A procuração é um instituto reconhecido no nosso ordenamento jurídico (cfr. os art. 262º e segs. do CC) que tem também aplicação no âmbito da propriedade horizontal (cfr. art. 1431º nº 3 do CC).
Viver em condomínio
5/07/2021
Limitar numero procurações
5/04/2021
Procuração
Art. 262º
1. Diz-se procuração o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos.
2. Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar.
1 - As procurações que exijam intervenção notarial podem ser lavradas por instrumento público, por documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento presencial da letra e assinatura ou por documento autenticado.
2 - As procurações conferidas também no interesse de procurador ou de terceiro devem ser lavradas por instrumento público cujo original é arquivado no cartório notarial.
3 - Os substabelecimentos revestem a forma exigida para as procurações.
1 - É permitida a representação por meio de procurações e de substabelecimentos que, obedecendo a algumas das formas prescritas no artigo 116.º, sejam transmitidos por via telegráfica ou por telecópia, nos termos legais.
2 - As procurações ou substabelecimentos devem estar devidamente selados.
Dada a natureza dos assuntos a submeter, em regra, à assembleia ordinária, bastará que o condómino dela ausente outorgue um mandato verbal ou, para maior facilidade da sua prova, escrito em documento particular."
Procuração e mandato são figuras distintas, como decorre do preceituado nos art. 262º e 1157º do CC. O mandato é um contrato, enquanto a procuração é um acto unilateral.
Na nossa lei civil fundamental a representação é dominada pela procuração. Esta tem, na linguagem jurídica corrente, um duplo sentido: traduz o acto pelo qual se confiram, a alguém, poderes representação – e, em simultâneo, exprime o documento em que tal negócio tenha sido exarado (cfr. art. 262º do CC).
Enquanto acto, a procuração é um negócio jurídico unilateral: reclama apenas um única declaração de vontade, não sendo necessária qualquer aceitação para que produza os seus efeitos: caso não queria ser procurador, o beneficiário terá de renunciar á procuração (cfr. art. 265º nº 1 do CC). A procuração, enquanto negócio jurídico, está, naturalmente, submetida aos respectivos preceitos gerais.
O Código Civil actual cindiu a procuração do mandato: a primeira promove a concessão de poderes de representação; o segundo dá lugar a uma prestação de serviço (cfr. art. 1157º daquele diploma legal).
Mandato e representação podem coexistir, mas tal coincidência não tem necessariamente que acontecer. “O mandato impõe a obrigação de celebrar actos jurídicos por conta de outrem; a procuração confere o poder de os celebrar em nome de outrem” (Galvão Telles, Contratos Civis, pág. 71).
Pelo mandato constitui-se um vínculo jurídico, através do qual o mandatário se vincula à prática de um ou mais actos jurídicos. Já a procuração não tem o efeito de obrigar o representante a uma actividade de gestão, pois, com a procuração, o representante apenas fica autorizado ao desenvolvimento de determinada gestão. Assim, pode haver procuração sem mandato.
Vale por dizer: a procuração pode ser verbal ou escrita, consoante os negócios a concluir sejam consensuais ou requeiram forma escrita; quando para estes se exija escritura pública, aquela pode assumir a forma de instrumento público, documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento presencial da letra e assinatura ou por documento autenticado (Neste sentido o Mestre João Nuno Calvão da Silva, Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra).
Na síntese de Antunes Varela e Pires de Lima, “O n° 2 [o art. 262°, n° 2, do CC] contém uma regra que, em face dos princípios expressos no art. 127° do Código do Notariado [actual art. 116° do CN], será seguramente de aplicação pouco frequente quanto a actos em que deva haver intervenção notarial. É, no entanto, uma regra geral de aplicação certa nos casos em que se exija para o acto apenas a forma escrita. Quando assim seja, a procuração deve igualmente ser passada por escrito. Em relação a actos para os quais se não exija sequer a forma escrita valerá a procuração verbal.” Vide Pires de Lima e Antunes Varela (com a colaboração de M. Henrique Mesquita), Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, pág. 244. (parêntesis nosso).
E também o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-01-2012 decidiu que:
"I - Através de uma procuração são outorgados poderes de representação que se traduzem na possibilidade de alguém – o procurador – praticar actos e celebrar negócios que produzem efeitos na esfera jurídica do representado.
II - Estando em causa actos de administração ordinária, v.g., verificar e assegurar a conservação do imóvel, administrar o prédio, receber rendas, etc., não carece o procurador, para o exercício desses poderes, de se munir de um documento que o ateste, na forma escrita, ou lavrado nos termos dos arts. 116º e 117º do Cód. do Notariado.
