ao conjunto da prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomadas em consideração as declarações das partes em Audiência de Julgamento; os documentos juntos de fls. 3 a 39, os Estatutos da D, o Regulamento de Condomínio e a proposta de Orçamento para 2008. Assim, da análise da prova produzida, incluindo os documentos juntos aos autos, que se indicam e dão por reproduzidos, consideram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa:

1 – Os Demandantes adquiriram o direito de superfície da fracção autónoma designada pela letra “X”, que constitui o andar direito, com entrada pelo lote x, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, situado em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º x , à data omisso na matriz;
2 – Os Demandantes apresentaram a sua demissão de sócios da D em 3 de Março de .../;
3 – A acta de 28 de Março de 2008, fixa a quota de condomínio para a tipologia T3 em € 35,51, valor ao qual acresce a quantia de 0,50 cêntimos das antenas parabólicas aos utentes do sistema;
4 – A tipologia da fracção dos Demandantes corresponde à tipologia T3;
5 – Em 27 de Agosto de 2008 o Demandante marido solicitou um pedido de esclarecimentos quanto à “quota administrativa”;
6 – Carta essa recebida pela Demandada em 28 de Agosto de 2008;
7 – A “quota administrativa” foi fixada em € 1,73 (um euro e setenta e três cêntimos), não sendo considerado o valor de € 1,58 referido na carta enviada pela Demandada em 23 de Julho de 2008 e endereçada ao Demandante marido;
8 – O regulamento de condomínio não estipula quaisquer verbas;
9 – Não existe qualquer acta a aprovar a referida “quota administrativa”;
10 – A Demandada não aceita o pagamento das quotas de condomínio, se neste não for contemplado o pagamento da “quota administrativa”;
11 – A Demandada não prestou os esclarecimentos solicitados pelo Demandante marido no que respeita à “quota administrativa”;
12 – Os Demandantes, emitiram o cheque n.º x no valor de € 106,53 (cento e seis euros e cinquenta e três cêntimos), com data de 2008-07-21, correspondente a 3 x € 35,51;
13 – O Condomínio emitiu um recibo no valor de € 111,72, com data de 25 de Julho de 2008, correspondente a (3 x € 35,51) + (3 x € 1,73);
14 – O Condomínio emitiu um recibo no valor de € 80,73, com data de 7 de Maio de 2008, correspondente a acertos de Janeiro e Fevereiro (diferenças entre a quota fixada em 2007 e a fixada em 2008), quotas de condomínio de Março e Abril de 2008 e “quota administrativa” do mês de Março de 2008;
Não se provaram os factos que não se consignaram.

