Viver em condomínio

Viver em condomínio não é um processo pacífico face à dificuldade de harmonizar e conciliar a dupla condição de proprietários e comproprietários, pelo que, importa evitar situações susceptíveis de potenciar o surgimento de conflitos de vizinhança. O desiderato deste blogue é abordar as questões práticas inerentes ao regime jurídico da propriedade horizontal, atento o interesse colectivo dos condóminos em geral e administradores em particular.

3/16/2023

Usufruto vs Uso e Habitação


João e Ana são avós de Cláudia e pretendem doar-lhe o imóvel onde residem. No entanto, pretendem continuar a viver no mesmo imóvel até ao fim dos seus dias. Para acautelar o seu direito à posse do imóvel estão em dúvida se é mais vantajoso constituir um usufruto sobre o imóvel ou um direito de uso e habitação. 
Quid iuris?

Apreciando

Apesar de o usufruto e o direito de uso e habitação constituírem direitos reais, em termos práticos, são muito distintos, como veremos de seguida:

O artigo 1439º do Código Civil define o usufruto como o “direito de gozar temporária e plenamente de uma coisa ou direito alheio sem alterar a sua forma ou substância”. Já a noção de uso vem consagrado no art. 1484º do CC ao referir que o direito de uso consiste na faculdade de se servir de certa coisa alheia e haver os respetivos frutos, na medida das necessidades, quer do titular, quer da sua família. Quando este direito se refere a casa de morada chama-se direito de habitação.

A partir da análise das duas noções supra facilmente se conclui que se tratam de dois institutos jurídicos distintos, mas vejamos, de seguida, as principais diferenças: O beneficiário do usufruto beneficia de um poder muito mais vasto sobre o bem imóvel uma vez que poderá usar o bem de boa-fé como se do real proprietário se tratasse, pelo que será igualmente responsável pelo pagamento dos impostos, como por exemplo, o pagamento anual do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI);

O direito de uso é um direito pessoal, intransmissível e impossível de ser onerado, dado que o uso do imóvel visa apenas a satisfação das necessidades pessoais do seu titular e agregado familiar mas já não de terceiros, pelo que o seu titular apenas o poderá usar como sua habitação e da sua família e apenas para satisfação das suas necessidades. No entanto, o direito de uso e habitação pertence apenas ao seu titular e já não à sua família.

Denote-se que extinguindo-se o direito de uso e habitação do seu titular o mesmo acontece relativamente aos membros da sua família. Já o usufruto caracteriza-se pela possibilidade de transmissão ou de oneração, salva as restrições impostas pelo título constitutivo ou pela lei (cfr. art. 1444º do CC).

O direito de uso e habitação é um direito pessoal e como tal não pode ser penhorado. No entanto, existe uma situação excepcional que ocorre quando o imóvel sobre o qual índice o direito de uso e habitação tiver registada uma garantia real como por exemplo uma hipoteca, anterior ao registo da constituição do direito de uso e habitação.

Existindo uma garantia real registada e o imóvel venha a ser vendido em processo executivo, o direito de uso e habitação é inatacável no âmbito da execução movida contra o titular do direito de uso e habitação mas a mesma conclusão já não se aplica ao proprietário porque o seu direito de propriedade é atacável em sede de processo executivo.

3/12/2023

Definição de prédios

 

O Código Civil distingue coisas imóveis de coisas móveis, nos termos do art. 203º do CC. O legislador optou, no entanto, por não definir coisa imóvel, apresentando antes uma lista de coisas que considera imóveis. 

Confrontando as várias categorias de coisas imóveis, existem dois tipos fundamentais: coisas imóveis por natureza e coisas imóveis por relação. As coisas imóveis por natureza compreendem os prédios rústicos e urbanos e as águas, no seu estado natural. As coisas imóveis por relação, não sendo em si imóveis, têm tal categoria por disposição da lei, nelas se incluindo todas as demais coisas enumeradas pela mesma como tal. 

