Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

6/02/2021

2ª convocação 30 min. depois


Se da convocatória constar o seguinte texto «Não estando presentes e/ou representados condóminos em número suficiente para se formar o quórum constitutivo e obter vencimento, a assembleia de condóminos reúne-se meia hora depois», estamos perante uma segunda convocatória?

Do art. 1432º, nº 4 do CC, não se retira que, em caso de falta de quórum para a constituição da primeira assembleia, a segunda tenha de ter lugar sete dias depois, porquanto tem-se esta uma norma supletiva, que não impede a fixação de prazo mais curto, dentro dos limites da boa fé. Ou seja, a lei estabeleceu uma norma claramente supletiva, com a finalidade de simplificar a convocatória da segunda reunião.

Com efeito, a lei não impõe que a nova assembleia seja convocada dentro de uma semana. O art. 1432º nº 4 do CC estabelece que, não havendo quórum e não se tendo indicado nova data na convocatória, considera-se convocada nova assembleia para uma semana depois, na mesma hora e local, podendo, nesse caso, a assembleia deliberar por maioria de votos dos condóminos presentes, desde que representem pelo menos ¼ do valor do prédio.

A lei não estabeleceu, pois, um prazo fixo de uma semana entre a primeira e a segunda data, como pretende Abílio Neto, Manual da Propriedade Horizontal. Almedina, 3.ª edição, pág. 335-6. Segundo este autor, no art. 1434º, nº 4, do CC, o legislador ficcionou ser essa a dilação mínima aceitável para que os condóminos reponderassem a necessidade ou conveniência de estarem presentes na assembleia.

Não está, pois, vedada a possibilidade de fixação de um prazo mais curto, dentro dos limites da boa fé, como defende Sandra Passinhas, A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal, Almedina, pág. 226. Solução que não choca porque os condóminos já tiveram oportunidade de se preparar para a assembleia na sequência da primeira convocatória. Recorde-se que na redacção anterior ao DL 267/94, de 25/10, o nº 3 ao art. 1432º do CC estabelecia que, na falta de quórum a nova reunião seria convocada dentro dos dez dias imediatos.

Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. III, 2.ª edição, pág. 446, sublinhavam não existir um intervalo mínimo, embora recusassem a possibilidade de a segunda reunião ocorrer no dia em que falhou a primeira convocatória, perigo que estava esconjurado pela necessidade de ser enviada carta convocatória.

Não é, pois, admissível a segunda convocatória com a mera dilação de meia hora, pois tal não salvaguarda a conveniência de se dar àqueles que não compareceram a possibilidade de o fazerem. Ao determinar uma segunda convocatória em caso de falta de quórum da primeira pretende-se propiciar uma maior afluência de condóminos atenta a natureza dos interesses envolvidos.

E, uma vez que na segunda assembleia o quórum é menos exigente, é necessário evitar que a segunda assembleia tenha lugar na mesma data da primeira, com uma mera dilação horária, pois na prática as deliberações seriam tomadas com uma menor representatividade do capital investido, sem se ter dado uma segunda oportunidade aos condóminos.

Em síntese, a lei não fixa um prazo mínimo de dilação entre a primeira e a segunda assembleias, mas tal prazo não deve ser tão exíguo que impeça a possibilidade de os que não compareceram à primeira poderem comparecer à segunda, pelo que se deve ter por excluída a possibilidade de a segunda assembleia ser convocada com uma dilação de meia hora relativamente à primeira.

Não obstante constar da convocatória que, em caso de falta de quórum a assembleia de condóminos se reunirá meia hora depois, o que se verifica não é uma segunda assembleia reunida meia hora depois, mas uma primeira assembleia que se iniciou com uma dilação de meia hora.

A questão apenas assumirá relevância para efeitos da anulabilidade prescrita no art. 1433º do CC, se a assembleia reunir meia hora depois, em segunda convocatória e subsequentemente deliberar com o quórum reduzido a que alude o art. 1432º, nº 4, CC (maioria de votos dos condóminos desde que representassem ¼ do valor do prédio).

Em bom rigor, poucas serão as assembleias de condóminos cujos trabalhos se iniciem à hora designada na convocatória, especialmente se a hora designada coincidir por exemplo com a hora em que as pessoas que trabalham estarão regressando a casa.