Da Apreciação de Facto e de Direito
Cada condómino tem o dever de contribuir para o pagamento das despesas comuns, pois estas destinam-se a garantir o regular funcionamento do condomínio. Assim, a luz da escada, a electricidade gasta com o elevador, a água com que se lava a escada e o salário de quem o faz são despesas que, em princípio, devem ser suportadas por todos.
A não ser que o título constitutivo, o regulamento do condomínio ou uma acta da assembleia de condóminos correctamente aprovada determine algo diferente, as despesas comuns devem ser pagas pelos condóminos na proporção do valor das respectivas fracções. Ou seja, nada impede que se estabeleçam esquemas de pagamentos diferentes, e até a própria lei admite que as despesas com serviços de interesse comum possam ser suportadas “em partes iguais ou na proporção da respectiva fruição” – art. 1424º/1 CC.
No entanto, torna-se necessário que a acta da assembleia de condóminos especifique claramente os critérios que levaram à repartição das despesas e que a proposta seja aprovada por um grupo de condóminos que represente, pelos menos, 2/3 do valor do prédio e sem qualquer oposição, ou seja, alguns condóminos podem abster-se, mas nenhum pode votar contra.
Fixado o critério de repartição das despesas, há que definir o método de pagamento, que assume, regra geral, a forma de quotas.
A quota de condomínio é a prestação periódica – normalmente, mensal – com que cada condómino contribui para assegurar o pagamento das despesas comuns.
O montante da quota deve, então, ser determinado em função das despesas previstas para cada ano e devidamente aprovado pela assembleia de condóminos, em sessão própria convocada para o efeito – “desde que, na convocatória para uma assembleia de condóminos, não se faça constar que se vai tratar da fixação da comparticipação dos condóminos nas despesas – as quotas de condomínio –, é inválida a deliberação sobre tal matéria. Só não o seria, se todos os condóminos tivessem comparecido e concordassem que se deliberasse sobre tal assunto.” – Tribunal da Relação de Lisboa, sentença proferida em 1991.
À quota normal do condomínio podem somar-se outras prestações que tenham como objectivo fazer face a despesas extraordinárias. É o caso do Fundo Comum de Reserva, que a própria lei impõe, ou ainda eventuais despesas relacionadas, por exemplo, com custas judiciais, já que a possibilidade de ter de recorrer aos Tribunais nunca deve ser posta de parte.
Após esta exposição preliminar, vejamos então se assiste razão aos Demandantes.
Resulta dos factos provados que não existe qualquer deliberação da assembleia de condóminos (órgão de administração do condomínio) a criar uma “quota administrativa”. Da mesma forma, não resulta do regulamento de condomínio aprovado a criação de qualquer “quota administrativa”. No decorrer da audiência de julgamento, a Demandada, por diversas vezes, referiu que esta “quota administrativa” se encontrava aprovada porque os condóminos aprovaram a proposta de Orçamento para 2008. Vejamos se assim é:
A acta n.º 33, junta aos autos a fls. 27 e seguintes, aprovou, com os votos contra do condómino E, proprietário das Fracções “P”, “AH” e “AI” (permilagem de 74/ºº) e a abstenção do condómino LF, proprietário da Fracção “K” (permilagem de 30/ºº) a proposta de Orçamento para o ano de 2008. Ora, da referida proposta de Orçamento não consta qualquer “quota administrativa”, pelo que não podemos considerar que a mesma tenha sido aprovada, ainda que tacitamente. Mesmo que tivesse sido aprovada por constar na proposta de Orçamento para 2008, o que não aconteceu, sempre esta deliberação seria inválida.
No caso concreto, não constava da Ordem de Trabalhos que a assembleia de condóminos iria aprovar o Orçamento para 2008, o qual fixou a quota de condomínio do Demandante em € 35,51 (trinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos). Tal significa que a deliberação que aprovou a proposta de Orçamento para 2008 é inválida. “I – Desde que, na convocatória para uma assembleia de condóminos, não se faça constar que se vai tratar da fixação da comparticipação dos condóminos nas despesas – as quotas de condomínio –, é inválida a deliberação sobre tal matéria. II – Só não o seria, se todos os condóminos tivessem comparecido e concordassem que se deliberasse sobre tal assunto. III – A invalidade de uma deliberação não acarreta invalidade de tudo o mais que, então, se tenha deliberado” – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 19/12/1991, Col. Jur. XVI, 5, 142.
Ou seja, mesmo que constasse da proposta de Orçamento para 2008 uma rubrica “quota administrativa” e que a referida proposta fosse aprovada em assembleia de condóminos, o facto de esta deliberação não constar na Ordem de Trabalhos, fazia com que a mesma fosse inválida e, consequentemente, anulável. Situação que seria ultrapassável se estivessem presentes todos os condóminos, o que não se verificou.
Não pode este Tribunal deixar de referir que um Orçamento, ou a sua proposta, sempre deverá ser um documento claro, que não deixa quaisquer dúvidas de interpretação aos condóminos que o irão aprovar. Da leitura atenta da 2ª página do mesmo (cálculo orçamento 2ª Fase) resulta claro que as despesas são apenas repartidas por uma permilagem de 972 (ao invés de 1000), não estando incluída a Fracção “A”, correspondente à Cave, que detém uma permilagem de 28/ºº. Quanto à explicação avançada pela Demandada quanto à razão de ser desta “quota administrativa”, que seria fazer face a despesas relacionadas com o papel, as fotocópias, as cartas, os selos, etc., no fundo despesas/encargos administrativos, não entende o Tribunal porque razão as mesmas não estão incluídas na rubrica “Encargos Administração”, orçamentada em € 1.161,48 (mil cento e sessenta e um euros e quarenta e oito cêntimos)!!!
Não pode ainda o Tribunal deixar de referir que a quantia de € 1.051,74 (mil e cinquenta e um euros e setenta e quatro cêntimos), respeitante a Fundo de Reserva (10%), a que também se chama Fundo Comum de Reserva, não corresponde à quantia de 10% referida. Ou seja, o financiamento deste fundo deve ser assegurado pelas contribuições dos condóminos e corresponder, pelos menos, a 10% da quota mensal estipulada. Assim, se as quotas anuais correspondem a uma receita de € 11.253,72 (onze mil duzentos e cinquenta e três euros e setenta e dois cêntimos), o Fundo de Reserva teria de ser, no mínimo, de € 1.125,37 (mil cento e vinte e cinco euros e trinta e sete cêntimos), que corresponderiam a 10% das receitas anuais de quotas de condomínio.
Por último, não conseguiu o Tribunal vislumbrar qual a fórmula em que a Demandada se baseou para chegar a uma quota de condomínio mensal relativa aos Demandantes de € 35,51 (trinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos), uma vez que o Orçamento se encontrava rasurado quanto aos Encargos Administrativos e quanto às Antenas.
Resulta, assim, claro que a “quota administrativa” criada pela Demandada é inválida, uma vez que a mesma não consta de qualquer acta de assembleia de condóminos, não consta do regulamento de condomínio aprovado na acta n.º 1 e também não consta da proposta de Orçamento de 2008, ainda que tacitamente. Desta forma, não pode a Demandada exigir aos Demandantes qualquer quantia referente a uma “quota administrativa”, por mais diminuta que a mesma seja, mas apenas e só, a quantia de € 35,51 (trinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos) correspondente à quota mensal de condomínio. O facto de o Tribunal considerar que a deliberação da proposta de Orçamento de 2008 é inválida, não é relevante para os presentes autos, uma vez que a Demandante nada pediu quanto à mesma.

Face ao que antecede e às disposições legais aplicáveis, julgo a presente acção totalmente procedente por provada e, em consequência, declaro que os Demandantes não devem à Demandada nenhuma “quota administrativa”, devendo, por isso mesmo, os Demandantes proceder ao pagamento mensal da quota de condomínio no valor de € 35,51 (trinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos) e condeno a Demandada na devolução aos Demandantes do valor de € 8,65 (oito euros e sessenta e cinco euros) que estes pagaram a mais com as quotas dos meses de Março a Julho de 2008.

Custas: Declaro parte vencida a Demandada, a qual vai condenada no pagamento das custas do processo, no valor de € 70,00. A Demandada deverá efectuar o pagamento das custas em dívida, no valor de € 70,00 (setenta euros), num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, incorrendo numa sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no efectivo cumprimento dessa obrigação, conforme disposto nos números 8º e 10º da Portaria 1456/2001, de 28 de Dezembro. Decorridos dez dias sobre o termo do prazo supra referido sem que se mostre efectuado o pagamento, será entregue certidão da liquidação da conta de custas ao Ministério Púbico, para efeitos executivos, no valor então em dívida, que será de € 135,00 (cento e trinta e cinco euros).
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida Portaria em relação aos Demandantes.
Esta sentença foi lida na presença de todos, considerando-se dela pessoalmente notificados.