III - Em situações dessa natureza, a lei basta-se com a mera procuração verbal. Sem a observância de qualquer forma escrita.
IV- A procuração, como acto unilateral que é, ainda que verbal, expressa uma declaração de vontade do representado, em que confere poderes ao procurador para o representar e, em seu nome, praticar os actos que forem necessários, por sua conta e em seu nome. Porém, os efeitos dos actos praticados produzem-se e repercutem-se directamente na esfera jurídica e no património daquele."
Coisa diversa resulta, por exemplo, no caso de celebração de um negócio jurídico de compra e venda de imóveis, em que a procuração para a concretização do respectivo negócio necessita de ser documentada, possuir suporte escrito e obedecer às formalidades previstas no CN quanto a actos em que deva haver intervenção notarial. Ou seja, deve revestir a forma exigida para o negócio jurídico que o procurador pretenda realizar e a que a lei alude no nº 2 do art. 262º do CC.
Conclusão que pode ser lida no mesmo sentido em Antunes Varela, no “Código Civil Anotado”, I Vol., pág. 244., pela qual ensina o autor que não será, necessária uma procuração escrita para a prossecução das actividades de mera administração ordinária do prédio, porquanto a lei se satisfaz com a procuração verbal, donde, não ser portanto exigível a forma escrita para qualquer acto de mera gestão do prédio.
Assim sendo, importa, por conseguinte, aferir quais as consequências dessa representação voluntária desenvolvida pelo procurador.
Assentando a representação voluntária na ideia de que a emissão de uma procuração em nome de alguém, ou a atribuição do papel de procurador e a escolha deste, se assume como um acto de demonstração de confiança do dador de poderes para aquele, é evidente que os actos praticados pelo procurador e os efeitos dos negócios realizados nos limites desses poderes se produzem na esfera jurídica do representado.
A procuração, enquanto declaração unilateral de atribuição e concessão de poderes representativos, ainda que verbal, produz plenos efeitos impondo ao procurador o dever de agir de acordo com esses poderes, salvo se a procuração for revogada pelo representado, nos termos que constam do art. 265º, nº 2, do CC.
Sobre o papel e a função da procuração, e poderes do procurador, ensina Pedro Pais de Vasconcelos que a procuração não tem uma causa típica. Do modo como está construída não desempenha uma função económico-social típica, limitando-se a determinar o nascimento de um poder de representação na esfera jurídica do procurador. E o simples facto de alguém ser titular de um poder de representação em relação ao dominus, sendo seu procurador, não significa que haja necessidade de justificar a razão pela qual lhe foram outorgados os poderes de representação a não ser pela invocação da qualidade de procurador, que resulta da procuração
Assim, a procuração, como acto unilateral que é, expressa uma declaração de vontade do representado, em que confere poderes ao representante para o representar e, em seu nome, praticar os actos que forem necessários, por sua conta e em seu nome. O que significa que os efeitos dos actos praticados produzem-se e repercutem-se directamente na esfera jurídica e no património daquele. Esta relação de representação tem, pois, efeitos externos.
Para esses efeitos adverte-nos também Enzo Roppo, dizendo: "A procuração está, destinada, pela sua natureza, a operar nas relações com terceiros, a atingir posições de terceiros: o seu objectivo é, com efeito, exactamente o de determinar, através da actividade do representante, a produção de efeitos jurídicos directamente entre o representado e terceiros com quem o primeiro contrata."
E continua: "Mas a relação (externa) de representação ficaria, como que suspensa no vazio, abstracta, desprovida de justificação, se não se fundasse numa diferente e autónoma relação interna entre representante e representado, que constitua a sua razão justificativa, que explique – de um ponto de vista substancial, do ponto de vista dos interesses e das posições recíprocas de representante e representado – porque o primeiro tem o poder de vincular juridicamente o segundo nas relações com terceiros."
Clarificando finalmente que: “Essa relação interna entre representante e representado que, embora sendo distinta e autónoma da relação (e do poder) de representação, lhe está na base, a suporta e justifica, chama-se relação de gestão. E as relações de gestão subjacentes à representação podem ser diversas: pode tratar-se, por exemplo, de um mandato”.
Pese embora esta referência ao mandato, da parte de Enzo Roppo, é sabido que o mandato é diverso da procuração (cfr. art. 1157º e 262º, ambos do CC). Enquanto o mandato, integrado na categoria dos contratos, é um negócio jurídico bilateral, um contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra, a procuração constitui, como se disse, um acto unilateral pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos.