Para se evitarem confusões, o mais avisado será o administrador, aquando da convocação da assembleia, ressalvar na respectiva convocatória que «Não estando presentes e/ou representados condóminos em número suficiente para se formar o quórum constitutivo e obter vencimento, a assembleia de condóminos suspende-se por meia hora e recomeça às (...) horas, nos termos do art. 1432° n° 3 do Cod. Civil». 
 
Neste termos, pese embora a convocação se realize meia hora depois da hora primitivamente fixada, continuará a exigir-se o quórum constitutivo de metade mais um da totalidade dos condóminos.

6/01/2021

Obras - regras

O art. 1305º do CC coloca ao lado dos poderes de que goza o proprietário (uso, fruição e disposição), as restrições ou limites impostas por lei, sendo que tais restrições podem ser de direito público, como a expropriação por utilidade pública, ou de direito privado, como as que derivam de relações de vizinhança, que têm em vista regular conflitos de interesses que surgem entre vizinhos.

No que concerne à realização de obras nas fracções autónomas, a sua feitura está desde logo sujeita aos condicionalismos impostos pelo regime da propriedade horizontal e cumulativamente pela salvaguarda das boas relações de vizinhança.

Destas sortes, sobre os condóminos que pretendam proceder à realização de quaisquer tipo de obras nas suas respectivas fracções autónomas, impendem duas obrigações:

- Devem respeitar o horário fixado pela lei, sendo que as obras apenas podem ser realizadas nos dias úteis entre as 8 e as 20 horas, para salvaguarda do direito ao descanso dos restantes condóminos (cfr. art. 16º , nº 1, DL 9/2007, de 17/01/2007, que aprova o Regulamento Geral do Ruído).

- Devem informar o administrador que, por sua vez, publicitará em local de passagem a informação aos restantes condóminos relativamente às obras que se irão realizar – nomeadamente, o período de tempo em que a mesma irá decorrer, mencionando em que período horário possa ocorrer maior intensidade de ruído (cfr. art. 16º , nº 2, DL 9/2007, de 17/01/2007, que aprova o Regulamento Geral do Ruído).

No entanto e não obstante estas regras, importa salientar que nos termos do art. 17º do mesmo diploma, não estão sujeitos às limitações previstas nos art. 14º (Actividades ruidosas temporárias), 15º (Licença especial de ruído) e 16º (Obras no interior de edifícios), os trabalhos ou obras em espaços públicos ou no interior de edifícios que devam ser executados com carácter de urgência para evitar ou reduzir o perigo de produção de danos para pessoas ou bens. 

Acresce também ressalvar que nos termos do art. 18º (Suspensão da actividade ruidosa) as actividades ruidosas temporárias e obras no interior de edifícios realizadas em violação do disposto nos art. 14º a 16º do referido regulamento são suspensas por ordem das autoridades policiais, oficiosamente ou a pedido do interessado, devendo ser lavrado auto da ocorrência a remeter ao presidente da câmara municipal para instauração do respectivo procedimento de contra-ordenação. 

A fiscalização do cumprimento das normas previstas no presente Regulamento Geral do Ruído compete:

(i) à Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território; 

(ii) à entidade responsável pelo licenciamento ou autorização da actividade; 

(iii) às comissões de coordenação e desenvolvimento regional;

(iv) às câmaras municipais e polícia municipal, no âmbito das respectivas atribuições e competências; 

(v) às autoridades policiais e polícia municipal relativamente a actividades ruidosas temporárias, no âmbito das respectivas atribuições e competências; e 

(vi) às autoridades policiais relativamente a veículos rodoviários a motor, sistemas sonoros de alarme e ruído de vizinhança (cfr. art. 26º do diploma).

Nos termos do art. 28º (Sanções) constitui contra-ordenação ambiental leve, a realização de obras no interior de edifícios em violação das condições estabelecidas pelo nº 1 do art. 16º e o não cumprimento da obrigação de afixação das informações nos termos do nº 2, e ressalvando-se no nº 3 deste preceito que a negligência e a tentativa são puníveis, sendo nesse caso reduzido para metade os limites mínimos e máximos das coimas referidos no presente Regulamento. 

Dispõe também o art. 30º (Processamento e aplicação de coimas), no seu nº 1 que "o processamento das contra-ordenações e a aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias é da competência da entidade autuante, sem prejuízo do disposto nos números seguintes", pelo que, no que nos aproveita, aplica-se precisamente o que estatui o número seguinte: "Compete à câmara municipal o processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas e sanções acessórias em matéria de actividades ruidosas temporárias e de ruído de vizinhança."