Assim sendo, nesta segunda categoria de imóveis encontramos realidades que teriam a natureza de coisas móveis. A sua qualificação como imóveis advém de certa relação que mantêm com as coisas imóveis, o que permite concluir que quebrada a referida relação, estas coisas readquirem a sua qualidade de móveis e, por outro lado, o objectivo do legislador terá sido o de aplicar-lhes o regime das coisas imóveis, muito mais do que qualificar essas coisas como imóveis. 

A lei tem preocupação em definir prédio rústico e prédio urbano (cfr. nº 2 do art. 204º do CC). Assim sendo, prédio rústico é uma parte delimitada do solo terrestre e as construções nela existentes que não tenham autonomia económica. Já prédio urbano é qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro. 

Existem, contudo, de prédios mistos. O CC adoptou, porém, a solução de não admitir prédios mistos e alargar o conceito de prédios rústico e urbano, de forma a incluir nessas categorias, as situações referidas. 

A lei qualifica também como imóvel os direitos inerentes aos imóveis elencados, o que significa que aqui estão abrangidos os direitos reais (direitos sobre as coisas, tal como o direito de propriedade ou o direito de usufruto). Finalmente, são elencados como imóveis as partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos, ou seja, toda a coisa móvel ligada materialmente ao prédio com carácter de permanência, nos termos do nº 3 do art. 204º do CC.

O que é um prédio rústico
 
São designados rústicos, os terrenos que se encontrem fora de uma zona urbana, não podendo estes estar classificados como terrenos para construção e podendo apenas ser utilizados para fins agrícolas. Caso se encontrem dentro de zonas urbanas, serão considerados rústicos caso tenham unicamente rendimentos agrícolas. Podem igualmente ser considerados prédios rústicos, os edifícios e construções, que no terreno estejam construídos, desde que estejam somente afectos à produção de rendimentos agrícolas
 
Para a AT são prédios rústicos os edifícios e construções implantados em terrenos classificados como prédios rústicos, desde que esses edifícios e construções estejam directamente afectos à produção de rendimentos agrícolas ou silvícolas. Assim, os edifícios e construções, ainda que situados em prédios rústicos, só podem ser classificados como prédios rústicos (na medida em que são parte integrante dos prédios rústicos em que se situam) desde que estejam directamente afectos ao exercício e apoio da actividade agrícola ou silvícola que é desenvolvida nos prédios rústicos onde se integram, o que implica que sejam utilizados na produção ou no armazenamento das espécies vegetais dela resultantes ou na instalação e arrumo das alfaias e máquinas necessárias ao exercício daquelas actividades.

O que significa que os edifícios e construções situados em prédios rústicos que não estejam a ter esta afectação directa à produção de rendimentos agrícolas ou silvícolas não podem ser classificados como prédios rústicos, por não serem parte integrante dos prédios rústicos onde se situam, antes constituindo uma realidade física autónoma sem qualquer ligação funcional a esses prédios rústicos, devendo por isso ser classificados como prédios urbanos.

O que é um prédio urbano
 
Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, nem mistos. São considerados prédios urbanos, as construções de carácter habitacional, comercial, industrial ou para serviços, terrenos para construção, entre outros. 
 
Assim, considera-se prédio urbano, para além dos imóveis já edificados e incorporados no solo, qualquer terreno para construção, considerando-se como tal o terreno para o qual tenha sido concedido alvará de loteamento, aprovado projecto ou concedida licença de construção, e ainda aquele que assim tenha sido declarado no título aquisitivo, nos termos previstos no nº 3 do art. 6º do Código da Contribuição Autárquica;

Considera-se ainda prédio urbano, para os mesmos efeitos, qualquer terreno situado em solo urbano, considerando-se como tal aquele para o qual esteja reconhecida vocação para o processo de edificação, de acordo com o estabelecido em plano municipal de ordenamento do território (art. 15º da Lei nº 48/98, de 11 de Agosto; art. 72º do DL nº 380/99, de 22 de Setembro; e art. 41º do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro, na redacção dada pelo DL nº 177/2001, de 4 de Junho);

O que é um prédio misto
 
Sempre que um prédio tenha uma parte rústica e urbana será classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal. Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio será havido na sua totalidade como misto.