4/24/2021
A AG como órgão colegial
«Pedimos cuidado para a interpretação do Artigo 5º, número 1 da Lei 1º-A/2020, de 19 de março, com a redação mais recente pela Lei n.º 1-A/2021, de 13 de janeiro, que refere:
“A participação por meios telemáticos, designadamente vídeo ou teleconferência de membros de órgãos colegiais de entidades públicas ou privadas nas respetivas reuniões, não obsta ao regular funcionamento do órgão, designadamente no que respeita a quórum e a deliberações, devendo, contudo, ficar registado na respetiva ata a forma de participação.”
Portanto, não devemos confundir uma assembleia de uma associação, partido político, acionistas de uma empresa, entre outras, pois estas sim, são uma assembleia de um órgão colegial, como o próprio artigo informa, com regras e estatutos próprios de funcionamento.
A assembleia de condóminos não é exemplo de um órgão colegial.»
4/23/2021
Assembleias online
O que é uma Assembleia online (virtual)?
Uma Assembleia online ou virtual é uma reunião de condóminos realizada no ambiente digital (rede de internet) através do uso de diversos meios telemáticos (aplicativos) disponibilizados gratuitamente por várias empresas, a qual, pode ser uma interessante alternativa às assembleias presenciais porquanto pode promover uma maior participação dos condóminos que assim não tem que sair do conforto do lar para se deslocarem ao local de realização da reunião plenária.
As assembleias virtuais vieram para ficar?
A era digital com os seus constantes avanços tecnológicos estão continuamente a modificar a forma como interagimos uns com os outros e com o mundo em geral, pelo que, os condomínios, para o seu regular funcionamento administrativo, podem e devem acompanhar esta evolução, podendo também as assembleia adaptar-se a esta nova realidade.
Quais são as vantagens?
As vantagens e benefícios atinentes à realização de assembleias virtuais têm-se muito superiores às eventuais desvantagens (a maior desvantagem será porventura o facto de alguns condóminos poderem não dominar esta nova tecnologia). Mas a maior vantagem será indubitavelmente a objectividade, porquanto, os condóminos terão que se focar nos pontos em discussão, tendo que fazer propostas, debater e votar de forma mais organizada, evitando-se outrossim, conversas laterais ou comentários descontextualizados.
Acresce sublinhar que esta metodologia promove uma maior participação dos condóminos, sendo que, nos países onde se tem consolidada esta prática, é referida a existência de uma notável convivência durante a realização da reunião plenária.
As assembleias de condomínio virtuais são legais?
Com a reforma operada pelo DL 76-A/2006 passou a existir a possibilidade de se realizarem Assembleias Gerais virtuais (leia-se, por meios telemáticos), nomeadamente através de videoconferência, a qual foi consagrada no art. 377º, nº 6, al. b) do CSC, podendo, assim, realizarem-se Assembleias Gerais através destes meios, desde que os estatutos da sociedade não o proíbam. No entanto, apesar deste artigo apenas dizer respeito às Sociedades Anónimas, por força do art. 248º, nº 1 do mesmo diploma, estende-se às Sociedades por Quotas.
No passado havia quem defendesse que a realização de assembleias de condomínio virtuais era uma prática não conforme à letra lei e portanto, passíveis de impugnação nos termos do art. 1433º do CC. De facto, o regime da propriedade horizontal tinha-se omisso nesta matéria, no entanto, mediante disposição contida no regulamento, aprovada em reunião plenária, por unanimidade, podiam os condóminos reunir-se nestes termos.
No mais, se dúvidas subsistissem, a Lei nº 1-A/2020, no seu art. 5º refere-se a “entidades públicas e privadas” dando a entender que o que se disse em relação às sociedades comerciais se aplica outrossim ao universo completo de pessoas coletivas, a não ser que os estatutos/regulamento destas proíbam a existência de assembleias gerais online. Mesmo que proibidos, e porque se vão buscar soluções para estas entidades privadas ao regime das sociedades comerciais supletivamente, pode permitir-se uma alteração ad hoc ao regulamento do condomínio, nos termos do art. 54º do CSC.
Como são feitas as convocatórias?
Nos termos do art. 1432º, nº 1 do CC, as assembleias são convocadas por meio de cartas registadas, enviadas com 10 dias de antecedência, sendo que a este meio se pode equiparar o envio do documento por meios telemáticos com assinatura electrónica qualificada, que assegure a sua efectiva recepção, nos termos do DL nº 290-D/99, que institui o regime jurídico dos documentos electrónicos e da assinatura digital.
Isto significa que a convocatória poderá ser enviada por e-mail, desde que, (i) respeitando a antecedência fixada no nº 1 do art. 1432º do CC; (ii) informe que a assembleia geral de condóminos decorrerá através de videoconferência (indicando qual a plataforma, software ou aplicativo a usar e como efectuar o acesso); e (iii) seja assinada pela forma indicada e que contenha uma validação cronológica emitida por uma entidade certificadora (os CTT oferecem o serviço Marca do Dia Electrónica, por exemplo).
Como são enviados os documentos?
O art. 289º do CSC estabelece que, com pelo menos 15 dias de antecedência relativamente à data da assembleia, devem ser disponibilizados no site da sociedade – caso exista – os documentos e as informações preparatórios da Assembleia Geral ali mencionados, mas caso este não exista, poderá qualquer accionista requerer que estas informações lhe sejam enviadas no prazo de oito dias após a recepção do pedido, por correio electrónico. No entanto, o envio destas informações por correio electrónico não preclude a obrigação de se enviarem as informações em papel, se o sócio o solicitar.
No âmbito condominial pode-se aplicar, com as necessárias adaptações (não olvidar que na propriedade horizontal, a antecedência exigida é de apenas 10 dias) um idêntico regime, mediante disposição contida no regulamento, aprovada nos termos do art. 1432º, nº 3 do CC. Assim, conjuntamente com a convocatória, o administrador pode obrigar-se a enviar os documentos que lhe sejam exigidos e bem assim toda a informação preparatória da reunião.
Como decorre a assembleia virtual?
Caso os condomínios pretendam optar por este tipo de assembleia torna-se necessário que os meios escolhidos permitam assegurar: (i) a autenticidade e a segurança das comunicações; e (ii) o registo integral da reunião, do seu conteúdo e dos respectivos intervenientes. Neste contexto, a utilização de meios telemáticos e a preocupação em registar a forma de participação foi também reforçada pela Lei nº 1-A/2020 que no respectivo art. 5º refere que “a participação por meios telemáticos, designadamente vídeo ou teleconferência de membros de órgãos colegiais de entidades públicas ou privadas nas respectivas reuniões, não obsta ao regular funcionamento do órgão, designadamente no que respeita ao quórum e às deliberações, devendo, contudo, ficar registado na respectiva acta a forma de participação”. Importa também sublinhar que a realização destas reuniões não pode prejudicar “o regular funcionamento do órgão”, ou seja, a colegialidade da assembleia, pelo que se se verificar interrupção da transmissão por problemas técnicos ou hackers, isso pode determinar a invalidade das deliberações tomadas em plenário.
Destarte, sendo possível a reunião em assembleias gerais utilizando estes meios, colocam-se uma série de questões, pois a realização de reuniões por meios telemáticos tem riscos, e tem uma grande capacidade para litígios, nomeadamente a possibilidade de violação do direito à participação na assembleia de todos os condóminos em condições de participação, discussão e votação e a violação das regras de segurança, autenticidade, identificação dos representantes dos condóminos ou de terceiros titulares de direitos sobre as fracções e registo da reunião. Isto pode levar à consequente invalidade das deliberações tomadas.
No caso de quem assista por videoconferência, numa assembleia virtual ou numa assembleia mista, nos termos da lei, é necessário: (i) assegurar a possibilidade de cada condómino intervir plenamente na reunião, permitindo-se-lhe colocar questões, fazer propostas e votar; (ii) garantir a segurança da videoconferência e verificar a qualidade e a identidade dos participantes na assembleia; e (iii) assegurar a gravação, de modo a poder registar-se o conteúdo da reunião.
Neste caso, para se garantir a autenticidade das declarações e se verificar a identidade dos condóminos importa realizar-se uma verificação visual, que deve ficar registada para comprovar que aqueles condóminos estiveram presentes na reunião e nela participaram. Este expediente pode substituir a tradicional lista de presenças. Quanto ao registo do conteúdo da assembleia através da gravação integral da mesma, atendendo que pode interferir com a protecção de dados pessoais e com a invasão na vida privada dos condóminos, o registo pode ser feito apenas em formato áudio, a não ser quando o regulamento consinta o registo em formato vídeo.
Em relação aos condóminos que pretendam ser representados por via de mandato, estes deverão enviar por correio electrónico ou carta registada uma competente procuração ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral, assinada ou com assinatura digital, e este documento deve ser aceite pelo mesmo como representação válida.